quinta-feira, 30 de abril de 2009

SURPRESA? VERGONHA? AS NOMEAÇÕES NO MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS


MAIS UM, AGORA PARA WASHINGTON!

Alguns se recordarão que há cerca de três anos o Ministério dos Negócios Estrangeiros pôs abruptamente termo a cerca de três dezenas de contratos e comissões de serviço de adidos e conselheiros em serviço junto de diversas embaixadas, com o argumento, então apresentado por Freitas do Amaral, de austeridade orçamental.
Rapidamente se percebeu, tanto durante o mandato de Freitas, como principalmente do do seu sucessor e actual titular, que tal argumento não passava de um pretexto para sanear um conjunto de pessoas que ao Ministério não convinha manter nas funções que então desempenhavam. Prova disso é o facto de a tal lei anunciada por Freitas para regular em novos termos as futuras contratações nunca ter sido aprovada e a circunstância de o decurso do tempo se ter encarregado de demonstrar que novas contratações para os mesmos e outros lugares se terem continuado a fazer a um ritmo nunca antes visto, de tal modo que hoje elas mais que triplicam os saneamentos de há três anos.
A análise destas nomeações para os quatro cantos do mundo, embora com especial incidência em Bruxelas, constitui o exemplo mais acabado do modo como hoje em Portugal os governantes exercem os poderes discricionários que a lei lhes confere e como interpretam o interesse público que aqueles poderem têm em vista prosseguir. Os casos mais escandalosos têm sido aqui denunciados, embora verdadeiramente todos sejam escandalosos, porque em todos eles se trata de usar os poderes públicos e os recursos públicos sem a devida fundamentação. Quem tiver em seu poder a extensa lista das nomeações efectuadas estará particularmente à vontade para falar sobre este assunto…
Acontece que, dentre as pessoas que há três anos mais se destacaram no trabalho de intoxicação dos media, tentando fazer passar a mensagem de que a acção de Freitas do Amaral era verdadeiramente democrática e profilática na medida em que visava a transparência do sistema e o saneamento das finanças públicas, conta-se o seu porta-voz de então, o sr. Carneiro Jacinto.
Vale a pena perder algum tempo na análise do curriculum deste cavalheiro para se compreender melhor, não a sua personalidade, mas como actua, no quadro deste governo e noutros da mesma cor, o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Pois bem, este sr. foi porta-voz de Mário Soares, como PM (1983/85) e como PR (1986/89), tendo sido exonerado destas últimas funções antes do termo do primeiro mandato presidencial por factos que ele, melhor do que ninguém, poderá explicar. Ou, se as explicações do próprio não foram suficientes, sê-lo-ão certamente as do Chefe da Casa Civil ou do Chefe de Gabinete do Presidente.
Como prémio, foi depois colocado na embaixada de Portugal em Washington, com a categoria de conselheiro de imprensa, onde esteve durante alguns anos (1995/98). Entretanto, Pina Moura, Ministro da Economia de Guterres, nomeou-o administrador do ICEP, onde, a fazer fé nos textos de então, passou a desempenhar funções com a categoria de “doutor”.
Com esta mesma categoria, que consta de alguns anuários do MNE (nos anuários do MNE os dados biográficos são fornecidos pelos próprios), foi colocado na embaixada de Portugal em Paris como conselheiro de imprensa (2001). É durante este período que os anuários do MNE referem entre os seus dados biográficos a licenciatura em direito pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa (não, não é pela Independente…é pela Clássica!). Depois de vários anos em Paris, António Monteiro, então Embaixador na capital francesa, entretanto empossado Ministro, requisitou-o, em Outubro de 2004, para desempenhar as funções de porta-voz dos serviços centrais do MNE. Freitas do Amaral, no governo Sócrates, herdou-o e manteve-o com gáudio e pompa no desempenho dessas mesmas funções, onde chegou a ter uma visibilidade nunca antes atribuída a um lugar daquela natureza.
Acontece que os diplomatas em posto ou equiparados quando requisitados para desempenhar funções em Lisboa passam a receber pelo vencimento de origem, ficando automaticamente suspenso o abono de representação. O vencimento de origem do sr. Carneiro Jacinto, agora dr., era muito baixo e terá sido certamente esse facto que levou, já durante o mandato de Freitas, o ex-Ministro dos Negócios Estrangeiros, Martins da Cruz, a perguntar na imprensa qual era o vencimento por que estava a ser pago o sr. Carneiro Jacinto. Perante tão incómoda pergunta, Freitas do Amaral lavrou um despacho atribuindo-lhe, com efeitos retroactivos a 12 de Março de 2005 (data da tomada de posse do governo) a remuneração mensal de 4.432 euros!
Então, o sr. Carneiro Jacinto, que pelo anuário desse ano já não era outra vez dr., num “gesto largo, liberal e moscovita” pediu a exoneração do cargo que já não ocupava há cerca de dois anos, para se manter apenas como porta-voz de Freitas do Amaral. E o Ministro num “gesto largo e transbordante” pagou-lhe, pelos vencimentos de Paris, o pré-aviso a que ele não tinha direito…por ter sido exonerado a seu pedido! E no lugar de Lisboa ficou enquanto Freitas do Amaral foi ministro.
Pois é esse mesmo cavalheiro, agora novamente apenas sr. Carneiro Jacinto, que Luis Amado, Ministro dos Negócios Estrangeiros, certamente ao abrigo de um programa de contenção orçamental, acabou de contratar para desempenhar as funções de conselheiro de imprensa na Embaixada de Portugal em Washington! Grande Ministério e grande Ministro!
Relembro a Democracia Ateniense, relembro Tucídedes e a oração fúnebre de Péricles, no livro II da História da Guerra do Peloponeso, quando, na exaltação das virtudes atenienses, disse:
A nossa constituição não copia as leis dos Estados vizinhos. Bem pelo contrário, somos mais um modelo para os outros que imitadores de costumes alheios. A nossa administração favorece a maioria do povo e não uma restrita minoria. É por isso que lhe chamamos democracia. Quando temos de recorrer às leis, verificamos que elas conferem a todos o mesmo nível de justiça, no respeito pelas suas diferenças. A progressão na vida pública depende do mérito e das capacidades de cada um, sem olhar à sua origem social. Se um homem possui aptidões para servir o Estado, não é a obscuridade da sua condição social que o impede o fazer (….) Mas toda a liberdade de que gozamos não faz de nós cidadãos sem leis. Contra este receio a salvaguarda encontra-se na nossa educação, que nos leva a obedecer aos magistrados e ao cumprimento das leis, particularmente as que respeitam à protecção dos oprimidos, sejam elas leis escritas ou pertençam aquela outra categoria que, não estando escritas, não podem sem vergonha ser violadas”.
Relembro também Montesquieu e as virtudes republicanas tão magistralmente descritas no “Espírito das leis”.
Mas vem-me também recorrentemente à ideia o Código Penal, no Título V, dos Crimes contra o Estado, nomeadamente os descritos no capítulo IV, dos Crimes cometidos no exercício de funções públicas, e interrogo-me se, além dos tipificados (corrupção, peculato, participação económica em negócio, abuso de autoridade, etc.), não se deveria ir muito mais longe na defesa do interesse público.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

O REMÉDIO PARA A ABSTENÇÃO ELEITORAL


AS ELEIÇÕES PARA O PARLAMENTO EUROPEU



Está causando séria preocupação nos meios comunitários a alta taxa de abstenção que as sondagens anunciam vir a verificar-se nas eleições para o Parlamento Europeu em todos os países da União.
As causas são por demais conhecidas e não adianta, por isso, insistir aqui na sua enumeração. Mas já é importante conhecer os remédios propostos.
Hoje de manhã, no Opinião Pública da SIC N, Isabel Meireles, conhecida divulgadora dos regimes comunitários, disse, em rosa vivo, que, para além dos debates, conferências, comícios, escritos e outros actos da idêntica natureza, destinados a sensibilizar os eleitores, era preciso passar a encarar “meios mais musculados”, como a imposição do voto obrigatório com aplicação de pesadas sanções aos recalcitrantes.
Perante tão sábia proposta, só me resta sugerir, dentro da tal linha musculada de actuação, a aplicação de castigos corporais severos, relativamente diferenciados consoante a idade e o sexo.

UM CASO EXEMPLAR



AS ALIANÇAS DO PSOE NO PAIS BASCO



Confirmou-se, como se sabe, a aliança do PSE-EE com o PP com vista à governação do País Basco pelos socialistas.
Entre as muitas cláusulas do “negócio” efectuado entre os dois partidos, assume particular importância simbólica a atribuição da presidência do Parlamento Basco ao PP.
Para desempenhar o lugar, o PP indicou a Senhora Arantza Quiroga, uma jovem de 35 anos, licenciada em direito.
Vejamos quem é esta Senhora: é jovem, como já se disse, elegante, de olhos azuis, mãe de quatro filhos e muito próxima da Opus Dei. E a partir daqui ela própria se define. “Nunca utilizaria o preservativo”. Diz ainda que a religião a ajuda a ser melhor e a preocupar-se com os demais, o que só lhe fica bem.
Quando durante a campanha eleitoral, os candidatos do PP se banharam em La Concha donastiarra (a praia de San Sebastian), a candidata aceitou fazê-lo…mas completamente vestida. “É que”, diz, “mais do que de frio, teria morrido de vergonha”. Tomando banho completamente vestida, não haveria o perigo de aparecer numa revista posando em biquíni. Apesar de vistosa, tanto quanto se depreende da fotografia, ela confessa que “em jovem não tinha êxito com os rapazes”. E explica porquê: “É que eu levava colado na testa que queria um marido e não um noivo.”
Bento XVI tem finalmente alguém à altura das suas exigências num alto lugar do Estado. E o PSOE certamente beneficiará de algumas indulgências pela colaboração prestada…

O DEBATE ENTRE OS CANDIDATOS AO PARLAMENTO EUROPEU



AGRAVAM-SE AS DIFICULDADES PARA O PS

O PS e o PSD têm uma manifesta dificuldade em justificar a existência de listas separadas ao Parlamento Europeu. Rigorosamente, deveriam concorrer na mesma lista. Quase não há diferenças entre os dois partidos e não há diferenças praticamente nenhumas entre os dois cabeças de lista.
O CDS, historicamente muito mais ambíguo – já defendeu o federalismo e o anti-europeísmo - , prevalece-se nesta eleição da inteligência de Nuno Melo e da sua capacidade parlamentar para se introduzir entre o PS e PSD, tentando ficar com votos de ambos.
Do lado da esquerda, a separação das águas é mais nítida. O PCP continua muito ligado a uma posição nacionalista e soberanista sem sequer fazer muita força na defesa da construção de uma Europa de natureza radicalmente diferente da que existe. Pelo contrário, o BE rejeita completamente a Europa que existe em nome de uma outra.
Dada a dificuldade de marcar diferenças relativamente à concepção europeia, tanto o PSD como o CDS fustigam o PS com questões relacionadas com a execução das políticas comunitárias e com típicas questões de política interna. E o candidato do PS é sistematicamente batido neste tipo de debate, não tendo até hoje sido capaz de encontrar um espaço próprio de afirmação política.
Ele não cativa à esquerda, nem seduz a direita. Não consegue desligar a actual crise dos fundamentos neoliberais em que assenta a construção europeia, nem passar com convicção a mensagem de que o futuro político da Europa se afastará do neoliberalismo, tal a veemência com que defende o Tratado de Lisboa. É um candidato que precisa manifestamente do auxílio partidário para se livrar do naufrágio.
Mais difícil será prever em que medida tanto o PCP como o BE poderão, na defesa de Europas alternativas, capitalizar o descontentamento popular gerado pela crise. Uma vez que essa parece claramente ser a estratégia do PSD e do CDS: beneficiar do descontentamento sem questionar a Europa.

MÁRIO SOARES NOS PRÓS E CONTRAS


A “IMPLOSÃO DO NEOLIBERALISMO”


Mário Soares interveio ontem com muita vivacidade nos Prós e Contras. Vê-se que está animado e esperançado com o futuro do mundo. Principalmente, com as mudanças que podem chegar da América. Relativamente à Europa e aos europeus, mantém o cepticismo que nos últimos anos o tem acompanhado.
No essencial, toda a gente que pugna pelo progresso da humanidade estará de acordo com este ponto de vista. Obama suscita muita mais esperança do que qualquer político europeu.
Daqui para a frente é que surgem as diferenças. Soares agora, como sempre durante toda a sua vida política, continua a acreditar que as grandes mudanças decorrem da chegada ao poder de homens excepcionais. Evidentemente, que é preferível ter na governação gente excepcional, clarividente, ousada, sinceramente dedicada e devotada à comunidade do que políticos de vistas estreitas, receosos, que passam o dia fazer contas como se estivessem a governar a cozinha de uma casa. Mas daí a supor-se que as grandes mudanças decorrem deles, vai uma grande diferença.
É preciso muito mais do que isso. É preciso que haja movimentos sociais poderosos, sejam eles estimulados por quem governa, ou destinados a estimular quem governa, para que as verdadeiras mudanças realmente ocorram. E isso é o que infelizmente se não vê. O que se vê é a tentativa de saída da crise por aqueles mesmos que a geraram. O que se vê é a tentativa de restaurar o sistema o mais rapidamente possível, sem curar das causas profundas que estão na origem da crise que o afecta.
É por isso muito precipitado dizer que nestes últimos vinte anos assistimos à implosão do comunismo e do neoliberalismo. Ou que assistimos à queda de dois muros: ao de Berlim e ao da rua do muro (Wall Street).
Realmente, o neoliberalismo não implodiu, nem as medidas que eventualmente venham a ser tomadas na sequência do G20 ou pelas principais potências económicas têm em vista acabar com o neoliberalismo. Elas destinam-se apenas a retocar alguns dos aspectos mais grosseiros do capitalismo actual.
Fala-se de regulamentação, por exemplo. Mas quando se fala de regulamentação não estamos todos a falar do mesmo. A regulamentação que porventura será posta em prática (se for…) irá muito provavelmente dizer respeito aos bancos de investimento, que na América passaram a desempenhar uma actividade, não regulada, semelhante à dos bancos comerciais. E talvez também a um maior controlo dos produtos financeiros, nomeadamente dos derivados. E nada mais do que isto.
E quando se fala de off shores também não estamos todos a falar da mesma coisa. O mais que se poderá avançar é no sentido da identificação da proveniência dos fundos e da sua movimentação. Ou seja, resolver (se se resolver) alguns problemas do foro criminal ou fiscal.
Quanto ao mais, o capitalismo financeiro e a liberalização do mercado de capitais, logo que se recupere da crise, continuarão a existir com a mesma pujança e com a mesma capacidade especulativa de agora. E que ninguém se esqueça: o capitalismo financeiro é que é o verdadeiro sangue arterial do neoliberalismo!

O GESTO DE GOMES CANOTILHO



APRESENTAÇÃO DO LIVRO DE PAULO RANGEL



Pode ter causado algum espanto, a presença de Gomes Canotilho na apresentação do livro de Paulo Rangel, em plena campanha eleitoral para o Parlamento Europeu, conhecendo-se o apoio que o constitucionalista tem prestado ao PS nas Novas Fronteiras e a amizade e cumplicidade de muitas décadas com Vital Moreira.
Qualquer que seja o valor intrínseco do livro de Rangel - e tê-lo-á seguramente, de outro modo Canotilho não estaria lá – ninguém será ingénuo ao ponto de supor que a sua apresentação nesta altura se não insere na campanha eleitoral em curso, mesmo que a dita apresentação já estivesse marcada antes de Rangel saber que iria ser candidato. E é provavelmente o que deve ter acontecido.
Entre profissionais da política, seria perfeitamente normal, face a uma tão “radical alteração das circunstâncias”, que o apresentador comprometido com a prática do acto se escusasse agora a praticá-lo para evitar qualquer tipo de conotação ou aproveitamento político.
Acontece que Gomes Canotilho não é um político, nem deve nada à política. É o que sempre foi: um estudioso, um brilhante universitário desde sempre ligado aos valores fundamentais da democracia. Por isso, não me custa nada a admitir que a sua presença como apresentador do livro de Rangel tenha exclusivamente a ver com alguma admiração intelectual pelo autor, eventualmente também amizade. Subjacente a tudo isto, porventura inconscientemente, a convicção de que não há entre os dois candidatos do Bloco Central nenhuma diferença programática séria.

REGRESSAMOS



QUASE TRÊS SEMANAS DEPOIS

Afastado dos assuntos nacionais há cerca de três semanas, a muitos fusos horários de distância, lá bem perto da “swine flu” – apesar de o meu amigo JVC, grande especialista na matéria, não se cansar de explicar que ela nada tem de suíno – só a pouco e pouco me vou inteirando do que entretanto aconteceu.
Houve a entrevista do PM, o discurso do PR, a entrevista de MFL e os primeiros debates entre os candidatos ao Parlamento Europeu. Para dizer a verdade, nada de muito novo ou diferente do esperado.
Cavaco dá conselhos, envia recados, fala da “nossa democracia”, mas verdadeiramente nada tem de novo e de importante para nos dizer. Insiste na dívida, descreve algumas consequências da crise, ensaia dar-nos algumas lições de moral (sobre quanto gastar nas eleições, sobre que falar nos debates eleitorais e outras banalidades do género), mas percebe-se, ao ouvi-lo, que ele tem da democracia e das origens da crise uma visão muito limitada.
Será que Cavaco, ao menos como economista, ainda não compreendeu que uma das principais causas da crise eclodida nos países ricos é a terrível desigualdade na distribuição de rendimentos que levou o capitalismo a estimular permanentemente a procura mediante o recurso ao endividamento pessoal e familiar? A título de exemplo, falando apenas da América: a dívida privada das famílias americanas com cartões de crédito atingiu, em 2007, 900 mil milhões de dólares! Ou seja, o dobro da existente dez anos antes. E a dívida das famílias, no seu conjunto, passou de 46% do PIB em 1979 para 98% em 2008! E por ai fora nos demais países…
E no que respeita à democracia, mais do que palavras, o que interessa é praticá-la diariamente…
Ferreira Leite, na entrevista de ontem à noite ao inefável Crespo - agora também prefaciador encomiástico de um dos grandes expoentes do neoconservadorismo (Robert Kagan) -, mais uma vez nos deixou a ideia de que ainda não compreendeu a crise em que o mundo está atolado, e continua a falar de economia e do país como se estivesse a tratar de economia doméstica numa perspectiva estreitamente pequeno-burguesa.
A entrevista de Sócrates, para dizer a verdade, não tive paciência para a procurar na internet. Sei que falou em cada um pedalar sua própria bicicleta – preocupação saudável, em termos ambientais -, que não resistiu a insurgir-se contra a TVI das sextas-feiras – o que é mau, como se verá – e outras coisas do género…
Houve também o 17 de Abril – 40 anos, como o tempo passa! – e o 25 de Abril – 35 anos…
Um dia destes falarei das duas datas…

sexta-feira, 10 de abril de 2009

SAAKASHVIL RESPONDE PELO SEU AVENTUREIRISMO




QUEM O SALVA?


Está cada dia mais difícil a vida para o ainda Presidente da Geórgia. A oposição concedeu-lhe 24 horas para se demitir e abandonar o país.
Saakashvil, acossado, esquece temporariamente a arrogância com que tem governado e apela ao diálogo.
Acusado de vencer as últimas presidenciais com fraude eleitoral e responsabilizado por ter envolvido a Geórgia numa aventura sem sentido, quando resolveu atacar as tropas russas na Abkasia e na Ossétia do Sul, Saakashvil espera que os seus amigos ocidentais o salvem.
Depois das mudanças ocorridas em Washington, fica-se com a impressão, não obstante uma certa retórica, que seria com algum alívio que a nova administração encararia a sua substituição por alguém mais consensual. Do lado do eixo franco-alemão também não se esperam grandes solidariedades, pois se nem durante a guerra a defesa foi muito convincente, menos ainda o seria agora. Sobram-lhe o Reino Unido, que não actuará contra a vontade de Washington, os bálticos, a Polónia e Viktor Yushchenco, que sem o apoio americano não contam nada.

UM TEXTO QUE O MINISTRO DA DEFESA DEVERIA CONHECER



SOBRE AS CAMPANHAS NO AFEGANISTÃO


Se o Ministro da Defesa conhecesse este texto, escrito há mais de cem anos, talvez fosse mais comedido no entusiasmo que manifestou a propósito da guerra no Afeganistão e das hipóteses de sucesso da NATO/USA.
Os ingleses estão experimentando, no seu atribulado império da Índia, a verdade desse humorístico lugar-comum do século XVIII: “A História é uma velhota que se repete sem cessar”.
O Fado ou a Providência, ou a Entidade qualquer que lá de cima dirigiu os episódios da campanha do Afeganistão em 1947, está fazendo simplesmente uma cópia servil, revelando assim uma imaginação exausta.
Em 1847 os Ingleses, “
por uma Razão de Estado, uma necessidade de fronteiras científicas, a segurança do império, uma barreira ao domínio russo da Ásia…” e outras cousas vagas que os políticos da Índia rosnam sombriamente retorcendo os bigodes – invadem o Afeganistão, e ai vão aniquilando tribos seculares, desmantelando vilas, assolando searas e vinhas: apossam-se, por fim, da santa cidade de Cabul; sacodem do serralho um velho emir apavorado; colocam lá outro de raça mais submissa, que já trazem preparado nas bagagens, com escravas e tapetes; e logo os correspondentes dos jornais têm telegrafado a vitória, o exército, acampando à beira dos Arroios e nos vergeis de Cabul, desaperta o correame, e fuma o cachimbo da paz…Assim é exactamente em 1880.
A esse tempo, precisamente como em 1847, chefes enérgicos, Messias indígenas, vão percorrendo o território, e com os grandes nomes de Pátria, de Religião, pregam a guerra santa: as tribos reúnem-se, as famílias feudais correm com os seus troços de cavalaria, príncipes rivais juntam-se no ódio herético contra o estrangeiro,
o homem vermelho, e em pouco tempo é um rebrilhar de fogos de acampamentos nos altos das serranias, dominando os desfiladeiros que são o caminho, a entrada da Índia…E quando por ali aparecer, enfim, o grosso do exército inglês, à volta de Cabul, atravancado de artilharia, escoando-se espessamente por entre gargantas das serras, no leito seco das torrentes, com as suas longas caravanas de camelos, aquela massa bárbara rola-lhe em cima e aniquila-o.
Foi assim em 1847, é assim em 1880. Então os restos debandados do exército refugiam-se em algumas das cidades da fronteira, que ora é Gasnat ora Candaar: os afegãos correm, põem o cerco, cerco lento, cerco de vagares orientais: o general sitiado, que nessas guerras asiáticas pode sempre comunicar, telegrafa para o viso-rei da Índia, reclamando com furor
reforços e chá e açúcar! (isto é textual; foi o general Roberts que soltou há dias esse grito de gulodice britânica; o inglês sem chá bate-se frouxamente.) Então o governo da Índia, gastando milhões de libras, como quem gasta água, manda a toda a pressa fardos disformes de chá reparador, brancas colinas de açúcar, e dez ou quinze mil homens. De Inglaterra partem esses negros e monstruosos transportes de guerra, arcas de Noé a vapor, levando acampamentos, rebanhos de cavalos, parques de artilharia, toda uma invasão temerosa…Foi assim em 47, assim é em 1880.
Este hoste desembarca no Industão, junta-se a outras colunas de tropa índia, e é dirigida dia e noite sobre a fronteira em expressos a quarenta milhas por hora, daí começa uma marcha assoladora, com cinquenta mil camelos de bagagens, telégrafos, máquinas hidráulicas, e uma cavalgada eloquente de correspondentes de jornais. Uma manhã avista-se Candaar ou Gasnat – e num momento, é aniquilado, disperso no pó da planície o pobre exército afegão com as suas cimitarras de melodrama e as suas veneráveis colubrinas de modelo das que outrora fizeram fogo em Diu. Gasnat está livre! Candaar está livre! Hurra!- Faz-se imediatamente disto uma canção patriótica; e a façanha é por toda a Inglaterra popularizada numa estampa, em que se vê o general libertador e o general sitiado apertando –se a mão com veemência, no primeiro plano, entre cavalos empinados e granadeiros belos como Apolos, que expiram em atitude nobre! Foi assim em 1847; há-de ser assim em 1880.
No entanto, em desfiladeiro e monte, milhares de homens que ou defendiam a pátria ou morriam pela fronteira científica lá ficam, pasto de corvos – o que não é, no Afeganistão, uma respeitável imagem de retórica: aí são os corvos que nas cidades fazem a limpeza das ruas, comendo as imundícies, e em campos de batalha purificam o ar, devorando os restos das derrotas.
E de tanto sangue, tanta agonia, tanto luto, que resta por fim? Uma canção patriótica, uma estampa idiota, nas salas de jantar, mais tarde uma linha de prosa numa página de crónica…
Consoladora filosofia das guerras!
No entanto a Inglaterra goza por algum tempo a “grande vitória do Afeganistão” – com a certeza de ter de recomeçar daqui a dez ou quinze anos; porque nem pode conquistar ou anexar um vasto reino, que é grande como a França, nem pode consentir, colados à sua ilharga, uns poucos de milhões de homens fanáticos, batalhadores e hostis. A “
política
” portanto é debilitá-los periodicamente, com uma invasão arruinadora. São as fortes necessidades de um grande império. Antes possuir apenas um quintalejo, com uma vaca para o leite e dois pés de alface para as merendas de Verão…”

O autor deste texto é José Maria Eça de Queiroz, in Cartas de Inglaterra - um génio. O outro, o do Público, é de Severiano Teixeira…

AFEGANISTÃO: UMA NOVA OPORTUNIDADE?



A OPINIÃO DE SEVERIANO TEIXEIRA OU DO MINISTRO DA DEFESA?



Na passada 5.ª feira o Ministro da Defesa publicou um artigo no jornal “Público”, intitulado “Uma nova oportunidade”.
Nele o autor diz: “Os militares portugueses estarão presentes na ISAF, sem caveats que prejudiquem o seu emprego como forças combatentes, porque a fronteira de segurança nacional está no Afeganistão” (sic). E acrescenta que o nosso compromisso com a NATO “implica um reforço significativodas forças portuguesas no ISAF.”
A primeira coisa que ocorre perguntar é se trata de um artigo de opinião de Severiano Teixeira sobre a “relação transatlântica” e a guerra no Afeganistão, ou se se trata antes de uma comunicação do Ministro da Defesa sobre como vai evoluir a posição de Portugal relativamente àqueles dois temas.
Assunto que não é de importância menor, nomeadamente no que respeita ao Afeganistão, por várias razões:
Em primeiro lugar, ainda há bem pouco tempo o Ministro dos Negócios Estrangeiros, em resposta a uma jornalista que o confrontava com um menor esforço de Portugal naquele teatro de guerra, respondeu que haveria uma mudança da natureza da missão, mas que se manteria o mesmo esforço;
Em segundo lugar, o Primeiro-ministro ainda não anunciou, nem à opinião pública, nem ao Parlamento, qualquer modificação significativa da presença portuguesa no Afeganistão;
Finalmente, este é um daqueles temas em que o Presidente da República tem, constitucionalmente, uma importante palavra a dizer; será que ele já a disse?
Tudo aponta, portanto, no sentido de se tratar de uma opinião de Severiano Teixeira. De alguém que, não obstante as funções que desempenha, não é capaz de fazer calar a profunda admiração pela política de um país estrangeiro, pela NATO e pela “relação transatlântica”.
E nem sequer lamenta que esse mesmo país, cuja política embevecidamente ele admira, ainda há bem pouco tempo tenha sobrevoado o território nacional e nele feito escala com pessoas raptadas a caminho de um campo de concentração sem sequer ter tido a cortesia de informar o Governo português do que estava a acontecer, contrariamente ao que sucedeu, por exemplo, com a Espanha, que está muito longe, como se tem visto, de lhe dedicar idêntico entusiasmo.
Agora, como em Roma, o Império sabe bem como tratar os incondicionais…

LEGÍTIMAS DÚVIDAS SOBRE O PAPEL DO PS NO COMBATE À CORRUPÇÃO




PS: UM PARTIDO COM MUITAS RETICÊNCIAS



O último debate parlamentar com o primeiro-ministro deixou novamente muitas dúvidas sobre a disponibilidade do PS para lutar contra a corrupção. Curiosamente, o PSD continua a afirmar-se disponível para criminalizar o enriquecimento ilícito, enquanto o PS vai defendendo a tese de que já há no ordenamento jurídico português vários tipos legais de crime contemplando as diversas situações por via das quais se pode enriquecer ilegitimamente, pelo que não se justifica a criação de um tipo autónomo, que além do mais se debate com problemas jurídicos complicados, como a inversão do ónus da prova.
Descodificando: o que o PS quer dizer é que quem se for “safando” dos vários tipos legais de crime que punem a corrupção, o tráfico de influência, a participação económica em negócio, etc., não deve ser incomodado, mesmo que entre o seu património e os seus rendimentos lícitos não haja qualquer correspondência. O PS lá sabe…
Quanto ao crime de corrupção, continua a polémica entre os que defendem a equiparação da corrupção por acto lícito à corrupção por acto ilícito e os que defendem que se deve manter a distinção, punindo mais fortemente a corrupção por acto ilícito.
À medida que o tempo passa vou firmando a convicção de que deve haver distinção entre as duas situações, embora no sentido exactamente oposto ao defendido pelo PS. A corrupção por acto lícito, tendo quase sempre por pressuposto o exercício do poder discricionário, é muito mais frequente, mais difícil de investigar e mais insidiosa por partir muitas vezes do corrompido. Por isso, ela deve ser mais severamente punida. Pelo contrário, a corrupção por acto ilícito, tendo na ilicitude do acto um sinal inequívoco de que algo não vai bem, acaba por ser menos frequente, tem a investigação mais facilitada e justifica menos a necessidade de prevenção. Por isso, não há necessidade de agravar a pena.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

PT: UMA EMPRESA QUE ME EXIGE INDEVIDAMENTE DINHEIRO HÁ 20 ANOS



UMA SITUAÇÃO INADMISSÍVEL


Tenho, numa residência secundária, um telefone da PT há mais de 20 anos . Com excepção do mês de Agosto, irei, em média, uma vez por mês a essa residência. Sempre ou quase sempre que lá me desloco, o telefone está avariado. Protesto, reclamo e, sem excepção, a avaria nunca é reparada enquanto eu lá estou. E até já aconteceu a avaria ter levado meses a reparar, apesar de comunicada logo que detectada. E isto passa-se regularmente há anos, sem que a PT tenha tido até hoje a menor preocupação em resolver a situação ou em ressarcir-me dos prejuízos sofridos.
Uma vez, magnânima, a PTdevolveu-me na factura cerca de 3 euros para me compensar. Eu nunca consigo fazer a prova que o telefone está avariado desde uma data anterior. Eu somente consigo provar que o telefone não funciona quando o quero usar. E a PT sente-se assim "legitimada" para não me devolver o que indevidamente me cobrou por um serviço que não me prestou.
Obviamente que não mantenho esta situação por masoquismo. Mantenha-a porque eu preciso do telefone para ter internet. E como nenhuma das outras companhias opera no lugar, apesar de se situar numa das zonas mais turísticas do país, tenho de continuar com a PT...que regularmente me engana.
O que me aconteceria, a mim ou a qualquer outra pessoa, se cobrasse regularmente um serviço que não presto? Iria de certeza para a cadeia. Tem de haver um tipo legal de crime para esta situação!

quarta-feira, 8 de abril de 2009

A FALSA LUTA CONTRA O NEOLIBERALISMO



A CONVERSA E A PRÁTICA


A esquerda do PS, tanto a filiada no partido como a chamada “independente”, logo que a crise financeira começou a ganhar os contornos que hoje tem, passou a fazer um discurso contra o neoliberalismo sem que, com o andar dos tempos, se vislumbre qualquer correspondência entre a palavra e a acção.
No fundo, não andou muito longe do Secretário Geral, um homem do centro, moderno e moderado, como ele se auto-intitula, que, mal se apercebeu de um clima politicamente favorável àquele tipo de discurso, não teve qualquer pejo em no Parlamento o adoptar com o mesmo à vontade com que antes defendera o seu contrário.
O pior é que tanto num caso como noutro não há qualquer correspondência entre as palavras e os actos. O PM continua a governar do mesmo modo e para o mesmo fim, agora apenas sem qualquer preocupação pelo aumento da dívida, certo de que, quando chegar a hora de a pagar, será aos mesmos de sempre que ele (ou quem lá estiver) vai exigir o dinheiro e os sacrifícios.
Os outros, a tal esquerda que esboça protestos nos jornais quase sempre ao que já aconteceu e quase nunca para impedir que se consume o que vai acontecer, assiste passivamente às manifestações de neoliberalismo do governo…sem qualquer protesto.
Referimo-nos como é óbvio a essa operação ruinosa que vai ser a privatização da ANA e a construção de um aeroporto que não faz falta. Aqueles que clamam contra o excesso de privatizações, que acusam o neoliberalismo de querer despojar o Estado de qualquer papel na economia, enfim, aqueles como Mário Soares e Manuel Alegre que se referem abstractamente a estas questões, como se elas existissem em consequência de um desígnio providencial, têm aqui uma boa ocasião para travar dentro do PS uma luta que o impeça de levar à prática mais este atentado contra o Estado português.
Provavelmente, protestarão mais tarde, sempre contra um sujeito invisível, autor nefasto de acontecimentos de geração espontânea, quando já não há nada a fazer, e entretanto entretêm-se com o apoio ou o desapoio à candidatura de Durão Barroso!

A CANDIDATURA DE DURÃO BARROSO: GUERRAS DE ALECRIM E MANJERONA



UMA QUESTÃO MENOR


A dita esquerda do PS já encontrou um outro motivo com que “entreter a malta” durante uns tempos. Como sempre, batem-se apenas vocalicamente e por questões menores. Que à frente da Comissão Europeia esteja Durão Barroso ou um qualquer socialista das muitas centenas que há na Europa exactamente iguais a Durão Barroso é rigorosamente indiferente para a esquerda.
E, salvo o devido respeito pela opinião contrário, acho que esta é uma guerra que a esquerda não deveria comprar. O apoio ou não a Durão Barroso é uma questão de família entre o PS e o PSD. Eles querem a mesma Europa, defendem os mesmos princípios, lutam pela ratificação dos mesmos tratados, enfim, são apoiantes da mesma política europeia. A questão Durão Barroso é apenas um pretexto para parecer que são diferentes e para distrair as atenções do essencial. Para não terem de se confrontar com a mudança que os europeus reclamam e a que eles não estão em condições de dar resposta.

GRANDE PORTO


ASSIM DÁ GOSTO VER JOGAR

Num país futebolístico onde o Sporting permanentemente se queixa dos árbitros, exercendo obre eles uma enorme pressão com a intenção de dela tirar indiscutíveis vantagens (como Dias da Cunha ainda hoje reconheceu), e externamente é copiosamente batido por números próprios de um jogo de andebol; e onde o pobre e triste Benfica não passa de uma relíquia mirrada, ao qual tudo acontece desde dirigentes incompetentes e broncos a treinadores de flamengo metamorfoseados em treinadores de futebol, emerge o FCP como grande equipa europeia já hoje senhor de uma tradição que indiscutivelmente o coloca como a mais prestigiada equipa de futebol portuguesa de todos os tempos.
Grande jogo do Porto em Old Traford. Ao nível dos melhores de sempre da Liga dos Campeões.
Sim, eu sei que a “acumulação primitiva” do Porto é muito parecida com a “acumulação primitiva” do capital. Mas que se há-de fazer? Não vivemos em regime capitalista?
Que pena que os dirigentes máximos do FCP não aceitarem a aleatoriedade do futebol!

segunda-feira, 6 de abril de 2009

OS CANDIDATOS DO PS AO PARLAMENTO EUROPEU E DURÃO BARROSO



DEMAGOGIA E MÁ CONSCIÊNCIA


Como aqui tínhamos previsto, a candidatura de Durão Barroso à Presidência da Comissão Europeia iria necessariamente “cruzar-se” com a campanha do PS para as europeias.
Sócrates, numa crise de honestidade, disse que o seu partido apoiaria Durão Barroso, e que a candidatura deste não era uma candidatura do PPE, mas do Conselho Europeu.
Entretanto, os candidatos do PS que já se exprimiram sobre o assunto não podem deixar de fazer o seu “número”. Uns por razões manifestamente pessoais, atacam Durão Barroso por princípio, outros, por razões políticas, querem distanciar-se dele durante a campanha eleitoral para o Parlamento Europeu para não dar trunfos à esquerda. E pedem o auxílio de Mário Soares que lá vem lembrar a guerra do Iraque e as amizades com Bush, enfim, episódios que nada tem a ver com a prestação de Barroso à frente da Comissão, embora tenha sido obviamente por força deles que ele para lá foi.
O que seria interessante é que os candidatos do PS dissessem ao eleitorado que actos de Durão Barroso, como Presidente da Comissão Europeia, eles não apoiaram. À parte o episódio da constituição inicial da Comissão (que começa por ser da responsabilidade dos Estados Membros), que indiquem um em que tenham estado em desacordo. Um único!
Raia a demagogia mais caricata os candidatos do PS dizerem que querem substituir Durão Barroso para acabar com o neoliberalismo na Europa e outras tiradas do género. A verdade é muito outra: a Europa que temos é a Europa que o PS e PSD, na mesma medida e com o mesmo empenho, ajudaram a construir com outros que pensam como eles ou que pensam por eles e que eles apoiam!

domingo, 5 de abril de 2009

AGORA É LARRY SUMMERS

MAIS UM LIGADO A WALL STREET


É praticamente impossível na América constituir uma equipa económica sem ligações a Wall Street.
Antes de Obama sequer estar designado pelo Partido Democrático logo aqui dissemos que a nomeação do Secretário de Estado do Tesouro e equipa económica do Presidente constituíam a verdadeira prova de fogo de qualquer administração. Alguns chegaram a admitir que o actual contexto – uma crise provocada pelas acções de rapina do capital financeiro – facilitaria a nomeação de uma equipa mais distanciada. Puro engano.
Agora é Larry Summers, que já foi Secretario do Tesouro de Clinton, e é conselheiro económico de Obama, que recebeu vultosas quantias de um fundo de risco, onde foi director executivo, e mais uns tantos milhões por conferências, pagos por companhias de Wall Street , que receberam ajuda do governo. Entre elas J.P. Morgan, Citigroup, Godman Sachs, Lehman Brothers.
Para quem se comprometeu a fechar a porta aos lobbbies na Casa Branca, a designação de Summers não pode deixar ter-se como um trunfo do capital financeiro, independentemente de ele alguma vez ter estado registado como lobbista

INVENTÁRIO DAS MEDIDAS DE COMBATE À CRISE

A AVALIAÇÃO QUE SE IMPÕE


Desde que a crise financeira se começou a manifestar entre nós e depois se transformou numa crise económico-financeira-social, o Governo tem-se desdobrado em anúncios de medidas destinadas a combatê-la.
Passados que são vários meses, impõe-se que alguém com legitimidade – o Parlamento, por exemplo – peça ao Governo o inventário de todas as medidas adoptadas nos diferentes domínios – financeiro, social, económico, etc. –, o seu estado de execução, acompanhamento e avaliação sumária dos efeitos esperados.
Este inventário teria vantagens a vários títulos:
Em primeiro lugar, permitiria conhecer com exactidão a verdadeira extensão daquelas medidas (é que a gente, em vão, as procura no DR e não as encontra);
Em segundo lugar, permitiria conhecer o seu estado de execução e que acompanhamento têm tido (se as medidas foram adoptadas, mas não têm sido executadas de nada valem; por outro lado, se não houver um acompanhamento criterioso, elas prestam-se a todo o tipo de abusos);
Em terceiro lugar, permitiria fazer uma primeira avaliação dos resultados esperados (se realmente têm contribuído para manter o emprego; se as empresas que delas beneficiam têm tirado vantagens empresariais; enfim, se por via delas se tem distorcido a concorrência).
Deixar isto para os resultados de fim de ano não parece uma boa politica...para ninguém.


AINDA HÁ DEMOCRATAS EM ISRAEL



UM INTERESSANTE ARTIGO DE AMNON KAPELIOUK


Pela leitura deste interessante artigo de Kapeliouk , jornalista e escritor israelita, fica-se com uma imagem muito fiel do que é hoje Israel.

UM EXEMPLO TÍPICO DE NEOLIBERALISMO



A PRIVATIZAÇÃO DA ANA
E A CONSTRUÇÃO DO NOVO AEROPORTO

Para os que duvidam que o neoliberalismo exista entre nós ou para os que teimam em nos demonstrar que ele não existe, aqui vai mais um grande exemplo.
O Governo quer tornar irreversível o mais rapidamente possível a construção do novo aeroporto de Lisboa. É essa a razão que leva o Ministro das Obras Públicas, praticamente em cima das eleições, a lançar a primeira fase do concurso para a construção do novo aeroporto de Lisboa e para a privatização da ANA- Aeroportos de Portugal.
Não vamos agora discutir a sua necessidade – toda a gente sabe que não faz falta tão cedo; não vamos considerar a sua eventual importância para a TAP – a TAP até pode já nem existir à data da sua entrada em funcionamento; não vamos igualmente considerar a enorme pressão que as grandes empresas de construção civil fazem para que haja obra – as obras não existem para assegurar a existência de empresas de construção civil, as empresas de construção civil é que existem para fazer obras; não vamos tão-pouco considerar o impacto de uma obra desta envergadura sobre o emprego – pode ser muito inferior ao que se anuncia ou pode mesmo ter um efeito relativamente reduzido no relançamento da procura.
Vamos supor que a obra é necessária e altamente rentável, como em princípio são os grandes aeroportos das principais capitais. Vamos supor que as coisas são como o Governo nos diz que são.
Assim sendo, a primeira dúvida que um vulgar cidadão teria seria a seguinte: se o empreendimento é tão necessário e tão rentável por que não fica o Estado com a sua exploração e suporta os ónus da sua construção, como tem feito, através da ANA, em todos os demais casos?
Aí o Governo responde-nos: esse modelo não é possível, porque o Estado não tem recursos financeiros disponíveis para o investimento. E a gente volta a perguntar: por que não os obtém no mercado internacional, tal como seguramente vão fazer os que vierem a ficar com o encargo da construção e as vantagens da exploração? E o Governo vai seguramente responder-nos: Isso não se pode fazer, porque segundo as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento há limites ao endividamento estadual.
Bem, vamos fazer de conta que aceitamos esta resposta, embora a gente saiba que há, na na zona euro, Estados com altíssimas percentagens de endividamento. E vamos ainda fazer de conta que esse endividamento não seria amortizado em prazos relativamente rápidos, apesar da alta rentabilidade do negócio, se o aeroporto for de facto tão necessário como dizem que é. E vamos por fim fazer de conta que o Governo, no negócio que vier a fazer com os privados, não vai fazer o Estado português assumir vários riscos e inclusive garantir partes essenciais dos financiamentos por eles contraídos, como aconteceu com a Lusoponte e outras famosas “parcerias”.
Neste contexto, assim expurgado de todas as dúvidas, um consórcio provavelmente constituído por várias empresas portuguesas de construção civil, que se tenha candidatado à privatização da ANA e saído vencedor do respectivo concurso, ficará com o encargo de construir as infra-estruturas do novo aeroporto, cuja exploração lhe será dada em concessão por um determinado número de anos (não se sabe quantos), entrando o Estado neste negócio com o valor da ANA (como se vai determinar o valor da ANA sabe-o o Governo) e com as ajudas comunitárias a que tem direito para a construção do aeroporto.
Vamos supor que a entidade que sucede à ANA na gestão e exploração do aeroporto fica com um objecto de negócio semelhante ao que agora aquela empresa tem. Ou seja, com a gestão e exploração de todos os aeroportos nacionais, embora na Madeira exista uma empresa autónoma da ANA, ela é por esta dominada em mais de 90%. Portanto, para os efeitos que aqui se tem em vista, pode dizer-se que haveria uma gestão integrada de todos os aeroportos nacionais (3 no continente, 2 na Madeira e 5 nos Açores).
A ANA tem sido altamente lucrativa, apesar de nem todos os aeroportos o serem. A gestão integrada de vários aeroportos permite colmatar os prejuízos de alguns deles e terminar os exercícios sempre com grandes lucros.
A construção do novo aeroporto traduzir-se-ia assim num grande negócio para os privados e na privação de uma importante fonte de receita para o Estado. Dir-se-á que só assim será no primeiro período da concessão. Nos subsequentes tudo seria diferente…Enfim, se a gente nem sequer é capaz de prever, com alguma exactidão, o que se vai passar neste primeiro período, seria certamente muito arrojado supor o que se vai passar depois. A gente nem sequer faz ideia do número de anos por que a concessão vai ser concedida; que tipo de contas vão ser feitas para calcular esses anos; a que ritmo vai ser reembolsado o capital investido; como vai ser calculada a remuneração desse capital. Enfim, a gente não sabe praticamente nada, embora saiba, pelas experiências passadas, que se o negocio se fechar, como certamente vai acontecer, é porque ele será bom para os privados.
Mas há mais dúvidas. Os jornais têm noticiado com alguma insistência o interesse de empreendedores homens do Norte na exploração do aeroporto Sá Carneiro. Se o Governo ceder a estas pressões – e sabe-se como o Governo, tal como a carne, cede facilmente a tentações nestas matérias – deixa de haver uma gestão integrada dos aeroportos. E, se assim acontecer, é natural que os privados só queiram ficar com os que dão lucro e remetam para a exploração do Estado os que dão prejuízo. Por outro lado, suscita algumas dúvidas o interesse despertado pelo aeroporto do Porto, pois tendo sido nele realizadas importantíssimas obras de ampliação e modernização (verdadeiramente, há uma nova aerogare), é natural que esse aeroporto esteja ainda onerado com pesados encargos financeiros. No caso de privatização do aeroporto do Porto, os laboriosos homens do Norte também ficariam com todos os encargos financeiros actualmente existentes?
Arrisco-me a afirmar que o Governo saberá encontrar para todas estas questões uma resposta verdadeiramente neoliberal. Resposta cujos contornos nunca viremos a conhecer, por o governo seguramente entender que esses excessos de glasnost só nos criam angústias…

sábado, 4 de abril de 2009

O PS E O 25 DE ABRIL

A PROMOÇÃO DE JAIME NEVES A MAJOR GENERAL


A poucos dias do 35.º aniversário do 25 de Abril, nada mais acintoso o Governo PS e as chefias militares poderiam encontrar que a promoção de Jaime Neves a major general.
O PS, este e o de Mário Soares, que tão mal tem tratado os militares genuinamente identificados com o 25 de Abril, mesmo aqueles a quem o PS tanto deve, maculará com a promoção de Jaime Neves a comemoração do 35.º aniversário da Revolução de Abril.
O facto ainda não está consumado, mas a circunstância de o Ministério da Defesa se ter limitado a encará-lo como uma situação normal deixa antever a sua próxima consumação.

A IGREJA PORTUGUESA E O PAPA

VÁRIAS VOZES DISCORDANTES


Não se poderia esperar que a Igreja portuguesa, institucionalmente, desautorizasse o Papa. Só num clima de afrontamento quase “cismático” se poderia esperar tal coisa. Mas seria de esperar – e isso tem acontecido – que diversas vozes, mais corajosas, venham, em nome individual, dizer o que muitos pensam e que, por razões diversas, entendem não o dizer em voz alta.
Contra a alocução papal sobre o uso de preservativos já se manifestaram o Bispo das Forças Armadas e o Bispo de Viseu e agora também o presidente da comissão episcopal da pastoral social, Carlos Azevedo.
Finalmente, a imprensa portuguesa, por intermédio do Público, deu também voz às criticas que no seio da Igreja se fazem ouvir sobre a carta que o Papa dirigiu aos bispos na sequência da polémica gerada pelo perdão concedido aos bispos integristas.
Essa carta, a que aqui já fizemos circunstanciada referência, tem merecido grande contestação de teólogos e outros altos dignitários da Igreja Católica por ser, no mínimo, muito equívoca relativamente ao concílio Vaticano II.
Esta profunda contestação que existe, em larguíssimos sectores da Igreja, relativamente às posições do Papa – e, dentre todas, a desvalorização do Vaticano II é certamente a mais contestada – é um fenómeno novo nas relações da Igreja com o Vaticano. Novo, não porque nunca tenha acontecido, mas novo porque expõe uma polémica entre o Papa e sectores da alta hierarquia eclesiástica que estão muito longe de poderem ser identificados com qualquer tipo de "revolucionarismo".


OBAMA EM STRASBOURG COM A JUVENTUDE

UM ENCONTRO INOLVIDÁVEL


Pode-se dizer que o sistema americano se manterá, no essencial, inalterável. Pode-se descrer da capacidade de Obama para mudar os estigmas mais contestáveis do imperialismo americano. Pode-se dizer muita coisa, mas não se poderá negar a sua inigualável capacidade para criar nas pessoas um sentimento que há muito estava arredado de qualquer discurso politico: o de fazê-las acreditar que é possível mudar e fazer desta terra onde todos vivemos um mundo melhor.
Isso voltou a ser patente ontem, em Strasbourg, no encontro que manteve com milhares de jovens alemães e franceses.
Há muitas décadas que nenhum politico, em qualquer parte do mundo, gozava desta tão profunda identificação com os anseios populares.

RASMUSSEN: UMA ESCOLHA POLÉMICA

A POSIÇÃO AMERICANA

Sem grande entusiasmo da nova administração americana, Anders Fog Rasmussen acabou por ser escolhido para Secretário Geral da NATO.
Rasmussen, o homem da “flexissegurança” e do “socialismo” neoliberal, tem uma relação difícil com os muçulmanos e não gozava do apoio da Turquia. Interessado em melhorar a relação com o mundo muçulmano, Obama, ao que se diz, terá hesitado, acabando, todavia, por aceitar a escolha dos europeus, patrocinada por Paris e Berlim.
Mais importante do que a escolha do Secretario Geral, seria para ele o apoio à sua política no Afeganistão e a criação de um novo clima de entendimento da NATO com a Rússia, para o qual contaria principalmente com o apoio da França, da Alemanha, da Itália e a da Espanha.

A NATO E O PENSAMENTO NEOCONSERVADOR


QUE MUDANÇAS COM A NOVA ADMINISTRAÇÃO?

Desde Reagan, salvo os 4 anos de Bush pai, que a política externa americana apresenta características muito comuns, independentemente de a administração ser republicana ou democrática. As diferenças porventura existentes são mais tributárias do contexto internacional em cada momento existente do que propriamente dos princípios que a informam.
A política realista que atingiu o seu auge com Nixon/Kissinger foi, a partir de Reagan, substituída pelo pensamento neoconservador que prescreve princípios completamente diferentes dos até então seguidos. Bush pai, formado na velha escola realista da política externa americana, apesar de ter sido Vice-presidente de Reagan durante oito anos, manteve-se sempre mais perto dos velhos princípios do que do novo pensamento que começava a dominar, das universidades à administração, a vida política e intelectual americana. O fim da guerra fria, na América muito associado à política de Reagan, permitiu uma expansão sem precedentes do pensamento neoconservador.
O pensamento neoconservador está, contudo, longe de ser uma novidade, embora tenha adquirido um novo fulgor na década de 80 e se tenha depois consolidado doutrinalmente na década seguinte.
A sua génese é normalmente associada ao grupo de intelectuais judeus que na segunda metade dos anos 30 até ao começo de 40 frequentou o City College of New York (CCNY). É um grupo constituído por Irving Kristol, Daniel Bell, Seymour Martin Lipset, Irving Howe, Nathan Glazer, Philip Selznick e Daniel Patrick Moynihan. Trata-se de gente oriunda da classe trabalhadora, ligadas a meios de imigração recente, que frequentavam o CCNY por não terem dinheiro para estudar nas escolas de elite americanas. É gente, nos seus primórdios de esquerda, ligada ou próxima do trotskismo, que, por oposição ao estalinismo, evoluiu para um anticomunismo militante e mais tarde para uma contundente oposição aos meios liberais americanos de esquerda que encaravam com alguma simpatia os objectivos de uma sociedade mais igualitária construída com o apoio do Estado.
Nem todos os membros do grupo evoluíram da mesma maneira ou até no mesmo sentido. Há quem tenha ficado ligado ao Partido democrático, como Daniel Moynihan, e outros, poucos, mantiveram-se numa posição centrista, como Bell e Glazer, embora a maioria tenha caminhado abertamente para a direita. Foi a estes que mais tarde se juntaram novos pensadores, como Leo Strauss, judeu alemão emigrado para os EUA na década de 30 e Albert Wohlstetter, professor de nomes ilustres que mais tarde trabalharam na administração de Georges W. Bush. Mas é já na década de 90 que o filho de Irving Kristol, William Kristol e Robert Kagan, acabarão por dar um contributo muito importante para uma certa coesão do pensamento neoconservador tal com hoje se encontra estruturado.
São quatro as principais ideias norteadoras do pensamento neoconservador:
Em primeiro lugar, a ideia de que a natureza interna do regime influencia decisivamente o seu comportamento externo; se, por um lado, tal ideia significa que um regime não democrático, segundo o ponto de vista americano, acabará sempre por reflectir na sua politica externa a essência do regime, ela significa também, por outro lado, que a política externa das democracias deverá reflectir os valores das sociedades abertas que elas constituem;
Em segundo lugar, a ideia de que o poder americano tem sido e pode ser usado para servir fins morais; os Estados Unidos como potência mundial dominante têm de permanecer envolvidos na política internacional e o seu poder deve e pode ser usado para atingir objectivos morais;
Em terceiro lugar, a ideia de que são de rejeitar todos os projectos de “engenharia social” ou de construção social; esta ideia que tem a sua génese na rejeição do estalinismo estendeu-se depois a todo e qualquer tipo de engenharia social, desde os programas de Combate à Pobreza e a “Grande Sociedade” de Lyndon Johnson, até aos estados de bem-estar social europeus, tanto de origem democrata-cristão, como social-democrata;
Em quarto lugar, a ideia de rejeição, ou, pelo menos, um grande cepticismo em relação à eficácia e legitimidade do direito internacional e das instituições internacionais como instrumentos adequados a garantirem a segurança e a justiça; dai a desconfiança com que encaram as Nações Unidas, o multilateralismo e outras formas de cooperação multilateral, desde que estas se mostrem renitentes ou resistentes a abandonar os velhos princípios.

O conhecimento de tantos episódios da história recente dispensa exemplificações. E tais episódios, como a intervenção da NATO na Jugoslávia, Kosovo incluído, não são exclusivos da administração Bush nem de outros republicanos. Por outro lado, aquando da guerra do Iraque, ficou também claro para os ideólogos da Casa Branca, que a NATO, enquanto aliança militar dominada pelos Estados Unidos, só interessaria como organização multilateral se desse plena satisfação àqueles princípios.
Se igualmente nos recordarmos da concordância (expressa em palavras) de Guterres com a “hegemonia benevolente” ou benigna dos Estados Unidos, ou das declarações de outros socialistas, como Ana Gomes, que abertamente reclamam a intervenção da União Europeia por “razões humanitárias”, isto é, morais, nesta ou naquela parte do mundo ou a sua colaboração na mudança de regimes, ficamos com uma ideia bem aproximada da capacidade de penetração do pensamento neoconservador em muitos daqueles que se consideravam opositores de Bush.
O grande desafio da nova administração americana estará na sua capacidade para romper com o pensamento neoconservador na política externa americana. Tal objectivo constituirá, ninguém duvide, uma ingente tarefa. Há, todavia, alguns sinais positivos que o futuro se encarregará ou não de confirmar. De todos, o mais significativo, é alocução dirigida ao Irão, na qual expressamente se assume que a América não pretende mudar o regime. Ponto de vista absolutamente inaceitável para os neoconservadores. Também os recentes desenvolvimentos quanto à Rússia, que os neoconservadores, como R. Kagan, consideram um regime não democrático, vão no mesmo sentido, embora sejam menos significativos.
A continuação do alargamento da NATO a leste, a questão da Geórgia e da Ucrânia, o escudo anti-míssil na Polónia e a base de radares na República checa serão outros tantos temas que permitirão aferir do alcance das mudanças na administração americana.

A PROPÓSITO DO 60.º ANIVERSÁRIO DA NATO

UM EPISÓDIO QUE CONVÉM AGORA RECORDAR


Pouca gente saberá ou se recordará que em 1955, em Genebra, na primeira reunião, depois da guerra, dos dirigentes máximos dos Estados Unidos, da Grã-bretanha, da França e da União Soviética, se passou um episódio que convém agora recordar.
A reunião, tendo por tema a reunificação da Alemanha, abordou, como não poderia deixar de ser, o papel da NATO, criada há meia dúzia de anos. Nas violentas discussões que então tiveram lugar, Eisenhower, A. Eden e Edgar Faure esforçavam-se por demonstrar que a Aliança Atlântica era uma força de paz, defensiva e que a União Soviética nada tinha a recear da sua existência. A União Soviética, pelo contrário, via na NATO uma forma encoberta de remilitarização da Alemanha Ocidental com vista à absorção da Alemanha Oriental.
É então que, perante a insistência ocidental na natureza pacífica da Aliança, a delegação soviética, composta por N. Khruschev, Bulganin, Molotov, Zhukov e Andrei Gromiko, anunciou que a União Soviética estava disposta a integrar a NATO. Se a sua causa era a da paz, a União Soviética não poderia ficar à margem de tão importante objectivo; queria também fazer parte da aliança atlântica, disse Bulganin, então Presidente do Soviete Supremo.
As delegações ocidentais ficaram sem palavras. Eisenhower trocou umas palavras com Foster Dulles, seu Secretário de Estado, e mudaram de tema. No fim da reunião, Dulles acercou-se de Gromiko e perguntou-lhe: “A União Soviética falava a sério?”. Gromiko respondeu: “ A União Soviética não faz propostas que não sejam a sério, especialmente num forum tão importante como este”. Entretanto, Eisenhower, que passava junto de ambos, agora já com o seu habitual sorriso, disse: ”Devo dizer-lhe, Sr. Gromiko, que estudaremos cuidadosamente a proposta soviética, já que se trata de um assunto muito importante”.
O marechal Zhukov, grande herói da II Guerra Mundial, ainda se avistou com o antigo aliado e camarada de armas, Eisenhower, para desenvolver o tema, mas este, não obstante o passado militar comum na luta contra a Alemanha nazi, não terá passado de algumas generalidades
Nas posteriores reuniões entre os “4 Grandes”, como então se chamavam, o assunto era cuidadosamente evitado ou desviado, sempre que voltava à baila. Misteriosos e enigmáticos sorrisos faziam a conversa deslizar para outros temas, mais cómodos.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

NOVA DERROTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO



O CASO DO ENVELOPE


Mais uma vez, num processo de grande exposição mediática, o MP foi derrotado. Pode ainda reverter a situação, em recurso. Certamente, em teoria pode. Na prática tudo depende do que se apurou neste julgamento.
Antes de finalizado o julgamento em primeira instância ouvimos de tudo um pouco: um juiz aposentado, amigo do principal acusado, disse que 2500 euros era uma verba ridícula para corromper um árbitro; outros disseram que a testemunha que alegadamente presenciara o acto ou nele tinha colaborado não era credível; outros ainda, muito em segredo, que o árbitro que dois dias depois iria arbitrar um jogo da equipa do principal acusado, se tinha dirigido à casa deste para lhe pedir um favor de natureza pessoal.
Não obstante toda esta intimidade, este estreito relacionamento, o MP não conseguiu fazer vingar a sua tese. Não é com derrotas como esta que se constrói o prestígio de uma carreira.

A SEGURANÇA SOCIAL, O PS E O PSD



O MELHOR É NÃO CONFIAR EM NENHUM DELES


O PS tem vindo, nos últimos dias, a desencadear um ataque contra o PSD por causa do regime da segurança social. Diz o PS que o PSD quer privatizar a segurança social e aduz algumas provas documentais sobre o assunto retiradas de anteriores posições do PSD até então não desmentidas. O PSD, agora em vésperas de eleições, já veio negar que queira tal coisa. E considera que se trata de mais uma calúnia do Eng.º Sócrates.
Há cerca de um ano, Luis Amado, Ministro dos Negócios Estrangeiros, e um dos seres pensantes deste governo, disse numa entrevista à Visão. “O Estado deve ser reconfigurado. Depois de corrigido o problema do défice, temos de repensar o Estado no exercício das suas funções, uma a uma. Temos de encontrar um equilíbrio entre as funções de soberania e as funções sociais. Em algumas funções sociais, não vejo qualquer problema em que haja, garantido o sistema público, áreas de actuação privada”.
A que funções sociais se queria referir Luis Amado? Ele não o disse, mas nessas funções cabe perfeitamente a segurança social. Entre aquilo que os partidos ditos de governo dizem em campanha eleitoral e o que fazem depois quando governam vai uma grande distância, como todos, por experiência própria, sabemos. Por isso o mais avisado é não acreditar nem num nem noutro!

quinta-feira, 2 de abril de 2009

DÚVIDAS SOBRE A LEGITIMIDADE DO G20



OS PROGRESSOS DA DEMOCRACIA MUNDIAL



Têm-se levantado dúvidas sobre a legitimidade do G20 para se ocupar dos grandes problemas da economia mundial. O Primeiro-ministro português e o seu Ministro dos Negócios Estrangeiros têm-se feito ecos destas dúvidas e questionado directamente a legitimidade do resultado daquelas reuniões.
Claro que todos preferiríamos que o G20 fosse a emanação formal de uma organização constituída de acordo com os ditames clássicos do direito internacional. Acontece que, não o sendo, o G20 representa um assinalável progresso no caminho da democracia mundial relativamente a tudo o que antes existia.
Sem sequer trazermos à colação as intervenções unilaterais preconizadas pelos neoconservadores americanos, algumas delas apoiadas por alguns que agora contestam o G20, já que aquelas intervenções, pela própria natureza das coisas, não são susceptíveis de aplicação no domínio da economia mundial, sempre se dirá que, no plano económico, uma reunião como a que hoje se realizou em Londres representa um progresso considerável relativamente a tudo o que até agora existia no domínio multilateral.
De facto, o G20, no plano económico, tem mais legitimidade substancial que o Conselho de Segurança das Nações Unidas ou, sem qualquer espécie de dúvida, que as instituições de Bretton Woods, nas matérias das respectivas competências. Um grupo cujos componentes representam mais que 85% da economia mundial e mais de dois terços da população mundial e que, além disso, é constituído por países com níveis muito diferentes de desenvolvimento, com interesses económicos, políticos, geoestratégicos diferenciados, com regimes políticos e sistemas socioeconómicos também distintos, tem – diga-se o que se disser – uma legitimidade acrescida relativamente a tudo o que antes existia. Aliás, só essa legitimidade vai no fundo assegurar a eficácia das suas deliberações.

A CORRUPÇÃO, O MP E O PS



DUAS OU TRÊS NOTAS QUE AJUDAM A CLARIFICAR AS COISAS


O problema da corrupção nas democracias dos nossos tempos está ligado a dois factores que se têm revelado incontornáveis: um é o poder discricionário da administração, o outro é a tomada do aparelho de Estado pelos aparelhos partidários.
O poder discricionário é o tumor maligno da democracia. Isto de quem manda poder, em execução da lei, dizer sim ou não, sendo juridicamente válida qualquer das decisões, faz com que o titular de um poder discricionário seja alguém que, nas sociedades mercantilistas em que vivemos, tenha algo para vender. E quem tem algo para vender, mais tarde ou mais cedo, vai pôr o bem no mercado. Tudo depende do preço. O problema poderia ser consideravelmente atenuado, se os tribunais perfilhassem uma interpretação mais lata do seu poder de sindicância dos actos praticados ao abrigo daquele poder à semelhança do que já ocorre em países democraticamente mais avançados. Hipótese para já pouco provável, até pela a oposição que estas teses levantam os próprios juristas que apoiam os partidos da “governabilidade”, como eles gostam de dizer…
O outro problema, intrinsecamente ligado a este, é a tomada do Estado, a todos os níveis – administração directa e indirecta; administração central, local e regional; administração autónoma bem como a actividade empresarial – pelos aparelhos partidários. Digam o que disserem, mas as pessoas que estão de passagem pela administração, em lugares de responsabilidade, bem como as que sobem nas respectivas carreiras encostadas aos partidos a que pertencem, criam uma mentalidade e são portadores de uma ética (ou de falta dela) que nada tem a ver com uma administração constituída por profissionais, fundada no mérito e portadora de um alto sentido de defesa do interesse público. Qualidades que hoje, por corrupção material e moral, estão em vias de desaparecer da nossa administração.
A Justiça, um dos pilares fundamentais do Estado de direito democrático, é o sector que até hoje tem sabido resistir melhor a esta praga dos nossos tempos. Padece de outros males, igualmente graves do ponto de vista dos resultados esperados, mas corrigíveis com outras políticas e outros critérios de exigência, resultantes de factores muito diversos daqueles que minam, pela via da corrupção, as instituições democráticas. Importante também é que os magistrados não se deixem partidarizar no sentido vulgar e corrupto de termo, que não tem nada a ver, antes pelo contrário, com a exigência de um alto nível de consciência política.
Vem estas considerações a propósito dos recentes desenvolvimentos do caso Freeport. Já aqui falámos noutra ocasião sobre pressões, dos vários tipos de pressões e da capacidade para lhes resistir. Não constitui um passo seguro na luta contra a corrupção a invocação de pressões que se não traduzam em verdadeiras coações ou chantagens exercidas sobre quem tem por missão desempenhar uma tarefa que não agrada ao agente pressionador. Não é aconselhável trilhar essa via. A melhor resposta a qualquer pressão, quando ela realmente existe, é o desempenho competente do trabalho que se tem a cargo.
Também não ajuda nada a luta contra a corrupção a atitude que o governo do Partido Socialista, a sua maioria parlamentar ou as suas extensões autárquicas têm tido relativamente a alguns assuntos candentes da vida pública portuguesa.
Em primeiro lugar, a escolha de uma pessoa condenada por corrupção, embora sem trânsito em julgado da sentença, para presidir a uma empresa intermunicipal, seja o lugar ocupado por rotatividade ou não, não constitui um precedente de que alguém em democracia se possa orgulhar.
Também não atesta a favor do partido que governa a recusa da equiparação do crime de corrupção por acto lícito ao crime de corrupção por acto ilícito. Se se quisesse manter a distinção, ela deveria figurar no código penal no sentido exactamente inverso ao que hoje tem: punir mais severamente a corrupção por acto lícito e alargar o respectivo prazo de prescrição. A corrupção por acto lícito tem sempre, ou quase sempre, por base um acto discricionário e é por isso mesmo muito mais difícil de investigar do que o crime de corrupção por acto ilícito.
Do mesmo modo, não assegura nenhum pergaminho na luta contra a corrupção ao partido do governo a recusa em considerar o crime de “enriquecimento ilícito”. Constitui uma fraca desculpa a que se baseia no argumento de que a consagração de tal tipo legal de crime pressupõe uma inversão do ónus da prova.
Finalmente, o Partido Socialista já deveria ter solicitado, sugerido, recomendado, aconselhado (deixo o verbo à escolha do leitor) ao seu Secretário Geral e actual Primeiro Ministro a prestação de declarações no processo Freeport.

PORTUGAL FORA DO MUNDIAL 2010

DEPOIS DAS VITÓRIAS DA DINAMARCA E DA HUNGRIA

Depois da jornada de hoje, ficou praticamente inviabilizada a presença portuguesa no mundial de futebol da África do Sul. A sete pontos de distância da Dinamarca, com 5 jogos, e da Hungria, com 6 jogos, e em igualdade pontual com a Suécia, mas com mais um jogo (5), Portugal não tem a menor hipótese de se qualificar. Tendo cinco jogos para realizar, três dos quais fora, com a Albânia, a Hungria e a Dinamarca, as hipóteses são nulas.
Foi uma grande irresponsabilidade de quem dirige a federação escolher Queiroz para orientar a equipa com vista à qualificação de um campeonato que, pela primeira vez, se vai jogar, na fase final, em África. Se o campeonato se realizasse na Austrália ou na Ásia o prejuízo seria quase nulo. Em África, na África austral, é uma perda irremediável.
Espantosa é a compreensão que a imprensa e as televisões continuam a manifestar relativamente a Queiroz, principalmente depois de terem atacado ferozmente Scolari por ter alcançado, depois da dupla Manuel da Luz Afonso/Otto Glória, os melhores resultados da história do futebol português em selecções.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

AS DIVERGÊNCIAS E AS CONVERGÊNCIAS DO G20


MAIS DINHEIRO OU MAIS REGULAÇÃO?


É inevitável voltar ao tema até porque há muita confusão a respeito. Antes de mais, é preciso dizer abertamente que a reunião de amanhã, em Londres, não tem vista nenhuma “revolução” do sistema capitalista. O que está em causa é a reconsolidação do sistema, embora as propostas destinadas à sua restauração divirjam consideravelmente por serem provenientes de economias que se defrontam com problemas diferentes.
Os três grandes temas que vão estar em discussão no G20 são a coordenação dos planos de recuperação económica, a regulação do sistema financeiro internacional e o comércio internacional.
A tese americana e inglesa é a de que apenas se sai da crise pela via da recuperação da procura, sendo por isso necessário injectar vultosos fundos públicos na economia para relançar o consumo. A administração Obama fala em 4,5% do PIB, apesar de para alguns neo-keynesianos americanos esse montante não se afigurar suficiente.
Do lado das duas principais economias da Europa continental, a posição é diferente. Tanto Merkel como Sarkozy defendem a tese de que os planos já aprovados nos respectivos países são suficientes ou, pelo menos, não devem ser acrescidos de novos fundos enquanto não puder ser avaliado o resultado do que já foi feito. A isto acresce o facto de numa economia como a alemã, muito virada para a exportação, a procura não poder ser relançada por via de estímulos internos. Por outro lado, tanto a França como a Alemanha insistem na grande diferença que existe entre os dois lados do Atlântico no que respeita à protecção social dos respectivos cidadãos. Ou seja, em países onde existe um verdadeiro estado social não pode contabilizar-se apenas o que directamente se injecta na economia. É preciso igualmente considerar o acréscimo de gastos públicos, em solidariedade social, em consequência da crise.
É também evidente que um agravamento do défice nestes países não encontrará as mesmas facilidades de financiamento que encontra num grande mercado, como o americano, onde os capitais de todo o mundo são atraídos por um mercado financeiro capaz de proporcionar outro tipo de rentabilidades.
A Alemanha e a França pugnam, portanto, por um capitalismo baseado na economia real na qual o capital financeiro em vez de especular e de se expor a riscos cada vez mais inaceitáveis faça aquilo que lhe compete: “financiar o desenvolvimento da economia”.
Nesse sentido, avançam com propostas muito ousadas em matéria de regulação financeira. “Nenhum actor, nenhuma instituição, nenhum produto financeiro poderá voltar a escapar ao controlo de uma autoridade reguladora. Esta regra deverá aplicar-se às agências de qualificação, mas também aos fundos especulativos e, ainda, aos paraísos fiscais”, diz Sarkozy. O ataque aos paraísos fiscais é um dos pontos fundamentais da proposta ou da posição Merkel/Sarkozy. Eles pretendem a sua completa identificação, propõem alterações de conduta e elencam consequências para os casos de não colaboração. Ou seja, tem de se saber de onde vêm e para onde vão os capitais dos paraísos fiscais.
É natural que haja sobre este ponto graves divergências com a posição americana e inglesa, representantes daquilo a que Merkel tem chamado o “capitalismo anglo-saxónico”, onde uma grande parte da riqueza se obtém por via das aplicações do capital financeiro. Tais divergências, contrariamente ao que pregam certas vozes pró-americanas, não têm nada a ver com a tal questão da “menos Europa” ou da falta de falta de solidariedade e outras tonterias do género. Tem a ver com duas formas diferentes de encarar o capitalismo. Por isso, não será de estranhar que em matérias como esta a posição da Rússia esteja próxima da francesa e da alemã.
Em matéria de comércio internacional todos se manifestarão contra o proteccionismo, sem que todos o deixem de praticar em determinadas ocasiões. Assistir-se-á certamente por parte dos países emergentes, fortes em agricultura e em produtos manufacturados com mão-de-obra intensiva, a mais uma investida no sentido da completa liberalização dos mercados que lhes interessam.
Finalmente, não deixa de ser curioso verificar que as propostas da França e da Alemanha, governadas por Sarkozy e Merkel, são muito mais avançadas que as da social-democracia europeia…

O G20 E A UNIÃO EUROPEIA


A REALIDADE E AS VELEIDADES



Quem ler a principal imprensa portuguesa sobre a reunião de amanhã, em Londres, que reúne os países representativos da maior parte da economia e da população mundiais, fica com a impressão de que a União Europeia, mais uma vez, não estará à altura daquilo que dizem ser as suas responsabilidades.
Há nesta maneira de ver as coisas, muito frequente a partir do momento em que a crise se intensificou, um erro de análise que me parece grave por assentar numa distorção da realidade. Esperar que a União Europeia se comporte como um Estado Nação, ou simplesmente como um Estado, e que, como tal, tenha uma intervenção semelhante à dos Estados Unidos, da China, do Japão, da Rússia ou da Índia, para apenas citar os mais importantes, não faz o menor sentido. A União Europeia, como todos muito bem sabemos, está muito longe de constituir uma unidade política ou mesmo uma unidade económica, baseada em laços de solidariedade e apta a desenvolver uma política de integração das partes componentes, com vista a uma efectiva coesão da população que a integra.
A União Europeia é acima de tudo um espaço de comércio livre, que gerou um mercado interno europeu com livre circulação de pessoas, capitais, bens e serviços. Com vista à criação e consolidação deste mercado interno, os países mais ricos da União Europeia disponibilizaram ajudas que serviram para compensar e preparar as economias mais fracas para o embate da abertura económica e simultaneamente para consolidar aquele mercado, mormente pelo progresso introduzido nas infra-estruturas.
Nem mesmo a criação de uma moeda única para os Estados que, estando em condições de a integrar, quiseram a ela aderir, alterou qualitativamente a anterior situação, já que a moeda por si só não determinou uma alteração da substancia da União existente, embora tenha contribuído para reforçar aquele mercado, doravante imune a oscilações cambiais entre as diversas moedas das partes constitutivas e sujeito a uma política monetária e cambial comum.
Esta situação que já estava latente na União a 18 ficou absolutamente clara na União a 27. A constituição de este imenso mercado único constituído por economias tão diferentes, sob todos os pontos de vista, tornou o seu equilíbrio instável, como se está a ver em momentos de crise, e acabou de vez com a veleidade de uma União Europeia que, embora de uma forma sui generis, pudesse sob alguns aspectos actuar como se de um único Estado se tratasse.
As dificuldades da União não estão apenas, como durante muito tempo se tentou fazer crer, em concertar uma política externa e de defesa comuns (dificuldade, aliás, resultante de esses dois vectores da actuação do Estado mais não exprimirem que a defesa dos respectivos interesses internos na ordem externa), e em caminhar para políticas comuns nos domínios da fiscalidade, da solidariedade social, da justiça, do trabalho, do emprego, do ambiente, etc. As dificuldades estão se fazendo sentir nas próprias áreas sujeitas a uma política comum, embora a situação que no presente contexto as reclama não estivesse prevista e possa até considerar-se excepcional. Todavia, a sua importância é tal que pode pôr em causa a própria solidez do conjunto.
Significativo do modo com a Europa é encarada por aqueles que reclamam “mais Europa” é a “Carta aberta aos líderes europeus antes da cimeira do G20” subscrita por várias personalidades europeias, a maior parte delas integráveis no PSE e do PPE, na qual em parte alguma se fala de uma Europa diferente da que acima deixamos retratada. A Europa de que se fala é a Europa do mercado interno, do euro e do alargamento e o que dela se reclama são medidas que contribuam para reforçar e consolidar o mercado interno. Questões como o emprego, a harmonização fiscal, políticas comuns ambientais, de trabalho e de solidariedade social são questões que ficam à margem das preocupações dos autores da Carta.
Não admira por isso que amanhã em Londres não haja uma posição comum europeia, mas apenas uma posição das principais potências económicas da Europa: Alemanha, Reino Unido, França e ainda a Itália e a Espanha. Haverá coincidências e divergências tanto entre europeus como entre estes e os demais.