O QUE O PS NÃO QUER VER
Depois da eleição de Ferreira Leite como presidente do PSD, a direita recobrou um ânimo e uma capacidade de intervenção que antes manifestamente lhe escasseavam. Depois dos insucessos de Santana Lopes, Marques Mendes e Meneses, todos “moeda falsa” ou “moeda má” , segundo a metáfora construída por Cavaco com base na sua cultura geral, Ferreira Leite, não obstante a sua insignificância política, tanto pela obra realizada, como pela proposta apresentada, aparece aos olhos da direita como a moeda fiável de que Cavaco necessitava para governar.
Este é um dado que nem o PS nem a esquerda podem ignorar. O pretexto para atacar o governo só poderia, portanto, ser um pretexto que tivesse acolhimento em Belém, ou melhor, para não haver dúvidas: um pretexto construído a partir de uma posição de Belém – o financiamento das obras públicas anunciadas pelo governo.
O governo tem tido muita dificuldade em explicar como vai financiar as obras públicas que tem programadas e que vantagens vai o país tirar delas. Talvez porque o governo saiba que a grande divergência entre ele e o PSD está em ser ele e não o PSD a fazê-las. Talvez porque o governo saiba que tais obras são eleitoralmente vantajosas. Talvez por tudo isso, o governo responda evasivamente sem se dar conta que tais respostas só favorecem a direita. Dizer que se trata de obras já decididas pelo PSD ou afirmar que vão ser financiadas pelo capital privado é praticamente o mesmo que não dizer nada e permitir que a partir de comentários “independentes” dos habituais fazedores de opinião se vá instalando nos portugueses a ideia de que “não há dinheiro para nada” e de que este governo conduz alegremente o país para a bancarrota!
O governo e o PS não explicam, mas há, felizmente, quem o faça por eles com uma clareza e transparência que aqueles dificilmente seriam capazes de igualar. Como se vão então financiar as obras? As que dão lucro, com capital privado no quadro das parcerias público-privadas, as que não dão lucro, pelo orçamento de Estado!
Só por grande ingenuidade se pode continuar a falar de “parcerias público-privadas” como modelo de financiamento de obras públicas. Não há parecerias deste tipo em Portugal (não sei se existem noutra parte do mundo…), como à saciedade demonstram todos os exemplos conhecidos: Luso-Ponte, as SCUTS, o Hospital Amadora-Sintra, etc. O Estado priva-se do que lhe dá lucro, garante os financiamentos angariados, directa ou indirectamente, aceita todo o tipo de ónus e de custos indevidos, arca com o risco do negócio, e facilita um grande negócio ao capital privado. Como se pode perante os exemplos que se conhecem afirmar que se trata de obras sem custos para o Estado ou de financiamentos privados?
E afirmar que as novas estradas, construídas em parceria, passam a ser financiadas pelos recursos próprios do novo modelo de gestão rodoviária, sem intervenção de fundos orçamentais, não passa de uma enorme ficção. Ficção, porque o novo modelo de gestão rodoviária continua a trabalhar com recursos orçamentais – não tem, na realidade, outras receitas - e ficção ainda porque ninguém acredita que, quando cessarem as actuais concessões, os “novos” concessionários não sejam “novamente” os antigos.
E se as barragens vão dar assim tanto lucro, por que não as financia e as constrói o Estado?
Não, o problema não está na falta de dinheiro, como diz a direita. O problema está no dinheiro que o Estado vai transferir para os privados ou nos rendimentos que ao Estado deveriam pertencer e que o PS se prepara para entregar aos privados com grandes e graves custos para o erário público. Ai é que está o problema e não na falta de dinheiro.
Depois, há opções que, independentemente de haver ou não dinheiro, se não justificam. O aeroporto é uma delas, como aqui já se referiu e demonstrou. Fazer agora um novo aeroporto é uma péssima opção que enfraquece o Estado e empobrece a maioria dos portugueses. A direita está calada a propósito do aeroporto e sabe-se porquê: a nova localização e aval para a sua construção foram dados por Cavaco, com perfeito conhecimento do tipo de interesses em jogo… Se houvesse uma verdadeira democracia em Portugal, a construção agora do novo aeroporto seria resolvida por referendo.
Já combater o TGV ou pugnar pela construção de “estradinhas” à Salazar parece de uma pequenez de vistas incompatível com o século em que vivemos e com o tipo de problemas com que nos defrontamos.
Sem comentários:
Enviar um comentário