BARROSO VAI PAGAR PELO
QUE DISSE
Referindo-se aos programas de ajustamento que estão sendo aplicados na zona euro a diversos países, Barroso teve o desplante de afirmar que os "programas" funcionam. E deu o exemplo da Irlanda e da Letónia. Inacreditável que
um alto responsável político com aspirações a desempenhar altas funções políticas em
Portugal tenha o descaramento de afirmar que um programa devastador para a
sociedade portuguesa – devastador no plano económico, financeiro, político,
sociológico, psicológico, etc. – funciona. E como se isso não bastasse, como se
não bastasse o cortejo de misérias que a espiral recessiva que tal programa
engendra, evidenciadas em centenas de milhares de despedimentos, de milhares e
milhares de falências e insolvências, do empobrecimento generalizado e acelerado
da esmagadora maioria da população portuguesa, aduziu em defesa da sua tese
os “êxitos” da Irlanda e da Letónia.
Com o euro no estertor e a "Europa" à beira de se confirmar como o "grande embuste" dos tempos modernos, Barroso, apoiando-se numa descarada mentira, sai em defesa dos credores que estão estrangulando Portual com a colaboração do Governo Português, tentando fazer crer que aqueles "programas", unica e exclusivamente destinados a garantir o pagamento de dívidas contraídas para garantir a rentabilidade de capitais excedentários e sem aplicação nos países que os geraram, se destinam a assegurar um futuro melhor para os povos que agora os suportam. É dá como exemplos a Irlanda e a Letónia.
Sobre estes exemplos, basta dizer o seguinte: a Irlanda não
tinha, nem tem, uma crise económica, mas uma crise financeira resultante da
actuação desregulada e irresponsável do sector financeiro. Remediado esse
problema pelos contribuintes e pela contínua entrada de capitais americanos de
origem irlandesa, o sistema financeiro restabeleceu-se, mas o desemprego não se
alterou nem há perspectivas de que se venha a alterar a curto prazo. E só não é
maior porque os irlandeses, de acordo com uma velha tradição nacional,
emigraram em massa para a América, Austrália, Africa do Sul, Nova Zelândia,
etc. A Irlanda era um praça financeira e sede privilegiada de multinacionais e
assim vai continuar a ser, depois de os contribuintes e a emigração terem evitado o colapso do sistema financeiro. Mas o povo não beneficiou nada com este "êxito": os salários diminuiram, o desemprego aumentou e o pequeno acrécimo do PIB, que todavia se mantém muito inferior ao do início da crise, beneficiou exclusivamente os detentores do capital financeiro.
E quanto à Letónia nem falemos. A Letónia é um caso exemplar
de empobrecimento brutal resultante de um programa de “ajustamento estrutural”
aplicado a um país europeu. Apesar de a Letónia não pertencer à moeda única, o
que à partida seria uma vantagem, mesmo assim o empobrecimento gerado pelo tal
programa de que fala Barroso foi da ordem de quase 50% do PIB! Ainda vão
decorrer muitos anos até que a Letónia volte a alcançar o grau de
desenvolvimento económico existente antes da aplicação do “programa”. Tal
desgraça só foi suportável porque a extrema xenofobia dos letões os levou a
acreditar que as disfunções do seu sistema económico tinham a sua origem na
“perversa” União Soviética, estando agora predispostos a suportar todos os
sacrifícios para se “purificarem” e “expiarem” aquela malvada influência…
Mas há mais: Barroso como ex-Secretário de Estado da
Cooperação sabe muito bem o que foram os “programas de ajustamento estrutural”
em África. A que levaram, que consequências tiveram no plano social e político,
a desestruturação que provocaram em sociedades mal saídas da colonização. A
expansão do islamismo radical em África é uma consequência da brutalidade desses
programas de ajustamento que o FMI aplicou na década de noventa do século
passado com a mesma cegueira ideológica com que hoje o faz na Europa em
parceria privilegiada com a Alemanha, representada na Troika pelos seus lacaios
de estimação.
Durão Barroso pode estar certo de que as suas palavras não
serão esquecidas em Portugal.
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