sábado, 7 de outubro de 2017


AINDA SOBRE A CATALUNHA
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A EVOLUÇÃO DOS ACONTECIMENTOS



Maldigo la poesía concebida como un lujo
cultural por los neutrales
que, lavándose las manos, se desentienden y evaden.
Maldigo la poesía de quien no toma partido hasta manchars
e”.



Noto pelo que vou lendo que há quem compreenda muito mal os que não tomam partido no diferendo da Catalunha. Encimo este texto com os versos de Gabriel Celaya (A poesia é uma arma carregada de futuro) exactamente para sublinhar que há uma diferença muito grande, enorme, entre não tomar partido no conflito catalão e no conflito que em Espanha ou em qualquer outra parte do mundo dividia ou divide os que combatiam ou combatem a direita reaccionária e opressora e os que, beneficiando dessa situação, a defendem e apoiam.

Na Catalunha essa questão não se põe. O choque, a luta se quisermos, é transversal, na medida em que tanto na sociedade espanhola como na catalã, exploradores e explorados, patrões e empregados, amos e servos, políticos e não políticos, institucionais e não institucionais, estão indiferenciadamente situados de ambos os lados do conflito. O choque seria quando muito um choque de nacionalismos. Talvez tenha começado por o não ser, mas corre o risco de o ser cada vez mais. E como neste conflito não tenho por certo o que seja mais vantajoso para Portugal, como país peninsular, nem para os ideais democráticos de liberdade com justiça social, vou-me mantendo neutral quanto ao fundo da questão. O que não significa que não tente com objectividade compreender o que se está a passar.

E, de facto, o que se está a passar é para já muito simples de explicar, embora muito difícil de resolver.

Do lado da Catalunha é difícil não criticar o irrealismo, a “insustentável leveza do ser” dos responsáveis políticos catalães, que assentam a sua actuação numa mensagem que não tem qualquer possibilidade de se concretizar nos termos em que é veiculada. É certo que a independência da Catalunha tem de contar com a vontade dos catalães. Pelo menos, com a vontade inequivocamente maioritariamente dos catalães. Sem essa vontade não haverá quem a defenda. Mas já será uma irresponsabilidade fazer crer aos catalães que eles podem decidir essa questão democraticamente. Não podem, como aliás aconteceu com quase todas as independências e continuou a acontecer com as mais recentes.

Sem apoios internacionais de vulto e apostando apenas num processo de vitimização, que somente resulta até certo ponto, a independência não será alcançada a curto prazo nem sem grandes provações. E a ideia com que se fica, face a este inevitável desfecho, é a de que os catalães não estão preparados (e quem estará na Europa ocidental?) para uma dura e longa batalha que envolva sacrifícios e privações por que até hoje nunca passaram. E é preciso ter presente que esta luta pode custar a privação da liberdade por anos a pessoas que apenas executam ordens e que agem na convicção de que não terão de responder pelos seus actos, exactamente por decorrerem do cumprimento de ordens superiores. Para a Espanha será sempre mais fácil agir contra estes, pelo efeito desmobilizador que estas sanções podem ter, do que contra os principais responsáveis políticos

Pelo lado de Espanha, Rajoy alinhou pelo “politicamente correcto”. Ou seja, Rajoy situou o conflito no plano exclusivamente jurídico. A via que o Governo da Catalunha pretende seguir para alcançar a independência é ilegal, logo a nulidade dos actos praticados e a proibição dos actos a praticar serão suficientes para impedir a concretização do efeito pretendido. Rajoy, a quem o fantasma de Franco incomoda e persegue, tem resistido a aplicar meios mais drásticos, convencido de que o uso proporcional da força será suficiente para resolver o problema.

A verdade é que não é. Por várias razões. Primeiro porque não se pode tentar resolver no plano jurídico um conflito que é político e que já atingiu um nível de crispação elevado.

Quando a lei que se pretende aplicar não é reconhecida como válida  pelos seus destinatários no território  a que presuntivamente se aplica e quando as decisões dos tribunais em geral também não são reconhecidas por aqueles contra os quais foram ditadas nós deixamos de ter num problema jurídico ou de ordem pública para passarmos a ter um conflito político, o qual, como todos os conflitos políticos, apenas se resolve por meios pacíficos (diálogo, mediação, negociações, bons ofícios ou que se lhe queira chamar), ou pela força.

Ora, acontece que Rajoy não parece dispor de uma base de apoio que lhe permita “dialogar”. A direita franquista acantonada no PP sob vários matizes exige uma resposta musculada para o problema da Catalunha e o PSOE, dividido entre uma direita quase idêntica à franquista (Gonzalez, Guerra, Ibarra, Borrell, e tantos e tantos outros) que reclama medidas igualmente drásticas, e uma esquerda dialogante, embora com grandes dificuldades em estabelecer as bases do diálogo, não constituem nem um nem outro uma base com que Rajoy possa contar para viabilizar a sua política.

De facto, Aznar e a sua gente já culpam Rajoy pela situação a que se chegou, acusando-o de uma governação titubeante. O mesmo fazem os falcões do PSOE, os mesmos que combateram a ETA com os GAL. Há ainda o silêncio do PSOE que pouco ou nada se manifesta (Zapatero) e a direcção de Pedro Sanchez que tudo está fazendo, embora possa fazer muito pouco, para impedir uma catástrofe na Catalunha.

Restam o Podemos, que defende o direito a decidir, de influência sempre incerta na sociedade espanhola relativamente a assuntos críticos e os Ciudadanos que igualmente exigem uma via dura. Ou seja, não nem um nem outro oferecem algo de novo relativamente ao que já existe.

O Rei tendo alinhado completamente com Rajoy também não trouxe nenhum contributo à resolução do conflito, salvo o que realça a sua completa inutilidade à frente do Estado espanhol.

Como a via de Rajoy não tem saída - ele não dialoga, nem pode juridicamente resolver o problema – o mais provável é que as posições se extremem e Madrid, seja com Rajoy ao leme, seja com qualquer outro, acabe por ocupar militarmente a Catalunha.

O que acontecerá depois, logo se verá.

3 comentários:

osátiro disse...

Parece mais que óbvio que a independência irá provocar graves problemas económicos....
as grandes e boas empresas só vêem problemas ....e os empregados é que vão sofrer

até o "nosso" caixabank já mostrou não gostar da brincadeira das crianças....incluindo Piquê e outros..

Rogério G.V. Pereira disse...

Constato três coisas
1ª - Que não refere a posição da Izquierda Unida
2ª - Que Alberto Garzón terá tido conclusões muito próximas da sua ao considerar que as posições de Rajoy irão conduzir "uma situação de repressão, provavelmente inédita, nas sociedades democráticas"
3ª - que apesar de lhe apontar uma omissão, sou da mesma opinião e tomei a liberdade de, na minha página, linkar este seu texto

JM Correia Pinto disse...

Meu Caro Rogério G.V. Pereira, quando escrevi o post não tinha lido nem tomado conhecimento da posição da Esquerda Unida, mas pelo que percebo destas coisas não deve andar muito longe do que eu penso. Negociações com vista à criação de Estado plurinacional, com várias línguas e culturas, de preferência republicano. É que qualquer pessoa de esquerda defende. Espero não me ter enganado.
Obrigado