sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O BALANÇO DA CAMPANHA


O QUE DELA RESTA

A maioria dos comentadores considera a campanha para as presidenciais uma das mais desinteressantes de todo o regime democrático português.
É bom que se perceba por que está tão arreigada esta convicção na generalidade do povo português e por que razão a campanha constituiu uma desilusão para quase todos, não apenas para os que não participam em comícios, arruadas e outras tipo de acções, mas também para muitos destes, se não para os próprios candidatos, como resulta de algumas intervenções televisivas.
A primeira explicação deve buscar-se na profunda transformação ocorrida nestes últimos dez anos no seio da União Europeia, acentuada pela recente crise da dívida e do euro, que fez com os países menos influentes - na prática quase todos, com excepção dos que realmente mandam: a Alemanha, com o apoio da França, a abstenção da Inglaterra, a indiferença da Itália, e mais um ou dois países ricos - deixassem de ter uma palavra importante sobre quase tudo o que é importante para o seu próprio destino.
Esta ideia que corresponde ao que de facto se passa é claramente compreendida e interiorizada pelas classes dirigentes, mas é também intuída pelo povo em geral por via de um sentimento difuso de impotência e incapacidade para o arreigamento do qual muito têm contribuído aqueles que, tendo desistido de lutar em Bruxelas, apresentam as suas decisões como uma inevitabilidade resultante de algo que não podem comandar, nem sequer influenciar.
Perante este quadro numas eleições como as presidenciais, onde esse poder de intervenção é ainda menor e confuso – menor porque o Presidente não governa e confuso porque numa campanha presidencial surgem sempre propostas impossíveis de concretizar – é natural que o povo se afaste, tanto mais quanto menos interessantes são os candidatos e as propostas que eles apresentam.
Por outro lado, o povo também compreende que as propostas de ruptura para serem viáveis têm de ser realistas, exequíveis e não apenas demarcadoras de um terreno que se ocupa no quadro de um mero protesto destinado a não perdê-lo ou a ampliá-lo para fins futuros.
Em segundo lugar, mesmo nestes estritos limites em que a campanha tenderia sempre a realizar-se, a sua animação poderia ter sido outra se a demarcação esquerda/direita correspondesse, pelo lado da esquerda, a uma ruptura geracional capaz de entusiasmar largos estratos etários que dela estão completamente alheados e, por outro, reunisse em si potencialidades aglutinadoras de toda a esquerda, quanto mais não fosse numa segunda volta.
Como nada disto aconteceu, o saldo positivo que resulta desta campanha é o fim do mito Cavaco, como personalidade política apolítica, como individualidade acima de qualquer suspeita e relativamente à qual nem sequer havia a ousadia de a ligar a algo que fosse menos recomendável ou digno, e ainda a sua confirmação como político demagógico e limitado, incoerente e incapaz de compreender os grandes desafios que se põem ao futuro de Portugal, realidade excessivamente ilustrada pela repetição de banais lugares comuns que apenas atestam as suas limitações!