quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O ERRO DE KRUGMAN




PARA ALÉM DO ERRO DE ANÁLISE ECONÓMICA

Logo que me chegou a notícia do post de Krugman sobre Portugal – Portugal? O nao! -, minutos depois de publicado no seu blog do NYT, fiquei apreensivo com o seu teor e mais ainda quando horas depois foi transcrito no Estado de S. Paulo, em português, pelo aproveitamento que seguramente iria ter por parte da direita.
Krugman, que sem hipocrisia nutre simpatia pelo nosso país, demonstra pela forma relativamente titubeante como começa o post, que não tem um conhecimento profundo da situação macro-económica portuguesa, contrariamente ao que se passa, por exemplo, com a situação da Grécia, da Irlanda e da Espanha que domina melhor.
A referência ao abaixamento de salários que aqui há cerca de seis meses já havia feito num contexto diferente, e que rapidamente foi aproveitado pela direita que o execra, é agora repetida, sem outro contexto que não seja o que resulta do post, embora se saiba que as propostas de Krugman para a crise da dívida na zona euro passam por uma alteração estrutural da União Económica e Monetária, devendo aquela sua ideia interpretar-se no quadro do imobilismo reinante entre os principais Estados da zona euro, nomeadamente a Alemanha, que rejeitam qualquer outra concepção político-económica do euro, bem como qualquer outra saída da crise que não seja através de políticas recessivas, altamente penalizadoras da procura interna e do emprego.
Independentemente deste facto, de que a direita não quer saber, e independentemente do erro de análise económica de Krugman – um erro factual, de facto a perda de competitividade da economia portuguesa não resulta de nenhuma subida desproporcionada dos salários, contrariamente ao que se passa noutros países -, o erro substancial de Krugman é de natureza essencialmente política.
Uma personalidade como Krugman, que luta consequentemente contra a direita no seu país, ouvida em todo o mundo pelos seus atributos científicos e posições políticas, não pode “oferecer de bandeja” à direita portuguesa e europeia argumentos para agravar ainda mais o fosso que separa os ricos dos pobres e para tornar o trabalho no bode expiatório da crise da dívida, fazendo dele o alvo fácil e indefeso por que toda direita aspira.
Talvez Krugman não saiba que a direita portuguesa é social e politicamente falando tão ou mais cavernícola que a direita do seu país, e não é por ela não ter um discurso ostensivamente tão violento, do ponto de vista do confronto político, quanto a americana que ela deixa de olhar com desprezo para os direitos do trabalho e demais direitos sociais, estando sempre à espera que se lhe depare uma boa oportunidade (FMI, descalabro económico-financeiro, etc.) para poder pôr em prática o seu verdadeiro programa.
Mesmo involuntariamente, como é seguramente o caso, Krugman não pode prestar-se a esse papel.
Essa ideia muito difundida na América de que há na Europa, nomeadamente na Ocidental, uma espécie de “pacto” mínimo entre o capital e o trabalho com vista à institucionalização e manutenção de um Estado social amortecedor dos grandes desmandos do capitalismo pertence ao passado. É uma ideia que teve concretização prática entre o fim da guerra e a Queda do Muro de Berlim. Depois de 1989, principalmente depois de 1991, tudo mudou. Que Krugman não tenha ilusões: o grande inspirador do “pacto social” era o “espectro do comunismo”. Hoje o programa da direita é destrui-lo!

4 comentários:

Anónimo disse...

Ao autor deste Blogue direi: continue! Foi através de outro, o Duas ou Três Coisas que aqui cheguei. E vou passar a ser seu leitor atento! Excelente Blogue! Oportuno. E onde se lê aquilo que deve ser dito. Alto e em bom som!
Com consideração, muita, e cordialidade,
P.Rufino

jvcosta disse...

Zé, desculpa lá o Krugman, ao menos atendendo ao alerta que ele hoje deixou em relação à nossa vitória de Pirro no leilão da dívida, como escrevi.

Dá-me gosto que estejamos tão sintonizados que, neste meu escrito, por coincidência, alinho com o que escreves sobre a importância da queda do muro e da exploração política, social e económica dos össies para o sucesso do regulamento económico em estilo de tropa prussiana da Merkel sargenta de artoilharia.

Gonçalo Nascimento Rodrigues disse...

Meu Caro,

No seu artigo não encontro um único argumento tecnicamente válido para justificar a sua posição e desacordo com Krugman.

Assenta exclusivamente a sua posição atacando a direita e apelidando-a de «cavernícola» e «destruidora do pacto social».

Krugman limitou-se a ler os factos, ao contrário de si. E os factos são claros:

- Para quê continuar a insistir num financiamento externo que se irá revelar insustentável para Portugal?
- A alternativa é bem menos ruinosa e custosa para o País;
- Se a procura e a colocação foram assim tão sensacionais, porquê um custo tão alto de dívida? Se a procura é susbtancialmente superior à oferta, não deveria ser esta a ditar o preço?
- Para quê prolongar esta morte lenta?...

Enquanto Português, social-democrata e, sobretudo, contribuinte e trabalhador, estou farto destas discussões que põem tudo num prato de balança: direita vs esquerda. Por uma vez, por favor, ponhamos Portugal nos 2 pratos da balança e trabalhemos para sair deste buraco que o PS, nos últimos 15 anos, nos colocou.

JMCPinto disse...

Lamento desiludir o Gonçalo Nascimento Rodrigues (GNR), mas quem não compreendeu Krugman não fui eu.
Krugman tem passado ultimamente o seu tempo a estudar a União Económica e Monetária e a possibilidade da subsistência de uma moeda única, como o euro, unicamente alicerçada no Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Por outro lado, ele foi o primeiro a compreender o que se passava com Portugal e, por extensão, com os países periféricos da zona euro. Na segunda vez que veio a Portugal, já depois da criação do euro, ele disse (cito de memória) para alguém que o acompanhava: “Da primeira vez que cá estive, em 1976, achei que isto era parecido com a América Latina. Havia muitas semelhanças, embora também houvesse diferenças, mas a dominante era latino-americana. Agora, eles ultrapassaram essa fase, mas estão metidos numa dificuldade muito maior de que nem sequer suspeitam: têm uma moeda muito valorizada relativamente à competitividade da economia. Isto não vai dar certo.”
Desde então, principalmente a partir da crise financeira, e mais explicitamente a partir da crise da dívida e, por arrastamento, da crise do euro, Krugman não tem deixado de insistir numa estruturação da zona euro em termos completamente diferentes dos actuais, sempre, em todo o caso, com uma dúvida, mesmo que houvesse mudanças essenciais: sem mobilidade da força de trabalho vai ser sempre muito difícil combater o desemprego com eficácia e atenuar as assimetrias.
Como sabe que nada disto – do que ele propõe – ocorrerá, Krugman não tem dúvidas de que será pelo desemprego e pela deflação dos salários que nos países periféricos (e posteriormente porventura noutros) se tentará “recuperar” a competitividade. Porque – e isso também é verdade – houve “borbulhas” em alguns países que, tendo criado uma ilusão de prosperidade, provocaram uma subida desproporcionada dos salários. Só que isso não aconteceu em Portugal, contrariamente ao que, presumo, pensa GNR e sem pudor defende a tal direita cavernícola.
Aliás, esta não é uma questão ideológica. É uma questão de facto. Matematicamente demonstrável.
Questão ideológica é dar armas ao adversário. E Krugman num comentário ligeiro, factualmente com erros, deu armas ao adversário. E isto é uma luta, uma luta política, por muito que GNR pense que é uma questão técnica.