segunda-feira, 8 de agosto de 2011

SERVIÇOS MÍNIMOS


E ALGUMAS NOTAS SOLTAS…
 Agosto não é um mês muito propício a blogues. Por isso, o Politeia tem estado tão irregular. E assim vai continuar até ao fim do mês. Com serviços mínimos. Temas certamente não faltam. Não é por falta de temas que a irregularidade se manifesta. É mais por falta de disposição para abordar os mesmos assuntos de sempre num clima de efémero desprendimento, mais físico do que mental, como sempre acontece em períodos de férias. Além de que os blogues, principalmente os individuais, também devem ter as suas pausas. Para que se atenue a pressão de ter de escrever sobre os assuntos do dia em prejuízo da reflexão e da leitura.

Há, porém, alguns apontamentos que não podem deixar de fazer-se.

Começando pelas privatizações. Desde Cavaco, como PM, mas principalmente a partir de Guterres (a propósito: nos últimos tempos tem aparecido muito…), que privatizar passou a ser a palavra de ordem da política económica portuguesa. De uma política fundamentalmente inspirada em fundamentos ideológicos que na maior parte dos casos só tem trazido prejuízos económicos e sociais aos portugueses e que está na origem da maior parte dos problemas com que Portugal actualmente se defronta.

Para além das decisões ruinosas conscientemente adoptadas em benefício do capital privado, como é o caso de todas as parcerias público-privadas, o gigantesco défice do que fala “Álvaro” quando se refere a certas empresas, além de se explicar pelos múltiplos erros de gestão provocados pelo assalto do “Bloco Central” à direcção dessas empresas, explica-se também por o Estado entretanto se ter despojado dos meios que lhe permitiriam fazer face àqueles desequilíbrios sem onerar o contribuinte nem penalizar brutalmente o utente, como está a ser o caso.  Entregues ao capital privado empresas lucrativas, nomeadamente as situadas nas áreas estratégicas, o Estado deixou de ter receitas patrimoniais para acudir aos prejuízos das empresas que prestam (e têm de continuar a prestar) serviços de cunho social aos utentes, e passou a fazer recair sobre estes e sobre os contribuintes em geral o ónus de equilibrar os custos com um aumento exponencial das receitas com aquela proveniência.

Mas há mais: o Governo prepara-se para cometer outros crimes de “lesa-Pátria” na área dos transportes aéreos e das infra-estruturas aeroportuárias. O caso da TAP e da ANA são paradigmáticos. Vejamos o da TAP.

A TAP tem sido ao longo da sua existência um dos mais conhecidos símbolos do país no estrangeiro e um elo de ligação entre os portugueses espalhados pelo mundo e a sua Pátria. Toda a gente percebe que com a sua privatização, a TAP acabará como entidade com esta natureza. Passará a ser um simples apêndice de uma qualquer grande empresa de aviação ou, se não for esse o caso, limitará a sua presença às rotas mais lucrativas e onde está actuando quase sem concorrência. Pois o Governo em funções, com a tranquilidade exibida pelo Ministro das Finanças, quando anuncia e põe em prática as medidas mais brutais, prepara-se para fazer tudo isto sem pestanejar. Muito provavelmente, como já fez com o BPN, ainda prodigalizará várias centenas de milhões de euros a quem se prontificar a “ficar” com a TAP. E a justificação é conhecida: “a TAP é uma fonte incomportável de prejuízos para o contribuinte e a única forma de o Estado aliviar os cidadãos desse pesado encargo é privatizá-la”.

Acontece que os pressupostos são falsos. E além de falsos assentam numa fanática base ideológica que tende a ser disfarçada com meias verdades. De facto, a TAP não dá prejuízo ou não tem que dar prejuízo por ser uma empresa pública. O que dá prejuízo são certas empresas dominadas pela TAP que ela se viu obrigada a constituir por imposição de Bruxelas, por razões puramente ideológicas, como é o caso do handling.  

Mas há mais: a TAP como qualquer outra empresa precisa com a passagem do tempo de reforçar o seu capital social. A TAP tem nesta matéria um défice considerável, em virtude de o Estado – único accionista da empresa – ter extrema dificuldade em o fazer ou não o poder mesmo fazer, também por imposição de Bruxelas. Ou seja, as regras comunitárias praticamente proíbem o Estado de reforçar o capital social da TAP… para defesa da concorrência! Mas não proíbem o Estado de transferir para o comprador do BPN mais de 500 milhões de euros! Nem o proibirão, em caso de privatização da TAP, em arcar com o passivo da empresa pelo qual é responsável para a entregar “limpinha” ao “comprador”! E, se porventura o permitissem, o Governo encarregar-se-ia de dizer que não tinha meios para a capitalizar. E todavia não lhe escasseiam recursos para entregar aos bancos ou, indirectamente, aos “compradores” de certas empresas nacionalizadas

É este o capitalismo em que vivemos. Um capitalismo que não se contenta com o lucro obtido no desempenho de uma qualquer actividade económica, mas que exige ainda em nome da pureza ideológica neoliberal que o Estado não possa desempenhar actividades onde ideologicamente já se fixou o princípio de que a sua exploração pertence exclusivamente ao sector privado.

Realmente não há qualquer distinção material entre estas actividades e outras que o Estado presta, igualmente susceptíveis de apropriação particular e susceptíveis de se transformarem em actividades lucrativas, como é o caso da segurança social, da saúde e do ensino. É tudo uma questão de timing e de preparação ideológica da opinião pública…para o assalto.

A primeira a cair vai ser a segurança social. O Governo tudo fará para a descapitalizar, quer por via da famigerada taxa social única, quer por via das transferências líquidas para o orçamento de Estado, como já estava para acontecer no próximo orçamento rectificativo se não fosse a pronta intervenção do deputado Honório Novo.

Depois será a saúde. Aqui o argumento será vulgar. Primeiro dir-se-á que ninguém será privado do direito à saúde – a primeira etapa da discriminação; depois, defender-se-á que quem tem posses deve pagar ou pagar uma parte substancial do serviço que lhe prestam…para melhor se poder cuidar da saúde de quem as não tem; a seguir, argumentar-se-á, sem provas de nenhuma espécie, que a prestação dos cuidados de saúde devem ficar a cargo de quem esteja em condições de os prestar melhor do que o Estado, como já antecipou Cavaco quando demagogicamente citou as IPSS, que são o “cavalo de Tróia” da iniciativa privada na área da saúde; finalmente, estarão criadas as condições para que a saúde vá gradualmente passando para as mãos de privados, financiados simultaneamente pelo orçamento de Estado e pelos doentes.

E a seguir virá o ensino…


Tudo isto em nome da pureza ideológica neoliberal que já decidiu que há actividades para as quais o Estado não está vocacionado. Daqui à proibição de direito ou de facto vai um pequeno passo que este Governo está convictamente disposto a transpor.

Mas não param por aqui as façanhas deste Governo. O que se está a passar com a anunciada privatização da RTP é uma vergonha. Tudo o que se conhece aponta para a existência de um compromisso, de que Relvas por parte do Governo será o principal executor, com a Ongoing. Vale a pena ler a entrevista de Balsemão, ao Público de ontem, sobre este assunto…

E as privatizações vão prosseguir em áreas antes impensáveis de serem entregues à ganância privada, como é o caso das águas, dos correios e do transporte da energia eléctrica. Sobre estas matérias não adianta pedir referendos para auscultar a vontade popular. De facto, tais matérias não são susceptíveis de decisão por esta via. O que tem de dizer-se – o que as forças políticas que se opõem à privatização de serviços essenciais à vida em sociedade têm de dizer-se é que tais serviços serão recuperados sem direito a qualquer indemnização!

Mas a pouca vergonha não pára por aqui. O CDS governamentalmente acantonado nos seus nichos eleitorais dedicou-se às esmolas. Trata, com migalhas, dos “pobrezinhos” que o Governo diariamente vai fomentando.

Finalmente, PSD e CDS coincidem na imposição de trabalho gratuito aos titulares do subsídio de desemprego, preferencialmente em empresas! Será preciso acrescentar algo mais?

Boas férias…para quem ainda as tem!
(A imagem foi retirada do blogue "Alho politicamente incorrecto")


4 comentários:

anamar disse...

Para quem está de férias... mesmo asim o "bicho "está lá.
Até breve.
:))Ana

Anónimo disse...

Boas ferias Dr. Correia Pinto. Mas entao para que serve este governo? Eu sempre pensei que o governo e do Povo e para o Povo! Para vender o que temos? E levar-nos ao caminho da miseria. Quanto seria bom ververmos no Anarquismo em celulas de interesse comum! E governarmos os nossos interesses a nosso belo prazer! Vou ter que morrer no mesmo tempo da minha mocidade! Mas se tivermos que voltar para traz...venha a guerra..venha o 26 de Abril. Parabens pelo post mesmo em ferias...

Anónimo disse...

Um post de uma realidade que dói!
A reflexão é um exercício que todos deviam exercitar.
(formiga que lê)

Anónimo disse...

Tudo bem dito e certo o que diz. Mas olhe que no caso da TAP muitos têm ajudado a um ambiente de aceitação, por boa parte dos portugueses, da alienação dessa empresa-símbolo. Lembro-me, por exemplo, da última ameaça de greve.

LG