O ENIGMA PERSISTE: QUEM AUTORIZOU O ATAQUE À OSSÉTIA?
A viagem de Condoleezza Rice a Tblissi vai seguramente contribuir para esclarecer o enigma. Washington, tal como as repúblicas bálticas, a Polónia e a Ucrânia, não concorda com o plano de cinco pontos negociado por Sarkozy. Condoleezza Rice vai à Geórgia dizer isso mesmo, se é que não o disse já a Sarkozy. Mas como rever um texto que ambas as partes acordaram e no qual se baseia o cessar-fogo? Apenas há uma forma de o fazer: levando a Rússia a violar ostensivamente o cessar-fogo. E isso poderá conseguir-se com algumas provocações da Geórgia, se não mesmo dos Estados Unidos.
Se tal acontecer – e em breve o saberemos – fica praticamente desvendado o enigma que, na maior parte dos media ocidentais, tem sido dado como resolvido praticamente desde a primeira hora. Ou seja, têm-se aceitado como boas as informações veiculadas pela Casa Branca que pretendem fazer crer que Saakashvili actuou à revelia de Washington ou até contra as suas instruções. Curiosamente, informações semelhantes já começaram a circular a propósito de um hipotético ataque de Israel ao Irão.
Esta tese, que é possível, é porém pouco provável e faz pouco ou nenhum sentido. Será Saakashvili tão irresponsável a ponto de se lançar num ataque suicidário convencido de que a sua aliança com os Estados Unidos inibiria a Rússia de actuar? Em abono desta tese poderá dizer-se que Saddam Hussein também ocupou o Kwaite convencido de que beneficiaria da neutralidade americana (ponto de vista de Pierre Sallinger).
Mais provável é que Saakashvili se tenha aconselhado previamente com gente da administração Bush, próxima da Casa Branca. Como o passado recente revela à saciedade, aventureiros é o que não falta na entourage de Bush. Aventureiros ou, pior do que isso, gente capaz de cometer qualquer infracção por mais grave que seja.
Se Saakashvili actuou por sua conta e risco, cometeu um erro fatal, e, tal como Saddam, mais cedo que tarde está condenado a desaparecer da cena. Se, pelo contrário, contou com a prévia compreensão de gente da Administração americana – e as palavras de Dick Cheney sobre a actuação da Rússia não deixam de ser muito elucidativas – então a crise está para durar e assistiremos a novos (e perigosos) desenvolvimentos nos tempos mais próximos.
Perante este cenário, seria do interesse dos europeus que a UE tivesse a coragem suficiente para marcar as suas diferenças relativamente a Washington. Não é, porém, nada crível que tal venha a acontecer. Aquilo que os MNE dos países que mantêm uma falsa ambiguidade não tiveram coragem de dizer na reunião da UE, irão dizê-lo os ministros da defesa desses mesmos países na reunião da NATO da próxima terça-feira.
Faltam cinco escassos meses para terminar a Administração Bush ou apenas três, se se tiver em conta a eleição do próximo presidente. Aparentemente, pouco se poderá fazer, além do que já se fez nos últimos oito anos. Todavia, a aposta na tomada do poder pelos neo-conservadores foi tão forte, penetrou tão profundamente o Partido Republicano e o seu fanatismo está tão profundamente enraizado em amplas camadas da classe política americana que não é de rejeitar a hipótese de tudo continuar a ser feito até ao último minuto para condicionar a acção do próximo presidente e, directa ou indirectamente, manter o poder, continuando a empurrar a América para o confronto e aventureirismo político.
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