QUEM PERDER SAI
É difícil falar da campanha e mais ainda acompanhá-la. Os assuntos que realmente interessam não são discutidos, num pacto tácito de silêncio entre os partidos da troika. Quando algum jornalista mais afoito ou mais desalinhado traz à discussão o memorandum assinado com o FMI/BCE/UE e tenta evidenciar as suas inevitáveis consequências, logo o político interpelado responde com ar definitivo: “Portugal não é a Grécia”. E se for necessário acrescenta: “E também não é a Irlanda”.
E assim fica resolvida a questão…Eliminados os assuntos principais, que o BE e o PCP tentam colocar na agenda, mas sem êxito ao nível do grande público, por força da ensurdecedora “barreira sonora” levantada pelos media a qualquer tentativa que vise distrair a atenção do público dos tais assuntos de lana caprina com que o PS e o PSD se entretêm, resta como tema principal de campanha o destino dos respectivos protagonistas, escrutinados que sejam os resultados eleitorais.
E é disso que neste momento se trata, mais do que os interesses, os grandes interesses, que sempre estão presentes neste tipo de eleições. De facto, os grandes interesses não se deram nada mal com o PS, nem sequer estão dispostos a arriscar exageradamente uma mudança com os graves e até custosos inconvenientes que ela teria. A substituição do pessoal de serviço por outro, certamente igualmente solícito, acarretaria custos, implicaria perda de tempo em habituação aos novos interlocutores e porventura até a substituição de algumas prioridades já estabelecidas com prejuízo para todos. Salvo um ou outro conhecido “caceteiro”, os grandes interesses estão bem como estão.
Depois há essa enorme cáfila de pequenos e médios interesses, a que o cosmopolitismo do PS tem dificuldade em atender e que se sentem muito mais à vontade com o ruralismo e o suburbanismo do PSD, interesses que certamente pesam na eleição, mas não são definitivos, tanto mais que já em eleições anteriores estavam com o PSD e nem por isso o quadro eleitoral se alterou.
Restam as clientelas partidárias que, essas sim, apesar de impossibilitadas de discutir o essencial, nem por isso deixam de conduzir uma luta de morte pela sua sobrevivência. Desde logo as do PS, que instaladas vai para quinze anos, já nem sequer saberiam como seria a vida afastada do poder. Muita coisa importante está em jogo para elas nessas eleições…
Do lado do PSD, apesar de afastadas do poder praticamente desde o cavaquismo, nem por isso a presente contenda deixa de representar uma luta de vida ou de morte. Depois de derrotas sucessivas dos anteriores quatro dirigentes máximos do partido, Passos Coelho assentou a sua estratégia na erosão causada pelo poder e pela crise a José Sócrates, esperando que o dito lhe caísse nas mãos como uma maçã madura. Só que as suas clientelas, ávidas de poder – de “aceder ao pote” – forçaram-no a desencadear uma crise numa altura em que as sondagens já pareciam desenhar uma tendência irreversível.
Afinal, por razões de vária ordem entre as quais intervêm a astúcia de Sócrates e a inabilidade e até a inexperiência dos principais arautos do partido, o que parecia simples, complicou-se e obrigou o PSD nesta parte final da campanha a ter de recorrer a todos os meios ao seu dispor para tentar segurar o que cada vez está mais periclitante. Desde a lisonja aos hipotéticos sucessores de Sócrates, inclusive com a cumplicidade destes, passando pelo aproveitamento das vinganças de Soares, até aos ataques mais soezes, tudo vale para não perder uma oportunidade que, se falhar, para muitos deles não se voltará a repetir nos anos mais próximos.
Sim, ninguém duvide que se Passos Coelho perder ou se não conseguir formar governo com maioria absoluta, mesmo perdendo, a sua carreira política acaba no dia das eleições. E, apesar da sua extrema volubilidade, o mesmo se passa com a maior parte das suas clientelas, já que o processo de tribalização em curso no PSD desde há vários anos não permite agora passar de grupo para grupo com a mesma facilidade com que isso se faz noutros partidos – há ódios e ressentimentos que somente a vitória atenuaria.
Do lado do CDS, capitaliza-se. Portas acha hoje que pode pelo menos dobrar no próximo governo a influência que teve no de Durão Barroso. E como o CDS não brinca em serviço, já pelo Caldas se antevêem pastas muito mais rendosas do que a da defesa e a do turismo, pastas com orçamento a sério, que permitam finalmente ao seu dirigente máximo e à sua gente ocupar-se de assuntos que vão muito para além de uns simples sobreiros ou de uma triste parelha de submarinos!
A esquerda vai ter de multiplicar as “acampadas” para, juntamente com o poder dos votos, estar presente em força no momento – que não será muito longínquo – em que se torne bem evidente a inviabilidade desta política…
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