sábado, 6 de abril de 2013

TRIBUNAL CONSTITUCIONAL


 

O SENTIDO POLÍTICO DO ACÓRDÃO
 

O primeiro comentário que fiz, no Facebook, muito a quente, depois de ter ouvido a súmula do Acórdão pelo Relator (presumo) carece de alguns desenvolvimentos.

A ideia com que logo a seguir fiquei, sem ouvir ninguém – aliás ainda não ouvi ninguém para não ser, mesmo subconscientemente, influenciado – foi que o TC com esta decisão se queria defender de uma campanha demagógica que seguramente seria feita se declarasse a inconstitucionalidade da contribuição extraordinária de solidariedade sobre as pensões acima de 1350 € e da sobretaxa sobre o IRS, ambas indiscutivelmente inconstitucionais, mas que se prestavam muito facilmente à demagogia da direita por os grandes beneficiários dessas inconstitucionalidades serem obviamente os mais ricos (Pinhal, etc); é certo que também havia todos os outros, mas aproveitava-lhes relativamente pouco e tanto menos quanto menos ganham.

Quanto ao corte dos vencimentos dos funcionários públicos, dificilmente o tribunal poderia decidir de outra maneira depois do que já tinha decidido no primeiro acórdão (o “acórdão Sócrates”); relativamente à redução dos escalões do IRS, que também viola o princípio da progressividade, deve entender-se a decisão como um “rebuçado” dado ao Governo numa matéria em que a densificação do conceito (ou princípio) se presta a uma razoável amplitude de entendimentos.

No que toca à inconstitucionalidade da contribuição adicional dos beneficiários dos subsídios de desemprego e de doença, respectivamente de 6% e 5%, a decisão do Tribunal já se insere naquilo a que se poderia chamar o respeito pela mais elementar “decência civilizacional” que o Governo PSD/CDS manifestamente não tem.

Atacando o corte dos subsídios de férias dos funcionários públicos e dos pensionistas, o Tribunal privilegia um vastíssimo universo de pessoas que se sentem tratadas por igual por todas passarem a receber todos os ordenados a que têm direito. Aqui já não há mais nem menos beneficiados nem tão pouco a decisão é passível de qualquer campanha demagógica. Depois de tudo o que tem sido feito aos pensionistas e aos funcionários públicos seria preciso muita lata para que os comentadores do Governo regressassem à estafada conversa do “justo tratamento diferenciado” (para pior) dos pensionistas (por já não poderem perder o “emprego”, argumentação de Vital Moreira) e dos funcionários públicos (por ganharem mais e não poderem ser despedidos, argumentação de Paulo Rangel e quejandos) relativamente aos demais trabalhadores.

Creio que esta é a orientação política do acórdão. Depois é uma questão de lhe dar forma jurídica. Essa análise fica para mais tarde, depois da leitura do acórdão.

3 comentários:

Ana Paula Fitas disse...

É fundamental que a leitura integral de uma decisão desta natureza seja debatida... por isso, é de inestimável relevância ter escrito este texto... obrigada, meu amigo! Vou levar, claro! Um abraço.

Albino M. disse...

Muito me admira a(s) sua(s)análise(s)...
Se incluisse a mal-fadada CÊS, certamente a sua conclusão seria bem menos optimista!

Anónimo disse...

Concordo inteiramente com a sua análise. Deixo por isso a nota - que me pertence - de que o TC não tem nada para dar, inclusive rebuçados. O que tem é, simplesmente, de restituir.
Se o TC, enquanto órgão do Estado de Direito, é intocável, na sua composição não está imune a apreciações, corolário da possibilidade de votos de vencido (que poderia - ou deveria - estar excluída). Para mim, não representa a nata dos juízes, qualquer que seja a sua extracção. Muito pelo contrário, lamentavelmente.