OS PRIMEIROS DESAIRES
Vistas da Europa, algumas das posições de Obama, enquanto Presidente, não podem deixar de parecer ingénuas. Desde logo, as de inspiração lincolniana, tendentes a restabelecer a concórdia entre os campos adversos, mediante o recrutamento de antigos adversários para o desempenho de funções tidas de interesse comum. Depois, o recrutamento de equipas cujos membros antecipadamente se sabe não partilharem pontos de vista susceptíveis de levar à prática os fins eleitoralmente sufragados nem os meios necessários para os atingir. E sabe-se, como, em política, os meios são cada vez mais determinantes para se alcançarem os fins pretendidos. Finalmente, alguns erros de facto, que desgastam, perfeitamente evitáveis, ainda por cima por quem tinha tecido uma malha fina de não sei quantas dezenas de perguntas para assegurar apenas a passagem dos mais aptos, para utilizar uma linguagem darwiniana.
A analogia com Lincoln deveria ter sido mais cuidada e levada à prática com arte, tanto mais que a situação de hoje é muito diferente da de 1862-65. Naquela altura, estava vencida uma guerra que foi preciso travar. Agora está por vencer uma guerra que ainda nem sequer foi travada. Naquela altura, os confederados poderiam pensar em tudo, menos em restaurar a situação anterior. Hoje, os que saíram em Janeiro, podem aceitar muita coisa, menos algo que possa por em causa ou fazer perigar a restauração da situação anterior.
E mesmo a comparação com certas experiências europeias de “conciliação”, aliás muito escassas, pecam do mesmo mal. Na Europa, a escolha dos actores destinados a fazer crer no restabelecimento de um clima de concórdia, com o objectivo de qualificar de incorrigíveis recalcitrantes aqueles que dele se afastam, são feitas sábia e criteriosamente. Em todos os casos há antecipadamente a certeza de que, no essencial, nunca se afastarão da linha de rumo de quem manda. Quem escolhe sabe escolher e conhece perfeitamente os escolhidos. Sabe o que eles querem…
A escolha de membros do partido republicano para o desempenho de funções tão importantes como a defesa e o comércio, que, juntamente com o tesouro, a agricultura e a energia, fornecem a matriz da governação americana, só poderá dar maus resultados. No comércio já deu, antes mesmo de começar. Na defesa e nos transportes vamos ver, quando as coisas começarem a apertar…
Depois vem o segundo grupo: a escolha de equipas cujos membros, embora dêem a entender que concordam com os fins eleitoralmente sufragados, fazem uso de meios de tal modo inadequados que começa a ser patente que, pelas vias escolhidas, nunca os poderão alcançar. Neste plano, a equipa económica constitui a maior decepção. E sabe-se como, em última instância, as questões económicas são determinantes, ainda por cima numa sociedade onde os eventuais retrocessos da ideologia dominante são facilmente recuperados se não houver progressos significativos na situação de quem suporta a parte mais pesada da crise.
Como aqui frequentemente tem sido dito, o sistema financeiro continua em crise e as medidas que nos demais domínios económicos foram aprovadas serão sempre insuficientes se aquele não funcionar.
Finalmente, todas as escolhas fracassadas desgastam, porque lançam a dúvida sobre a competência de quem escolhe. Quem se engana no plano ético, no plano técnico ou no plano político, por mais desculpas que peça, tende a ser desconsiderado.
Propositadamente, não me referi às relações exteriores. Por duas razões:
A primeira, porque este é um dos domínios em que o Presidente, se for competente, pode enquadrar completamente a acção política dos escolhidos; portanto, é o lugar ideal para colocar os principais rivais do seu campo político.
A segunda, porque as relações exteriores não são determinantes. São determinadas. Dependem acima de tudo da política das cinco áreas acima referidas.
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