O QUE FAZ FALTA...
Verdadeiramente, Portugal só teve, desde o 25 de Abril, um Procurador Geral da República. Todos os demais são um triste exemplo do que é o exercício de um cargo por pessoas que não estão minimamente habilitadas para o desempenhar, por mais respeitáveis que sejam os seus méritos para o desempenho de outras funções.
O Procurador Geral da República deverá, em princípio, ser alguém licenciado em direito, mas por aí se deveria ficar a sua ligação com o Direito. Tem de ser alguém politicamente capaz. Alguém que saiba assumir e impor a autonomia que a função exige, norteando o seu comportamento por critérios aceitáveis e compreensíveis pela opinião pública esclarecida. Para desempenhar o cargo com competência não são necessárias novas leis nem alterações na estrutura da magistratura que dirige. O que é preciso é ser inteligente, é saber dar vida às leis que regem a função e acima de tudo ter uma ideia muito clara do modo como ela deve ser desempenhada.
Numa estrutura hierárquica, o comportamento de quem está “por baixo” depende muito mais da capacidade de direcção de quem está “por cima” do que de eventuais poderes fácticos existentes no seio dessa estrutura.
Se a justiça já estava pelas ruas da amargura por todas as razões que se conhecem e, principalmente, pelo enraizado sentimento popular de que as leis apenas têm de ser respeitadas pelos mais fracos, mais desacreditada fica quando o vértice da pirâmide do Ministério Público vem publicamente confessar a sua impotência e a sua incapacidade para se fazer respeitar por toda a estrutura que hierarquicamente dele depende.
Depois desta constatação, ao PGR, para ser coerente as declarações proferidas, só lhe resta apresentar a demissão. E o Governo se realmente estivesse interessado na autonomia e no prestígio da instituição – atributos que certamente não valoriza, nem este nem qualquer outro – deveria propor, na ausência daquele pedido de demissão, a sua substituição.
Infelizmente, tudo vai continuar na mesma, porque esta é a situação que mais convém a todos os poderes do establishment. Só uma forte reacção vinda de outros quadrantes, dos que só têm a ganhar com uma justiça isenta, poderá contribuir para uma alteração da actual situação, muito degradada pelos sucessivos eventos que ao longo do tempo a têm corrompido.
4 comentários:
Não sei se vai tudo ficar na mesma. Já ouvi reacções do PSD e do PCP a pedirem a cabeça do PGR, avançando com os mesmos argumentos que aqui avançou.
Eis o link da notícia com as reacções políticas:
http://tv2.rtp.pt/noticias/?t=Queixas-do-PGR-geram-criticas-a-esquerda-e-a-direita.rtp&article=365086&visual=3&layout=10&tm=8
Ondas de choque destas declarações:
1º) PGR garante que não tem poderes para interferir no caso Freeport - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=8&t=PGR-garante-que-nao-tem-poderes-para-interferir-no-caso-Freeport.rtp&article=364999
2º) "PGR tinha consciência dos poderes que possui quando tomou posse"- Paula Teixeira da Cruz - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=8&t=PGR-tinha-consciencia-dos-poderes-que-possui-quando-tomou-posse--Paula-Teixeira-da-Cruz.rtp&article=365032
3º) Constitucionalista dá razão ao procurador-geral da República - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=8&t=Constitucionalista-da-razao-ao-procurador-geral-da-Republica.rtp&article=365033
4º) PCP disposto a contribuir para reforço da autonomia do MP - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=9&t=PCP-disposto-a-contribuir-para-reforco-da-autonomia-do-MP.rtp&article=365077
5º) PS disponível para rever constituição e estatuto do MP - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=9&t=PS-disponivel-para-rever-constituicao-e-estatuto-do-MP.rtp&article=365076
6º) Bloco de Esquerda exige que Pinto Monteiro dê "explicações ao país" - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=9&t=Bloco-de-Esquerda-exige-que-Pinto-Monteiro-de-explicacoes-ao-pais.rtp&article=365106
7º) PS admite "desequilíbrios" nos poderes do PGR - http://tv2.rtp.pt/noticias/index.php?headline=46&visual=9&tm=9&t=PS-admite-desequilibrios-nos-poderes-do-PGR.rtp&article=365102
2º) Já agora, a quem é que se estava a referir quando diz que só houve um PGR a valer? Como só houve 3, este é o que se está a ver, e o 1º era conhecido como "gaveteiro-mor" (todos os processos quentes eram remetidos para a gaveta), sobra o Dr. José Adriano Machado Souto de Moura. Acertei?
Desculpe, não me lembrei 2 1ºs senhores que ocuparam o cargo nos 10 1ºs anos a seguir ao 25 de Abril.
Será algum deles?
CP refere-se, obviamente, a Cunha Rodrigues.
Esqueceu-se, de facto, de outro: Arala Chaves.
VM
Permita-me discordar dessa eleição do melhor PGR após o 25 de Abril.
Cunha Rodrigues, nos principais processos mediáticos, limitou-se a mandá-los para a gaveta, não actuando de modo a tentar resolvê-los.
Estávamos numa época em que o dinheiro chegava a toda a gente, havia poucas reclamações, emprego para todos, logo o clima social era bem melhor do que hoje em dia, o que ajudou a uma certa boa imagem de Cunha Rodrigues como PGR.
No entanto, quando os problemas não são logo resolvidos, eles reaparecem mais tarde e com maior força.
Só que, quando eles reaparaceram, já não era ele que estava lá. Conscientemente, ou não, praticou uma política tipo "quem venha atrás que feche a porta".
Pessoalmente, dou muito mais mérito a Souto Moura, que tentou resolver as coisas sem as tentar adiar. Tendo sido obrigado a implementar essa maneira de actuar pelas circunstâncias, ou tendo feito isso por convicção, pagou por isso! Mas, se não fosse ele, seria outro, sairia sempre queimado.
Hoje em dia, com aquela maneira de actuar, penso que Cunha Rodrigues teria sido pior ainda que o actual PGR ... Será que teria havido sequer julgamento no caso Casa Pia?
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