O QUE REALMENTE ESTÁ EM CAUSA
Como de costume há muita confusão propositadamente criada sobre a situação financeira da Madeira, exactamente para que se não perceba o que está em causa e na verdade se passa.
Ontem, na TVI, o comentário de Marcelo Rebelo de Sousa foi um dos mais tristes exemplos de mistificação e encobrimento que se tem visto e ouvido sobre a situação financeira da Madeira. Valeu tudo, a ponto de se ter considerado virtuosa a situação criada por Jardim por confronto com a do continente. Todavia, as palavras de Rebelo de Sousa não são particularmente graves, salvo para ele próprio, já que de momento ele não desempenha qualquer cargo político, apesar da defesa de Jardim fazer parte da pré-pré campanha eleitoral que o conhecido comentador já vem fazendo com vista às presidenciais de 2015. Aliás, Rebelo de Sousa dificilmente poderia ter outra opinião, uma vez que sobre ele pesa a suspeita – ou, a certeza, a avaliar pelo que se tem lido nos jornais ao longo destas três décadas de jardinismo – de ser um dos consultores mais bem pagos da falida região autónoma. Para que as suas declarações pudessem ter outro peso, Marcelo deveria ter feito uma “declaração de interesses”, tanto quanto possível quantificada. Mas não fez. E como não fez terá de entender-se que a sua intervenção a favor de uma solução para Jardim faz parte do seu trabalho de consultadoria e nela está incluída para efeitos relevantes.
Deixando Marcelo e a sua “compreensível” intervenção, é preciso começar por esclarecer que este “buraco” de que agora se fala de 500 milhões de euros só muito parcialmente tem a ver com a dívida da Madeira. Este “buraco” para o qual Jardim pede urgentemente uma solução tem a ver com compromissos inadiáveis que Jardim tem de respeitar nos próximos meses. Nem sequer é seguro que os 500 milhões sejam suficientes para solver os compromissos inadiáveis até ao fim do ano.
A dívida da Madeira é outra coisa. Uma “coisa” incomensuravelmente mais pesada cujo montante com rigor se desconhece, não apenas pela opacidade com que o governo regional sempre rodeou as contas públicas, mas também pela cumplicidade dos poderes continentais relativamente a Jardim, tido como aliado insubstituível.
Por outro lado, é preciso também compreender que as palavras na boca ou na pena de Jardim têm um significado completamente diferente daquele que elas revestem para o comum dos mortais. Quando Jardim coloca o Ministro das Finanças perante a ameaça de bancarrota da Madeira e pede um programa de “ajustamento estrutural” para a região, não está a solicitar que lhe “desenhem” um programa de austeridade com forte contenção de despesas, aumento dos impostos locais e cessação da maior parte das “discriminações positivas” por ele adoptadas. Não, nada disso. O que Jardim está a fazer é a pedir-lhe urgentemente dinheiro... a pagar pelos mesmos de sempre.
Perante este quadro, ainda por cima agravado pela “vingança” do CDS, que vê na situação da Madeira uma excelente oportunidade para, atacando-a, sibilinamente se distanciar do insustentável aumento da carga fiscal imposta pelo Governo completamente à revelia das promessas eleitorais e do seu próprio programa, o Primeiro Ministro cala-se na vã esperança de que alguém lhe encontre uma solução que não ponha em causa o resultado eleitoral das próximas eleições autonómicas.
O mesmo faz Cavaco, o que aliás não pode causar qualquer admiração, já que as suas actuações como Presidente da República em nada se distinguem das que tinha como Primeiro Ministro, sempre marcadas pelo sectarismo e por um real desprezo pelos seus adversários políticos. A que propósito denunciar a situação da Madeira se ainda há a esperança de o poder fazer em relação aos Açores?
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