O PRÉMIO NOBEL DA DESTRUIÇÃO EUROPEIA
Começando do particular para o geral: aquela “negociata” que, segundo o Público da semana passada, o Relvas e o Passos Coelho queriam fazer com a Ordem dos Arquitectos para “sacar” o dinheiro da União Europeia é apenas um pequeno exemplo do que entre nós se passou desde que passámos a ter como lema de vida a “Europa connosco”.
Milhares, dezenas de milhares, de “relvas” e de “passos coelhos” por esse país fora, principalmente nas grandes cidades, sempre muito próximos dos centros de poder, central, regional ou local, criaram empresas de duração efémera para aceder “aos dinheiros” de Bruxelas para fazer formação, de formandos que muitas vezes nem existiriam ou que, quando existiam, eram formados em coisa nenhuma ou para aceder a subsídios destinados aos mais variados fins, mas quase sempre altamente prejudiciais para a economia nacional ou para o futuro do país.
A ideia ingénua, em que muitos de boa fé acreditaram, de que os europeus estavam muito interessados no nosso progresso, tanto assim que nos davam muito dinheiro, turvou por completo as nossas mentes e empurrou-nos para um beco de saída muito estreita.
Claro que toda a malandragem se perfilou para receber “dinheiro de graça” insensível ao que viria a seguir. E mesmo aqueles que não lucraram directamente com esse dinheiro, que sub-repticiamente nos ia destruindo, tiraram disso vantagens directas ou indirectas pelas consequências positivas que aparentemente, no imediato, resultavam dessa entrada inabitual de recursos financeiros.
Por essa altura já o país vivia na mais completa irrealidade, mas poucos se davam conta disso. Era aquilo a que na Espanha se chamou a cultura “del pelotazo”. Grandes fortunas se faziam do dia para noite, mercê da capacidade de uns quantos “empreendedores” que sabiam fazer dinheiro do nada. Onde antes se agonizava lentamente em terreno áspero e seco, jorrava agora a prosperidade propiciada por quem tinha tido a arte de tornar fecundo e produtivo o que antes era pasto de miséria.
Com a entrada no euro tudo se agravou. A moeda tornou-se subitamente forte, tão forte como o forte “deutsch mark”, as taxas de juro caíram abruptamente para níveis iguais aos das economias mais desenvolvidas do mundo, e então é que o descalabro foi total. A princípio tudo corria aparentemente bem. O endividamento ia crescendo lenta mas persistentemente sem contudo fazer perigar a solvência nacional tão baixos eram os custos desse endividamento e tão abundante e constante era a torrente de capitais que proporcionava esse dinheiro barato.
Nesta loucura coletiva em que todos fomos sendo envolvidos, o país começou por se privar da parte mais importante do seu aparelho produtivo, deixou de ter meios de se defender dos múltiplos ataques que vinham de fora, fiel ao princípio de que qualquer entrave, por pequeno que seja, ao livre desenvolvimento das forças produtivas é uma semente que as forças da tirania deixam a medrar para mais tarde atacar a liberdade.
Até que, quase do dia para a noite, um “pelotazo” ao contrário tomou conta da vida de todos nós. O dinheiro deixou de jorrar, o preço do pouco que existe tornou-se proibitivo e o país acordou cheio de dívidas e saqueado por todos os lados com o mesmo despudor com que antes alguns formavam pessoal para aeródromos que não existiam.
Entretanto, na Europa consolidaram-se vantagens que os seus beneficiários de forma alguma querem perder e agravaram-se desvantagens que tornam impossível a vida de quem as sofre.
Nada disto tem saída pelo mesmo caminho por onde se entrou. Como quase ninguém aprende com os erros alheios e tem muita dificuldade em aprender com os próprios, vai haver – está a haver- quem queira à viva força trilhar um caminho sem regresso convencido de que por um qualquer milagre encontrará depois da curva da estrada o futuro que agora não alcança.
E é neste contexto de profunda desagregação europeia que tem de ser compreendida a atribuição do Prémio Nobel da Paz à União Europeia. A Europa é o mais belicoso continente do mundo. Foi pela guerra e pela violência que se moldaram as relações entre os seus povos. Foi pela guerra e pela violência que a Europa estendeu a sua influência aos quatro cantos do mundo. A guerra e a violência espreitam aparentemente adormecidas no bojo insaciável dos dominadores europeus a possibilidade de alcançar por outros meios os mesmos objectivos que a guerra tende a consolidar.
A reacção de quem rejeita esta dominação será inevitável. Dentro de pouco tempo será impossível não reflectir no quadro institucional europeu o sentimento que grassa nas ruas. De momento ainda são os dominadores que mantêm a iniciativa. São eles que clamam nas instituições europeias a incompreensão dos seus povos pela incúria e pelo desleixo dos povos do sul. São eles que conduzem a extorsão levada ao limite do sacrifício em nome do falso risco moral. São eles que agravam no fim de cada exercício a já insuportável situação anterior. Até ao momento têm contado com as cumplicidades dos que internamente entre os dominados lhes aparam o jogo em nome de uma falsa ausência de alternativa.
O conflito, porém, está aberto e será inevitável dentro de pouco tempo.
3 comentários:
Não entendi bem..
Primeiro revê o que foram os tempos de deslumbramento com os dinheiros da CEE sem que a imensa maioria dos portugueses se questionasse sobre a contrapartida que essa transferências "unilaterais" implicaria. Foi um ver- se-te-avias. Como a associação (uma joint venture) Relvas-Passos, uma miríade delas nasceu como cogumelos; Pressupunham uma "ligação" aos meandros da "aprovação" aí entrava a boyada que enxameava, e enxameia, os Serviços, nomeadamente os Institutos de tudo e mais alguma coisa. Sobre a "formação" só não viu quem não quis. (visto agora a "formação" em aeroportos até faz rir, mas foi assim. Este v/concidadão participou numa do género). Não era preciso ter acesso a processos complexos tipo Amorim e outros, bastava abrir os jornais, falar com formandos, formadores etc. parecia que o pessoal estava alucinado. Eu, dei por mim muitas vezes a pensar se a minha perplexidade teria real razão de ser. O autor não refere, mas o que se passou com os projectos de "formação" passou-se com tudo o resto: florestação, jovens agricultores, turismo rural etc etc. Foi o êxtase do xico-espertismo português. O que se passou com as pescas e o abate à frota não foi imposto, ninguém foi pressionado, o que aconteceu é que armadores e pescadores, sim também os pescadores, não resistiram ao tilintar do vil-metal.
Por isso não entendo porque é que, também para o autor, houve "uma loucura colectiva" e depois considera que os "outros" devem ter compreensão para com a incúria e o desleixo, e nem ao menos "compreende" essa incompreensão. Eu compreendo-os porque no lugar deles teria uma reacção muito parecida, o que não quer dizer que a "coisa" seja assim tão linear, não é!Concordo.
Mas...pergunta-se: foram o dinamarqueses que fizeram do Duarte Lima o nº1 do Parlamento durante o periodo crucial desta desastrosa caminhada? Este tipo de perguntas não me sai da cabeça . O autor não discordará que os portugueses se estariam nas tintas para que os gangs espatifassem biliões e a conta fosse apresentada a outros. Muitos, os tais inorgânicos, estão agora a acordar porque estão a sentir os t----s apertados.
lg
Pois, mas os ganhos foram bilaterais. Muito mais da parte deles do que da nossa. Não há aqui inocentes E como ninguém quer perder as vantagens adquiridas, a única forma de resolver este assunto é partir...Deixar isto.
Mais uma vez o exemplo de África é importante: o grande veiculo da corrupção foi a "ajuda".
CP
Dividir/dissolver identidades para reinar
.
-> A superclasse (alta finança internacional - capital global, e suas corporações) não só pretende conduzir os países à IMPLOSÃO da sua Identidade... como também... pretende conduzir os países à IMPLOSÃO económica/financeira.
-> Só não vê quem não quer: está na forja um caos organizado por alguns - a superclasse: uma nova ordem a seguir ao caos... a superclasse ambiciona um neo-feudalismo.
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