RESISTIRÁ A UNIÃO EUROPEIA AO TERRAMOTO FINANCEIRO?
Razões tinham os americanos informados quando logo nas primeiras manifestações da crise financeira nos avisaram de que era impossível prever os seus efeitos, a sua duração e a sua extensão. Apenas nos advertiram para o seu carácter devastador.
E é isso o que se está a passar, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Europa e, mais uns dias, em todo o mundo. Bastou que um ou dois grandes bancos americanos falissem e outros ficassem em grande dificuldade, para que a crise se propagasse como “uma nódoa de azeite” a todo o mundo.
E, vendo bem, não há que estranhar. Não é preciso ser economista, nem ter especiais conhecimentos económicos para compreender o que se passou. Basta reflectir um pouco sobre a realidade que cada um de nós conhece para se perceber que “aquilo” iria estourar mais dia, menos dia.
Se um banco tradicional, coisa que já não existe, destinado a financiar a economia real (batatas, chouriços, automóveis, aço, etc.), regulado na sua actividade, embora muitas vezes por gente tipo Constâncio, assenta a sua solvabilidade na confiança que inspira aos seus clientes, já que apenas uma parte do seu passivo, em regra cerca de um terço, está coberta pelo activo, imagine-se agora o que se passa num banco que não esteja sujeito a nenhum controlo e que possa apresentar como activo produtos que na realidade não valem nada. Produtos, fruto dessa tão cantada criatividade com que os neoliberais e seus acólitos nos encheram os ouvidos durante décadas! A criatividade era tanta que até os títulos representativos do que nada valia ou do que valia muito pouco eram subdivididos em títulos autónomos para mais facilmente serem transaccionados, com base numa pretensa avaliação diferenciada do risco. E com estas e outras práticas infestaram o sistema bancário no seu conjunto.
Ora, se os todos os bancos assim actuaram, é evidente que os seus activos, pouco valiosos numa situação de crise mesmo quando representativos de actividades da economia real, não valem nada ou valem muito pouco quando referidos a essa tal criatividade financeira. Por outro lado, a crise agravou as necessidades de liquidez e as empresas da economia real, sem crédito e com a retracção da procura resultante da crise, vão falir umas atrás das outras.
A questão que se põe é a seguinte: perante este descalabro, o que podem os Estados fazer? Apenas algo de semelhante ao que fizeram os americanos e esperar. Obviamente, que não passa de conversa psicológica essa prática anunciada pelos governos de alguns países de que garantirão os depósitos bancários na totalidade. No fundo, com essa declaração o que esses governos pretendem é: primeiro, impedir a corrida aos bancos; segundo, atrair capitais. Só que o problema pode pôr-se pelo outro lado: dada a crise generalizada de liquidez, como podem os bancos responder perante os seus mutuantes à medida que estes forem exigindo os seus créditos? Repare-se que os governantes não garantiram o pagamento de todas as dívidas dos bancos, mas apenas as provenientes de depósitos, exactamente para que, sem a sua mobilização pelos depositantes, eles tenham dinheiro para pagar as outras dívidas. Só que, muito deles não terão e então será a falência.
Se, na União Europeia, cada Estado actuar isoladamente, com mais ou menos conversa comunitária, e se as falências continuarem, como inevitavelmente vão continuar, o que vai ser do euro? Resistirá a moeda única à crise? Se não houver uma política concertada, dificilmente o euro sobreviverá, se a crise prosseguir. E a União Europeia, aguentar-se-á? Sem o euro, não.
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