terça-feira, 2 de março de 2010

UMA DECISÃO INCOMPREENSÍVEL- II


COMENTÁRIO DE UM LEITOR

A propósito do post “Uma decisão incompreensível” foram feitos comentários diversos, entre os quais, o que abaixo figura, do estimado leitor identificado por Jos, que merece destaque especial, não só pelos argumentos aduzidos pelo seu autor, mas também por nele se ter considerado haver na defesa da tese do A. do blogue erros de “cabo de esquadra” e de o próprio A. do blogue ter cometido lapsos que somente podem ser levados à conta de “apreciável oxidação”. Estas as razões da sua publicação no texto do blogue.

"Jos disse...
Sem desprimor para a sagacidade do editor e da sua visível preocupação de rigor, algumas das suas observações enfermam de uma surpreendente falta dele.
Na verdade, é de cabo de esquadra - ou inferior - a sua asserção de que o despacho do PGR (e, parece, o do PSTJ) deve ser tornado público por não estar coberto pelo segredo de justiça! O processo de inquérito é por definição um procedimento administrativo, sim, mas da competência do Ministério Público e que se objectiva na colheita de documentos e nas apreciações interlocutórias ou finais, emitidas por quem tenha legitimidade para tanto, sobre a sua suficiência indiciária de ilícitos criminais e, assim, justificar a instauração do procedimento criminal propriamente dito, por passar então a correr em tribunal criminal e se subordinar inteiramente ao julgamento de quem for arguido dos crimes indiciados. A intervenção do Juiz de Instrução é avulsa e obrigatória sempre que a investigação do MP e dos órgãos de policia criminal que o coadjuvam colida com as garantias fundamentais dos cidadãos definidas na CRP e na lei processual penal.
Se o PGR examina material de escutas e desacompanha o Procurador no juízo perfunctório da probabilidade de envolvimento do PM na prática de actos redutíveis à autoria de um dado crime, teve de dar corpo às suas próprias considerações desqualificantes ou desincriminantes, fundamentando-as. Não vejo como possa ter-se desincumbido desse dever, que tão bem conhece pela qualidade de distinto Juiz Conselheiro que não perdeu, sem explicar como (des)qualifica a materialidade crítica, explicitando-a ou reenviando para o despacho que lhe submeteu a questão na óptica da competência própria para a direcção do inquérito de foro exclusivo. Logo aqui se vê o dislate de pretender a sua publicação. Mas o editor erra também quando pretende encontrar no acto do PGR uma nota de "caso julgado" que faria cessar a ratio do segredo! Surpreendente lapso este em quem maneja com tanta destreza o florete dos conceitos de direito, só mesmo de levar à conta de apreciável "oxidação". Mesmo irrecorrível a decisão do PGR foi de mera abstenção, por natureza cingida ao material indiciário sobre que assenta; ora daqui decorre com meridiana evidência que se ulteriores investigações da competência do Procurador de Aveiro fornecerem outro material que force o PGR a rever a sua posição, este não está inibido de o fazer pelo despacho em que antes se absteve.
Isto mesmo põe a claro algo que os juristas deviam saber muito bem: é que o inquérito é uno até que se verifiquem factores de diferenciação e que todo ele está sujeito ao mesmo regime legal.
28 de Fevereiro de 2010 05:23"
Se bem compreendo, o ilustre A. do comentário aduz duas razões fundamentais para contrariar a tese aqui defendida da publicidade dos despachos do PGR, sem deixar, de passagem, de explicar como terá certamente actuado o PGR, contanto que tenha actuado correctamente.
E essas razões são as seguintes: a) os despachos do PGR foram proferido em processo de inquérito, tendo sido (ou devendo ter sido) remetidos ao Procurador de Aveiro, acompanhados das razões que os justificam: ou seja, dos fundamentos que levaram o PGR a não acompanhar o Procurador de Aveiro “no juízo perfunctório da probabilidade de envolvimento do PM na prática de actos redutíveis à autoria de um dado crime” (para não juristas: o PGR terá remetido, ou deveria ter remetido, os seus despachos ao processo de Aveiro, explicando por que razão não podem os factos constantes das certidões que lhe foram enviadas ser qualificados como crime de atentado contra o Estado de direito). Logo, os despachos não podem ser publicados porque ainda se encontram em segredo de justiça no âmbito de um processo de inquérito em curso.
b) Segunda razão: os despachos do PGR não constituem “caso julgado” (para os leigos: assunto arrumado definitivamente), porque, apesar de actos de mera abstenção irrecorríveis, cingidos ao material indiciário que lhe foi remetido, podem vir a ser alterados e revistos se ulteriores investigações do processo que corre em Aveiro a tanto o forçarem. Logo, não há caso julgado, ou seja, o assunto ainda não está arrumado.
O ilustre A. do comentário, cujo texto agradeço, merece uma resposta à parte, no post seguinte.

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