sábado, 16 de janeiro de 2010

AFEGANISTÃO: UM ARTIGO SURPREENDENTE




MAIS CONSELHOS RUSSOS

O Monde de hoje dá conta de um artigo surpreendente publicado no New York Times de 11 deste mês (depois reproduzido no Internacional Herald Tribune de 12), assinado por dois altos responsáveis russos: Dmitri Rogozini, Embaixador da Rússia na NATO e Boris Gromov, actual governador da região de Moscovo e comandante do 40.º exército soviético no Afeganistão.
Ambos se dizem muito preocupados com a sorte da NATO no Afeganistão, considerando que a aliança perderá a sua base moral e a sua razão de ser se não cumprir a sua tarefa no Afeganistão. Vão mesmo ao ponto de afirmar que uma saída do Afeganistão sem uma vitória poderia provocar um colapso das estruturas de segurança ocidental.
Curiosamente, também referem terem sido eles, os soviéticos, os primeiros a defender a civilização ocidental no Afeganistão contra os muçulmanos fanáticos, facto que ninguém lhes agradeceu.
Na resposta que dei a um comentário sobre o último post que escrevi sobre o Afeganistão referi esse aspecto para o contrastar com o facto de terem sido exactamente os americanos que armaram, treinaram e apoiaram os talibãs obscurantistas, baseados no princípio de que tudo valia para lutar contra a União Soviética e o comunismo, esquecendo-se que socialismo e capitalismo são duas variantes da cultura ocidental, uma contradição secundária, na terminologia marxista, quando comparada com o verdadeiro choque civilizacional que hoje existe entre o mundo ocidental tal como os muçulmanos o vêem e o Islão que lhe resiste, tal como os ocidentais o entendem – essa sim, uma contradição verdadeiramente primária.
O Monde continuando hoje com a linguagem da Guerra Fria não tem qualquer problema em, passados mais de vinte anos, veicular uma série de mentiras como se estivesse em plena época McCartista e deixar implícito que no Afeganistão dantes estavam os “maus” e agora estão os “bons”..
Mas voltando ao artigo das personalidades russas. O que é surpreendente não é tanto o facto de a sua análise divergir consideravelmente de outras análises russas, como a circunstância de ambos recearem que a derrota da NATO acarrete o colapso das estruturas da segurança ocidental. E é surpreendente porque Rússia tem visto na NATO, e principalmente na sua extensão a leste, uma ameaça à sua própria segurança.
Duas explicações parecem possíveis. Uma, a pérfida, que vê na exortação da continuação da luta, que se sabe perdida, o caminho mais rápido para a desagregação da NATO. A outra, não assente na teoria da conspiração, que aponta para uma análise de dois responsáveis políticos que realmente temem uma derrota da NATO no Afeganistão, antes de mais pelas consequências que essa derrota poderia acarretar para as repúblicas da Ásia Central, limítrofes do sul da Rússia.
Esta segunda explicação também ajudaria a demonstrar que, afinal, a tal falta de liberdade de que frequentemente se fala permite apesar de tudo que dois altos responsáveis da Rússia exponham a respeito da NATO posições claramente contrárias à doutrina oficial.

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