A SOLUÇÃO ESPANHOLA
Como se sabe – e agora já pode dizer como se sabe porque
deixou de ser segredo – o sistema financeiro espanhol, sem excepções, está em
grandes dificuldades, na iminência de falência, se muito rapidamente não forem
tomadas as medidas adequadas.
Essa situação decorre da “bolha
imobiliária” – a crise del ladrillo –
e também de muitos outros activos tóxicos inscritos nos activos dos bancos dos
quais os menos importantes não serão certamente os resultantes do subprime americano.
Depois de muitas mentiras e encobrimentos durante o governo
anterior, como a boa nota nos famosos testes de esforço – as metáforas
que estes tipos usam para esconder a verdade… -, e de o governo em funções
ainda há poucas semanas ter voltado a garantir que não haveria dinheiro público
para os bancos, a “bomba” rebentou com a calamitosa situação financeira da Bankia, instituição resultante da fusão
em Dezembro de 2010 de sete caixas regionais, entre as quais estão com um peso
correspondente a cerca de 90% a Caja Madrid e a Bancaja. Depois de uma guerra
política travada no seio do PP, a Comunidade de Madrid, chefiada por Esperanza
Aguirre, uma senhora condessa de extrema-direita, acabou por impor a direcção
por que peleou durante vários meses – Rodrigo Rato, ex-ministro de Aznar e
ex-director do FMI.
O negócio não poderia ter corrido pior: menos de dois anos depois,
o banco estava falido, tendo o governo Rajoy sido obrigado a nacionalizá-lo
para evitar a cessação de pagamentos. A intervenção do Estado começou com uma
ajuda de cerca de 5 mil milhões de euros, tendo-se concluído, a meio da semana
passada, que seriam necessários mais 19 mil milhões para evitar a falência.
O Estado espanhol não tem este dinheiro. Não pode angariá-lo
directamente no mercado porque a taxa de juro previsível, acima dos 6%, seria
incomportável. Também não quer recorrer ao fundo de resgate (futuro ESM), já
que segundo as regras em vigor, o fundo somente pode emprestar aos Estados e um
empréstimo do fundo equivale a uma intervenção da Espanha com tudo o que vem
atrás – troika, despedimentos, cortes nos salários dos funcionários públicos e
das pensões, enfim, o que nós e os gregos conhecemos bem. Tentou em vão Rajoy
que a Merkel abrisse uma excepção e permitisse uma injecção de dinheiro do BCE a troco
de garantias de pouco ou nulo valor, mas nada conseguiu. Somente Hollande o
apoiou. Então, qual vai ser a solução do governo espanhol? Uma solução
arrojada, mas engenhosa: vai injectar directamente no banco dívida pública! Em vez
de emitir dívida no mercado para arrecadar dinheiro e metê-lo a seguir no
banco, vai emitir a dívida pública directamente para o banco nacionalizado que
nele figurará como um activo, teoricamente convertível em liquidez desde que
seja aceite nas operações interbancárias como garantia (pouco provável) ou
vendendo os respectivos títulos no mercado de capitais (hipótese também pouco provável
pela desvalorização que sofreriam e consequente aumento da taxa de juro) ou (hipótese
mais provável) para se financiar junto do BCE, entregando os títulos da dívida
pública em garantia como actualmente fazem todos os bancos.
Se tudo correr bem, acabará por ser o BCE a recapitalizar o banco
com a garantia do Estado espanhol. A dívida pública espanhola aumentará uns
pontos percentuais, cinco ou seis, ficando mesmo assim aquém da generalidade
das congéneres europeias em percentagem do PIB.
O verdadeiro risco desta operação não estará certamente na
recusa do BCE em aceitar as garantias, mas na situação em que ficam o banco e
Tesouro espanhol no mercado de capitais. Os juros vão indubitavelmente subir…e
a intervenção tornar-se-á inevitável mais dia menos dia.
Moral da história: este “esquema” é bom ou mau? No presente
momento histórico tudo o que agrave a situação na zona euro tem mais hipóteses
de ser bom do que mau. Quem tiver mais a perder vai ter de pensar duas vezes. E
depressa…
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