quarta-feira, 30 de maio de 2012

O DEBATE SOBRE O SERVIÇOS SECRETOS NO PARLAMENTO



UMA OPORTUNIDADE FALHADA



É caso para perguntar se o Primeiro Ministro escolheu o tema das “secretas” como objecto do debate quinzenal no Parlamento para congregar argumentos que lhe facilitassem a demissão de Relvas ou se, pelo contrário, teve em vista promover uma discussão que lhe permitisse manter o ministro.

O mais provável é que o PM quisesse tomar o pulso da oposição sobre aquela matéria agindo depois em função da avaliação que objectivamente resultasse do debate.

Analisando o que se passou a primeira conclusão que se impõe é a de que a oposição perdeu uma excelente oportunidade para apressar a queda de Relvas. De facto, num debate deste género a oposição teria de ter escolhido sem hesitações o resultado que pretendia atingir bem como alvo das suas críticas. Ao ter escolhido os serviços de informação como alvo preferencial das suas diatribes associando vagamente Relvas ao que se passou escolheu uma estratégia antecipadamente condenada ao fracasso.

De facto, a participação dos quatro grupos parlamentares da oposição ficou muito aquém das expectativas. A do PS, como de certo modo se esperava, foi decepcionante: Seguro não enumerou com firmeza nem valorizou devidamente os factos mais relevantes, acabando por ficar cercado pelos argumentos de Passos Coelho todos eles baseados na factualidade que se conhece.
Jerónimo de Sousa falou na promiscuidade entre interesses económicos e serviços secretos, mas ficou sem argumentos quando o PM lhe respondeu que tudo o que é grave se passou fora dos serviços. Acabou por trazer à discussão um outro tema importante – a ameaça de descida dos salários – tendo recebido a garantia do PM de que nada estava sendo preparado nesse sentido…o que não significa que não venha a estar.

Louçã terá ido mais além que os demais na direcção que interessava seguir, mas também não estabeleceu as conexões mais relevantes que o caso tem.

E a Heloísa Apolónio com a pergunta que fez ao PM, e à qual este expressamente declarou não responder, sobre a demissão do adjunto de Relvas acabou por evidenciar como teria sido útil insistir no tema Relvas, já que era o único que verdadeiramente tinha “pernas para andar”.

De facto, tudo o que tem vindo a público sobre a acção do SIED em domínios ilícitos tem a desculpa simples e verdadeira de que não foram os serviços que produziram esses documentos nem levaram a cabo essas investigações, mas antes um seu ex-dirigente com a colaboração também ilícita e à margem da hierarquia de alguém de dentro. E o PM para “limpar” essas ramificações dentro dos serviços tomou as medidas que se impunham: deu conta ao MP do que se passara, inquiriu internamente e demitiu dos serviços quem estava comprometido nas acções criminosas.

Mas então se é gravíssimo que um ex-dirigente dos serviços secretos tenha usado para fins particulares de natureza empresarial ou de controlo da comunicação social informação dos serviços enquanto era dirigente e tenha continuado com essa actividade ilícita com a colaboração de gente de dentro depois de ter deixado de o ser, não é igualmente gravíssimo que esse ex-dirigente tivesse tido relações próximas com o secretário-geral do PSD e as tivesse mantido depois de este ter sido empossado como ministro, sabendo-se, como se sabe, que o que veio a público dessas relações versava sobre matérias dos serviços secretos?

Como pode o PM considerar gravíssimo o comportamento desse ex-dirigente e achar normal que um ministro do seu governo tenha dele recebido informação que somente poderia ter sido recolhida por via das funções que antes desempenhara?

E como pode o PM continuar a assegurar a sua confiança num ministro que tem a seu cargo a comunicação social quando esse ministro teve as tais relações próximas com o dito ex-dirigente que entretanto passou a integrar os quadros de uma empresa de comunicação, lugar que mais tarde teve de abandonar por força do escândalo que entretanto rebentou, sabendo-se que essa empresa mantinha uma guerra aberta com outra empresa de comunicação social, da qual alguns nomes de relevo foram ilicitamente investigados por esse ex-dirigente?

E não constituirá prova indiciária dessas ligações a demissão do adjunto do ministro Relvas exactamente por força das ligações que manteve com esse ex-dirigente dos serviços secretos?


Enfim, parece que o debate deveria ter tido como alvo principal Relvas e como matéria acessória os serviços de informação. Não se trata de negar a importância de discutir e de assegurar que os serviços de informação não serão utilizados para fins diversos dos que por lei lhe estão consignados, trata-se apenas de sublinhar que esse não não poderia ser o objectivo fundamental deste debate, tanto mais que as ilegalidades que foram cometidas ocorreram fora dos serviços embora praticadas por quem lá tinha desempenhado um papel relevante.

Do debate fica a dúvida: depois de todas as culpas do Governo terem sido lançadas sobre Silva Carvalho será que ele vai falar?

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