sexta-feira, 29 de agosto de 2008

PUTIN ACUSA EUA DE ORQUESTRAREM CONFLITO NA GEÓRGIA


OBJECTIVO? BENEFICIAR UM CANDIDATO PRESIDENCIAL

Em entrevista à CNN, o Primeiro-ministro russo acusou hoje os Estados Unidos de orquestrarem o conflito na Geórgia para beneficiarem um candidato presidencial.
Evidentemente que só por ingenuidade se pode pensar que Saakashvili actuou por conta própria. Como este cenário é completamente inverosímil, alguns (ou algumas) dizem que ele “caiu que nem um patinho” nas provocações da Ossétia do Sul, outros, mais elaborados, são de opinião que ele conhecia perfeitamente os riscos, mas quis com o seu gesto forçar a entrada na NATO, outros…
Insisto: nada disto faz sentido. Depois do que se passou nos tempos mais próximos (independência do Kosovo; declarações de Putin na CEI sobre o reconhecimento do Kosovo; a intervenção de Putin na Conferência da NATO em Budapeste, etc.) sabia-se de antemão qual seria a reacção da Rússia à intervenção na Ossétia. Faz, portanto, todo o sentido supor que Saakashvili actuou escudado em alguém da Administração Bush. E embora o objectivo imediato pudesse ter sido o favorecimento de um candidato, a razão de fundo vai muito para além desse facto. Aguardemos até Novembro para vermos o que ainda vai acontecer…

A CRISE NO CÁUCASO


AJUDA HUMANITÁRIA EM NAVIOS DE GUERRA?


A imprensa e a televisão portuguesas completamente submersas pela crise securitária nem sequer se dão conta do que acontece no mundo. A comunicação social defende-se dizendo que lida com factos e alija qualquer tipo de responsabilidade pelo clima criado. É verdade que a comunicação social lida com factos, pelo menos uma parte dela, embora acima de tudo lide com a escolha dos factos….
Vem isto a propósito de a anunciada ajuda humanitária dos Estados Unidos à Geórgia estar a ser prestada em navios de guerra. Ou seja, nas zonas do mundo onde se justificaria a prestação de ajuda humanitária por meios militares, isso nunca ocorre, acabando parte dela por ir parar a mãos erradas. Na Geórgia, onde não existe qualquer conflito interno entre refugiados ou deslocados, a América usa meio radicais.
Com navios de guerra americanos no Mar Negro e com Dick Cheney por perto tudo pode acontecer. Por isso, insisto em dizer que esta é uma das mais graves crises que o mundo vive desde a segunda guerra mundial.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

AGUDIZA-SE O CONFLITO NO CÁUCASO

A RÚSSIA RETALIA KOSOVO E RECONHECE A OSSÉTIA DO SUL E A ABEKÁZIA

Já por diversas ocasiões tive oportunidade de analisar a crise do Cáucaso, a expansão a leste da NATO e a política americana relativamente à Rússia, por via da sua política na Europa do leste, no Cáucaso e na Ásia central. Hoje, o Presidente da Rússia, depois da recomendação unânime do Parlamento, reconheceu a independência da Ossétia do Sul e da Abekázia.
Este episódio, que é mais um passo na escalada que os americanos aventureiramente provocaram, vai ter efeitos muito duradoiros na política internacional. Ele vai acelerar a corrida aos armamentos, vai agudizar o conflito de Israel com os seus vizinhos, nomeadamente com o Irão e vai condicionar negativamente o futuro da União Europeia nos tempos mais próximos.
Num sentido muito coincidente com os pontos de vista aqui defendidos, leia-se, no El País de hoje, o artigo de Norman Birnbaum, professor catedrático da Universidade de Georgetown. Sublinho, com particular agrado, o reconhecimento da continuidade (apenas insinuada) das políticas externas de Clinton e W. Bush, uma vez que essa tem sido também umas das constantes da minha análise. De facto, a escalada imperial da potência hegemónica para espaços nunca antes dominados começa com Clinton e desenvolve-se despudoradamente com W. Bush, agora ideologicamente apoiada numa irresistível e cruzadística procura do BEM … e do petróleo.

AS TELEVISÕES PORTUGUESAS E O QUE SE PASSA NO MUNDO

A OBSESSÃO SECURITÁRIA

As televisões portuguesas sem excepção abriram os seus telejornais das 8 horas da tarde com uns pequenos assaltos ocorridos em estações de serviço. Depois de muita conversa, lá se ficam a conhecer outras notícias de importância nacional: uma gravidez mal concluída em Viseu e o estado da menina timorense recém-operada. E por aí adiante. É este o nosso mundo. Um mundo pequenino.
Mais tarde, muito mais tarde, lá para o fim dos telejornais ou para lá do meio, consoante os casos, fica a saber-se, sem qualquer emoção, que a Rússia terá reconhecido a independência de umas províncias da Geórgia e que num estado do sudoeste americano terá havido uma convenção do Partido Democrático para nomear o seu candidato às próximas eleições presidenciais. Enfim, coisas pequenas que resvalam na couraça da indiferença das nossas televisões…

domingo, 24 de agosto de 2008

O CAMPEONATO AINDA NÃO COMEÇOU, MAS O SPORTING JÁ PRESSIONA OS ÁRBITROS


PAULO BENTO AO ATAQUE


O futebol português não tem emenda. O Sporting foi, juntamente com o Guimarães, a equipa mais favorecida da ultima liga. Beneficiou de mais grandes penalidades do que os concorrentes directos juntos. Foram-lhe perdoadas outras tantas. Beneficiou ainda de erros clamorosos ocorridos noutros campos. Pois não obstante tudo isto, já o treinador do Sporting nas primeiras declarações da época vem dizer que o Sporting nunca beneficiou de uma penalidade marcada por um juiz de linha, para assim contestar o penalty assinalado a favor do Porto na final da supertaça e exigir que, além dos penalties que os árbitros generosamente lhe têm marcado, outros sejam assinalados pelos liners.

ADITAMENTO

Por razões alheias à minha vontade não foi possível publicar este post na sexta-feira. Sai agora, apesar de o Sporting, segundo li na net, se poder queixar de um penalty mal assinalado por a falta ter sido cometida fora da área. Se assim é, “o capital de queixa” sportinguista vai ser devidamente empolado até que a compensação esteja assegurada em termos amplos…

CAVACO E A LEI DO DIVÓRCIO


A ARGUMENTAÇÃO ERRADA DE UM VETO RETRÓGADO

Supor que Cavaco poderia estar à altura de Afonso Costa era tão absurdo como admitir que eu pudesse bater o campeão jamaicano numa corrida de 100 metros. Agora, o que não se supunha era que a argumentação usada num veto político assentasse em pressupostos jurídicos ridículos e errados, destinados a esconder uma opção sociológica muito retrógrada.
O veto de Cavaco assenta numa opção legislativa, sendo certo que essa competência não é sua. Não sei se o entendimento dos poderes constitucionais que o veto pressupõe é constitucional, mas sei que o PS e os demais partidos que votaram a lei se pretendem cortar cerce qualquer entendimento dos poderes presidenciais contrários à Constituição têm que reafirmar a lei sem mais delongas.

A IMPARCIALIDADE DOS MEDIA OCIDENTAIS


A RÚSSIA NA GEÓRGIA E OS EUA NO IRAQUE: SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS

Depois de, em vão, ter tentado intervir no Iraque ao abrigo de um mandato do Conselho de Segurança, com base no argumento de que Saddam possuía armas de destruição massiva, os Estados Unidos, juntamente com o Reino Unido e mais alguns (poucos) incondicionais apoiantes, invadiu e ocupou o Iraque. Para justificar a agressão, a América fabricou uma série de mentiras, que o tempo se encarregou de trazer à superfície.
A invasão do Iraque, a subsequente ocupação e a agressão que tal acto consubstancia, constitui uma das mais graves violações ocorridas depois da segunda guerra mundial. Meio-mundo, literalmente meio-mundo, lavrou nas ruas dos cinco continentes o seu protesto. Saddam vivia à época num regime de soberania limitada em consequência das sanções que lhe foram impostas pela ONU, depois da tentativa de anexação do Kuwait. Não obstante aquele generalizado protesto, a acção de George Bush passou a gozar, se não com o apoio, pelo menos, da compreensão da imprensa ocidental. No fundo, Bush tinha como objectivo promover o Bem: livrar o Iraque de um ditador e implantar a democracia no país. Os resultados são os que se conhecem: Bush mergulhou o país no caos, fomentou o terrorismo, deu novo alento à Al Qaeda e transformou o Iraque num enorme atoleiro para os Estados Unidos, apesar das vantagens materiais que a ocupação trouxe a sectores empresariais próximos da Casa Branca, nomeadamente no plano energético.
Ninguém na imprensa pede hoje a retirada dos americanos; o candidato às presidenciais americanas que começou por a advogar foi considerado insensato, os jornalistas acham-na normal e a NATO, fiel ao carácter belicista da organização, nem lhe passa pela cabeça qualquer recriminação aos americanos.
Depois da desagregação da URSS e da retoma da soberania das repúblicas que a integravam, a Geórgia não conseguiu assegurar de facto a sua soberania sobre duas regiões que recusaram a integração no novel Estado. Houve guerra e acordos de paz, garantidos pelos russos. Desde então essas duas regiões – Ossétia do Sul e Abekázia -, que já manifestaram por mais de uma vez, em referendo, que querem ser independentes ou integrar-se na Federação Russa, têm vivido com autonomia absoluta face a Tblissi. A maior parte dos seus habitantes tem passaporte russo.
Na noite de sete de Agosto deste ano, o Presidente da Geórgia, aliado incondicional dos Estados Unidos (tinha 2 mil homens no Iraque), interveio militarmente na Ossétia do Sul, praticando violências sem conta contra a população civil.
A Rússia, face à violação dos acordos de 1992, interveio militarmente com toda a força. Derrotou o exército georgiano nas regiões autonomistas e ocupou parcialmente a Geórgia. Os apelos da imprensa ocidental para que a Rússia abandone a Geórgia são diários e cada vez mais contundentes. Ninguém nomeia as causas da intervenção russa e toda comunicação social de ampla difusão tende a mostrar a Rússia como potência ocupante.
Também quase ninguém contextualiza com rigor a situação. O cerco militar que a NATO, por iniciativa e impulso dos Estados Unidos, montou à Rússia é tido como normal e a sua ampliação a áreas de tradicional influência da Rússia é deixada sem comentários, embora toda essa mesma imprensa tivesse achado plenamente justificado que os Estados Unidos se tivessem proposto agir pela força para desmontar um cerco parcialmente semelhante, como o que aconteceu com a instalação das plataformas para o lançamento de mísseis em Cuba, nos idos de 1962!
Hoje é cada vez mais claro que as palavras de parceria e de boas relações que a América usou para com a Rússia, depois da desintegração da URSS e da derrota do socialismo real, não passam de uma profunda hipocrisia. Certamente que a América aceitava essa parceria com uma Rússia dependente, humilhada e derrotada, mas não com uma Rússia verdadeiramente independente. Basta recordar o que se passou nas duas últimas administrações americanas. Com Clinton, foi a intervenção na Jugoslávia à margem do direito internacional e a constituição de um protectorado sobre o Kosovo; com W. Bush, foi a denúncia do tratado sobre a limitação de mísseis; a não ratificação do tratado de proibição de ensaios nucleares e das alterações de SALT II com vista ao desarmamento atómico; o alargamento da NATO a leste e a instalação de radares e de escudo anti - mísseis junto às fronteiras da Rússia.
Na última reunião da NATO, terça-feira passada, os Estados Unidos, sempre apoiados pelos países Bálticos, pela Polónia e pelo Reino Unido, foram os que mais pugnaram por um endurecimento das relações com a Rússia. O jogo está assim cada vez mais claro: aos Estados Unidos interessa manter um clima de alta tensão internacional no quadro de um hipotético conflito de altíssima intensidade justificador das enormes despesas militares insaciavelmente reclamadas pelo complexo militar industrial representado elo Pentágono. Além deste objectivo, os EUA com esta posição (e ai coincidem com os ancestrais interesses britânicos) dividem a Europa e dificultam, ou inviabilizam mesmo a consolidação da democracia na Rússia, tornando muito mais fácil no plano ideológico a defesa das suas posições. O próximo presidente americano, seja ele quem for, herdará esta pesada herança…

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

NOVA LUZ SOBRE OS ACONTECIMENTOS DE 11 DE FEVEREIRO EM TIMOR-LESTE

AFINAL, QUEM ATIROU SOBRE RAMOS-HORTA?

Depois das revelações ontem feitas pelo The Australian, é hoje a vez de um outro jornal australiano The Age, pela pena do seu correspondente em Dili, Lindsay Murdoch, afirmar que há provas que contrariam a tese amplamente difundida de que Ramos-Horta teria sido atingido por um elemento do grupo do Major Reinado.
O mistério pouco a pouco começa a desvendar-se. Reinado e gente da sua confiança teriam sido atraídos à residência de Ramos-Horta, supostamente para conversações (de resto, não inéditas entre ambos), onde, segundo The Australian, foram executados. Entretanto, alguém, com uniforme diferente do dos homens de Reinado, disparou sobre o Presidente. Simultaneamente, ter-se-ia registado um atentado falhado contra Xanana Gusmão.
O homem a quem é imputado a autoria material dos disparos nega que os tenha feito e Ramos Horta não reconhece nele o seu atacante.
A Fretilin e algumas personalidades políticas de Timor-Leste pedem uma investigação independente. Xanana resiste e até ao presente ainda não a viabilizou.
A histérica emoção que se apoderou da maior parte da sociedade portuguesa a propósito da situação de Timor-leste, por razões que não interessa aqui analisar, e para a qual contribuíram, em partes iguais, tanto as autoridades públicas como os media em geral, não permitiu uma análise serena da situação e muito menos dos protagonistas timorenses. Esqueceram-se episódios passados, daqueles que marcam definitivamente o percurso político dos seus intervenientes, construíram-se heróis e embarcou-se num voluntarismo totalmente irracional, a ponto de o então Primeiro-Ministro português ter afirmado que com Timor se gastaria tudo o que fosse necessário, sem limites!
Mais lúcidos, sem emoção, os australianos compreendem Timor muito melhor do que os portugueses e paulatinamente vão contribuindo para a nossa compreensão de Timor-Leste. Enfim, mais vale tarde…

BARACK OBAMA DESCE NAS SONDAGENS, McCAIN SOBE E FICA À FRENTE

O PREÇO DAS “MUDANÇAS”

Há uma grande diferença entre o Obama das primárias e o que agora está a disputar com McCain a eleição de presidente dos Estados Unidos da América. Desde que a sua nomeação se tornou certa, o discurso alterou-se, e candidato jamais conseguiu descolar nas sondagens. Pelo contrário, foi-se cristalizando uma pequena diferença, muito próxima do empate técnico, e hoje a Reuters publica uma sondagem onde, pela primeira vez, McCain aparece à frente com cinco pontos de vantagem.
Os estrategas da campanha de Obama não se têm mostrado impressionáveis com as sondagens a nível nacional. Consideram que o importante é vencer em quatro ou cinco estados decisivos, que nas últimas eleições têm sido favoráveis aos republicanos. E é nesses que têm apostado tudo, convencidos de que nos tradicionais bastiões democráticos a tendência se manterá, não obstante as alterações do discurso muito viradas para aquele objectivo.
Em Novembro saberemos se os estrategas de Obama têm razão ou se, pelo contrário, este novo discurso, claramente mais à direita, não lhe será fatal. O esfusiante entusiasmo dos seus apoiantes, que marcou decisivamente o seu percurso nas primárias, assentava acima de tudo na mudança e na diferença relativamente a tudo o que tinham conhecido nas últimas décadas. Com a “mudança” de discurso, Obama corre o risco de perder o entusiasmo dos seus apoiantes e não ganhar o respeito dos seus adversários.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

A DESFAÇATEZ DA SRA RICE


COMO É POSSÍVEL QUE A AMÉRICA DE BUSH SE ARVORE EM GRANDE DEFENSORA DO DIREITO INTERNACIONAL?

De facto, não há palavras para comentar a desfaçatez da Sra Rice. Primeiro, como conselheira do Conselho Nacional de Segurança, com uma posição na hierarquia semelhante à de Kissinger, quando este exercia o mesmo cargo, depois, como Secretária de Estado, a Sra Condoleezza Rice participou como co-autora ou, na melhor das hipóteses, como cúmplice, em todas as barbaridades da Administração Bush. De facto, esta Administração espezinhou o direito internacional, fez da força o direito do mais forte, transformou o mundo numa selva, fez regredir a comunidade internacional ao estado de natureza, para usar uma linguagem hobbesiana, e vêm agora uma das suas mais destacadas personalidades, com aquele ar de virgem pudica, queixar-se da Rússia.
Esta gente da administração Bush, entre a qual se conta Dick Cheney como grande agente do mal – para usar a linguagem dele –, seria implacavelmente julgada por um tribunal penal internacional, se houvesse um tribunal verdadeiramente independente ou, mesmo com o que existe, se pertencesse a um pobre pais africano ou mesmo a um europeu, desde que derrotado.
Como pode a administração Bush falar na reputação perdida da Rússia, se ela própria, pelos actos que praticou e pelas posições que assumiu, é responsável pelas maiores violações do direito internacional, desde o nazismo? Do direito internacional não apenas como direito regulador das relações entre os Estados, mas também como protector dos direitos dos indivíduos!
À medida que o tempo passa cresce a convicção de que a América – as forças que dominam a América –, desde que assumiu o estatuto de super potência e, depois, a partir do momento em que se transformou em potência hegemónica, tem uma extrema dificuldade em viver em paz com os demais países, exactamente por não admitir manter relações paritárias com os Estados cujos interesses conflituam com os seus.
A América e todos aqueles que ela acirra contra a Rússia são os grandes responsáveis pela actual crise internacional, que é uma crise grave, porventura a mais grave que o mundo vive desde a segunda guerra mundial e que poderá ter consequências trágicas, já que de nenhum dos lados da barricada há um projecto de futuro baseado em ideias suficientemente elevadas para as impedir.
A América está perdendo gradualmente o estatuto de potência hegemónica, embora a sua actuação na cena internacional seja a de quem se não apercebeu completamente da nova situação existente no mundo ou de quem a não aceita. E isso poderá ser trágico. O atoleiro em que o Iraque se transformou, as grandes dificuldades no Afeganistão, que apontam mais para uma derrota do que para uma vitória, a impossibilidade de resolver a seu favor o conflito com o Irão e o clamoroso fracasso em que se tornou a independência do Kosovo, demonstram isso mesmo. E a questão que se põe é: vai a América aceitar a nova situação ou cometer uma loucura para forçar a sua reversibilidade?

OS ACONTECIMENTOS DE 11 DE FEVEREIRO EM TIMOR-LESTE

O MISTÉRIO PERSISTE

Bem pode o Procurador-geral da República de Timor-Leste desmentir as notícias australianas, que sugerem a execução do Major Reinado e do seu companheiro Exposto, que nem por isso a dúvida se desvanece ou a suspeita de que algo de muito estranho aconteceu naquela fatídica manhã.
Se o major Reinado, apesar da situação em que se encontrava, mantinha relativamente boas relações e contactos com Ramos-Horta por que razão teria ele decidido assassiná-lo?
Para quem, como eu, nunca entrou em histeria por Timor, nem justificou o apoio à intervenção da NATO na Jugoslávia como mal necessário para a libertação de Timor-Leste (de facto, entre as duas situações não existia qualquer semelhança), os acontecimentos de 11 de Fevereiro, como outros, uns mais antigos, outros mais recentes, ocorridos naquele país, sempre estiveram envoltos na opacidade e na completa falta de lógica. Os resultados da autópsia que o jornal de Sydney, The Australian, divulgou adensam ainda mais aquele mistério e as suspeitas que lhe andam ligadas, na medida em que indiciam a execução de Reinado e do seu companheiro.
É caso para dizer que até agora quem tem tido muita sorte é o actual Primeiro-ministro que escapou ileso a um atentado que, nas condições em que se diz ter sido executado, normalmente não falha.

sábado, 16 de agosto de 2008

DEVERIA A RÚSSIA TER TOMADO TBLISSI ANTES DA CHEGADA DE SARKOZY A MOSCOVO?

TERÁ COMETIDO A RÚSSIA UM GRAVE ERRO ESTRATÉGICO?

Estando a comunidade internacional no estado em que Bush a colocou com a ajuda objectiva dos fundamentalistas islâmicos, ou seja, sem respeito pelo direito internacional e sujeita à lei do mais forte, com uma arrogância que se não conhecia desde o tempo da ascensão do nazismo, é caso para perguntar se a Rússia não terá cometido um grave erro estratégico ao deixar Saakashvili no poder.
Com o presidente georgiano no poder as provocações vão seguramente continuar, sendo cada vez mais difícil e perigoso responder-lhes. De facto, não é crível que os americanos o deixem cair agora. E se a intenção do Washington é fomentar um clima de alta tensão internacional para alimentar o complexo militar industrial que o Pentágono representa, o mais natural é que o exército georgiano seja reorganizado pelos americanos, que estes assumam um papel cada vez mais relevante e visível na Geórgia e que o país dentro de pouco tempo acabe por pertencer à NATO. As eventuais objecções europeias acabarão por sucumbir, como é hábito, face às pressões americanas.
Por tudo isto, é legítima a questão de saber se a Rússia não deveria ter tomado Tblissi e instalado um governo “amigo” que pusesse por largo tempo cobro às aspirações americanas na região.
Creio que a Rússia quis agir tomando por paradigma a Sérvia e o Kosovo. Proteger da limpeza étnica georgiana as regiões autonomistas da Ossétia do Sul e da Abekázia, rechaçar o agressor dos direitos humanos para dentro das suas fronteiras e preparar a independência daquelas duas regiões.
Esqueceu-se, porventura, de que, com a máquina de propaganda e contra-informação que os americanos e o ocidente em geral têm ao seu dispor, os custos políticos da intervenção acabam por ser os mesmos. O que se ouve nas televisões e se lê nos jornais são as declarações grandiloquentes de Bush e da sua camarilha erigidos em grandes defensores da democracia, dos direitos humanos, da integridade territorial dos Estados e da sua soberania, como se estes últimos vinte anos, e particularmente os últimos oito, tivessem sido um modelo de virtudes que todos devemos seguir e respeitar.
O Ocidente, ao contrário da Rússia, tem meios ideológicos suficientes para fazer passar aqueles motivos como sendo os que realmente determinam a sua acção. Só quando a situação é particularmente escandalosa, como aconteceu no caso do Iraque, é que se poderá assistir a uma reacção da opinião pública, embora, mesmo neste caso, a situação tenda, com o tempo, a ser desvalorizada, primeiro, e esquecida, depois, com o argumento muito em voga em situações semelhantes: “O que está feito, está feito, e o que agora temos de fazer é agir em conjunto para evitar um mal maior”. E os que institucionalmente tiveram a ousadia de reagir mais fortemente são ostracizados pelo agressor, com a complacência dos demais, como aconteceu com Zapatero.
Por isso, é que faz todo o sentido perguntar se a Rússia não deveria ter tomado por paralelo o Iraque. Sem o dramatismo que antecedeu a invasão americana do Iraque e sem os problemas que se seguiram à invasão, os russos teriam desalojado do poder Saakashvili em poucos dias, instalariam um governo provisório baseado na forte oposição interna ao presidente e selariam a paz com um “pacto de não agressão e amizade” entre os dois países. A comunidade internacional e os americanos, em particular, não teriam outra alternativa, que não fosse a de protestar e aceitar. A Rússia ficaria sujeita à reprovação temporária de largos sectores da comunidade internacional, tal como os americanos nestes últimos anos, mas ganhava o respeito dos seus aliados e o temor dos seus inimigos. Assim, tendo ficado a meio caminho, vão ter de suportar todos os incomoda, sem verdadeiramente beneficiar dos comoda.
Quando, no tempo da guerra fria, se lutava por ideias, principalmente os mais fracos, uma acção como a dos americanos no Iraque – supondo que ela era possível – ou como seria a da Rússia na Geórgia estigmatizaria por lado tempo o bloco que a tivesse levado a cabo. Hoje, esse problema não se põe. Entre os oligarcas de Moscovo e os capitalistas que apoiam e beneficiam com a política agressiva de Washington não há diferenças assinaláveis. O que conta é saber se queremos um mundo unipolar ou multipolar.
Se este último, como tudo indica, for mais vantajoso para a humanidade no seu conjunto, pelos equilíbrios que cria e pelos constrangimentos que impõe a quem está habituado a usar a força para impor a sua vontade, deveremos apoiar as acções que vão nesse sentido e rechaçar as demais. Apoiar criticamente, pois é lamentável que se tenha de recorrer a processos pouco ortodoxos para o conseguir. Mas – e a questão é essa - que fazer quando uma potência que não aceita perder a sua hegemonia monta um cerco a uma antiga potência rival, disfarçando a sua profunda agressividade com palavras de boa vizinhança e cooperação, mas na realidade inclui numa aliança militar todos os países que antes estavam sob a influencia daquela e, além disso, instala em dois desses países um sistema militar anti-mísseis que potencia aquele cerco?

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

AINDA A GUERRA NO CÁUCASO


O ENIGMA PERSISTE: QUEM AUTORIZOU O ATAQUE À OSSÉTIA?

A viagem de Condoleezza Rice a Tblissi vai seguramente contribuir para esclarecer o enigma. Washington, tal como as repúblicas bálticas, a Polónia e a Ucrânia, não concorda com o plano de cinco pontos negociado por Sarkozy. Condoleezza Rice vai à Geórgia dizer isso mesmo, se é que não o disse já a Sarkozy. Mas como rever um texto que ambas as partes acordaram e no qual se baseia o cessar-fogo? Apenas há uma forma de o fazer: levando a Rússia a violar ostensivamente o cessar-fogo. E isso poderá conseguir-se com algumas provocações da Geórgia, se não mesmo dos Estados Unidos.
Se tal acontecer – e em breve o saberemos – fica praticamente desvendado o enigma que, na maior parte dos media ocidentais, tem sido dado como resolvido praticamente desde a primeira hora. Ou seja, têm-se aceitado como boas as informações veiculadas pela Casa Branca que pretendem fazer crer que Saakashvili actuou à revelia de Washington ou até contra as suas instruções. Curiosamente, informações semelhantes já começaram a circular a propósito de um hipotético ataque de Israel ao Irão.
Esta tese, que é possível, é porém pouco provável e faz pouco ou nenhum sentido. Será Saakashvili tão irresponsável a ponto de se lançar num ataque suicidário convencido de que a sua aliança com os Estados Unidos inibiria a Rússia de actuar? Em abono desta tese poderá dizer-se que Saddam Hussein também ocupou o Kwaite convencido de que beneficiaria da neutralidade americana (ponto de vista de Pierre Sallinger).
Mais provável é que Saakashvili se tenha aconselhado previamente com gente da administração Bush, próxima da Casa Branca. Como o passado recente revela à saciedade, aventureiros é o que não falta na entourage de Bush. Aventureiros ou, pior do que isso, gente capaz de cometer qualquer infracção por mais grave que seja.
Se Saakashvili actuou por sua conta e risco, cometeu um erro fatal, e, tal como Saddam, mais cedo que tarde está condenado a desaparecer da cena. Se, pelo contrário, contou com a prévia compreensão de gente da Administração americana – e as palavras de Dick Cheney sobre a actuação da Rússia não deixam de ser muito elucidativas – então a crise está para durar e assistiremos a novos (e perigosos) desenvolvimentos nos tempos mais próximos.
Perante este cenário, seria do interesse dos europeus que a UE tivesse a coragem suficiente para marcar as suas diferenças relativamente a Washington. Não é, porém, nada crível que tal venha a acontecer. Aquilo que os MNE dos países que mantêm uma falsa ambiguidade não tiveram coragem de dizer na reunião da UE, irão dizê-lo os ministros da defesa desses mesmos países na reunião da NATO da próxima terça-feira.
Faltam cinco escassos meses para terminar a Administração Bush ou apenas três, se se tiver em conta a eleição do próximo presidente. Aparentemente, pouco se poderá fazer, além do que já se fez nos últimos oito anos. Todavia, a aposta na tomada do poder pelos neo-conservadores foi tão forte, penetrou tão profundamente o Partido Republicano e o seu fanatismo está tão profundamente enraizado em amplas camadas da classe política americana que não é de rejeitar a hipótese de tudo continuar a ser feito até ao último minuto para condicionar a acção do próximo presidente e, directa ou indirectamente, manter o poder, continuando a empurrar a América para o confronto e aventureirismo político.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

PORTUGAL E O CONFLITO NO CÁUCASO


AS AMBIGUIDADES DE UMA POLÍTICA EXTERNA


Para o conflito da Geórgia é absolutamente irrelevante a posição de Portugal, mas poderá não ser indiferente para a defesa dos interesses nacionais a posição da diplomacia portuguesa.
Com Sócrates de férias, embora certamente contactável, cabe a Amado gizar a posição portuguesa relativamente àquele conflito. Depois do que se ouviu sobre o Kosovo, era de admitir que o MNE tivesse relativamente à Ossétia do Sul e à Abekázia uma posição semelhante. Ou seja, considerar que a intervenção de Saakashvili contra aquele território autónomo, etnicamente diferenciado e com a esmagadora maioria da sua população (mais de 90%) a desejar a sua integração na Federação Russa, representava uma agressão inadmissível dos direitos humanos, se não mesmo um genocídio, do povo ossetiano e legitimava a intervenção de uma força de paz internacional para conter as manifestações belicistas da Geórgia, com vista á preparação de um referendo, internacionalmente observado, para em definitivo se definir o destino daquelas regiões autónomas.
Mas não, não ouvimos nada disso. O que ouvimos foi uma declaração relativamente ambígua que, se em alguns passos não prima pela ambiguidade, é exactamente por deixar uma censura à intervenção russa. Depois da aposta, muitas vezes defendida pelo Primeiro-ministro, numa diplomacia virada para os grandes países emergentes, como potenciais mercados das empresas portuguesas, além de grandes fornecedores de energia, supúnhamos que iríamos ver o MNE defender uma posição mais consentânea com aqueles interesses e mais coerente com as posições anteriores sobre situações semelhantes. Mas não foi isso o que aconteceu: nem defesa dos tais interesses económicos, nem coerência com posições assumidas anteriormente.
A coerência que parece existir é de outra natureza: defender uma tese que não conflitue com a posição de Bush e que dela se aproxime tanto quanto possível. Se Amado estivesse mais atento e mais empenhado na defesa de uma linha política própria, posto que harmonizável com as iniciativas em curso da UE, teria reparado que até Obama disse que a Geórgia se deveria abster de usar a força na Ossétia do Sul e na Abekázia.
Enfim, nuances que a diplomacia portuguesa dispensa…

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

A UNIÃO EUROPEIA E A GEÓRGIA

A IMPOSSIBILIDADE DE UMA POLÍTICA EXTERNA COMUM

Sarkozy, presidente de turno da UE, foi, em nome da União, a Moscovo e a Tblissi com um plano de paz para fazer cessar as hostilidades no Cáucaso. Segundo as agências noticiosas, o plano teria sido aceite pelas duas partes, embora declarações posteriores atribuídas ao Presidente da Geórgia façam crer que o último ponto do plano não teria sido aceite por este. Se tal acontecer, as hostilidades vão seguramente continuar.
O quinto ponto é o que prevê o início de discussões internacionais sobre o estatuto e as modalidades de segurança nas regiões da Ossétia e da Abekázia, ou seja, por outras palavras, manter indefinidamente o status quo saído da guerra.
A proposta da UE, da iniciativa Sarkozy, aparentemente representa a convergência possível entre as posições dos 27 sobre o conflito. Mas só aparentemente, pois é sabido que tanto a NATO – a estrutura militar da NATO – como os EUA estão longe de se ver representados em tal proposta. Por isso é que os representantes da “nova Europa”, Polónia, Ucrânia, Letónia, Estónia e Lituânia, se apressaram a ir a Tblissi manifestar a sua solidariedade ao aliado incondicional dos Estados Unidos.
Esta viagem, diga-se dela diplomaticamente o que se disser, é a constatação óbvia de que, para lá das ambiguidades que já existiam na Europa a 15, existem agora, na política externa europeia, duas linhas políticas claramente definidas: a representada pela França e pela Alemanha (apesar das aproximações democratas-cristãs às teses de Washington), e também pela Espanha quando é governada pelos socialistas, a que se associam ambiguamente a Itália (quando governada pela direita), Portugal e alguns outros, e a representada pelos que assumem sem reservas a posição americana (países bálticos, Polónia, República Checa, Eslováquia e ainda e sempre, mas com as devidas distâncias, o Reino Unido).
Esta divisão, que não é tão radical como por vezes se pretende, tem porém o condão de irritar as grandes potências fundadoras por não lhes permitir apresentar com alguma credibilidade e força uma linha política com nuances e especificidades relativamente à americana. Mais tarde ou mais cedo esta questão vai ser resolvida, já que não é crível que a França ou a Alemanha, quando se dispõem a desempenhar o papel de mediadores num conflito europeu, possam admitir que um grupo de países da União manifeste a uma das partes a sua inequívoca solidariedade, mediante a presença na capital desse país de cinco chefes de estado e de governo. Enfim, a questão já estaria resolvida se a Grã-Bretanha estivesse mais próxima das teses continentais.
Sem menosprezar as diferenças apontadas, a verdade é que, mesmo sem elas, ainda estaríamos muito longe de uma política europeia mais próxima da actual correlação de forças a nível mundial. Depois da queda do muro e da desagregação da URSS, a União Europeia, tão inebriada quanto Washington pela vitória, reforçou o seu “complexo” eurocêntrico, paradoxalmente numa época que marcava como nenhuma outra o seu declínio. Convencida por força do triunfalismo americano da época de Clinton que estavam relançadas as condições para a criação de um mundo unipolar, sob a égide dos Estados Unidos, a Europa teve e tem alguma dificuldade em se aperceber do mundo que entretanto ia surgindo e que aos poucos se consolidava. Por um lado, a força de poderosos países emergentes, com ou sem armas nucleares, e por outro a dificuldade de impor pela força as chamadas “posições ocidentais”a regiões ou a países que antes as aceitavam sem dificuldade, desde que situados na sua área de influência.
Muitos exemplos, nestes últimos trinta anos, poderiam ser dados. Porém, o que se passa nas relações com a Rússia é paradigmático: derrotada a União Soviética, a Rússia não deixou desde então de ser humilhada pelos Estados Unidos, sempre com a cumplicidade da Europa, salvo algumas distâncias marcadas por Chirac e Scheröder. Primeiro, foi a vergonhosa intervenção do FMI na economia russa, sob Yeltsin; depois, a intervenção na Jugoslávia à margem do direito internacional e o posterior reconhecimento do Kosovo; a seguir, o alargamento da Aliança Atlântica até às suas fronteiras, quando já nada justificava (nem justifica) a sua existência; e ainda a colocação de um escudo antimísseis na República Checa e na Polónia; finalmente, como se tudo isto não bastasse, a “eleição” de vários presidentes da república ou primeiros-ministros americanos ou de longa vivência na América como governantes de países que antes pertenceram à URSS, de que é exemplo mais chocante o actual presidente da Geórgia.
Teria a Europa interesse nesta política? Em que é que a Europa poderia lucrar com a criação de um inimigo poderoso a algumas centenas ou a poucos milhares de quilómetros das suas capitais e do qual em grande medida depende energeticamente? Não se vislumbra deste lado de cá da Europa qualquer interesse que possa justificar tal política. Não assim do lado americano. Acabada a guerra-fria, o complexo militar industrial representado pelo Pentágono, apesar dos múltiplos conflitos militares de intensidade diversa em que desde então se envolveu, tinha e tem absoluta necessidade de manter um estado de tensão que justifique os fabulosos investimentos em armamento que somente uma “ameaça” de outra envergadura poderia justificar. E hoje, tal como ontem, somente a Rússia estava em condições de desempenhar esse papel. Daí as persistentes e humilhantes provocações de Washington, nas quais a Europa se deixou pouco a pouco enredar. A guerra da Geórgia seria uma boa ocasião para marcar distâncias, mas, como já se viu, a Europa parece não estar em condições de o poder fazer.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

POR QUE VIOLOU A GEÓRGIA OS ACORDOS DE 1992?


A RESPOSTA À INDEPENDÊNCIA DO KOSOVO

A única dúvida que legitimamente se pode colocar é saber se Saakashvili é estúpido ou se é um provocador nato.
Por obra e graça de Estaline, a Ossétia do Sul faz parte da Geórgia, apesar de étnica e geograficamente nada a distinguir da Ossétia do Norte, que integra a Federação Russa. Depois das graves desavenças havidas com Lenine sobre a forma de se relacionar com os comunistas georgianos, Estaline, com Lenine já no fim da vida, deve ter achado que a questão territorial da Geórgia não era suficientemente importante para justificar uma análise aprofundada da questão ossetiana. No fundo, que diferença fazia que a Ossétia a Norte integrasse a Federação Russa e a Sul a Geórgia, se tanto o norte como o sul, a Rússia e a Geórgia iriam ficar sujeitos ao mesmo comando político?
E, de facto, nada de muito relevante aconteceu na área durante a existência da URSS. Com a desagregação desta em 1991, logo no ano seguinte a Ossétia do Sul manifestou a sua inequívoca vontade de integrar a Federação Russa. Houve guerra (o mesmo se passou na Abekázia, um pouco mais a noroeste) acabando por ser firmado um acordo de paz, garantido pela Rússia, que assegurava à Ossétia do Sul um ampla autonomia que lhe permitia viver numa situação de independência de facto relativamente à Geórgia.
Mais ou menos contrariada, a Geórgia conviveu pacificamente com a situação até à chegada ao poder do “americano” que agora a governa – Mikail Saakashvili. Depois de várias tentativas de integração da Geórgia na NATO, e a promessa obtida este ano de que a integrará, Saakashvili sentiu-se suficientemente forte para, sem qualquer provocação, romper os acordos de 1992 e invadir uma região cuja população na sua esmagadora maioria não quer integrar a Geórgia e tem, além disso, passaporte russo.
Perante esta situação, e tendo principalmente em conta o antecedente do Kosovo (aliás, um dos grandes fracassos da diplomacia dita ocidental), que se esperava que a Rússia fizesse? A dúvida nunca esteve em saber o que a Rússia faria, mas em conhecer as razões que ditaram o comportamento de Saakashvili: jogador arriscado e, no fundo, estúpido ou provocador? E, neste caso, por iniciativa própria ou a soldo? Ou seja, provocador nato ou provocador da NATO?

sábado, 9 de agosto de 2008

CHINA ABRE OS JOGOS COM POMPA E CIRCUNSTÂNCIA, ALÉM DE MUITA BELEZA


QUEM FICOU A VER PELA TELEVISÃO, PODENDO LÁ ESTAR, ENGANOU-SE NA AGENDA

Os jogos olímpicos abriram hoje em Pequim com uma cerimónia extraordinária. Presentes, como convidados de honra, representantes de todos países, entre os quais muitos chefes de estado e de governo.
Aqueles que há uns meses atrás anunciaram a sua ausência, por motivos de agenda, convencidos de que os grandes deste mundo iriam boicotar a cerimónia de abertura, enganaram-se redondamente. Ficaram a ver pela televisão os que lá marcaram presença. Bem feito! Para a próxima esqueçam a agenda, que é assim uma desculpa que fica a meio caminho entre a displicência e a covardia, e tenham a coragem de dizer que não vão pelas razões que dizem querer defender ou então esperem que os outros digam a última palavra antes de tomarem uma decisão.

EANES CONCORDA COM CAVACO

CAVACO DEVE FALAR DIRECTAMENTE AOS PORTUGUESES, DIZ EANES

Eanes concorda com tudo que cheire a bonapartismo, por isso não admira que, a propósito dos Estatutos dos Açores, que é uma questão entre o Presidente da República e o Parlamento, ele concorde em que o Presidente se dirija directamente ao povo, em vez de o fazer a quem tem competência e legitimidade para alterar a lei.
Conhecemos bem os limites da democracia representativa e do mandato incondicionado. Por isso, achamos que se tornam cada vez mais necessários mecanismos que permitam aos representados (ao povo) controlar o exercício do mandato, para que os seus representantes, durante o seu exercício, respeitem a vontade popular.
Este controlo, exercido de baixo para cima, é um controlo democrático, amplamente desejável. Ele nada tem a ver com os apelos directos ao povo feitos de cima para baixo. Tais apelos são frequentemente anti-democráticos e prestam-se a todo o tipo de demagogias. Por isso, são amplamente indesejáveis.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

O BOAVISTA E OS ELOGIOS À CAPACIDADE DE GESTÃO DOS LOUREIROS


O TRISTE PAPEL DOS COMENTADORES DESPORTIVOS


Desde há muito que entendo que a corrupção no futebol não é apenas da responsabilidade dos dirigentes desportivos e dos árbitros, mas dos demais agentes desportivos em geral, com excepção, até ver, dos jogadores.
Vem isto a propósito do que está acontecendo ao Boavista, uma das maiores fraudes desportivas dos últimos anos. O Boavista, ano após ano, foi ganhando jogos de forma mais que duvidosa e até um campeonato ganhou. Um campeonato de futebol, apesar de para qualquer observador atento mais parecesse um campeonato de luta livre.
Nesse ano não faltaram os elogios dos comentadores desportivos, principalmente dos que em nomes dos respectivos clubes comentam semanalmente os jogos. Lembro-me de um conhecido comentador do Sporting, cujo “metier” é adivinhar o futuro, se ter desdobrado em elogios sobre a capacidade de gestão dos Loureiros, exemplo acabado de saudável gestão desportiva.
Dizia o dito adivinho, incapaz contudo de perceber o passado e compreender o presente, que o Boavista era um exemplo a seguir: vende caro, valoriza os jogadores como ninguém e compra barato.
O que se passou depois é do conhecimento público: o antepenúltimo presidente do Boavista está suspenso por vários anos; o penúltimo (e muito breve) garantiu que o clube não mais seria uma lavandaria; o actual viu o clube despromovido à segunda divisão por batota e o estádio nomeado à penhora, além de estar impossibilitado de inscrever jogadores, o que, a manter-se, relegará o clube para os distritais.
Ora ai está o exemplo de uma grande gestão!!!

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

OS JORNAIS EM FÉRIAS



A SRA TERESA DE SOUSA, SANTANA LOPES, CAVACO E OUTROS MAIS

A gente abre os jornais em férias, convencida de que vai haver uma pausa, mas eles não nos dão descanso.
É a Sra. Teresa de Sousa que, sob a forma de notícia, nos deixa em duas longas páginas o seu velado protesto e a sua amargura pelas relações que Portugal mantém com a Venezuela de Chavez, com a Angola de José Eduardo dos Santos, com a Rússia de Putin e com a Líbia de Kadafi. Se ainda fosse com Bush, homem respeitador do direito internacional, grande democrata e acérrimo defensor dos direitos humanos, ainda vá, mas agora com aquela gente…francamente. A China escapou-lhe, acto falhado de um grande passado democrático emeerre.
Depois vem Santana Lopes, a propósito da intervenção presidencial, avisar que levem Cavaco a sério. Se o homem falou no “regular funcionamento das instituições”, não o fez inadvertidamente. Quererá dizer, segundo Santana, que se não lhe atendem o “pedido”, e deixam ficar tudo como está, poderá, em caso de derrota do (mais que provável) veto político, dissolver o Parlamento.
Esta advertência de Santana Lopes faz todo o sentido. Quando comentei a intervenção de Cavaco, sem ter lido o acórdão do Tribunal Constitucional, supus, como toda a gente, creio, que Cavaco tinha levantado a questão da constitucionalidade perante aquele tribunal e que ela não tinha sido atendida. Qual não foi o meu espanto, quando, dois dias depois, constato que Cavaco não tinha levantado o assunto. E aí senti-me enganado pelo Presidente da República. Como é possível que o mais alto magistrado da nação (como se dizia no tempo de Salazar) tenha feito uma intervenção daquelas sem de imediato ter esclarecido esta questão? Cavaco deveria ter actuado de outro modo. Deveria ter-se dirigido à Assembleia da República - e não ao povo português, que nada, neste momento, tem a ver com aquele assunto – e humildemente reconhecido que, por lapso seu (ou dos seus brilhantes assessores jurídicos), não havia solicitado a apreciação preventiva da constitucionalidade daquelas disposições; porém, como, em sua opinião, elas eram manifestamente inconstitucionais, pedia agora a Assembleia da República que as alterasse no sentido da sua conformidade constitucional. Este era o comportamento normal e digno de um grande político. Fazendo o que fez - quaisquer que tenham sido as suas conversas com Sócrates sobre o assunto –, Cavaco mais uma vez deixou muitas dúvidas sobre se tem condições psicológicas para um dialogo democrático mais intenso. Autoritário por natureza, pouco dado a compromissos, habituado a impor a sua vontade por força das maiorias absolutas que outrora alcançou, Cavaco continua a entender a política como um jogo de resto zero. O que um ganha é o que o outro perde. Só que a política democrática não é isso. Por isso, repito, a advertência de Santana Lopes, que o conhece bem, deve ser levada a sério. Isto é, deve fazer-se frente ao autoritarismo…
A seguir vem o DN dizer-nos, como aliás o fizeram as agências noticiosas, mas não, sintomaticamente, o Público, que Mugabe poderá entregar o poder aos oposicionistas no quadro de um acordo que passa pela imunidade e manutenção de alguns poderes simbólicos. Pois é, em Portugal houve quem esperasse, em vão, durante 48 anos por um acontecimento do mesmo género e nada. Afinal, os ditadores não são todos iguais… E quando a gente tiver dúvidas pergunta aos ingleses que eles esclarecem logo…
Por falar em ditadores, a grande notícia de Agosto é abertura de um processo em Madrid, na Audiência Nacional, pelo juiz Petraz, contra altos comandos militares e políticos chineses, por crimes diversos perpetrados contra o povo tibetano. Esta mania das grandezas dos nuestros hermanos deixa-nos quase sem palavras. Então vão-se dar ao trabalho de investigar - e, antes disso, de justificar a competência dos tribunais espanhóis - crimes cometidos a uma tão grande distância e a uma tão alta altitude, quando, durante mais de duas décadas, tiveram lá em casa gente que cometeu crimes contra a humanidade e crimes de direito comum aos milhares sem nunca ter sido processada?