AS CONSEQUÊNCIAS DA DEMOCRACIA
Já que o mandato dos nossos representantes políticos não é imperativo, já que nem sequer sabemos quem é o nosso representante, já que desconhecemos por completo os critérios presidiram à sua escolha, valha-nos ao menos o direito, nesta nossa democracia dominada pelos partidos, de quer saber o que realmente se passa quando se tem a certeza de que, tendo sido fortuitamente interceptadas várias conversas em que interveio o Primeiro Ministro, houve pelo menos um magistrado que, tendo tido acesso a essas conversas, depreendeu poder haver nalgumas delas indícios da prática de um crime contra o Estado de Direito, sob a forma de manipulação da comunicação social.
Evidentemente que para este efeito nos não interessa o que sobre este assunto diz o Código de Processo Penal. Ou melhor, sobre a regulação do CPP já expendemos extensamente a nossa opinião, pelo que não se trata agora de retomar o tema numa perspectiva jurídica. Mas de trazer à discussão a dimensão política de um caso cuja importância não pode ser escamoteada, digam o que disserem os juristas “comissários” políticos do governo.
De facto, o que o Código diz é muito importante para ser invocado pelo cidadão comum perante os tribunais ou até perante a sociedade em geral (embora com algumas reticências), mas se for invocado pelo governante máximo do país, para por essa via se refugiar no silêncio de um assunto que exige explicações detalhadas, o mais provável é que definitivamente se quebre o vínculo de confiança com os cidadãos, indispensável para o exercício do cargo.
Ainda poderia dar-se o caso de, com o tempo, assunto poder cair no esquecimento se o visado e o seu interlocutor fossem ambos, ou pelo menos uma deles, pessoas que nunca estiveram sob suspeita social. Mas não é esse infelizmente o caso, já que tanto um como outro têm estado associados a factos reprováveis, falsos ou verdadeiros, para o efeito tanto importa. E é exactamente essa associação que faz com que a confiança que neles se depositava, que já não era muita, fique agora completamente abalada por este facto indesmentível de ter havido um juiz de instrução criminal que “viu” nalgumas daquelas conversações interceptadas indícios da prática de um crime.
No ponto em que as coisas estão no chamado domínio da opinião pública, a confiança na pessoa em causa e na própria justiça só ficará restabelecida se essas conversações (as que aparentavam indícios da prática de crime e não outras) se tornarem do domínio público. Não se trata de qualquer "voyeurismo" político como alguns maliciosamente dizem, pois, como bem se compreende, o que se pretende escrutinar não são assuntos alheios, mas questões da máxima relevância social que nos dizem directamente respeito: a liberdade de imprensa!
O visado pode resistir, fiado na sua boa estrela, mas, mais tarde ou mais cedo, acabará por se saber o que se passou…
1 comentário:
Disso, não tenho a menor dúvida...
E qual será o jornal ou jornalista que tem essas gravações em "caixinha"????
Que saiam, pois isto assim está a arrefecer...
Abraço
:))
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