quinta-feira, 4 de outubro de 2012

AS ILUSÕES MONETARISTAS



AINDA O PAPEL DO BCE

 

Apenas alguns parcos apontamentos sobre uma matéria que aqui tem sido frequentemente tratada: o papel do BCE na crise do euro. É sabido que o BCE tem limitações estatutárias que a Reserva Federal americana (FED) não tem. O BCE tem por função primordial controlar a inflação e manter a estabilidade dos preços, devendo, sem desrespeito pelo princípio antes enunciado, apoiar também as políticas económicas gerais da comunidade. A FED, pelo contrário, mantém em pé de igualdade estas duas funções.

Não obstante esta diferença de vulto que em múltiplos posts tem aqui sempre sido sublinhada (veja-se, entre outros, "Sobre a inacção do BCE”), é uma ilusão supor que a crise do euro, hoje propagada sob a forma de crise económica a quase toda a Europa, pode ser resolvida mediante a aplicação de medidas de natureza estritamente monetaristas.

É certo que um comportamento do BCE semelhante ao da Reserva Federal americana atenuaria fortemente o peso macroeconómico da crise da dívida, mas não resolveria a crise económica subjacente como se está a ver pelo exemplo americano, onde a economia manifestamente não descola e onde o emprego não cresce, antes pelo contrário.

A tal intervenção do BCE no mercado secundário da dívida pública nos termos em que foi anunciada por Mario Draghi, e que tantas expectativas e ilusões criou na mente daqueles que somente esperavam um sinal aparentemente contrário ao da “ortodoxia alemã” para cantar vitória, revelou-se completamente inoperante, por ninguém ter recorrido a ela, e, pior do que isso, até teria sido  nociva se algum Estado tivesse ido naquele canto de sereia.

É com satisfação que vemos estas conclusões confirmadas num recente artigo de Joseph Stiglitz, Mistificação Monetária, no qual diz expressamente: “Para afastar receios associados ao despesismo governamental, o BCE incluiu condicionantes no seu programa de compra de títulos. Mas se essas condições funcionarem como medidas de austeridade – impostas sem o acompanhamento de medidas substanciais de apoio ao crescimento – terão mais a ver com uma sangria: o paciente deverá correr um risco de morte antes de receber um medicamento eficaz”.

Qualquer pessoa “vê isto”, menos aqueles que em Portugal não querem ver por continuarem agarrados a mitos e desprezarem por completo a razão.

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