quinta-feira, 17 de março de 2011

TEM PORTUGAL UM PLANO B?


VALE A PENA CONTINUAR NO ACTUAL CONTEXTO?

Mesma para quem raciocina, certinho, dentro do sistema, impõe-se a Portugal, cada vez com mais premência, a existência de um plano B, não apenas em concepção, mas já em execução paralela para o qual se pudesse transitar sem soluções de continuidade.
O que se vai passar nos próximos anos é hoje, infelizmente, antecipável no essencial, não só por aquilo que já se conhece de situações semelhantes, mas também pelo que se passou no nosso passado recente.
Os pressupostos de que se tem de partir são fáceis de enunciar:
Primeiro, desde que o Governo de Cavaco Silva decidiu integrar o Sistema Monetário Europeu até hoje, Portugal, com excepção de dois ou três anos do Governo Guterres (em que entrou no país dinheiro a rodos) ou não cresceu ou cresceu muito pouco, sempre abaixo da média europeia.
Segundo, durante o mesmo período o país foi-se gradualmente endividando, tanto mais quanto menos crescia.
Terceiro, nesse período a economia portuguesa perdeu competitividade relativamente à média das economias europeias e, principalmente – e isto é o que mais interessa – em relação àquelas com as quais tem mais relações económicas.
A explicação para a situação descrita, não sendo certamente consensual, tem, contudo, factores presentes em todas as análises, que não podem deixar de ser ponderados.
Primeiro, a integração de Portugal num grande espaço económico comum tornou muito patente as debilidades e fragilidades da sua economia relativamente a economias muito mais desenvolvidas, situação consideravelmente agravada com a criação do “mercado interno” e a adesão à moeda única.
Segundo, as chamadas “ajudas comunitárias” mesmo que tivessem sido utilizadas com todo o rigor jamais compensariam aquelas debilidades.
Terceiro, tais ajudas, que contribuíram decisivamente para desencravar o país interna e externamente, acabaram por ser tão úteis a Portugal como aos demais países da comunidade em que nos inserimos.
Quarto, uma parte considerável da actividade económica portuguesa, um pouco mais de dois terços, impossibilitada de concorrer com as economias mais competitivas da dita comunidade, orientou-se para áreas onde a concorrência menos se fizesse sentir; e quanto mais estas áreas se desenvolviam, mais a dívida externa crescia.
Quinto, o quadro acima descrito foi consideravelmente agravado pela crise financeira que apenas tornou mais evidente uma situação que já existia, votada a uma espécie de “adormecimento táctico”, que a todo o momento nesta ou noutra situação poderia explodir.
Tendo Portugal perdido, com a adesão à Comunidade Económica Europeia e mais tarde à União Económica e Monetária duas das principais armas de que noutras circunstâncias poderia fazer uso – com produção de efeitos quase imediatos – para combater os crónicos desequilíbrios da sua economia - a desvalorização da moeda e a limitação de importações (seja por via fiscal ou outra) – apenas lhe restaria, na hora do aperto, a “desvalorização competitiva” dos salários.
E aqui é que bate o ponto. Esta via, em si sempre insuficiente e limitada na sua elasticidade, encerra uma armadilha que faz cair o país num circulo vicioso que leva a que quanto mais os salários baixam, mais a economia decresce e menos hipóteses tem Portugal de sair da crise. A espiral recessiva que resulta da tal desvalorização competitiva, nunca compensada pelo mítico aumento das exportações (que têm em si um limite objectivo de crescimento), leva, como se está a ver, a que a situação piore não já a cada ano que passa, mas a cada trimestre.
É a procura interna que cai, é o investimento que se contrai, são os juros que sobem, é a dívida que aumente, tudo num ciclo infernal, cada vez de efeitos mais demolidores, que faz com que a adesão ao euro e à Europa tenham necessariamente de ser repensados de alto a baixo.
Por outro lado, o equilíbrio das contas públicas, feito exclusivamente à custa de medidas de efeito restritivo imediato sobre o conjunto da economia, apenas agrava e torna praticamente impossível uma saída económica e politicamente sustentável.
Qualquer saída, e só eufemísticamente se pode falar em “saída”, atento o resultado das medidas adoptadas, vai colocar o país em geral, a grande maioria, num patamar muitos níveis abaixo daquele a que a generalidade das pessoas já se tinha habituado a viver.
Tal situação, em si grave e politicamente muito difícil de sustentar, tem ainda um outro irremediável inconveniente: é a de que ele não permite acalentar qualquer expectativa de melhoramento futuro.
E é por todas estas razões, que são políticas e económicas, que Portugal deve repensar a sua presença na União Europeia e no euro.
Repensar politicamente, à luz da sua história quase milenar. Uma história que não pode apenas ser avaliada pelo que se passou no salazarismo e que tanto traumatizou as gerações que fizeram o 25 de Abril e que depois governaram Portugal nas décadas subsequentes.

5 comentários:

jvcosta disse...

Meu caro, como tenho escrito no moleskine, não posso estar mais de acordo contigo, no essencial, mas parece-me que a saída da eurolândia ainda tem um cenário prévio a ser considerado, embora admita que muito difícil no quadro dos diktats comunitários. a reestruturação da dívida ainda no quadro do euro. mas não sei, porque, como também tenho escrito, isto pode ser "wishful thinking" de leigo em economia.

Pequeno pormenor: na lista muita extensiva de fatores que apontas, parece-me faltar um, importante: a taxa exagerada, revalorizadora, com que o escudo foi convertido em euro.

Anónimo disse...

João
Isso já é uma consequência da prévia adesão ao SME.
CP

Anónimo disse...

Ainda é preciso uma grande quebra para regressar aos níveis de vida anteriores à adesão! Politicamente a questão será outra porque boa parte das pessoas não conheceu esse país, e outros têm, sinceramente ou não, dificuldade em olhar para trás. Quem tenha mais de 45 anos poderá fazer o tal esforçozinho e lembrar-se do que era a habitação da maioria (Lx tinha 40% dos lares sem instalações sanitárias mínimas), este v/concidadão esteve num prédio novo de 8 pisos sem instalação de água, sim isto é verdade!!. Também se lembrarão da rede viária, a festa que foi a inauguração do troço de AE de VF de Xira até ao Carregado!!! Os hospitais,... conheceram o de Arroios e os outros, pelo país fora havia os das S.C.M., alguém se lembra de como eram? Quanto à Seg Social também nos lembramos de que pura e simplesmente não existia para a esmagadora maioria da população. Os velhos (e novos) que agora têm dificuldade em comprar os medicamentos na altura, pura e simplesmente, não iam ao médico, era assim...Tratar dentes ...oh! oh! Lembram-se de que os portugueses (não rurais) não tinham "pequeno almoço", tomavam "o café", lembram-se o que era? Para a maioria, claro!
Portanto, atentos os degraus subidos, o tombo pode ser muito, muito grande! Já se terá pensado que pode haver uma "pequenina" fuga de capitais se se começar a acreditar na eventualidade da saída. Os fluxos provenientes da Suíça, Alemanha etc etc estancarão por muito tempo. Porque 9oo anos é muito mais que os 48 de salazarismo mas o Mundo não é o mesmo, portanto sem fundos, sem remessas (novamente muito importantes)... seria o bom e o bonito. Com uma produção de cereais que cobre 10-12% do consumo....
Resumindo, talvez não seja má ideia pensar que a dívida é para pagar até porque, parte dela,(que não foi para os gangs do BPN e outros) está aí nas casas, estradas escolas e hospitais que usamos, e de futuro escolhamos melhor quem nos governe, se não, voltamos ao café e papo-seco com margarina.A história da bruxaMerkel não pega no chamado senso comum que ainda resta. NG

Anónimo disse...

Tudo isso e muito bonito....mas o nivel de vida de que todos falam foi construido atraves do aumento da divida. Nao da produtividade. Divida do estado e divida dos privados... Agora estamos todos encalacrados para muitas geracoes e sem fim a vista. Governados por incompetentes, mentirosos e predadores dos dinheiros publicos; mal que continua a persistir: cortam nas pensoes miseraveis, mas nao cortam nas acumulacoes de pensoes que so sao legais porque foram decididas por quem delas beneficia.

JMCPinto disse...

O que está em causa é o futuro. O passado, para o bem e para o mal, já ninguém o pode alterar.
De facto, a adesão à UE trouxe vantagens, mas também é verdade que o acréscimo do nível de vida foi muito conseguido à custa da dívida.
Todos beneficiaram disso, empresas e particulares, uns muito mais do que outros. Para pagar, é que já nem todos colaboram, como se está a ver.
O nosso problema nem sequer é tanto a dívida, mas a dimensão, a pequena dimensão, da nossa economia.
Se tivesse uma dimensão semelhante à da Argentina ou à do México, para citar dois exemplos clássicos, quem tinha de se preocupar com o assunto eram os credores.
Aliás, são considerações semelhantes que não permitem "esticar a corda" à Espanha para além de certos limites. Essa é que a razão do tratamento diferenciado da Espanha e não certas patetices que se lêem em artigos de opinião do Público.
Com a dimensão que nós temos, mesmo as rupturas, têm de ser feitas com cautela.