AS PROPOSTAS DE HOLLANDE
A serem verdadeiras as notícias hoje veiculas pela imprensa
sobre as propostas que Hollande apresentará na reunião de logo à noite, terá de
reconhecer-se que elas representam uma alteração significativa do que têm sido
nestes últimos quatro anos as reuniões da União Europeia ao mais alto nível.
Porventura pior do que as medidas que foram adoptadas ao
longo daqueles anos, foi, no plano dos princípios, a completa inibição que
recaía sobre os membros do Conselho para apresentar propostas ou discutir
assuntos que não constassem da agenda do directório franco-alemão.
Merkel “cozinhava” com a cumplicidade de Sarkozy as decisões
previamente tomadas pelos alemães e era apenas e só à volta dessas propostas
que a discussão tinha lugar. Elas balizavam os limites da discussão, nunca
ultrapassados pela covardia dos dissidentes ou pela sintonia dos acólitos.
E foi assim que as políticas de austeridade foram adoptadas
num misto de punição moral e de fervor ideológico e depois sucessivamente
reiteradas mesmo quando já se tinha demonstrado à evidência que elas só agravavam
ainda mais a situação dos países intervencionados. O que se fez à Grécia
figurará futuramente nos compêndios de economia como uma das maiores cegueiras
ideológicas do nosso tempo e nos de história como um crime friamente cometido
contra todo um povo na base de um fanatismo moral comparável ao que de pior a
Europa conheceu na sua história.
A fazer fé na imprensa, Hollande defenderá a emissão de eurobonds com vista à mutualização dos
riscos e ao abaixamento dos juros (incomportáveis) hoje pagos pelos países
intervencionados ou sob pressão dos mercados; a recapitalização directa dos
bancos pelos fundos de resgate sem o condicionalismo imposto pelos programas de
austeridade; o financiamento dos fundos de resgate pelo BCE ou mesmo o financiamento
directo do BCE aos países em dificuldades; e ainda a subtracção ao défice dos investimentos
de futuro.
São propostas que para aquelas cabeças quadradas dos alemães
representam a inversão da “ordem natural das coisas”. Está fora de questão que
Merkel venha a aceitar tais “heresias”, só que a questão que interessa não é
saber qual vai ser a posição da Alemanha, que antecipadamente se conhece, mas
quem se aliará a ela na defesa da “ortodoxia neoliberal”.
Estarão de certeza com a Alemanha aqueles que mais têm ganho
com a adopção do euro como moeda única, como é seguramente o caso da Áustria,
da Finlândia e da Holanda. Mais importante vai ser conhecer a posição daqueles
que, estando intervencionados ou sob forte pressão dos mercados, e tendo, portanto,
teoricamente todo o interesse na adopção daquelas medidas, as vão rejeitar por
razões ideológicas ou por cálculo político.
Certamente que a Grécia e a Itália apoiarão as propostas de
Hollande. Mas que dizer das posições da Irlanda, da Espanha e de Portugal?
O PS português poderá ter, em função dos resultados da
reunião de logo à noite, mais uma boa razão para rasgar o programa da Troika se
o Governo português, como tudo indica, continuar a apoiar as posições da Alemanha.
3 comentários:
Veremos... com tão curta espera, dá para esperar sentado...
Contudo, não bastará ao PS romper com o tratado. Restará saber quais as suas propostas, no concreto. A pressão dos maus resultados que apontam para o insucesso das medidas são por si só, razões fortes de carácter politico a justificar a ruptura. É no plano das alternativas que a questão se colocará...
É isso mesmo. É preciso fazer a discusão sobre o que vem a seguir. O que efectivamente queremos e o que tem de ser mudado. E muita coisa tem de mudar na UE para que ela possa continuar existindo.
Mais uma vez , obrigada pela sua lucidez. :)) E, clareza.
Vou partilhar no FB. Espero que os meus amigos não sejam preguiçosos e o leiam...
Estas letrinhas matam-me...
Abracinho
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