POR QUE NÃO FALIR NO
EURO?
Bruxelas começa a ficar seriamente incomodada com a hipótese,
cada vez mais provável, de a Grécia falir no euro.
Feitas as contas, entre a espiral “austeritária” e a falência
no euro, os gregos nada teriam a perder com a segunda hipótese e até poderiam
ter algo a ganhar, tanto analisando a isoladamente a situação assim criada como
integrando-a nas consequências devastadores, para a zona euro, que a
viabilização de tal hipótese necessariamente provocaria.
Pensar a falência da Grécia no euro como um acto isolado com consequências
apenas dentro do território grego é um mero exercício académico, sem qualquer hipótese
de coincidência com a realidade. Pelo contrário, a falência da Grécia no euro é
um acto de consequências em toda a zona euro, provavelmente tão devastadoras,
que tudo será feito para impedir que tal aconteça.
O caminho mais simples, já em pleno desenvolvimento, tanto
pelas declarações de Schäubler como de Barroso, além da tradicional ambiguidade
de Jean-Claude Juncker, é empurrar a Grécia para fora do euro. Uma saída
controlada pela Troika, pelo menos, no que diz respeito às consequências para
terceiros. Entre a ameaça e o conselho, esta é uma hipótese que não está de
todo afastada se as eleições de meados de Junho derem maioria (pouco provável)
aos partidos da Troika. Se esse não for o caso, como se espera – e muitos temem
–, a Grécia manter-se-á firme na sua nova base negocial: rejeição da austeridade
(o mesmo é dizer da completa hegemonia da sociedade neoliberal, no caso
concreto ao serviço exclusivo do estrangeiro, fazendo da Grécia um verdadeiro
Estado-vassalo) e manutenção no euro.
Pensar a falência da Grécia no euro significaria, no que
respeita aos recursos do Estado, ficar numa situação sensivelmente melhor do
que aquela em que o país agora se encontra. De facto, o orçamento grego, por força
da recessão que assola a Grécia desde que se iniciaram os programas de austeridade,
está a beira de alcançar um superávide primário. Ou seja, sem o pesadíssimo
fardo da dívida, as despesas estão em vias de ser cobertas pelas receitas que o
Estado arrecada. O que, por outras palavras, significa que a tal “ajuda”
recebida da União Europeia se destina exclusivamente ao pagamento dos credores
e…a fazer mais dívida!
A Grécia deixará de ter acesso a essas “ajudas”, mas não
estaria impedida de se financiar no mercado, se houver quem lhe empreste
dinheiro.
No que respeita a actividade económica fora do Estado, as
importações iriam certamente contrair-se – e muito, dando eventualmente lugar a
alguns problemas de abastecimento – tendendo, por essa razão, a balança
comercial para o equilíbrio. Por outro lado, os bancos continuariam a ter
acesso, como até aqui, ao Banco Central, já que juridicamente nada permite
negar à Grécia o acesso à liquidez que o BCE proporciona aos demais bancos da
zona euro, nas mesmas condições destes. Aliás, este seria o único meio de salvar
da falência o sistema financeiro grego – falência que necessariamente ocorreria
se a Grécia regressasse ao dracma. O mesmo se poderá aliás dizer das empresas endividadas
em euros, que igualmente faliriam, com o regresso do dracma.
Além de tudo isto, a Grécia teria oportunidade de, sob o seu
exclusivo controlo, pensar e executar as reformas de que o Estado e a economia
grega necessitam, com a garantia, que se espera os factos não venham a
desmentir, de tais reformas serem feitas no exclusivo interesse do país, o
mesmo é dizer de quem trabalha e produz, e não dos agiotas, das clientelas e
dos interesses patrimonialistas que minam o Estado grego.
Isto era o que aconteceria à Grécia isoladamente considerada.
E a quem está fora, o que aconteceria?
Primeiro que tudo, uma dívida de 240 mil milhões de euros que
ficaria por pagar. A tal dívida que agora está sendo paga com as “ajudas”. E,
além desta, a dívida privada que eventuais falências gregas tornariam
igualmente incobrável. Mas não seria tudo: a credibilidade do euro ficaria definitivamente
abalada. Mesmo que a sua relação quantitativa com as outras moedas não sofresse
um sério dano (como, de resto, não tem sofrido durante a presente crise), a sua
relação qualitativa ficaria seriamente danificada. Quem mais aceitaria o euro
como reserva de valor se um país falir dentro da sua zona?
Mas há mais: as bolsas reagiriam negativamente à falência da
Grécia, arruinando múltiplas empresas por essa Europa fora. E os “mercados” tornariam
insustentável a situação da Espanha e da Itália, chegando estes para deitar por
terra a zona euro.
Em conclusão: a Grécia tem muito a ganhar e nada a perder em
falir no euro. É a sua única arma negocial.
Que pena nós não sermos a Grécia…
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