NEM OUTRA COISA SERIA DE ESPERAR
O recém galardoado com o Prémio Nobel não deixa os seus méritos por mãos alheias. Como seria de prever, faz o elogio do Tea Party num artigo de opinião, publicado no El Pais de hoje.
O ultra-neoliberal peruano, que elegeu a Espanha como sua pátria e Nova York como sua residência, começa por fazer a defesa da tese peregrina – hoje desmentida pelos factos – de que o advento do Tea Party pode constituir uma espécie de bênção para o Partido Democrático, pelas complicações e divisões que o movimento pode causar nas hostes do Partido Republicano.
Se nos primórdios do lançamento do Tea Party ainda seria lícito pensar assim, hoje a defesa de tal ponto de vista não tem a menor consistência. Os neocons entenderam-se com o Tea Party na maioria dos estados e raros são os casos em que os candidatos do Partido Republicano não são apoiados por uns e por outros.
Muito mais grave do que um erro de apreciação, voluntário ou involuntário, é o elogio feito ao movimento em nome de algo muito saudável, realista, democrático e profundamente libertário, vindo do interior das suas entranhas, como que fazendo reviver o que de mais profundo e valioso existe nos fundamentos da nação americana.
Claro que o novel Prémio Nobel tem que se distanciar, nem que seja pelo emprego das conhecidas figuras de estilo, de algumas das maiores bestialidades do Tea Party, como a de garantir que Obama é um muçulmano clandestino empenhado na instauração do socialismo na América (só falta mesmo dizer que é em nome do Islão!), da convivência de Christine O’Donnell com bruxas, da criação do virus da SIDA pelos homossexuais, da imposição do criacionismo bíblico nas escolas, ou da incultura de Sarah Palin ou de Glenn Beck. Advogar tais pontos de vista ficaria mal a um Senhor tão cosmopolita como LLosa que teve o azar de nascer no Peru.
Mas já é perfeitamente normal para esse mesmo Senhor afirmar que o espírito libertário que levou os emigrantes europeus a fugir para o outro lado do Atântico, para escapar às guerras religiosas que por cá existiam com a ferocidade que se conhece, se mantém vivo na América dos nossos dias, quando todos sabemos o que está acontecendo na cosmopolita Nova York com a hipótese de construção de uma mesquita no “ground zero”, ou, muito pior, não haver hoje a menor hipótese de alguém naquele país ser eleito para um cargo público se se declarar ateu ou não religioso. Tem de pertencer a uma confissão religiosa, de preferência cristã.
E depois vem a conhecida conversa de que o Estado toma hoje conta da pessoa, desde que nasce até à morte – e ele diz isto, sem corar, a propósito da América -, impedindo o cidadão de fazer as suas livres escolhas e de ser o primeiro responsável pelos seus êxitos ou fracassos! E conclui vaticinando o envilecimento da democracia se não houver uma grande mudança que afaste de vez este poder invisível que impede o homem de ser autónomo!
É preciso ter lata! O Senhor Llosa não sabe, para continuarmos a faltar da América, que só há uma hipótese de alguém se candidatar pelo Partido Republicano se não for apoiado pelos neocons ou pelo Tea Party? É ser muito rico, riquíssimo, como acontece com Bloomberg em Nova York ou com a agora candidata (Meg Whitman) a governadora da Califórnia. E porquê? Porque as fundações dos neocons e outras “beneméritas” organizações de fins não lucrativos, como a Câmara do Comércio ou a American Crossroads, de Karl Rove (o rei do jogo sujo), inundam com dinheiro os seus candidatos, não deixando nenhuma margem aos que dentro do mesmo espectro político se lhes opõem.
Não vale a pena dizer mais nada: os factos falam por si. As desigualdades sociais não páram de aumentar nos países capitalistas avançados de há mais de vinte ano a esta parte, exactamente por o Estado ter sido tomado sem partilha pelos grandes senhores do capital. Mas o Senhor Llosa, saudoso do domínio oligárquico durante séculos exercido nas terras latino-americanas onde nasceu, não está satisfeito: quer mais.
O recém galardoado com o Prémio Nobel não deixa os seus méritos por mãos alheias. Como seria de prever, faz o elogio do Tea Party num artigo de opinião, publicado no El Pais de hoje.
O ultra-neoliberal peruano, que elegeu a Espanha como sua pátria e Nova York como sua residência, começa por fazer a defesa da tese peregrina – hoje desmentida pelos factos – de que o advento do Tea Party pode constituir uma espécie de bênção para o Partido Democrático, pelas complicações e divisões que o movimento pode causar nas hostes do Partido Republicano.
Se nos primórdios do lançamento do Tea Party ainda seria lícito pensar assim, hoje a defesa de tal ponto de vista não tem a menor consistência. Os neocons entenderam-se com o Tea Party na maioria dos estados e raros são os casos em que os candidatos do Partido Republicano não são apoiados por uns e por outros.
Muito mais grave do que um erro de apreciação, voluntário ou involuntário, é o elogio feito ao movimento em nome de algo muito saudável, realista, democrático e profundamente libertário, vindo do interior das suas entranhas, como que fazendo reviver o que de mais profundo e valioso existe nos fundamentos da nação americana.
Claro que o novel Prémio Nobel tem que se distanciar, nem que seja pelo emprego das conhecidas figuras de estilo, de algumas das maiores bestialidades do Tea Party, como a de garantir que Obama é um muçulmano clandestino empenhado na instauração do socialismo na América (só falta mesmo dizer que é em nome do Islão!), da convivência de Christine O’Donnell com bruxas, da criação do virus da SIDA pelos homossexuais, da imposição do criacionismo bíblico nas escolas, ou da incultura de Sarah Palin ou de Glenn Beck. Advogar tais pontos de vista ficaria mal a um Senhor tão cosmopolita como LLosa que teve o azar de nascer no Peru.
Mas já é perfeitamente normal para esse mesmo Senhor afirmar que o espírito libertário que levou os emigrantes europeus a fugir para o outro lado do Atântico, para escapar às guerras religiosas que por cá existiam com a ferocidade que se conhece, se mantém vivo na América dos nossos dias, quando todos sabemos o que está acontecendo na cosmopolita Nova York com a hipótese de construção de uma mesquita no “ground zero”, ou, muito pior, não haver hoje a menor hipótese de alguém naquele país ser eleito para um cargo público se se declarar ateu ou não religioso. Tem de pertencer a uma confissão religiosa, de preferência cristã.
E depois vem a conhecida conversa de que o Estado toma hoje conta da pessoa, desde que nasce até à morte – e ele diz isto, sem corar, a propósito da América -, impedindo o cidadão de fazer as suas livres escolhas e de ser o primeiro responsável pelos seus êxitos ou fracassos! E conclui vaticinando o envilecimento da democracia se não houver uma grande mudança que afaste de vez este poder invisível que impede o homem de ser autónomo!
É preciso ter lata! O Senhor Llosa não sabe, para continuarmos a faltar da América, que só há uma hipótese de alguém se candidatar pelo Partido Republicano se não for apoiado pelos neocons ou pelo Tea Party? É ser muito rico, riquíssimo, como acontece com Bloomberg em Nova York ou com a agora candidata (Meg Whitman) a governadora da Califórnia. E porquê? Porque as fundações dos neocons e outras “beneméritas” organizações de fins não lucrativos, como a Câmara do Comércio ou a American Crossroads, de Karl Rove (o rei do jogo sujo), inundam com dinheiro os seus candidatos, não deixando nenhuma margem aos que dentro do mesmo espectro político se lhes opõem.
Não vale a pena dizer mais nada: os factos falam por si. As desigualdades sociais não páram de aumentar nos países capitalistas avançados de há mais de vinte ano a esta parte, exactamente por o Estado ter sido tomado sem partilha pelos grandes senhores do capital. Mas o Senhor Llosa, saudoso do domínio oligárquico durante séculos exercido nas terras latino-americanas onde nasceu, não está satisfeito: quer mais.
Quer que a democracia dos banqueiros e da plutocracia, a tal que diz aos próprios Estados o que eles tem de fazer ou o que não podem fazer, se estenda a todos os domínios da vida em sociedade.
Além do mais é fazer dos outros estúpidos acusar o Estado americano de despesismo em matéria social, quando toda a gente sabe que a sua gigantesca dívida e o seu volumoso défice advêm das guerras imperialistas em que se meteu (onde torturou, matou e praticou toda a série de violações dos direitos que hipocritamente diz defender) e da crise financeira em que os libérrimos bancos americanos mergulharam o mundo ou uma grande parte dele.
Ora bolas, para um Prémio Nobel tão vulgar!
Além do mais é fazer dos outros estúpidos acusar o Estado americano de despesismo em matéria social, quando toda a gente sabe que a sua gigantesca dívida e o seu volumoso défice advêm das guerras imperialistas em que se meteu (onde torturou, matou e praticou toda a série de violações dos direitos que hipocritamente diz defender) e da crise financeira em que os libérrimos bancos americanos mergulharam o mundo ou uma grande parte dele.
Ora bolas, para um Prémio Nobel tão vulgar!
ADITAMENTO
Ainda bem que alguém me acompanhou. O artigo de Carlos Fuentes, no El País de 31 de Outubro, não é mais do que uma resposta a Vargas Llosas. Sem nunca o citar, é a ele e não ao Tea Party (que toda a gente instruída sabe o que é), que Carlos Fuentes quer atingir.
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