quarta-feira, 21 de abril de 2010

DUAS OU TRÊS NOTAS SOBRE A CRISE FINANCEIRA E A DÍVIDA


DÚVIDAS E CERTEZAS
Agora que se sabe, sem margem para qualquer espécie de dúvida, não apenas que os bancos foram os grandes responsáveis pela crise que hoje se continua a viver em muitas partes do mundo, mas que a própria crise está intimamente ligada à orquestração, pelos bancos, de gigantescos saques sobre o erário público…a que o erário público respondeu dando-lhes ainda mais dinheiro, fica ainda mais clara, depois das declarações que ontem prestou, a actuação de Constâncio à frente do Banco de Portugal. Com a total impunidade que tem caracterizado a sua passagem pela vida pública portuguesa, Constâncio vem aconselhar os Estados europeus, do alto do seu novo cargo, a ter muito cuidado (prudência, é a palavra que usa) na taxação dos lucos da banca e na regulação das suas actividades.
Se vivêssemos numa democracia, numa verdadeira democracia como era a democracia directa ateniense, Constâncio seria votado ao ostracismo e proibido de entrar na Cidade por tempo indeterminado. Como não vivemos, vai para Frankfurt defender os banqueiros e os especuladores.
A dívida pública portuguesa cresceu exponencialmente nestes últimos anos, ouve-se dizer com muita frequência. Aparentemente assim é, mas só aparentemente. A relação entre a dívida e o PIB subiu porque o PIB não cresceu nestes últimos dez, doze anos. Se tivesse crescido, a dívida apesar de ter aumentado, teria uma relação com o PIB completamente diferente da que hoje tem.
Logo, a questão não está apenas em saber por que razão a dívida cresceu, mas também por que razão o PIB estagnou. Certamente que houve muita asneira, houve dinheiros públicos malbaratados, o Estado conclui negócios que nenhuma empresa teria feito, tudo isto é sem dúvida verdade. O pior é que, mesmo que tivesse havido uma gestão diferente dos dinheiros públicos, o resultado (do ponto de vista acima referido) não seria substancialmente diferente, como se está a ver com o que se passa noutros países da zona euro.
Já aqui se disse que apenas há três formas de diminuir o peso da dívida pública no PIB, de preferência cumulativamente aplicadas: crescimento económico, inflação e uma distribuição mais equitativa do rendimento nacional.
A economia não cresce, porque o euro não deixa; inflação não existe porque as correntes monetaristas que governam o BCE não a permitem; a distribuição mais equitativa dos rendimentos não se faz porque temos sido governados há várias décadas por gente de direita avessa a doutrinas igualitárias. Perante este cenário todos conhecemos sem surpresa as propostas de solução apresentadas pelos nossos economistas. São as mesmas que têm sido aplicadas nestes últimos oito anos…com os resultados que estão à vista.
Mais grave ainda: mesmo que o Governo se prepare para pôr em prática aquilo que em voz alta, uns, em voz baixa, outros, vão advogando, tudo continuará substancialmente na mesma em termos macroeconómicos e muito pior em termos individuais. Referimo-nos ao ataque ao emprego (o ataque ao trabalho é, em última instância, um ataque ao emprego), à descaracterização ou mesmo eliminação do Serviço Nacional de Saúde e a outras despesas sociais.
Finalmente, muitíssimo mais grave do que a dívida pública, e incomparavelmente maior, é a dívida privada. E esta, como se resolve? Como se inverte a tendência? Se bem repararem nenhum economista daqueles que vai à televisão receitar menos direitos e menos rendimentos para os trabalhadores fala nesta questão. E, todavia, é nela que está a gravidade do problema.
A propósito desta dívida é importante que se pergunte o seguinte: qual a vantagem para a economia portuguesa dos investimentos externos, por exemplo, da EDP, agora que tanto se fala nos êxitos e na excelência de Mexia?
Esta é uma dúvida que gostávamos de ver esclarecida. Compreendemos sem muita dificuldade o endividamento de empresas nacionais viradas para a exportação. Compreendemos também o endividamento de empresas nacionais que concorrem no estrangeiro à prestação de serviços ou à realização de obras. Mas temos muita dificuldade em perceber as vantagens para a economia nacional do endividamento (do extraordinário endividamento da EDP) para fazer investimentos na exploração de energia eólica ou hídrica no estrangeiro.
Quando dizemos que compreendemos o endividamento das duas primeiras categorias de empresas queremos dizer que a sua actividade tem repercussões directas na economia nacional e o endividamento é pago com o resultado dessas mesmas actividades. E no caso da EDP e outros semelhantes também será assim? Essa uma dúvida que gostaríamos de ver esclarecida …

3 comentários:

jvcosta disse...

Podes dar o "link" para as declarações de Constâncio? Fiquei a salivar!

JMCPinto disse...

Já pus no texto. É este:
http://www.destak.pt/artigo/60635

jvcosta disse...

Às vezes, apetece-me ser ordinário. Esta conversa mole, diz que sim mas talvez não, chamava-se em vernáculo coisa de "empata f****"