QUASE CERTA FALÊNCIA CONTROLADA DA GRÉCIA
Já não há qualquer espécie de dúvidas de que a opinião pública alemã, completamente orientada por uma imprensa reaccionária e revanchista, quer eliminar do euro certos países ou então afastar a Alemanha dessas más companhias.
É claramente o que pensam os filhos e os netos dos nazis da Baviera, agora com nome CSU, e mais aqueles que se acolhem no CDU ou no FPD. São hoje como foram ontem. Ou talvez melhor: nunca deixaram de ser o que foram porque a desnazificação nunca passou de uma história mal contada. Eram tantos e tantos, e por todo lado, que, com excepção dos grandes “chefões” e dos criminosos mais conhecidos, todos ficaram onde estavam. Como substituí-los se todos estavam comprometidos? Substitui-los por quem?
O tempo passou, os nazis foram pela lei da vida desaparecendo, mas o clima que os criou, agudizado em tempos de crise, continua presente numa sociedade que, não obstante todas as expiações a que hipocritamente se submeteu, não deixa de olhar para outros em função da raça. E é esse preconceito racial, agora disfarçado de preconceito cultural, que permanece presente na sociedade alemã quando se trata de encontrar um compromisso que pressuponha a aceitação da diferença.
Quando Merkel diz que o multiculturalismo falhou, o que quer ela dizer? Muito simplesmente que os turcos nascidos na Alemanha se não tornaram alemães como ela gostariam que acontecesse. É exactamente o mesmo raciocínio que agora a afasta dos gregos e que amanhã a afastará dos portugueses não obstante o servilismo que rodeia a relação oficial com ela. Também aqui, na União Europeia, na zona euro, ela esperaria que todos nos tornássemos alemães. Pois é: mas não somos, nem queremos ser!
Apesar de todos os alertas, dos apelos angustiados que se vão ouvindo principalmente da parte daqueles que já desempenharam altas funções na Europa, a crise caminha para um beco sem saída. Bem pode Merkel, depois de ter admitido a “falência controlada” da Grécia ou de o seu Ministro da Economia ter mesmo admitido a saída da Grécia do euro, encontrar-se pela enésima vez com Sarkozy para mais umas fotografias e umas tantas frases soltas sobre a viabilidade do euro e permanência da Grécia nele, que nada disso contribuirá, um milímetro que seja, para a solução da crise.
Enquanto persistir a imposição dos severos programas de austeridade fiscalizados pelos gauleiters do neoliberalismo os países endividados estarão condenados a acrescentar crise à crise, sem qualquer hipótese de crescimento.
A última reunião dos ministros das Finanças, em Wroclaw, com a presença do Secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, não poderia ser mais elucidativa. O desentendimento entre os “patrões” da zona euro e a administração americana é total. Há visões muito diferentes, de um e do outro lado do Atlântico, sobre como fazer face à crise do euro. Os americanos parecem recear que a falência de um país da zona euro alastre até aos seus domínios, enquanto do lado de cá o objectivo primeiro continua a ser o de fazer vergar a Grécia…ou criar-lhe um situação que a obrigue a abandonar o euro, o que se torna, em qualquer dos casos, cada vez mais provável por inviabilidade prática de corresponder às exigências que lhe fazem.
Imagine-se que para além de todas as dificuldades que a Alemanha tem levantado com vista a impedir a remessa da sexta tranche (cerca de 8 mil milhões de euros) da ajuda em curso, aparece agora a Finlândia, apoiada pela Eslováquia, a Holanda e a Áustria, a exigir à Grécia garantias (depósito de dinheiro (!!!), bens imobiliários, etc.) de reembolso pela parte do empréstimo pelo qual se responsabilizará.
É evidente que nada disto pode ser entendido à letra. O que os “verdadeiros finlandeses”, os selvagens neoliberais de Bratislava e os incorrigíveis austríacos realmente querem é a falência da Grécia e a subsequente saída do euro. Aliás, a Eslováquia, pela voz dos neoliberais (SaS), di-lo expressamente.
Como tanto os “verdadeiros finlandeses” de Timo Soini, como os neoliberais de Richard Sulik não representam senão uma pequena parcela dos respectivos eleitorados (19% e 12,5%), é caso para perguntar que “força é essa” que lhes permite congelar um empréstimo absolutamente decisivo para o futuro próximo da Grécia.
Curiosamente, com excepção da Holanda, os países que estão levantando dificuldades suplementares na concessão do empréstimo são antigos aliados da Alemanha nazi. Coincidências? Em política não há coincidências…
Por tudo isto torna-se cada vez mais incompreensível – e mais ainda depois das “ajudas” de Jardim – que os governantes portugueses continuem orgulhososamente a demarcar Portugal da Grécia, numa espécie de delação de segunda categoria, como ainda ontem se ouviu a Passos Coelho e hoje a Portas e a Cavaco.
Enfim, as coisas estão cada vez mais claras: os cordeirinhos sacrificiais que sob a pele do “bom aluno” esperam escapar, dessolidarizando-se dos que se encontram na mesma situação e indo além do que conjunturalmente lhes é exigido, que se cuidem…Serão os próximos…
Espantoso é também que ninguém fale da Irlanda. Não falam em Bruxelas nem em Berlim os patrões do dinheiro, não falam os jornalistas nos jornais nem nas televisões, apesar de o défice da Irlanda ser o dobro do da Grécia - mais de 32%. E de a dívida ser também colossal para utilizar uma expressão tão cara aos nossos governantes.
A razão é muito simples: é que o défice da Irlanda foi contraído para salvar os bancos em consequência da “borbulha” imobiliária - uma constante da cultura neoliberal - que só se tornou um “pecado” porque rebentou. É essa sua génese que quase o torna virtuoso para a gente de Bruxelas e de Berlim, não obstante o seu extraordinário montante.
Verdadeiramente, o que eles reprovam, o que eles invejam, é o estilo de vida dos gregos. O sol, as praias, as esplanadas, as ilhas, aquela convivência serena com os deuses. O que eles não aceitam é que os próprios deuses tenham sido criados à imagem e semelhança dos homens. Sem imperativos categóricos nem máximas calvinistas. Sem verdades absolutas em nome das quais se combate a religião do outro, se discrimina, se extermina até, se necessário for. É isso que os bárbaros não aceitam. Viva a Grécia!
12 comentários:
Estou de acordo com tudo e acrescento que, a Alemanha, quer crescer para Leste, onde estão as economias que verdadeiramente lhe interessam. Então para quê o Euro? Com a sua própria moeda farão mais e melhor. Assim o ataque à Grécia é na verdade o cavalo de Troia do verdadeiro objectivo: O FIM DO EURO.
Excelente texto. Viva a Grécia!
Somos gregos, somos a Grécia. Viva a Grécia!
E parem de dizer (os nossos governantes) que não somos a Grécia.
Já chega!
1 - O critério rácico parece não ser exclusivo dos alemães, aliás, parece que os alemães, afinal, têm muitas companhias...
2 - A distinção que os malfadados mercados fazem entre a Irlanda e a Portugal tem, entre eventualmente outros, um fundamento muito real: a capacidade que a economia (real) mostra para gerar excedentes que poderão pagar o serviço da dívida.
3 - A história de que os Povos não têm "culpas" parece não se aplicar aos alemães e adjacentes, mas já é reclamaável para os Islandeses e sobretudo portugueses e gregos; Aqueles coitados nunca tiveram a curiosidade de perceber porque é que tinham enriquecido tanto e tão rapidamente que permitia à generalidade deles comprar belas propriedades em Espanha onde tanto gostam de mandriar com os indígenas. Paradoxalmente, o Jardim e o clarividente povo que, sucessivamente, o têm eleito devem gostar desta leitura das coisas...
4 Sejamos todos gregos, gozemos o belo sol e a cálida água. Podemos passar muito bem sem a manteiga e até o pão. Quanto ao bife é um hábito tão recente que nem vamos dar pelo seu desaparecimento, em vez desse atentado à ecologia, vai ser uma felicidade voltar às favas com um pouco de toucinho, só de vez em quando para que voltemos a gozar da saúde de que, antes das más companhias, o povo português disfrutava..E até as mortes que se evitarão se os diabólicos Audis e BMWs desaparecerem da nossa vista...
LP
Parabéns por mais um excelente texto. E viva Sócrates, claro! (Oops), o outro...
O meu pai dizia-nos sempre que se falava da Alemanha, ainda não se sonhava a reunificação: "Tenham sempre muito cuidado com a Alemanha". Ele lá sabia o queria dizer.
Entretanto o vergonhoso episódio das bandeiras a meia haste não passou de...nada. Assim, e ainda que isto se recomponha, fica claro, neste caso como no dos filandeses, que esta Europa é inviável. Os egoísmos irão sempre sobrepor-se.
Excelente!
O euro ainda não acabou porque os poderosos ainda não tiveram tempo de converter o dinheiro que têm nos "off-shores" em ouro, diamantes, outras pedras preciosas, bens imobiliários, etc. Quando tiverem esse "servicinho" concluído já pode acabar, como entre eles, tudo leva a crer, está combinado.
todos somos gregos ou para lá caminhamos...
oportuno texto
"VC" acrescentou uma coisa em que ainda não tinha pensado, ou seja, o fim do Euro por causa do mercado dos países mais a leste e o seu carácter descartável face a esse objectivo.
Falta é definir o que é esse "leste": é só até à ex-urss, ou vai até à china e arredores?
Se for até ali à Russia e adjacentes, o mercado até pode ser tentador, mas, ao excluir a "outra fronteira" vai dar guerra de certeza.
Se for mais além, a Alemanha vai ser engolida pelo extremo oriente.
Os orientais são igualmente inteligentes, disciplinados e criativos.
Finalmente estou com "LG", se isto for para o charco, até vai ser bom porque estas doenças do fast food e do consumismo vão desaparecer e dar mais saúde aos portugueses.
Comamos e bebamos pois, quem, vier que feche a porta (apagar a luz já não será preciso).
SF
Olha mais um a dar um empurrãozinho...
-> A superclasse (alta finança internacional - capital global, e suas corporações) não só pretende conduzir os países à IMPLOSÃO da sua Identidade (dividir/dissolver identidades para reinar)... como também... pretende conduzir os países à IMPLOSÃO económica/financeira.
-> Só não vê quem não quer: está na forja um caos organizado por alguns - a superclasse: uma nova ordem a seguir ao caos... a superclasse ambiciona um neo-feudalismo.
[nota: como seria de esperar, a superclasse é anti-povos que pretendem sobreviver pacatamente no planeta...]
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-> Para além da SUBSTITUIÇÃO POPULACIONAL [nota: não-nativos já naturalizados estão com uma demografia imparável em relação aos nativos]... também tivemos um que dizia «Há vida para além do deficit» [nota: pois há - a perda de soberania nacional]... etc... e também temos mais um a dar um empurrãozinho - JORNAL DE NEGÓCIOS, 15 Setembro 2011, George Soros: «é preciso um Ministério das Finanças europeu, com poder para decretar impostos e para emitir dívida»
Sou exilado económico no Bayern, Alemanha, desde 1999 e não sendo doutorado só posso dar uma opinião baseada na minha observação.
A "opinião pública" alemã nunca aceitou muito bem a troca do seu DM forte por um euro que a pouco e pouco se desvalorizou até tornar tudo três vezes mais caro. Por aqui até já se fala que deveria ser a Alemanha a deixar o Euro, ficando essa moeda para os "outros".
A CSU/CDU apesar de serem dois partidos, na teoria, são na realidade um só, correspondendo mais ou menos ao PSD e a FDP será o nosso CDS. E podem crer que é mais o que os une que aquilo que os separa.
A "tendência" para a superioridade racial é certo que nunca desapareceu e costumo até dizer que "os alemães nasceram para mandar e são todos chefes".
Mas vendo bem a vizinha Holanda e a França não andam muito longe desta mentalidade.
A questão dos turcos é mais complicada. A Merkel e os alemães decididamente estão arrependidos de os terem ido buscar para a reconstrução depois da guerra.
Mas que os turcos não fazem o mínimo esforço por se adaptarem ao mundo onde vivem é uma realidade. Conheço alguns que aqui residem há 30 ou 40 anos e não falam uma "palavra de alemão". São as novas gerações que tratam dos problemas dos pais.
E na questão do ódio racial nem sei bem se o ódio dos turcos não será superior ao dos alemães, que queiramos ou não até são os naturais deste País.
Não nos podemos esquecer que a crise do Euro acontece depois da "salvação" do sistema bancário pelo Estado. E isso aqui também é criticado.
Para terminar, esta "crise" está a abrir portas para compras do sector público nos "países em dificuldades" por parte de empresas alemãs ao mesmo tempo que está a tornar o salário mais barato para todos.
O Fraport vai comprar o Aeroporto de Barajas e o de Barcelona. A Deutsche Telekom vai comprar a Telecom grega e por aí fora...
Obrigado pela atenção
Obrigado João Carlos pelo seu contributo e pela clareza da sua exposição.
Compreende-se a nostalgia dos alemães pelo DM, não obstante as imensas vantagens que a moeda única, o euro, lhes proporcionou.Depois das vicissitudes por que passou o marco na República de Weimar, da hiperinflação para sempre gravada na memória colectiva dos alemães, é compreensível que a solidez da moeda saída do pós guerra constitua para as gerações que o conheceram um marco difícil de esquecer.
Mas no que eles estão rotundamente enganados é na imputação de responsabilidades que agora estão fazendo aos países do sul pelas dificuldades por que o euro está passando e vai continuar a passar enquanto não houver uma alteração radical das condições em que foi criado.
Por outras palavras, a crise do euro era, mais ano, menos ano, inevitável pela profunda desigualdade competitiva das economias que o integram no quadro institucional que o gerou.
Os alemães queixam-se ainda do modo como os bancos centrais dos países integrantes do euro lidavam com a política monetária por comparação com o que se passava com o Bundesbank, para eles uma instituição completamente independente do governo e atribuem àquele antigo "vício" - a tal grande proximidade (para eles quase promiscuidade) entre o banco central e o governo - a causa das múltiplas irregularidades que, segundo eles, o BCE começou a praticar depois de tornada ostensiva a crise do euro.
Acontece que essa independência do banco central - Bundesbank - e já agora também do Tribunal Constitucional não passa de uma "treta".
Na política, o grande objectivo de quem governa é ter nos múltiplos lugares de relevo da governação (em sentido amplo) pessoas às quais não seja permanentemente necessário dizer-lhes o que têm de fazer. Pessoas que saibam interpretar de acordo os interesses dominantes o que importa fazer. E era isso o que fazia o Bundesbank e é isso o que continua a fazer o TC. Nos países do sul, França incluída, as coisas não são assim tão claras. Há um sentido menos comunitário da vida em sociedade - no sentido de ver nela uma multiplicidade de interesses - que leva na prática a posições frequentemente divergentes com o que acriticamente se costuma chamar o "interesse geral". Isto tem uma explicação filosófica e radica numa concepção mais plural da sociedade, que não vem agora ao caso desenvolver.
O que impoorta agora dizer é que a Alemanha que tentou criar o BCE à sua imagem e semelhança - e assim ele funcionou há bem pouco tempo - não está por essas tais razões de filosofia política a que atrás aludimos muito preparada para aceitar a defesa de interesses plurais. O BCE deveria fazer aquilo que os alemães entendem que o Bundesbank faria se tivesse continuado a existir.
Ou seja, o problema da Alemanha, mal ganhe alguma força, seja ela militar ou económica, é sempre o mesmo: convive mal com a diferença.
Quanto ao facto de o preço dos produtos terem subido ma Alemanha de pois do euro, é verdade, mas não pelo euro se ter desvalorizado, mas antes pelo conntrário. Contudo, também aí a queixa dos alemães não tem sentido: para os demais países o aumento dos preços gerado pelo euro foi ainda muito maior.
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