segunda-feira, 21 de setembro de 2009

VER OU NÃO VER AS DIFERENÇAS

ALGUNS EXEMPLOS

Não gosto, nem tenho autoridade para estar a dar lições de história ou mesmo a tirar lições da história com a pretensão de ensinar os outros. Mas ninguém me pode impedir de as tirar para mim e de com elas argumentar sempre que o julgue conveniente e apropriado. Além de que há uma máxima que a experiência e também algum saber me ensinaram. Enquanto as ciências da natureza procuram investigar as semelhanças de modo a reduzir à regra geral de validade universal a aparente diversidade dos fenómenos estudados, as ciências sociais fazem exactamente o contrário: vivem da diferença, da sua aptidão para ver a diferença onde tudo parece igual.
Talvez por isso eu conviva mal com o excesso de analogia e com a tendência que alguns perfilham de ver igual o que é diferente.
Referindo apenas fenómenos da contemporaneidade e do presente: a situação vivida na Europa entre as duas guerras fez com que alguns considerassem igual o que realmente era muito diferente, independentemente de se estar ou não de acordo com a diferença que o sectarismo nega. E depois viu-se que consequências isso trouxe...
Pode admitir-se que por razões de mera táctica política, pontualmente, este ou aquele partido insista em identificar o que é diferente para desse modo melhor marcar a sua diferença e dela tentar tirar vantagens. Pode. Mas não se deve exagerar-se e até é duvidoso que isso seja sempre benéfico para o fim em vista. Depende do país e da cultura dos seus cidadãos.
Em primeiro lugar, gostaria de me referir ao caso “Barack Obama”. Não há qualquer espécie de dúvida de que para a imensa maioria das pessoas Obama é diferente dos seus antecessores, nomeadamente de Bush e há até quem, por isso, admita que Obama virá a fazer coisas que na realidade nunca fará. Mas há também quem negue a “especificidade Obama” e tudo reconduza à mesma medida: Obama é um agente do imperialismo americano como qualquer outro, disfarçado por uma falsa retórica de esquerda. Sob certos aspectos até seria mais perigoso, por suscitar menos defesas e poucas cautelas.
É claro que Obama tem os seus limites, sob pena de gerar uma situação incontrolável na América. Uma situação cujo resultado ele não domina e pela verificação da qual não está disposto a correr riscos.
Daí a negar-se a diferença e a relevância dessa diferença vai uma distância que não pode com credibilidade ser transposta. Quem até hoje na América, principalmente depois da Guerra dos Seis Dias, divergiu tão ostensivamente de Israel e condicionou tão fortemente a acção do Estado judaico, não obstante o poderosíssimo lobby judeu? Ninguém. E quem teve a coragem de “mandar às urtigas” o escudo anti-missil com que a administração Bush queria cercar a Rússia?
Ninguém pode negar que tanto num caso como noutro, independentemente dos princípios éticos ou ideológicos que possam justificar aquela conduta política, há interesses americanos que os justificam. Provavelmente sim. O que seguramente está em causa é uma outra forma de avaliar os interesses americanos completamente diferente da dos seus antecessores, agora muito mais próxima da perfilhada pela generalidade das pessoas e não a imposta pela defesa dos grandes interesses. E os exemplos, a propósito de Obama, poderiam multiplicar-se.
E depois temos o caso português, muito agudizado pela campanha eleitoral em curso. Certamente que o governo Sócrates deixou muita gente arrependida pelo voto que há quatro anos e meio lhe deu. A esquerda sente-se, e a justo título, traída em domínios importantes da governação, principalmente em áreas onde “fazer assim ou fazer assado” marca a diferença entre ser de esquerda ou de direita. Como aconteceu com o código do trabalho e tudo o que ele representa, com o ataque aos pensionistas, com o ónus recaído sobre os rendimentos mais baixos na busca do equilíbrio das contas públicas, com a vergonha das privatizações que transferiram para o capital privado rendimentos que deveriam estar ao serviço do interesse público, com o compadrio com o grande capital, com a ambiguidade de certas medidas que pareciam destinadas a preparar o caminho para o ataque ao que resta do Estado Social, e ainda com algumas reformas que mais pareciam dirigidas contra os utentes e agentes dos serviços do que propriamente destinadas a melhorar a situação existente. E o mais que se poderiam indicar, já que o rol é grande.
Mas daí a não ver as diferenças entre o PS e o PSD ou o CDS também vai a tal distância que não pode ser transposta sem demagogia. Nem tudo é igual e nem todas as diferenças são retóricas. Encostar o PS à direita para efeitos puramente eleitorais, ainda se compreende, embora se não justifique sempre. Mas encostar o PS à direita na governação, nomeadamente se governar, como parece que vai ser, em maioria relativa, pode constituir um grave erro. Certamente que nem tudo o que se pretende será conseguido, mas de outro modo corre-se o risco de nada se conseguir e, pouco, ou quase nada, se ficar a ganhar.

2 comentários:

Anónimo disse...

Tens razão em tudo, excepto numa coisa: pores no mesmo saco Obama e Sócrates. É um ofensa ao carácter de Obama.
Abraço

FJCoutinhoAlmeida disse...

Diferenças há ...
Isto impõe, no meu modo de ver, que se vote nos partidos à esquerda do PS.
E, mesmo assim, com quem é que, no passado, o PS fez coligações? Sempre à direita ... e com MÁRIO SOARES.
E a política concreta que estes senhores, comandados por Sócrates, nas áreas sociais acabam de fazer, nunca a direita se tinha atrevido a ir tão longe.
De modo que já estou farto de voto útil no PS, do género "desta vez é que eles vão ter juízo". Esperem por Janeiro ...