terça-feira, 26 de janeiro de 2010

A CANDIDATURA DE ALEGRE E A DIREITA



AS REACÇÕES DO PSD E DA DIREITA DO PS

A candidatura de Alegre não cessa de suscitar reacções da direita, tanto da parte do PSD, como da direita do PS.
Para quem acha que o anúncio foi extemporâneo, esta permanente preocupação de intervir só serve afinal de contas para demonstrar o contrário.
Do lado do PSD, a conversa é conhecida e repetida quase sem variações: Cavaco estava em dificuldades, foi o único Presidente que até hoje não conseguiu alargar a sua base de apoio para concorrer com tranquilidade a um segundo mandato, mas Alegre foi o bálsamo de que ele precisava para se reeleger sem dificuldades. Porquê? Porque Alegre não faz o pleno da esquerda e vai permitir a Cavaco recuperar os apoios perdidos.
Do lado do PS, a conversa é um pouco diferente, embora parta de alguns pressupostos semelhantes. A direita do PS, com o partido sem maioria absoluta no Parlamento, embora não queira reeleger Cavaco, também não quer Alegre para concorrer contra Cavaco. Porquê? Vital Moreira no Público de hoje explica porquê e indica as características que deverá ter um candidato vencedor.
Descontando a circunstância de, por uma questão de bom senso, Vital Moreira ser, nos tempos que correm, a última pessoa habilitada a traçar as estratégias eleitorais do PS, percebe-se das suas palavras que Alegre não serve, antes de mais, porque é preciso retaliar o seu comportamento em 2006 e posteriormente.
Alegre dividiu o partido em 2006, criou dificuldades ao Governo na legislatura finda, não apoia sem reticências o Tratado de Lisboa e defende um “gaullismo” totalmente contrário à compreensão que o PS tem da função presidencial.
Além disto, Alegre não serve porque não é um militante socialista que alinhe sem reservas com a actual direcção do partido, nomeadamente com Sócrates. Na verdade, Alegre opôs-se à aprovação de algumas disposições do Código de Trabalho, reagiu contra a tentativa de privatização dos sectores ricos da saúde, opôs-se “à modernização social-democrata da teoria e da prática política do PS” (isto dito a sério…) e é um candidato mais próximo do BE do que do seu próprio partido.
Por fim, reconhece-se que a eleição presidencial não pressupõe da parte dos partidos que apoiam um candidato um alinhamento total com o programa eleitoral deste.
Deste conjunto de razões incoerentes e assentes em pressupostos factuais falsos, o que sobressai é o facto de a direita do PS não querer Alegre por ele não alinhar a cem por cento com Sócrates. Todos os demais argumentos se reconduzem a esta verdade insofismável. De facto, tais argumentos visam criar no eleitor PS um sentimento de rejeição do candidato quer apelando subliminarmente à ideia de traição, quer inventando uma concepção do exercício da função presidencial que o candidato, na realidade, nunca defendeu.
Mas esta argumentação demonstra também o modo como essa mesma direita entende a função presidencial: como uma simples correia de transmissão do Governo PS. O candidato não serve, não pelo seu demérito ou pela inconsistência do seu programa, mas porque não tem sobre as diversas questões da vida política nacional uma visão idêntica àquela que o PS impõe, a cada momento, aos seus deputados na AR. Ou seja, de alinhamento incondicional com o Governo.
É claro que esta concepção da função presidencial está de antemão votada à derrota. Um candidato que o PS pudesse arranjar para desempenhar esse papel, e não faltarão certamente pretendentes, seria sempre um candidato sem o apoio indispensável para assegurar a vitória. Ele não contaria com os votos da esquerda, nem tão-pouco contaria com os votos de quem não quer em Belém uma sucursal do governo.
O que a experiência das anteriores eleições presidenciais demonstra é que sem o pleno da esquerda não há vitória de um candidato apoiado pelo PS. A escolha de um candidato alinhado com o Governo arrisca-se, com ou sem Alegre na corrida, a uma derrota tão humilhante como a das europeias.
Obviamente, que o argumento avançado pelo PSD segundo o qual, com Alegre, Cavaco recuperaria os apoios perdidos, não faz qualquer sentido, pois por maioria de razão os recuperaria se o candidato oponente fosse um simples alter ego do Governo. Ao PSD interessa minar a candidatura de Alegre exactamente porque a teme, na esperança de que o PS possa avançar com uma candidatura semelhante à defendida por Vital Moreira.

1 comentário:

Graza disse...

É com agrado que o leio aqui pela primeira vez e que verifico que também nesta matéria vale a pena voltar para ler.