QUEM SABE O QUE VAI
ACONTECER A ESPANHA?
Sobre as privatizações da TAP, da REN e da RTP há mais a
dizer para além de tudo o que já foi dito aqui e noutros lados em múltiplas ocasiões.
Tendo em conta a situação em que se encontra a zona euro, com três países
intervencionados, todos eles mergulhados em recessão, com dois à beira de não
poderem financiar-se no mercado pelo exorbitante preço dos empréstimos de que
necessitam para continuar a honrar os seus compromissos, com o euro muito
próximo do colapso, que sentido tem as nacionalizações que o Governo quer
fazer? O que se pretende com elas? Obter dinheiro, dirá Gaspar, para abater à
dívida. Pura ilusão: se o euro terminar, hipótese mais provável, ou se, na
hipótese menos provável, a Grécia, Portugal, a Espanha e a Itália tiverem de
abandonar o euro e este continuar, aquelas privatizações vão ficar muito caras
ao povo português e a Portugal, pois numa altura em que se fará necessariamente
a renacionalização das políticas económicas e financeiras a perda daqueles sectores
estratégicos para mãos estrangeiras, importantíssimos para a economia nacional,
deixará o país numa situação gravíssima.
Com o colapso do euro ou com o abandono do euro por um grupo
de países, a União Europeia não mais existirá como hoje a conhecemos. O mais
provável é que ela se desfaça, mas mesmo que isso não acontecesse cada país
passaria a tratar da sua própria vida de acordo com as necessidades impostas
pela situação de emergência em que se encontraria. Se aqueles sectores
estratégicos estiverem privatizados nem sequer se pode pôr de parte a hipóteses
de eles virem a ser novamente nacionalizados, porventura em clima de
hostilidade, com todas as consequências que daí adviriam.
Se outras razões não houvesse, e há muitas, a mais elementar
prudência levaria a que o Governo suspendesse de imediato estes processos,
qualquer que fosse a justificação apresentada, até poder ver com mais nitidez
como vão evoluir as coisas na Europa. Actuando como parece que está disposto a
actuar, o Governo não está apenas a ser imprudente, está a cometer um crime de
lesa-pátria pelo qual não pode deixar de ser responsabilizado.
Mas não é só o governo que está a actuar contra o interesse
nacional. Não é apenas Passos Coelho, Gaspar e Portas que terão de ser
responsabilizados pelo que estão a fazer. Há mais: pela calada, ou seja sem
qualquer discussão prévia, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa facilitou
ou até se pode mesmo dizer possibilitou a privatização da ANA, uma empresa
altamente lucrativa que o Estado Português está em vias de perder.
Havia uma disputa de décadas sobre a propriedade dos terrenos
em que está situado o aeroporto de Lisboa. A propriedade era simultaneamente
reclamada pelo Estado e pela Câmara. Havia mesmo ao que parece um processo
judicial instaurado há muitos anos que nenhum juiz “se atrevia” a resolver. A Câmara
aparentemente mantinha sobre o assunto uma posição firme, tanto mais firme
quanto mais perto esteve de se concretizar o projecto de construção do novo
aeroporto de Lisboa. Diversas vezes João Soares, enquanto presidente da Câmara
de Lisboa, falou publicamente do assunto, deixando claro que os terrenos eram
da Câmara, dos quais nunca abdicaria. O actual presidente da Câmara chegou
mesmo a dizer nas campanhas eleitorais que esses terrenos se destinariam à construção
de um grande parque, de uma enorme zona verde, caso o aeroporto viesse a sair
de Lisboa.
Tudo conversa, tudo mentira. O presidente da Câmara, António
Costa, acaba de vender ao Estado os tais terrenos ao que parece por baixo
preço. Mas isso não é necessariamente o mais importante. O mais importante é
ele ter resolvido em poucos dias uma disputa que durava há décadas para
facilitar a privatização.
Portanto, se amanhã ouvirem dizer a alguém do PS que é ou que
o partido é contra estas privatizações, por favor, não acreditem. Não se deixem
enganar. São iguais aos que lá estão. Porventura ainda pior. É que os que lá
estão só enganam quem se quer deixar enganar enquanto estes fazem da duplicidade
do discurso a sua verdadeira profissão.