sexta-feira, 30 de março de 2012

A RECESSÃO E A POLÍTICA DO GOVERNO



O PIOR ESTÁ PARA VIR



Não constitui novidade para quem esteja minimamente informado o resultado das previsões do BP para este ano e para o ano que vem. O que se poderá dizer, com toda a probabilidade, é que o resultado final ainda será pior, como de resto já vem sendo anunciado pelos mentores e fiscalizadores destas políticas (as agências de rating) …

Uma política económica exclusivamente orientada para a obtenção a qualquer preço de um determinado resultado nas finanças públicas pagará certamente um preço elevadíssimo para o conseguir, se é que alguma vez o conseguirá alcançar. Um governo que despreza por completo a economia e tudo faz para a sufocar com a obsessão de alcançar agora um equilíbrio financeiro, ao mais baixo nível, e que age baseado na convicção de que as profundas alterações económicas e políticas que a obtenção desse equilíbrio necessariamente provoca acabarão por ser compensadas lá mais para a frente, constitui um grave erro mesmo do ponto de vista dos interesses que pretende defender, como a realidade se tem encarregado de demonstrar.

Entendamo-nos: esta política sempre seria catastrófica para os trabalhadores e assalariados em geral, além de deixar também mazelas incuráveis no tecido empresarial de pequena e média dimensão, mesmo que ela estivesse a resultar do ponto de vista dos efeitos esperados por quem ideologicamente a defende. Esses efeitos, de resto, já estão à vista na sociedade portuguesa: perda e limitação de direitos sociais, desregulamentação acentuada das relações laborais, perda e diminuição de vencimentos, desemprego em massa, falências e insolvências como nunca se tinha visto entre nós.

Todavia, do ponto de vista do Governo, ou seja, daquilo que se pretendia garantir como pressuposto para uma nova política, esta política até seria apresentada como um um êxito, tal a fúria ideológica neoliberal com que tem sido posta prática, se ela economicamente estivesse a resultar na estrita perspectiva de quem a gizou e executa. Acontece que a política falhou, não obstante os estragos conscientemente produzidos pelos seus mentores e executores. A prova disso é que a um ano de recessão se seguirá nova recessão ou, na melhor das hipóteses, estagnação com acréscimo do cortejo de misérias que este primeiro ano já provocou.

E é bom sublinhá-lo para que não haja dúvidas: recessão em 2013 significa uma queda do produto superior à do PIB de 2012 relativamente ao de 2011, que já não era nada recomendável! E estagnação significa que tudo continuará como em 2012, ou seja, mais miséria!

Para além desta conclusão global, há muito antecipada, mas que agora está a ser confirmada pelos factos, há asneiras de palmatória mesmo para um fanático neoliberal como Gaspar. Que ele acredite na Virgem ou na Fada da Confiança e tenha por certo que das malvadezas com que fustiga os portugueses no presente resultará uma economia renascida no futuro, é algo que ainda se poderia aceitar como cegueira ideológica. Agora, o que não se percebe é que ele tenha recorrido ao fundo de pensões da banca para apresentar um défice fictício em 2011, ou dizendo as coisas como elas são, para falsificar o resultado do défice e não tenha previsto no orçamento de 2012 as consequências financeiras daquela transferência. Assim como também não previu a queda da receita fiscal, que qualquer aprendiz de finanças públicas antecipadamente sabia que iria acontecer, quanto mais não fosse no primeiro ano das políticas de austeridade. Se quanto aos anos seguintes ainda se poderia desculpar com a Fada da Confiança, no primeiro ano a falência dessa previsão, mais que do que cegueira ideológica, é burrice pura!

Perante este quadro trágico e negro o governo, este Governo, só tem duas hipóteses: ou recuar ou seguir em frente, aprofundando o que está a fazer.

Pela fraca oposição que o povo português lhe está fazendo, muito favorecida pelo estilo manso e aparente ausência de arrogância do PM, bem como discurso anti-emocional de Gaspar de aparência racional, também não é preciso ser bruxo para adivinhar o que vai acontecer: o Governo vai aprofundar o que está a fazer com novas e graves medidas de austeridade, agora todas do lado da despesa!

E já se está preparando o quadro para isso. Uma legião de comentadores, desde a insuportável Cristina Azevedo à Maria João Avilez (que é uma espécie de Eduardo Barroso dos governos de direita), passando pelos habituais, recorrentes ou reconvertidos palradores televisivos, todos eles descobriram agora as excelsas qualidades de Passos Coelho como líder político, ele que, de apagado e impreparado Primeiro Ministro, passou a ser portador das mais variadas virtudes políticas, sempre  subliminarmente sublinhadas por contraposição ao seu antecessor, agora em fase de intensa diabolização.

E nesta mesma linha, o PSD, tanto no Congresso como pela voz dos seus principais dirigentes, perante o fracasso evidente das políticas postas em prática, desencadeou uma intensa campanha contra as anteriores governações socialistas, responsabilizando-as por tudo o que está acontecer.

E apresentam como sucesso (!!!?) a ligeira quebra da taxa de juro nos empréstimos a 18 meses, ou seja, uma consequência da política monetária do BCE que, entre  Novembro e Janeiro, pôs em circulação um bilião de euros para salvar a Espanha e Itália e também para acudir a um sistema bancário europeu maioritariamente falido! Ou seja, a música vai ser: não fora a herança que o PS nos deixou…

Na continuação da linha que tem sido seguida, o próximo ataque será indubitavelmente às despesas sociais, já que não é ideologicamente condizente com o neoliberalismo esperar um aumento dos impostos.

Para terminar: evidentemente que há no PS e com o PS um grave problema. Porventura o mais grave problema da sua história. Um dia destes, no Público, Francisco Assis esboçou uma análise. Apesar de bem escrita e de ter ido muito além daquilo que é hábito no partido, ela é ainda muito insuficiente. Mas esse assunto fica para outro dia…

quinta-feira, 29 de março de 2012

VIVA A GREVE GERAL EM ESPANHA!



ONDE ESTÁ A DIFERENÇA?



Este é um post no estilo facebook. Sem demonstrações nem teorizações. Apenas afirmações. E, como sempre, sem nenhuma preocupação de ser politicamente correcto.

Uma grande diferença separa a combatividade dos trabalhadores espanhóis dos portugueses. Há a história de ambos os países, a idiossincrasia dos diversos povos peninsulares, enfim, muita coisa. O mais importante, porém, é a diferença que historicamente separa o PSOE do PS. Historicamente, um abismo.

Comparar Pablo Iglesias a Mário Soares (com quem haveria de ser comparado?) é algo que não se pode fazer. Para comparar é preciso que haja alguma semelhança por pequena que seja. E a partir daí comparar a UGT de cá, a sua génese, a sua história, bem adiante, com a UGT espanhola ainda é muito mais difícil. Aqui é que não há mesmo nenhum ponto de contacto.

Portanto, não admira que nós tenhamos um Proença e eles um Cándido Mendez, e antes deste um Nicolás Redondo que até pôs a cabeça em água a Felipe Gonzalez.

Em conclusão, o que nasce torto nunca se endireita.

O PS nunca foi um partido social-democrata. Veio directamente do republicanismo pequeno-burguês e por aí se foi ficando sem rumo confiável em matérias de natureza laboral, sempre predisposto a cedências em troco de nada, limitando a sua participação na luta à defesa de alguns princípios de democracia representativa que pouco tem a ver com essência da luta dos trabalhadores.

O PSOE, fundado em 1879, veio do marxismo e evoluiu, primeiro, para a social-democracia e agora para aquilo que hoje é, mas o código genético está lá, como nos momentos críticos se vê.

Como pode a combatividade dos trabalhadores portugueses equipar-se à dos trabalhadores espanhóis se a CGTP está sozinha neste combate?


terça-feira, 27 de março de 2012

PRIVATIZAÇÃO DA TAP – UM CRIME DE LESA-PÁTRIA


O QUE SE PERSPECTIVA



É de facto espantoso que a direita portuguesa, que até tinha uma tradição soberanista, tenha deixado cair uma após outra algumas das características que mais a marcavam para se ter transformado numa direita neoliberal disposta a alienar ao capital estrangeiro o património estratégico da economia e até simbólico da independência nacional e que da direita de que é descendente em linha recta só guarde os tiques de autoritarismo e o tradicional desprezo pelos mais pobres que alguns tentam, agora como dantes, disfarçar com um discurso assistencialista que humilha e degrada os destinatários que se vêem obrigados a aceitar as esmolas de que precisam para viver em lugar dos direitos que a cidadania tinha obrigação de lhes assegurar.

É ainda lamentável que essa direita reaccionária esteja disposta a terçar armas pela perda de algumas consoantes que a língua portuguesa pomposamente ostentava e ache perfeitamente natural que sectores estratégicos da economia nacional, alguns até revestidos de grande simbologia, sejam alienados a estranhos e corram inclusivamente o risco de desaparecerem ou de perderem a projecção que hoje têm em nome de uma estratégia soberanista levada a cabo por países que desde há séculos cobiçam aquilo a que se poderia chamar o “património cultural português”.

É isso o que necessariamente se passará com a privatização da TAP. A TAP representa no imaginário português e, principalmente no dos países de língua portuguesa, muito mais do que uma simples empresa. Ela um traço de união entre Portugal e as suas comunidades no estrangeiro e é também um factor de prestígio de Portugal em África e no Brasil, que presta sem o saber, pelo simples facto de existir, um papel político impar na ligação de Portugal a esses países.

A venda da TAP a qualquer empresa europeia – e só a uma empresa europeia ela poderá ser vendida – representa a perda simbólica, e depois material, dessa ligação, quaisquer que sejam as promessas que o capital vá fazendo ou que o contratos aparentemente consagrem. Estas coisas não podem ser negociadas, pela simples razão de que a soberania se não negoceia!

Portugal é hoje infelizmente governado por uma geração da direita radical para quem nada disto tem valor. Gaspar, no seu fundamentalismo ideológico, não é capaz de ver mais nada à frente dos olhos do que a execução de um programa de Governo que consagre as doutrinas de Milton Friedman, aplicadas com a devoção e o fervor típicos dos discípulos fanáticos, e Passos Coelho é, pela sua impreparação, incompetência e incultura, igualmente incapaz de compreender a complexidade do que está em jogo na Europa dos nossos dias. E de Portas nem vale a pena falar, porque o oportunismo não é para aqui chamado.

Enquanto na própria Europa os países preservam cada vez mais a sua soberania, mesmo aquelas que apesar de politicamente recentes se exprimem, para lá das contingências políticas, por uma identidade cultural profunda, como é o caso da Itália onde  Mario Monti tomou várias medidas nesse sentido, enquanto estes países, dizíamos, vão preservando os sectores estratégicos da economia da penetração do capital estrangeiro, Portugal – este Governo – vai esvaindo e desapossando o país de tudo o que é económica e simbolicamente importante.

Sim, porque a TAP, para além da sua enorme importância política, tem também uma extraordinária importância económica. A TAP é a maior ou uma das maiores empresas exportadoras portuguesas. E como se pode compreender que um Governo que tanto fala em exportação se proponha colocar em mãos estranhas uma actividade economicamente tão determinante? Uma actividade que, a ser privatizada, ficará a partir de então sujeita às estratégias próprias de quem administra o capital em função do lucro num quadro empresarial mais vasto.

Perder a TAP é virar as costas à África, é sacrificar as relações com o Brasil, é perder, no estrangeiro que verdadeiramente nos interessa, o que resta do prestígio de Portugal nas suas relações com esses países.

Alguém tem de pôr cobro a esta política. Alguém tem de terminantemente dizer NÃO! Esse alguém deveria ser, pela própria “natureza das coisas”, o Presidente da Republica. Mas já se percebeu que não será com ele que os portugueses podem contar para impedir a consumação destas políticas. Ele está lá para as coisas pequeninas, para umas vingançazinhas impróprias da função, para tratar de umas reformazinhas que estavam em vias de não ser pagas, enfim, para coisas sem importância. Por outras palavras: ele, Cavaco Silva, é o Pai espiritual desta geração que nos governa.

Quando a soberania está em jogo, quando aos poucos, mas determinantemente, ela vai escasseando até desaparecer por completo, só as Forças Armadas podem ter a palavra decisiva. E aqui a palavra das Forças Armadas é dizer: NÃO! A TAP NÃO!



  

ANTONIO TABUCCHI






O ITALIANO QUE SE INTERESSOU POR PORTUGAL

 Talvez por ter a certeza de não encontrar as palavras certas e justas à altura do grande escritor que Antonio Tabucchi é tenha demorado demasiado a homenagear o italiano que tanto contribuiu para divulgar Fernando Pessoa numa altura em que o grande poeta da língua portuguesa ainda não era, como hoje é, um ícone da literatura com projecção mundial.
Dirão os entendidos que o génio de Pessoa não carece de divulgadores: impõe-se por si. Certamente. Mas precisa de ser conhecido.
 Continuando neste terreno difícil que é a literatura não deixa de causar estranheza que um escritor tão genial como Fernão Lopes seja tão pouco conhecido fora das fronteiras de Portugal e até em países de língua portuguesa, como o Brasil. Não basta, portanto, ser genial, nem talvez ter como divulgadores Hermano ou António José Saraiva. É preciso um pouco mais.
Mas seria um pouco de menos ou mesmo muito pouco reduzir o papel de Tabucchi a essa sua paixão por Fernando Pessoa. Digamos que, por via de Pessoa, Tabucchi conheceu Portugal, a língua e a sociedade portuguesas que lhe serviram de fonte de inspiração a alguns dos seus mais belos romances como “Afirma Pereira” e “A Cabeça Perdida de Damasceno Monteiro”.
Prova, porém, do seu amor pela língua portuguesa é também o romance que em 1991 escreveu em português – Requiem – porque, como ele próprio diz: “ …percebi que não podia escrever um Requiem na minha língua e precisava de uma língua diferente, uma língua que fosse um lugar de afecto e de reflexão”. E mais adiante, acrescenta: “Mas, acima de tudo, este livro é uma homenagem a um país que eu adoptei e que também me adoptou, a uma gente que gostou de mim e de quem eu também gostei”.

segunda-feira, 26 de março de 2012

NOTAS DE FIM-DE-SEMANA



DO DIA DO ESTUDANTE AO CONGRESSO DO PSD

DIA DO ESTUDANTE - A primeira nota do fim-de-semana vai direitinha para as comemorações do Dia do Estudante de 1962. Meio século é muito tempo. Um tempo todavia que continua presente na memória dos que nele participaram e também presente nos tiques de autoritarismo que a direita reaccionária nunca se esquece de exibir, como na quinta-feira aconteceu no Chiado, a coberto de um discurso pretensamente respeitador dos “direitos democráticos”.

Dos muitos textos que sobre a efeméride foram publicados ou das entrevistas que a televisão transmitiu merece destaque o de Correia de Campos no Público de hoje. Não só a prosa é escorreita, o que já seria de louvar, como a análise é lúcida e objectiva. Além de que o tom perceptivelmente próximo do acontecimento mas simultaneamente distanciado de quem recusa a primeira pessoa do singular para fazer a narrativa é, nos tempos que correm, de exacerbado individualismo, mais um motivo de apreço que não pode deixar de ser assinalado.

 O CONGRESSO DO PSD – Ou a vertigem do sucesso. Onde é que já vimos isto? Incrível, de facto, como um partido que está mergulhando no desemprego e na miséria uma parte considerável da sociedade portuguesa, que deixa sem esperança nem expectativas de futuro a juventude deste país, que multiplica com os absurdos programas de austeridade a insolvência e a falência de tantos e tantos portugueses, consegue, isto é: tem a coragem de fazer um Congresso triunfalista e exaltante das virtudes da governação.

De tudo o que lá foi dito sobra apenas como motivo de preocupação o repto pérfido lançado a Seguro e a resposta que este dará. Mas isso é matéria para reflexão mais aprofundada…

A ESCOLA PÚBLICA - A escola pública está sob o fogo cerrado dos “cratos” deste país. Sendo impossível por força da conjuntura que eles diariamente agravam dar plena execução ao objectivo que têm em mente em matéria de educação -  destruir o primado do ensino público consagrado na Constituição -  vão, entretanto, fazendo com inusitada ferocidade o trabalho ideológico preparador do fim que abertamente pretendem.

Nada melhor para isso do que o pretexto das “derrapagens” das obras da Parque Escolar. Está fora de questão, como é óbvio, fazer a defesa de procedimentos administrativos, de natureza contratual ou outra, desrespeitadores da lei ou excessivamente dispendiosos. Não é disso que se trata. Trata-se apenas de sublinhar a diferença que a direita (e também o Tribunal de Contas) põe na discussão deste assunto quando comparado com o das inúmeras parcerias que pululam neste país.

Dir-se-á que também nestas o Governo e os seus acólitos não têm poupado críticas. Só que há uma diferença de vulto: nas parcerias, nas rendas e em toda essa roubalheira que para ai existe a crítica vai apenas dirigida a quem as fez e não a quem delas usufrui. A partir daí a crítica cessa com fundamento no sacrossanto valor dos contratos. E tudo o que à volta disso se tem dito não passa de encenação para dar a ideia de que se está fazendo qualquer coisa, deixando na realidade tudo na mesma (como se está a ver na energia e se verá nas SCUTS, nos hospitais e por ai fora).

Na Parque Escolar não tenhamos ilusões: a grande vontade, para já inexequível, de Crato era dar em concessão aos privados ou privatizar mesmo as excelentes instalações com que o ensino público está hoje parcialmente dotado!

ADITAMENTO À NOTÍCIA QUE DAVA TS NA PT

O QUE FICA, O QUE SAI E O QUE ACRESCENTA AO ÚLTIMO POST A "DESNOMEAÇÃO" DE TEIXEIRA DOS SANTOS



 Afinal, Teixeira dos Santos parece que já não vai para a PT. Houve levantamento no Conselho de Ministros e Gaspar teve de recuar. Portas e provavelmente alguém mais próximo do aparelho do PSD ter-se-ão oposto.
Este recuo não invalida o que está dito no último post, salvo a primeira parte da frase do primeiro parágrafo e a segunda parte do último (até ver). E confirma uma outra coisa que já todos sabíamos: que o PM é uma espécie de bola de ping-pong, que anda de um lado para o outro, sem opinião própria, ora ao sabor de Gaspar, ora ao sabor de quem se lhe opõe. Umas vezes inclina-se para um lado, outras para o outro, parecendo nunca ter a iniciativa de nada!


sexta-feira, 23 de março de 2012

TEIXEIRA DOS SANTOS NA PT


SÃO BENTO NÃO É ROMA...

O telejornal da tarde da RTP anunciou a futura (muito breve) escolha de Teixeira dos Santos para administrador não executivo da PT indicado pelo Estado via Caixa geral de Depósitos, a tal CGD que o Nogueira Leite ainda um dia destes para despistar as atenções sobre o ordenado que patrioticamente quer continuar a ganhar se ufanava de ser “agora uma instituição empresarial independente, gerida segundo pressupostos de natureza técnica e de negócios"!

Mas deixando o Leite de parte, conhecido pelas suas ridículas (por que não fui Ministro das Finanças) mas lucrativas (por que não devo ficar com o ordenado de gestor público) intervenções, e indo ao que importa, o que interessa dizer é que Teixeira dos Santos que ultimamente se tem notabilizado pela defesa empertigada do programa de recessão do Governo e certamente também por dois ou três actos anteriormente praticados, que o enobrecem, obteve a merecida retribuição, embora, diga-se, apenas com um “cheirinho” já que o “pote” tem fundo e os “comilões” são muitos, vorazes e invejosos…

Teixeira dos Santos tem no seu curriculum actos que a Pátria, agradecida, regista. A nacionalização do BPN, o pedido de intervenção de Portugal pelos representantes da agiotagem internacional e a negociação do memorandum da Troika, embora aqui os louros tenham de ser repartidos com Eduardo Catroga, apesar de agora haver uma materiazinhas com as quais Catroga já não concorda…

Viva, portanto, a independência da Caixa e viva o actual Governo que, nada tendo, felizmente, a ver com os Romanos, sabe premiar….

quinta-feira, 22 de março de 2012

NOTAS SOBRE O AJUSTAMENTO ESTRUTURAL



UM PERCURSO E UM OBJECTIVO



Este conceito de “ajustamento estrutural” de importação anglo-saxónica começou a vulgarizar-se, via FMI, a partir de finais da década de oitenta e princípios da década de noventa.

Iniciava-se então em grande escala o domínio das ideias neoliberais, politicamente impulsionadas por Thatcher e Reagan, baseadas nas doutrinas neoconservadoras que desde a década de trinta fervilhavam em certos meios académicos americanos sem contudo conseguirem impor-se, e nas doutrinas económicos liberais importadas de intelectuais judeus, oriundos de Viena, via Inglaterra, onde também começaram por não ter êxito, para depois se instalarem na América, na Escola de Chicago, com grande sucesso.

O ascenso destas doutrinas coincidiu como não podia deixar de ser com a profunda crise do “socialismo real”, politicamente muito debilitado desde que deixou de ter capacidade para competir económica, socialmente e ideologicamente com o Ocidente, e também, é bom não esquecê-lo, com o desenvolvimento da aliança táctica entre a China e os Estados Unidos, promovida com assinalável êxito por Mao e Nixon.

À medida que o “socialismo real” se aproximava do seu fim, primeiro com a desagregação dos regimes socialistas nas “democracias populares” e depois na própria “União Soviética”, cresciam de importância nos meios capitalistas ocidentais as doutrinas neoliberais destinadas a pôr um ponto final na intervenção do Estado na vida económica e acabar com qualquer tipo de “engenharia social”, de modo a deixar ao capital via livre para poder actuar com total liberdade nos quatro cantos do mundo em todos os domínios, sem excepção, evidentemente, daqueles que desde o fim da Segunda Guerra Mundial estavam vedados à iniciativa privada.

Para isso era necessário assegurar a disciplina fiscal, reduzir os gastos públicos, fixar as taxas de juro e de câmbio pelo mercado, abrir sem restrições os países ao investimento estrangeiro, assegurar a plena liberdade comercial, desregulamentar as actividades económicas e financeiras, sem esquecer, obviamente, a actividade laboral e privatizar as empresas públicas. E foi o que se foi fazendo por toda a parte, da África à Ásia, passando pela América Latina.

A primeira vítima desta liberalização em larga escala foi a África subsahariana. Muito endividada nos finais da década de oitenta por força da contracção de múltiplos empréstimos que o dinheiro barato favorecia para financiamento de projectos, por vezes sem qualquer racionalidade económica, sugeridos ou apadrinhados pelo Norte (e sempre executados por empresas europeias ou americanas), a África quando a maior parte das matérias-primas baixou de preço, petróleo inclusive, e os juros subiram, ficou sem possibilidade de pagar as dívidas. E então lá veio o “ajustamento estrutural” limitar drasticamente a já de si incipiente despesa pública, abrir o mercado aos produtos estrangeiros, deixando as indústrias locais sem protecção aduaneira, privatizar as empresas públicas, ficando a actividade económica dos respectivos países entregue, no essencial, à exportação de matérias-primas, com cuja receita se ia pagando a dívida.

Depois seguiu-se a América Latina que, por ter outra capacidade produtiva, resistiu melhor do que a África, salvo no que respeita à liberalização de capitais, área onde a devastação foi total (basta recordar o que se passou na Argentina, no Equador e mesmo no Brasil, no segundo mandato de FHC).

Nos Estados Unidos, apesar da força da propaganda neoliberal e neoconservadora de que Reagan foi, no plano político, o principal arauto, levou algum tempo a desmantelar as conquistas do New Deal de Roosevelt e da Grande Sociedade de Lyndon Johnson. Mas como sempre houve uma tradição mais liberal do que na Europa, o neoliberalismo acabou por impor-se em larga escala. No entanto, há áreas onde não conseguiu penetrar tanto quanto pretendia, como é o caso da segurança social, e certos domínios da saúde, não apenas em consequência da tímida reforma de Obama, mas também do que vinha de trás e se manteve (Medicare e Medicaid).

É bom não esquecer que na presente campanha eleitoral americana é ainda esta questão que está no centro do debate: o papel do Estado na economia e até na sociedade. E como a pressão para que o Estado se “encolha” é muitíssimo forte, a eventual vitória democrática não vai ficar imune às consequências deste debate.

Na Europa, como se sabe, este combate do capital pela sua total liberdade começou na Inglaterra com Thatcher e teve, no começo, como seu principal alvo os sindicatos. Atingidos estes em pontos fundamentais da sua actividade e perdida grande parte da força proletária que os animava muito por via da deslocalização industrial que entretanto se ia fazendo, estavam criadas as condições para que uma mudança em larga escala do panorama económico inglês tivesse lugar. Ocorreram as privatizações em praticamente todos os domínios, flexibilizou-se o mercado laboral e reforçou-se incomensuravelmente o poder do capital financeiro por força de múltiplas desregulamentações que foram sendo feitas.

No resto da Europa o movimento processou-se gradualmente em duas fases distintas correspondentes a outras tantas áreas geográficas.

No leste, depois da Queda do Muro e da desagregação da URSS, implantou-se por todo o lado aquilo a que com toda a propriedade se chamou o capitalismo selvagem. Selvagem pela total liberdade dada ao capital, mas selvagem também pelo saque operado sobre os bens públicos, até então colectivos, fenómeno que está na origem dos famosos oligarcas. O saque foi mais evidente na Rússia de Yeltsin, embora tenha existido por todo o lado, posto que com menor amplitude.

No oeste, a implantação do neoliberalismo ficou a cargo de Bruxelas e como passou a ser regra no nosso tempo as doutrinas económicas, para que pudessem ser aplicadas à risca, foram impostas por lei. Foi o que aconteceu com a ratificação do Tratado de Maastricht e com os demais que se lhe seguiram, nomeadamente o de Lisboa.

Como o Ocidente é profundamente hipócrita, assistiu-se a número bem interessante: à medida que o neoliberalismo se ia implantando em todos os domínios da actividade económica, desregulando e liberalizando, ia-se simultaneamente assistindo a uma falsa exaltação do Estado social como especificidade tipicamente europeia. À medida que o Estado social ia cedendo, de modo muito mais notório nos países em dificuldades, ia-se fazendo a propaganda de que essa era a grande matriz europeia.

Em alguns países da Europa comunitária não existe Estado social, noutros vai cedendo lugar a um Estado meramente assistencial e por todo lado, mesmo nos mais ricos, o trabalho e os direitos a ele ligados tem sido alvo de um ataque em grande escala que se nota mais nos países periféricos, mas que existe por todo o lado.

Ajustamento estrutural, portanto, não significa ajustar os rendimentos de todos às necessidades colectivas, significa antes ajustar os rendimentos dos economicamente mais fracos às “necessidades” insaciáveis de lucro de um pequeno número.

terça-feira, 20 de março de 2012

A VIGARICE DO "AJUSTAMENTO" ANTES DO PREVISTO



O QUE INTERESSA PERCEBER



Já aqui abordámos jocosamente este tema por duas ou três vezes, mas como ninguém foi a jogo nem aqui nem nos jornais, talvez seja esta a ocasião de voltar ao assunto, agora de outra maneira.

O primeiro a manifestar-se foi Moedas, depois, claro, veio Gaspar, a seguir Passos Coelho e, por fim, o inevitável Relvas. Todos eles estão muito contentes por o “ajustamento” estar a fazer-se mais rapidamente do que o previsto e com eles todos aqueles que no estrangeiro têm muito a ganhar com isso.

O que eles querem dizer na linguagem cifrada que propositadamente usam é que a as contas públicas tem registado ou estão em vias de registar um superávide primário e que as exportações tendem a cobrir as importações ou, pelo menos, a limitar o fosso que havia entre umas e outras.

O superávide primário é, em palavras simples, a diferença positiva entre as receitas e as despesas do Estado, fora os juros. Se as receitas do Estado forem superiores às despesas, com essa diferença pagam-se os juros e se pagos estes ainda sobrar dinheiro, amortiza-se a dívida. Se a situação for a inversa haverá défice que tem que ser coberto ou com a emissão de moeda (fora de questão no nosso caso) ou com a contracção de novos empréstimos, aumentando correspondentemente a dívida pública.

Relativamente à balança comercial passa-se algo idêntico: se houver superávide, o país armazena divisas; se houver défice, terá de recorrer às reservas cambiais que tem em caixa ou a empréstimos, que obviamente aumentam a dívida.

O grande problema português, como de resto da maior parte dos países da zona euro, fora dois ou três, entre os quais está a Alemanha, é haver défices por todo o lado, não apenas nas contas do Estado, mas também nas actividades privadas.

Tal situação não é sustentável indefinidamente, mesmo quando os juros são baixos, quanto mais quando os juros são altos como passaram a ser para os países da zona euro já intervencionados e também para aqueles que, embora não estejam, estão a viver à custa das emissões de moeda do Banco Central, como é o caso da Espanha e da Itália e também, em menor escala, da França.

Mas o que é que significa o nosso “ajustamento” e por que vias foi ele alcançado? O nosso “ajustamento” foi alcançado à custa de uma brutal redução da despesa pública, a qual teve como consequência inevitável uma queda dramática da procura e do investimento, ambos geradores de recessão, e com ela o cortejo de misérias que necessariamente a acompanha, no qual é figurante de primeiro plano o crescimento exponencial do desemprego.

Por outro lado, o ataque aos salários, ou dito mais correctamente, aos custos salariais directos e indirectos, tem em vista o relançamento da actividade económica em novos moldes, procurando pela via da sua redução ganhar competitividade e diminuir ou mesmo eliminar o tal défice das transacções correntes, das quais a balança comercial faz parte.   

E o que é que aconteceu? O que é que está acontecer? O que está a acontecer é de facto uma redução das importações não por efeito dos ganhos de competitividade da economia, mas como consequência natural da recessão económica, ou seja, de uma quebra drástica da procura.

Portugal não importa menos por ter passado a haver no mercado produtos portugueses que concorram vantajosamente com produtos estrangeiros, mas por ter havido uma quebra brutal da actividade económica. Por palavras simples: deixou de se importar tanto quanto se importava antes por não haver dinheiro para manter os anteriores níveis de procura.

O ajustamento seria excelente se esta quebra das importações fosse uma consequência directa dos ganhos de competitividade da economia portuguesa, que teria passado a produzir cá dentro o que antes se comprava lá fora ou parte significativa do que se comprava lá fora. Mas não é nada disso o que se está a passar como toda a gente sabe.

Este contentamento governamental pela rapidez com que o “ajustamento” está a ser feito explica-se, por um lado, pela completa insensibilidade social de quem dirige a economia, e, por outro, pela crença, melhor dizendo, pela fé de que deste “ajustamento” resultará o crescimento futuro.

 O futuro tratado da chamada “regra de ouro”, que constitucionalmente proíbe e penaliza os défices, tem exactamente em vista transformar esta doutrina em lei e ilegalizar as doutrinas económicas que propõem outras soluções para a crise. Já há muito que no mundo ocidental se não assistia a uma tão evidente manifestação de intolerância que tem passado relativamente despercebida na opinião pública tão forte é o domínio ideológico das forças dominantes e tão poderosas são hoje as doutrinas económicas neoliberais que até conseguem criar na cabeça da generalidade das pessoas um estado de espírito semelhante ao que na Idade Média existia relativamente ao catolicismo. Quem pusesse em causa os dogmas da Igreja de Roma era um herege. Hoje quem puser em causa os dogmas neoliberais é votado ao ostracismo ficando sem qualquer possibilidade de participar nos negócios da grei. É afastado dos media e corrido dos centros de decisão. Quando uma vez por outra lhe conferem voz é sempre num contexto de generalizada unanimidade de sentido contrário, assim ao jeito de quem apresenta no circo um animal exótico.

Se esta situação é grave para a generalidade dos países, em países como Portugal ela é de uma gravidade extrema. Não apenas porque esta doutrina, que despreza a procura para relançar a economia em tempos de crise, está condenada ao fracasso – a menos que se aceite manter por tempo indeterminado uma legião cada vez mais numerosa de desempregados e de precários que, aos milhões, pagam com o seu sofrimento a segurança e a estabilidade de uns poucos – mas também por o contexto económico-financeiro e monetário em que Portugal se insere lhe não permitir encontrar uma verdadeira saída, tendendo aquela regra a afunilar ainda mais as já quase nulas perspectivas de relançamento económico.
Aditamento: Na foto um quadro de Malangatana sobre a dívida e o ajustamento estrutural

segunda-feira, 19 de março de 2012

POR CÁ TUDO BEM

A SABEDORIA DO POVO

António Borges, que acaba de ser agraciado pelo Governo com mais uma compatibilidade, certamente no louvável propósito de o pôr a pagar mais impostos – que parece agora ser a justificação dos super boys – regozijava-se este fim-de-semana com o extraordinário consenso existente em Portugal sobre as medidas de “ajustamento” (como eles gostam de dizer) da economia portuguesa. E gozava com o sofrimento dos portugueses: cortaram-lhes dois ordenados, aumentaram-lhes os impostos, limitaram-lhes os direitos e o povo português num exemplo único nestes tempos que correm aceita tudo isto com sabedoria e compreensão, dando corpo com a sua atitude à formação de um amplo consenso no seio da sociedade portuguesa.

De facto, o programa da TROIKA que o Governo aplica com inexcedível zelo e não menos estúpida convicção parece gozar do tal amplo assentimento de que falava Borges. Contra, apenas os do costume. Mais ou menos o que se passava com o fascismo salazarista.

O povo na sua ancestral sabedoria acha que Gaspar, um novo Salazar – o tal mito do homem forte nas Finanças -, por mais miséria que espalhe com a sua política, por mais desemprego, falências e recessão que provoque, está a fazer o que tem de ser feito. Pôr as contas em ordem!

Que as contas sejam postas em ordem do lado dos que têm pouco ou são remediados, isso o povo também compreende. Os direitos de que o povo gozava são uma espécie de benesse tolerada ou até de ilicitude consentida. Que esses direitos se percam ou sejam limitados é normal, principalmente em tempo de crise.

Quem não os pode perder – e isso o povo compreende muito bem – é o Mexia e a EDP. Sempre viveram com grandes rendimentos e enormíssimos lucros. São coisas a que têm direito por tradição. Além de que prestam um inestimável serviço ao país: proporcionam-lhe energia eléctrica e levam-na aos lugares mais recônditos, coisa que os avós e os pais de muitos portugueses não podem deixar de enaltecer, lembrando-se e deixando o testemunho do que era a vida no “tempo deles”. Nada, portanto, que se compare com os direitos do povo que lhe foram oferecidos numa bandeja pelo MFA e pelo PCP e mais uns quantos entusiastas da Revolução que tiveram a estulta pretensão de tentar modificar este país. O que é oferecido também se pode ser perdido sem mágoa e até com muita compreensão.

Quem também os não pode perder é a GALP que acaba de aumentar os combustíveis pela 48.ª vez, já que não faria qualquer sentido que em tempo de crise uma empresa que actua num ramo tão importante da economia nacional não aumentasse os seus lucros na ordem inversa dos rendimentos do povo.

E quem também não pode perder direitos, nem deixar de aumentar os lucros são as empresas que têm parcerias público-privadas com o Estado, um exemplo de “empreendedorismo” que tem de ser mantido e continuado tanto mais que o povo com a sua imensa sabedoria compreende que sem elas não teríamos as autoestradas nem os hospitais que hoje temos.

É certo que agora apareceu um tal Jean Claude Juncker, que é - e vai deixar de ser - presidente do eurogrupo, a dizer que a política de austeridade imposta à Grécia tem sido uma estupidez e vai mergulhar os gregos num poço sem fundo. E logo Marcello Rebelo de Sousa, a voz abalizada do povo, veio dizer: “Mais vale tarde do que nunca!”.

Que ninguém pense que Marcelo estava a querer dizer ao povo que isto aqui também tem de mudar. Ele não estava a pensar em Portugal. Estava a pensar na Grécia, tanto mais que “Nós não somos a Grécia!”.

E se dúvidas houver, lá para o meio da semana aparecerá um Raul Vaz ou outro ilustre representante do povo a explicar ao dito que o tal Juncker é um despeitado e só porque vai ser substituído pelo rigoroso e competente Schäuble é que veio agora com essa conversa que não faz qualquer sentido, tanto mais que os gregos são uns “batoteiros”.

Por cá tudo bem. Muito bem até. O “ajustamento” está a fazer-se mais rapidamente do que o previsto!


quarta-feira, 14 de março de 2012

QUANDO É QUE ISTO VAI MUDAR?


EPISÓDIOS DO QUOTIDIANO POLÍTICO


Enquanto a situação portuguesa se encaminha para a catástrofe, como ainda hoje o anterior Primeiro Ministro grego teve a gentileza de avisar, por cá tudo parece correr no melhor dos mundos.

O que se pode dizer da situação portuguesa? Nada melhor do que descrever alguns dos acontecimentos que marcaram o dia.

Moedas, o inacreditável Moedas, não cabia em si de contente ao anunciar que o ajustamento em Portugal se estava a fazer mais rapidamente do que o previsto. Como se não bastasse o conhecimento que se tem da situação em Portugal, lá veio o sociólogo do Pingo Doce, António Barreto, na SIC, explicar-nos que o estado social está a funcionar, apesar da crise e que há hoje mais subsídios a chegar às mãos dos portugueses do que no passado. Mas como se não chegasse a sua arguta análise de sociólogo, ainda corroborou a judiciosa intervenção de Clara de Sousa, que, inteligentemente, como sempre acontece quando abre a boca por conta própria, concluiu que as dificuldades económicas de muitas famílias estarão provavelmente a favorecer uma alimentação mais saudável dos jovens e das crianças. “Quem sabe?”, rematou eloquentemente Barreto!

Finalmente, motivo de grande satisfação para todas os portugueses foi também a exoneração do Secretário de Estado da Energia, depois de Mexia lhe ter demonstrado que era a EDP que estava a financiar os consumidores e não o contrário como por aí se diz, tendo-o posto de imediato na rua para evitar mal-entenddidos futuros,

Perante isto, que dizer? Que somente a partir do momento em que o sofrimento resignado se transformar em revolta será possível começar a encontrar uma solução para os problemas dos portugueses.


terça-feira, 13 de março de 2012

CAVACO AJUSTA CONTAS



CAVACO TÃO PREVISÍVEL QUANTO COMUM

Já toda a gente opinou sobre as opiniões de Cavaco. Por razões que não vem ao caso, não foi possível, em cima do acontecimento, dizer qualquer coisa sobre o modo como Cavaco censurou o comportamento de Sócrates, enquanto Primeiro-ministro.

Cavaco tem uma particularidade interessante: quando as pessoas já estão a tentar esquecer-se da sua última asneira - é que ele, convém recordá-lo, é o Presidente da República - ei-lo que reaparece com outra, igual ou pior que a anterior, um pouco como quem diz: “Continuo cá!”.

E como não podia deixar de ser, levou “pancada” à esquerda e à direita. Uns por umas razões, outros por outras.

Sem entrar em considerações jurídico-constitucionais, que, aprofundadas, levariam à insustentabilidade das teses de Cavaco, o que talvez seja conveniente recordar, a propósito deste episódio, é que o cidadão Cavaco Silva é absolutamente incapaz de analisar objectivamente uma situação em que tenha participado. O que, diga-se, nada tem de excepcional. Limita-se a ser como a generalidade das pessoas comuns. Nesse sentido, Cavaco é realmente um homem comum.

As suas reacções apenas são notícia porque ele se está referindo a assuntos políticos como se de questões pessoais se tratasse. Apesar de estar envolvido na política há décadas, ele continua a ter a propósito dos assuntos em que é interveniente a reacção típica do homem comum.

Foi o que ainda agora se passou com o recente ajuste de contas com Sócrates sobre a alegada falta de solidariedade institucional do ex-Primeiro Ministro.

O raciocínio de Cavaco é mais uma vez muito simples. Ele acha que Sócrates é o grande responsável por um conjunto de ciladas de que foi vítima nos últimos três anos, a saber: o Estatuto dos Açores, a espionagem durante a visita à Madeira e as escutas a Belém; as acções da SLN; e a Casa da Coelha.

Para Cavaco o “ruído” feito à volta destes assuntos só pode ser da responsabilidade de quem tinha a intenção de pessoalmente o desqualificar para o fragilizar politicamente, sem sequer lhe passar pela cabeça a responsabilidade que ele próprio tem em todos eles, uma vezes porque foram inventados dentro da sua esfera de acção, outras porque somente a falta de transparência que os rodeou e continua a rodear explica a notoriedade que atingiram. 

É esta interpretação tão pessoalizada dos factos, e a correspondente interiorização de ofensas por factos que fazem parte do “jogo político”, em que ele está tão envolvido como os outros, que fazem com que Cavaco perca completamente a noção das proporções.

Foi o que se passou quando solenemente convocou o país, que estava em férias, para uma comunicação transcendente, que depois se veio a verificar dizer respeito a uma questão de lana caprina que poderia ser resolvida por outros meios, como aliás veio a ser (os poderes de PR no novo Estatuto dos Açores), e foi também o que se passou, mais tarde, quando ele próprio resolveu escrever uma incrível explicação sobre o episódio das escutas, tudo situações que perante uma oposição mais ousada lhe poderiam ter custado o segundo mandato.

E foi ainda o que se passou posteriormente, depois de assegurada a reeleição, quando procurou a desforra por métodos politicamente pouco recomendáveis para um Presidente da República ao atacar desabridamente nos dois discursos da vitória os tais responsáveis pelas “calúnias”; e ao atacar o Governo no discurso de investidura.

Perante tais factos, para o Governo de então passou a ser evidente que Cavaco deixou de ser confiável.

É que tanto o Governo como as pessoas politicamente habilitadas sabem muito bem que os “golpes políticos” podem ser sempre relativizados ou até esquecidos com a mudança da conjuntura, enquanto a interiorização dos conflitos políticos como ofensa pessoal torna os seus destinatários completamente imprevisíveis, se não mesmo irracionais, daí que tendam a ser marginalizados e sempre que possível afastados dos critérios de decisão política.

Parece ter sido o que se passou…

No fim de contas tudo isto não passa objectivamente de uma manobra de diversão da qual Cavaco volta a sair mal ferido. 

sexta-feira, 9 de março de 2012

AINDA A PROPÓSITO DO PERDÃO DAS DÍVIDAS NO DEUTERONÓMIO



A QUESTÃO VISTA À LUZ DO VELHO TESTAMENTO



Como no post anterior se dizia, o Deuteronómio, que faz parte do Pentateuco, consagra de facto o ano de perdão das dívidas, o chamado ano sabático. Tal como o Sábado é o tempo de Deus, também o ano sabático, que ocorre de sete em sete anos, é sinal de que “Deus é o único Senhor da natureza e da Terra de Israel”.

Mas é curioso analisar como a questão é abordada nos “Textos Sagrados”. O Senhor ordena que no ano sabático não seja exercida nenhuma violência contra o próximo nem contra o irmão, mas não já contra o estrangeiro a quem as dívidas continuarão a ser exigidas.

O Senhor também defende que não deve haver pobres entre o seu povo (o povo eleito), porque Ele abençoará a terra que “te há-de dar em herança para a possuíres”, desde que todos os preceitos sejam respeitados e cumpridos tal como são ordenados.

E se assim for feito, o “Senhor te abençoará como prometeu: poderás emprestar a muitos povos, mas não terás necessidade de pedir emprestado; dominarás muitos povos, mas eles não te dominarão”.

E, finalmente, neste versículo relativo ao perdão das dívidas, é feito ainda um apelo muito forte para que não deixem de ser ajudados aqueles (irmãos) que necessitem de ajuda. “Empresta-lhe sob penhor, de acordo com a sua necessidade, aquilo que lhe faltar”. E logo o Senhor adverte: “Guarda-te de alimentar no teu coração um pensamento perverso, dizendo: “O sétimo ano, o ano do perdão das dívidas, está próximo”, recusando-te sem piedade a socorrer o teu irmão necessitado”.  

Numa interpretação puramente exegética, mas nunca esquecendo a carga simbólica destes textos, parece, de facto, haver dois regimes: um para o povo eleito, outros para os que a ele não pertencem.

O perdão das dívidas entre o povo de Israel e a ajuda fraterna parecem ser condições indispensáveis para se ser bafejado pela graça divina que oferece como recompensa o domínio sobre os outros povos.

Os que não pertencem ao povo eleito vão, portanto, ter que fazer pela vida e com ou sem a graça divina terão de encontrar forças suficientes para impor a sua própria lei – a lei universal da sobrevivência, amaldiçoando aqueles que, entre os seus, defendem o interesse estranho.

quinta-feira, 8 de março de 2012

PORTUGAL NA CRISE DO EURO



LOUÇÃ NA TVI 24



Em vão se procura nas livrarias o livro de Louçã e Mariana Mortágua – A Dividadura, Portugal na crise do euro –, ao que parece apenas disponível, para já, na FNAC, não sendo, por isso, possível fazer uma apreciação crítica do seu conteúdo.

Todavia, o que ontem se ouviu de Louçã na TVI 24 dá para fazer alguns comentários. Louçã, numa argumentação muito próxima da que Fidel de Castro, numa entrevista a um jornalista americano, desenvolveu aqui há uns anos, quando ainda se encontrava no activo, demonstrando a impossibilidade de pagamento da dívida dos países do Terceiro Mundo, também é de opinião que a situação portuguesa não tem solução sem um “cancelamento substantivo” da dívida.

E aduz, em defesa desta posição, múltiplos argumento, na sua maior parte irrespondíveis, como, por exemplo, o que resulta de a actual dívida duplicar dentro de muito pouco tempo e triplicar logo a seguir, tornando, por um lado, inúteis as actuais medidas de austeridade e, por outro, insustentáveis a sua aplicação em duplicado e depois em triplicado como necessariamente teria de acontecer para continuar a fazer face aos pagamentos vincendos.

Ou seja, não se trata apenas de demonstrar a irracionalidade económica de uma política que leva ao colapso, nem tão-pouco de basear o cancelamento numa exigência moral irrecusável – a dívida como resultado da agiotagem – mas de assentar a conclusão numa impossibilidade prática: é económica e financeiramente impossível pagar a dívida!

E apresentou ainda lugares paralelos históricos, uns antiquíssimos outros mais recentes, tendentes a demonstrar que o “cancelamento da dívida” é uma prática corrente a que os Estados recorrem em situações semelhantes aquela em que agora se encontra Portugal.

Quantos aos exemplos da história antiga, bem como aos ditames do Velho Testamento, embora eles existam, manda porém a prudência não exagerar no seu significado.
De facto, o Código de Hamurabi é violento para com os devedores e mesmo no mundo grego arcaico, Sólon (sec.VII/VI AC), seguramente o maior reformador da Antiguidade, também está longe de todos os méritos que a lenda lhe atribui, embora seja indiscutível a natureza progressista das suas reformas, as quais todavia não operaram uma redistribuição da riqueza e apenas corrigiram as situações mais graves, como a escravidão por dívidas e o cancelamento de algumas outras, o que, não obstante as exigências económicas daquela época, não deixa de ser um feito extraordinário.
Muito mais atrasada estava Roma que somente pela Lex Poetelia Papiria de Nexis, de 326 AC, aboliu o autopenhoramento da pessoa do devedor, salvo ao que parece nas obrigações ex delicto, mantendo-se por largo tempo, em caso de incumprimento, a obrigação de prestação de serviços ao credor, ou seja, como se diz em direito romano, a partir de então manteve-se o nexum nas obrigações creditícias como simples stipulatio.
Finalmente, o Deuteronómio, segundo alguns o mais palatável dos livros do Velho Testamento, consagra de facto o “ano sabático” – o ano do perdão das dívidas. “De sete em sete anos cumprirás a lei do perdão das dívidas”.
Mas é bom não esquecer que, em todos os casos citados, Velho Testamento incluído, as medidas de alívio da dívida eram apenas aplicáveis aos nacionais. “Ao estrangeiro poderás exigir, mas quanto às dívidas do teu irmão farás remissão”.

Já mais força terão certamente os exemplos modernos, entre quais não poderá deixar de citar-se a Alemanha que, depois da guerra, em 1953, cancelou cerca de dois terços da dívida e indexou o pagamento da parte restante a uma pequena percentagem do crescimento económico.

Portanto, se da História alguma lição resulta é a de que, sendo embora uma constante do ser humano a luta contra a usura e a agiotagem, luta a que o Cristianismo in illo tempore deu um importante contributo, somente a mobilização popular em larga escala terá força suficiente para impor o cancelamento das dívidas.

Face ao panorama descrito, mais difícil será aceitar a conclusão de Louçã quanto à permanência de Portugal no euro. A cada dia que passa se percebe melhor que o euro é um projecto falhado. Um projecto que tem servido para consagrar a hegemonia de uma economia – a da Alemanha – e a de uma doutrina económica – o monetarismo – em prejuízo não apenas de amplas camadas populares em toda a Europa, que vêem a cada dia que passa degradar-se a sua situação, mas também de todos aqueles países que desde há dez anos perderam competitividade, não cresceram ou, quando cresceram, foi com base numa falsa prosperidade que os endividou para patamares insustentáveis.

Um projecto com estas características está necessariamente votado ao insucesso pela impossibilidade que ele próprio gera de continuar a alimentar aquela hegemonia. É além disso um projecto não é reformável, nem modificável porque as reformas a introduzir teriam de ser tão profundas que sempre seriam politicamente inaceitáveis para aqueles que  alicerçaram e consolidaram a sua economia num modelo completamente diferente.

O catastrofismo a que Louçã liga o fim do euro também está longe de se vir a verificar, como até ao fim da presente década certamente se verá. Louçã, que critica Krugman por racionar politicamente como um economista, acaba por padecer exactamente do mesmo mal. Ou seja, Louçã esquece que as medidas que propõe não são exequíveis na vigência do euro e depois olvida mais duas coisas muito importantes. Primeira: o fim do euro vai ocorrer num quadro de profunda convulsão político-social na Europa; segunda: os efeitos decorrentes de uma grande mudança não são programáveis nem previsíveis. Ocorrem e depois haverá os reajustamentos impostos pela situação.  

Entendamo-nos: não se trata de propor ou de advogar a saída unilateral de Portugal do euro. Trata-se de estar preparado para essa inevitável consequência e de não criar antecipadamente um clima político de pânico que contribua para a manutenção de uma situação socialmente insustentável.

Os efeitos desta crise originada pela completa hegemonia da agiotagem internacional vão ser devastadores na Europa para países como a Grécia (já estão a ser – é bom não esquecer que todo o dinheiro emprestado à Grécia é para dar aos bancos!), Portugal, a Espanha e a Itália, e vão propagar-se à França, à Bélgica e até à Holanda. Portanto, as falências em cadeia serão inevitáveis e vão ocorrer num contexto económico que não poderá deixar de causar grave dano a todos aqueles que agora obstinadamente se recusam a aceitar outras soluções.




terça-feira, 6 de março de 2012

OS FUNDOS DO QREN



A AUSTERIDADE ACIMA DE TUDO!

 Tudo no Governo corria num mar de rosas. Depois de oito meses de exercício de funções ainda não se sabia quem geria os fundos do QREN. Nem fazia falta saber-se já que eles não eram para gastar. Mas eis que o Álvaro começa a ser pressionado para dar dinheiro às empresas depois de na Europa certas vozes de direita terem alertado para os perigos da austeridade e de a Espanha ter feito o que  fez. Os patrões sentiram-se com força para exigir do Governo algo mais do que a eliminação dos direitos de quem trabalha. Querem o dinheiro do QREN. Percebem que sem negócios de pouco ou nada nada vale a mão-de-obra sem direitos. E assim se começa a falar num tema que estava silenciado desde que este Governo para lá foi.
E então surgiu a grande divergência. O Álvaro levou o assunto a Conselho de Ministros, num dia em que o Coelho não estava por cá, e exigiu que as Finanças disponibilizassem as verbas nacionais indispensáveis para a utilização daquele dinheiro.

E foi então que o Vítor teve de pôr os pés à parede e dizer: “Nesse dinheiro ninguém toca sem minha autorização”. E logo todos perceberam que, afinal, aquele dinheiro não era mesmo para gastar.
O raciocínio do Vítor foi muito simples: as receitas esperadas não vão ser arrecadadas, a diferença entre as despesas e as receitas vai ser superior à prevista, mesmo que as despesas se mantenham dentro das previsões; assim, para manter os números acordados com a Troika vai ser necessário impor mais austeridade, seja cortando nas despesas seja aumentando os impostos, ou uma coisa e outra; portanto, não há dinheiro paras co-financiar os “projectos do QREN”.
Perante esta argumentação, o Paulo olhou para os seus e pensou: “Se a Cristas despejar uns cento e cinquenta mil velhos e o Mota Soares conjugado com o Macedo conseguir que a gripe se prolongue até Junho, talvez se obtenha uma considerável redução da despesa sem necessidade de mais medidas de austeridade e até sobre alguma coisa para o Álvaro dar aos patrões”.
Estava o pavoneante Paulo nestas congeminações e o ousado Álvaro a tentar, sem papel, balbuciar mais umas quantas frases sobre a necessidade de, pelo menos, o Governo dar a impressão de estar a fazer alguma coisa pelo crescimento, quando o Vítor arrumou a conversa com um argumento definitivo.
Não podemos de forma nenhuma dar a ideia à Merkel nem aos alemães de que a “farra recomeçou”. Eles não podem ter nenhuma espécie de dúvida sobre a interiorização da nossa culpa nem sobre a expiação que continuamos dispostos a fazer dos nossos pecados. Enquanto o programa da Troika se mantiver em execução quem ousar desafiar as metas nele previstas não tem lugar neste lado de cá da barricada”.
Interrompeu de seguida a reunião e telefonou ao Coelho, contando-lhe o que se passara. Perante argumentação tão concludente, nomeadamente a invocação de Merkel, o Coelho também não teve dúvidas. Chamou de imediato o Relvas, já algo impaciente com esta falta de negócios e, peremptoriamente, disse-lhe: “Diz ai no Conselho que quem manda nos fundos do QREN é o Vítor. Chama o Álvaro de parte e dá-lhe a entender, mas de maneira que ele perceba, que se continuar a fazer ondas com este assunto será de imediato devolvido a Vancouver e far-se-á por cá uma tal campanha sobre a sua incompetência que nem o Ruas o receberá quando ele voltar de férias a Viseu”.
E assim, com mais esta vitória, se encerra o glorioso período iniciado com a avaliação da execução do Memorando da Troika feita no fim do mês passado.
SPARPOLITIK ÜBER ALLES!