O QUE INTERESSA E O QUE NÃO INTERESSA
De tudo o que Passos Coelho vem dizendo o mais importante é sem dúvida o que se prende com a revisão constitucional, nas áreas da saúde e do ensino.
O novo presidente do PSD diz que quer “despartidarizar” o Estado e retirá-lo dos negócios, reformar a justiça, alterar as leis eleitorais e dar liberdade de escolha aos cidadãos na saúde e na educação.
O que é isso de retirar o Estado dos negócios? Ainda um dia destes na TV um conhecido historiador defendia a mesma tese para combater a corrupção. E a gente fica sem perceber o que eles querem dizer. Então quem é que passaria a fazer os negócios do armamento e do material militar em geral? E quem faria os negócios das obras públicas? E quem faria os negócios da justiça e da administração interna? Isto para nos atermos apenas a algumas das “funções do Estado” que eles reconhecem. Portanto, conversa sem sentido.
E até se poderia dizer que se o Estado interviesse na economia como empresário, nas diversas áreas em que deveria intervir, as hipóteses de corrupção nessas áreas seriam bem menores do que são naquelas em que não pode deixar de intervir.
O problema, como todos sabemos, não está no Estado, mas em quem o governa!
Depois, o que é isso de alterar a lei eleitoral "para aproximar os eleitos dos eleitores" por via do voto preferencial? Se ainda fosse por via de um sistema eleitoral factível, como a criação de círculos uninominais combinados com um círculo nacional proporcional, ainda a proposta teria algum sentido. De outro modo não tem, além de que nos partidos ninguem quer mexer no que existe, porque nenhum deles está na disposição de abdicar de qualquer parcela de poder por ínfima que seja, quanto mais de uma grande fatia! Conversa, também.
E o que é isso de dar liberdade de escolha aos cidadãos na saúde e na educação? Então essa liberdade de escolha não existe? Não há serviços privados de saúde e de ensino? Passos Coelho ainda agora chegou e já tão apto a tentar ludibriar os eleitores. Realmente, o que ele pretende é quem o está a ouvir fique convencido de que com ele a governar as pessoas vão poder escolher, por conta do Estado, entre a saúde assegurada pelo Estado e a saúde prestada pelos privados e o ensino assegurado pelo Estado e o prestado pelos privados.
É óbvio que isto é mentira. O que ele quer dizer, nas palavras enganosas e dolosas que emprega, é que pretende acabar com a gratuitidade e a universalidade na saúde e na educação. Só que para isso precisa de rever a Constituição. Daí a importância da revisão. Essa sim, a única proposta verdadeira do seu programa.
Dirão alguns: proposta irrealizável já que para rever a Constituição, mesmo que se trate de uma revisão ordinária, precisa de uma maioria de dois terços. E quem tem memória responde, perguntando: e das outras vezes que a Constituição foi revista não foi sempre necessária essa maioria ou até superior, nos casos em que a Constituição assim o impunha? E quem tem memória acrescenta: e alguma vez essa maioria pôde prescindir do voto favorável do Partido Socialista?
Daí que a revisão da Constituição para aquele fim seja a única proposta realmente importante de Passos Coelho, tanto mais que ele não desconhece que “num lado se põe o ramo e no outro se vende o vinho”…
3 comentários:
Outra medida que ele vem anunciando (e que JM Correia Pinto esqueceu de mencionar), mas que, na prática, é só mera demagogia, é a de pegar num grupo de juízes "impolutos", e pedir-lhes opinião sobre as pessoas que vão ocupar altos cargos na função pública, "só porque estão habituados a julgar".
Claro que isso não vai para a frente, sob pena do PSD perder a sua clientela partidária.
Mas, mesmo que fosse para a frente, não era garantia de nada, pois quem julga não quer dizer que seja bom a avaliar as capacidades de chefia e a competência das outras pessoas. Para isso, mais valia submeter os candidatos (que saem com boas avaliações dos concursos públicos) a uma junta de psicólogos professores das Faculdades de Psicologia, para estes os submeterem a baterias de testes psicotécnicos.
Pior ainda: não só juizes impolutos como também outros impolutos, os anteriores presidentes da República. Não lembra ao diabo. Lá iria Soares propor gente com a mesma seriedade com que lançou Fernando Nobre, ou "despropor" pessoas com o seu exacerbado espírito de rancor. Além do mais, esta é a proposta mais gerontocrática de que me recordo.
Dessa medida nem tinha conhecimento. Será que o Ângelo Correia já "bazou"?
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