UMA BIOGRAFIA POLÍTICA
Foi hoje ao fim da tarde apresentada na Gulbenkian, a biografia de Melo Antunes – Melo Antunes - Uma Biografia Política – da autoria da jovem, mas já consagrada historiadora do 25 de Abril e do MFA, Maria Inácia Rezola.
Tereza Patrício Gouveia leu em nome do Presidente da Fundação Gulbenkian um pequeno texto evocativo do biografado. Joana Melo Antunes falou do Pai com comovente simpatia e agradeceu em nome da família a obra que ajudará a perpetuar o papel de Melo Antunes na Revolução dos Cravos. António Reis sintetizou numa cuidada e bem elaborada intervenção o roteiro da biografia e a personalidade política do biografado. Vasco Vieira de Almeida, numa intervenção brilhante, analisou as raízes do pensamento político e da formação intelectual de Melo Antunes percorrendo os grandes princípios do marxismo libertário tanto na sua génese como no seu posterior desenvolvimento e aprofundamento gramsciano. Vasco Lourenço, tendo por referência o processo de destruição em curso das bases democráticas do regime fundado na sequência do 25 de Abril, evocou o amigo, o companheiro de armas e o camarada de acção política, não deixando implicitamente de lamentar em tom auto-crítico não ter sabido o MFA impor-se com mais firmeza como presença incontornável no devir do regime. Finalmente, Ramalho Eanes lembrou que nestes “tempos dramáticos o país deve inspirar-se nos seus maiores”, como é o caso de Melo Antunes, a quem atribuiu a paternidade da democracia em Portugal.
Na História tão frequentemente mal contada e deturpada do 25 de Abril, Melo Antunes ocupa, para o bem e para o mal, um lugar incontornável nos acontecimentos capitais do processo revolucionário, desde o contributo decisivo para a textura ideológica do Movimento dos Capitães na fase conspirativa, passando pelos diversos governos provisórios, a descolonização e os movimentos de massas que fizeram avançar a Revolução e simultaneamente diminuir perigosamente a sua base de apoio, até à rotura que levou à fragmentação do MFA, por irredutibilidade das partes em confronto, e a alianças que se revelaram fatais para o desenvolvimento do próprio projecto político que Melo Antunes acalentava para Portugal.
De Melo Antunes ficará como marco inapagável da sua acção política a descolonização e a compreensão certeira do nacionalismo africano que em última instância animava os Movimentos de Libertação. Melo Antunes nunca se deixou enlear pelos antagonismos da Guerra Fria nem pela deturpada percepção que os representantes dos blocos em confronto iam tendo das múltiplas vicissitudes ligadas ao processo de descolonização. A descolonização foi a que tinha de ser e ela, para o ser, tinha (e tem) de ser acima de tudo obra do descolonizado. Melo Antunes compreendeu isto como ninguém: à simpatia intelectual pelos movimentos terceiro-mundistas, juntava três comissões militares em África no curto espaço de uma dezena de anos. O seu humanismo fez o resto.
Da luta pelo projecto democrático em Portugal, ficará a impossível combinação da democracia participativa de raiz amplamente popular com as degenerescências inevitáveis da democracia representativa. Ai, Melo Antunes falhou. Mas quem conseguirá romper a “quadratura do círculo”?
7 comentários:
"Na História tão frequentemente mal contada e deturpada do 25 de Abril...", JMCP dixit com toda a propriedade.
Mas então quando é que tu, JMCP, que estás em condições ímpares para a contar - ou, pelo menos, para contar grande parte dela - continuas sem a escrever?
Ninguém te perdoará se o não fizeres.
O comentário anterior é meu.
Vitor Miragaia
Duvido bastante que já exista suficiente distância para se historiar o 25 de Abril. Como se sabe, a História costuma pregar umas partidas aos presumíveis vencedores e aos seus apressados cronistas...
mesmo sendo já major, é um dos inesquecíveis, "Capitães de Abril".
tanto que lhes devemos!
Como gostaria de ter estado presente nesse lançamento!
Subscrevo o que Vitor Miragaia escreveu!
Alcipe
Foste citado. Foi um lançamento muito interessante.
Abraço
CP
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