terça-feira, 30 de setembro de 2008

AFINAL, AMADO QUER RECONHECER O KOSOVO



COMO SE EXPLICA?


A fazer fé no que diz o Público, Luis Amado vai realizar esta semana uma nova ronda de conversações com os partidos políticos com vista ao reconhecimento do Kosovo. Que Amado sempre quis reconhecer o Kosovo, é facto fora de qualquer dúvida, como neste blogue em devido ttempo se assinalou e comentou.
O que não se percebe é que tipo de interesse pode motivar esta diligência de Amado agora. Sendo certo que há países da UE que o não farão, que necessidade tem Portugal de mudar a sua posição? Não será certamente em defesa de qualquer interesse nacional digno de nota. Não haverá mais nada para tratar na diplomacia portuguesa?

PODERÁ O CAPITALISMO SUBSISTIR SEM O SOCIALISMO?



AS LIÇÕES DA CRISE CAPITALISTA

A primeira grande conclusão que se retira da crise capitalista global, agudamente manifestada no sistema financeiro americano, é exactamente a oposta à tese defendida por Fukayama depois dos eventos de 89. O fim da guerra fria, do muro de Berlim e de tudo o que ele representava, bem como a consequente universalização do modelo de liberalismo económico, não levaram ao fim da história, sendo hoje bem mais aceitável afirmar-se que a ausência de modelo alternativo ao capitalismo liberal poderá levar ao fim do capitalismo ou, na melhor das hipóteses, mergulhá-lo numa crise tão profunda da qual jamais poderá sair pelos seus próprios mecanismos, amplamente propagandeados para o impor como modelo único.
A ideia de que o mercado tudo resolve e que através da sua auto-regulação todos os equilíbrios rompidos se restabelecem está hoje completamente negada pelos factos. Como tal ideia nunca teve nada de científico e não passava de uma premissa ideológica indispensável à universalização do modelo vai ser necessário continuar a combatê-la com um vigor acrescido, agora que os factos indiscutivelmente apontam no sentido do seu clamoroso fracasso. O capitalismo entregue a si próprio lança o homem na sociedade de natureza hobbesiana. É como deixar à solta um animal selvagem e esperar que ele se auto-domestique. A domesticação dos animais selvagens é uma tarefa de séculos que o homem empreendeu desde os primórdios da humanidade. Não podemos hoje dispor do mesmo tempo para domesticar o capitalismo, nem podemos viver na sociedade de naatureza por ele criada, quando inteiramente entregue a si próprio. Temos de o domesticar já, agora que ele está de rastos, e pô-lo ao nosso serviço, deixando aos neo-liberais um papel apenas semelhante ao hoje desempenhado pelas sociedades protectoras dos animais.
Entendamo-nos: quando se insinua que o capitalismo não pode subsistir sem o socialismo, evidentemente que se não pretende ressuscitar sob nenhuma forma o "socialismo real", derrotado pela história e rejeitado pelo povo. Independentemente dos méritos da experiência, do próprio acquis que dela ainda resulta (infelizmente, não tão perenemente como as conquistas da Revolução Francesa) e sem nunca esquecer que a Revolução de Outubro foi a primeira grande experiência da história da humanidade baseada na ideia generosa de erradicar a exploração do homem pelo homem (a materialização - tentada - da utopia), a verdade é que o modo como tal ideia foi posta em prática e se materializou durante 70 anos afastou do socialismo milhões de pessoas que tiveram a infelicidade de o viver sob a forma como foi praticado.
Somente um grande choque como o que está a acontecer neste momento e o muito mais que ainda aí vem poderá relançar a ideia do socialismo. Um socialismo que estará certamente muito longe de qualquer das suas anteriores manifestações sob a forma de “socialismo real”, mas que nunca deixará de ser um socialismo económico, assente nos princípios da solidariedade, da justiça social e da liberdade.
Toda esta ganga ideológica com que nos fustigaram durante cerca de trinta anos terá de ser banida sem contemplações. Fim da auto-regulação, fim das actividades especulativas, fim das “entidades reguladoras independentes”, fim da iniciativa privada nos sectores estratégicos das comunidades. Por outras palavras mais simples: criação de um eficiente e poderoso sector público, com elevadíssimo grau de exigência relativamente a todos os que nele participem a qualquer nível; criação de um amplo sector social, nomeadamente no domínio da habitação; e manutenção do sector privado regulado e disciplinado.
Evidentemente, que nenhum partido socialista estará em condições de pôr em prática tal sistema. Completamente corrompidos pelo capitalismo, quanto mais não seja no sentido etimológico do termo, os dirigentes socialistas actuais são cúmplices e autores, materiais e morais, do sistema em ruínas. Alguns até podem com muita facilidade cair no mesmo ridículo daqueles que, mais à direita, continuam a advogar mais privatizações, menos regulação, menos Estado, enfim, mais estupidez! Pois não são eles que se preparam para privatizar mais sectores estratégicos do Estado, sectores lucrativos, apenas para transferir para as mãos dos especuladores um património que é de todos?

POR QUEM ESTÁ BILL CLINTON?



A INGENUIDADE DOS VOLUNTARISTAS

Há quem ande nestas coisas da política há décadas e continue a não perceber nada do que se passa na hora em que as coisas acontecem. Por ingenuidade, por excesso de voluntarismo, enfim por um complexo de causas que não vale a pena enumerar com minúcia.
Para qualquer observador minimamente experiente era claro desde há muito tempo que os Clinton não queriam, nem querem, que Obama ganhe as eleições. Durante o tempo em que ela esteve em jogo – e ela manteve-se em jogo muito tempo depois de já não ter cartas para jogar – coube-lhe a ela desempenhar esse papel, obviamente disfarçado pelo objectivo que ela própria prosseguia. Depois de ela sair de jogo, passou ele a dar o sinal aos seus mais fiéis apoiante e aos americanos ditos independentes.
A intervenção deles na Convenção de Denver foi um exemplo acabado desta estratégia, como neste blogue referi.
Pois há quem tenha vivido na América anos a fio, ande, cada quatro anos, de Convenção em Convenção, e não perceba nada do que se passa. Foi preciso que o Bill Clinton fosse entrevistado pelo Larry King para que finalmente percebessem o que se estava a passar. Até a Senhora do Alasca ele elogiou…

A AJUDA DE NANCY PELOSI


O DISCURSO DE ENCERRAMENTO DOS TRABALHOS NA CÂMARA DOS REPRESENTANTES

São já muitos os que, de ambos os lados da bancada, atribuem a Nancy Pelosi um desfecho desfavorável na votação.
Eis algumas das frases com Nancy Pelosi encerrou o debate:
Quando foi a última vez que alguém pediu 700 mil milhões de dólares? É uma cifra assombrosa que simplesmente nos demonstra o custo das políticas económicas falidas da Administração Bush. Políticas construídas na base da temeridade orçamental, com uma mentalidade do vale tudo, sem regulação, nem supervisão, e sem disciplina do sistema.
Os democratas acreditam no mercado livre. Um mercado que pode e deve criar empregos, riqueza e capital, mas que deixado ao seu livre alvedrio gerou o caos.
Os democratas insistiram em que a lei que responda a esta crise deve proteger o povo norte-americano e as pessoas da rua ante o desastre de Wall Street. Não foi o povo americano que decidiu debilitar perigosamente as políticas reguladoras e de supervisão. Não foi o povo que fechou acordos financeiros arriscados e poucos sensatos. Não foi o povo que pôs em risco a segurança económica da nação. Ele não deve pagar o custo desta lei de emergência e de estabilização.
Hoje vamos actuar para iludir esta crise, porém a experiência destes últimos oito anos diz-nos que falhou a liderança económica. Elegeremos um caminho diferente. No novo ano, com um novo Congresso e um novo Presidente, quebraremos os laços com este passado falido e levaremos os Estados Unidos numa nova direcção para um futuro melhor
”.

Grande Nancy Pelosi, que disse o que tinha de ser dito, e deixou claro que não acredita em nada do que se fez. E sua intervenção é ainda mais importante por ela ser a Presidente da Câmara!

A RECUSA DO PLANO BUSH



POR QUE VOTOU CONTRA A CÂMARA DE REPRESENTANTES


O plano Bush na sua versão inicial era um exemplo acabado do capitalismo puro e duro, embora abrisse brechas incolmatáveis no plano ideológico.
Paul Krugman, mais uma vez, explica como ninguém a actual situação e demonstra, a partir da compreensão que dela tem, por que razão o plano Bush, na versão apresentada por H. Paulson, não levaria à solução do problema.
Krugman distingue quatro fases na crise financeira:
1. O estouro da borbulha imobiliária provocou um drástico aumento dos pagamentos em atraso e das execuções hipotecárias, factos que, por sua vez, induziram uma queda dos preços activos hipotecários, cujo valor, em última instância, resulta dos pagamentos dos empréstimos hipotecários;
2. Estas perdas financeiras deixaram muitas instituições com escassez de capital: poucos activos relativamente às dívidas; este problema é particularmente grave por que toda a gente contraiu muitas dívidas durante os anos de “enchimento da borbulha”;
3. Como as instituições financeiras têm muito pouco capital relativamente às dívidas, não querem, ou não podem, conceder o crédito de que a economia necessita;
4. As instituições financeiras tentam pagar a dívida mediante a venda de activos, incluindo os activos hipotecários, o que, obviamente, faz baixar o preço dos activos e piora ainda mais a sua posição financeira – a este círculo vicioso chamam alguns o “paradoxo do endividamento”.

O plano Paulson visava pura e simplesmente a compra dos activos problemáticos, nomeadamente os hipotecários, pelo governo federal. Ou seja, visava actuar sobre a quarta fase e romper o círculo do endividamento. Antes de mais, não está claro que o conseguisse, porque a pressão incide sobre todos os activos e não apenas sobre aqueles que o governo compraria. E mesmo que o círculo do endividamento fosse limitado, o sistema financeiro continuaria paralisado por escassez de capital, a menos que o governo federal pagasse pelos activos um preço muito superior ao seu valor real, proporcionando às empresas financeiras – aos seus accionistas e executivos - uma “pipa de massa” à custa dos contribuintes.
Exactamente por esta razão é que a aprovação do plano Bush, na versão Paulson, seria escandalosa.
Círculos ligados aos democratas entendem que a actuação tem de fazer-se, isto é, tem de incidir sobre a segunda fase, já que o grande problema das empresas financeiras é a falta de capital. E se o governo vai proporcionar mais capital às empresas financeiras deverá ficar na mesma situação daqueles que praticam esse tipo de actos, ou seja, deve ficar com uma parte da propriedade, de modo a que, se o plano vier a resultar, as suas vantagens não redundem exclusivamente a favor dos que provocaram a crise.
Paulson não queria nada disto. Queria um plano limpo: uma ajuda proporcionada pelos contribuintes sem condições e uma actuação discricionária, com total imunidade face aos tribunais e organismos administrativos.
A Câmara dos Representantes, não obstante todas as emendas entretanto introduzidas, votou contra. É errado supor que o tenha feito apenas por simples eleitoralismo. Certamente, que as eleições de 4 de Novembro pesaram na decisão dos congressistas que não dependem do partido, nem do executivo (contrariamente ao que se passa na maior parte da Europa), mas muitos dos que votaram contra fizeram-no também por entenderem que o sistema somente se regenera se “aqueles que erraram” arcarem com as consequências. Votaram contra, em defesa do capitalismo “na sua pureza original”, por entenderem que não cabe ao contribuinte recuperar as empresas que não têm condições para subsistir no mercado!

sábado, 27 de setembro de 2008

McCAIN/OBAMA - UM DEBATE SOBRE O IMPERIALISMO AMERICANO


UMA COMPLETA DESILUSÃO

Dificilmente se assiste a um debate tão decepcionante para quem esperava que da América pudesse vir alguma mudança. Pior, só mesmo a tradução simultânea da SIC. Uma vergonha!
Admito que possa ser muito difícil na campanha presidencial de uma grande potência hegemónica em declínio alguém tentar remar contra a maré, e apresentar uma visão diferenciada da política em geral, ainda por cima num país tão fanaticamente nacionalista como os Estados Unidos. Certamente, tenho isso em conta, assim como tenho em conta a missão salvífica que América a si própria se atribui. Mas mesmo dando de barato estas condicionantes, tenho que reconhecer que o debate, olhado de fora, só foi importante para se ficar a perceber como é que a América tenciona manter e impor no futuro o seu imperialismo. Nunca no último meio século, que me recorde, houve uma tão grande aproximação de objectivos entre os candidatos democrata e republicano. Creio também que, por esta razão, Obama foi derrotado por um grande reaccionário do qual nunca se conseguiu demarcar.
Começando pelo princípio. McCain conseguiu logo no começo, a propósito do plano Bush, mostrar-se suficientemente distanciado do que se está a passar na economia para não ser responsabilizado pela crise. Obama nunca foi suficientemente categórico na denúncia do capitalismo financeiro.
Depois, na política internacional, Obama só apresenta como “histórico”, para usar a terminologia de McCain, o ter sido contra a guerra do Iraque, embora hoje se fique sem perceber que nobres razões terão ditado o seu voto.
A propósito do Afeganistão e do Paquistão, Obama pareceu até mais belicoso do que McCain, o que não deixa de ser notável.
Sobre o Irão, McCain levou claramente a melhor, já que Obama não foi capaz de explicar o que verdadeiramente pretende dos iranianos. Dito de outra maneira, enquanto McCain tem clara consciência de que a sua beligerância está estrategicamente orientada no sentido de assegurar a hegemonia americana, nomeadamente no que respeita ao domínio das fontes energéticas, as posições de Obama, muitas vezes próximas das de McCain, parecem não ser ditadas por uma razão profunda. E depois, Obama não tinha nada melhor do que referir-se a Kissinger…
Quanto à Rússia, se a posição de McCain, como já se sabia, é perigosa por pôr em risco a paz mundial, a de Obama é profundamente decepcionante. Mais uma vez parece que ele é contra, sem saber porquê.

AS NOTÍCIAS DO GUARDIAN SOBRE O ATAQUE AO IRÃO



ISRAEL QUIS ATACAR O IRÃO EM MAIO

Com o mundo mergulhado na crise capitalista, desencadeada a partir do capitalismo financeiro americano, o Guardian dá hoje a conhecer, com base numa alegada fonte de um governante europeu, que o ex-primeiro ministro de Israel, Olmert, substituído por corrupção, quis atacar o Irão em Maio passado, acabando por não o fazer por não poder contar com o apoio de W. Bush. Segundo o jornal, Bush não caucionou o ataque por temer represálias iranianas contra os Estados Unidos, no Iraque e no Afeganistão, mas também por duvidar da capacidade de Israel para provocar danos irreparáveis nas instalações nucleares do Irão.
Israel que teria admitido a hipótese de lançar o ataque contra a opinião dos americanos, terá sido levado a abandonar o plano por não poder consumá-lo sem passar no espaço aéreo iraquiano, controlado pelos americanos. Qualquer ataque nestas condições seria considerado pelos iranianos perpetrado com a cumplicidade dos americanos e provocaria naturalmente as mesmas reacções.
Dá que pensar o facto de esta notícia ser divulgada agora, neste preciso momento histórico, pelo Guardian. Vamos esperar para ver…

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

É VÊ-LOS CAIR



MAIS UM

O governo dos Estados Unidos fechou mais um banco – o Washington Mutual - naquela que foi a maior falência de um banco “savings and loans” na história do país. O WaMu, que era o sexto maior banco em activos, foi ontem absorvido pelo JP Morgan por 1,9 mil milhões de dólares.

FALECEU O EXORCISTA DO VATICANO, CORRADO BALDUCCI



COMO SE MANIFESTA O DIABO?

Corrado Balducci, grande especialista em Demonologia da igreja Católica, morreu em Roma, com 85 anos, no passado sábado.
Balducci trabalhou como exorcista na Arquidiocese de Roma e ficou famoso pelos comentários que frequentemente fazia na televisão sobre satanismo, astrologia e outras ciências ocultas.
O demónio moderno, segundo o exorcista do Vaticano, manifesta-se principalmente através da música rock, que “contém mensagens satânicas subliminares que empurram o homem para o mal e para o suicídio”.

JÁ SÃO MUITOS A PREVEREM O FIM DO IMPÉRIO



OS NOSSOS NEOCONS RESISTEM


Por todo o lado se vem falando de muitas formas sobre o fim do Império. O declínio dos Estados Unidos como potência hegemónica é, cada vez mais, uma realidade do passado. Como já aqui dissemos uma vez, a dificuldade não está em constatar o facto. Qualquer observador desapaixonado o observa através de múltiplas facetas. O problema está em saber como vão os Estados Unidos reagir a esta inevitabilidade.
Não é somente Ahmadinejad que, entre os políticos, vaticina o fim do império americano; também Peer Steinbrück insuspeito líder do SPD, e ministro das Finanças de Angela Merkel, não tem dúvidas em afirmar: “Os EU perderão o seu estatuto como grande potência do sistema financeiro internacional”.
Mas Steinbrück disse ainda que o mundo não voltará a ser igual ao que existia antes da crise, criticou Washington pela sua negligência e recusou participar num plano de resgate semelhante ao Bush.
Num outro registo, George Soros, conhecido especulador e filantropo, não reconhece a Paulson idoneidade, nem competência para discricionariamente dispor de 700 mil milhões de dólares. Lembrou o passado recente do Secretário de Estado do Tesouro na negociação com a Fannie Mae e Freddie Mac que colocou o mercado imobiliário em pior situação do que a que estava e aduziu, por último, um argumento político de fundo: “ O que é que os contribuintes vão ganhar com o resgate do passivo dos bancos insolventes?” Soros acha que nem todos os bancos devem ser salvos
Em Portugal, os nossos conhecidos neocons resistem…de vitória em vitória…

VALE A PENA PERDER TEMPO COM ELES?


COMO OS NEOCONS PORTUGUESES INTERPRETAM A CRISE

Não vale a pena perder tempo com eles. Dito de outra maneira: não vale a pena levá-los a sério, contra-argumentar, etc. Eles próprios se ridicularizam. Um diz: ”Vale uma aposta, que o capitalismo vai ficar muito mais forte”; outra acrescenta: “A crise é uma manifestação da pujança do sistema”; outro sentencia: “O culpado de tudo isto é o “socialista” Roosevelt que quis garantir com o dinheiro do Estado o cumprimento dos empréstimos contraídos pelos pobres para comprar casa”; e, finalmente, em obediência à mais pura ortodoxia, outro remata: “Em Wall Street há regulação e supervisão a mais; não falta uma coisa nem outra, o que houve foi incompetência”.
Depois de ouvir tudo isto, percebo por que razão Cavaco foi abrir a sessão da Bolsa de Nova York.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

OS OBJECTIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÉNIO

A REDUÇÃO DA POBREZA NO MUNDO

O Público de hoje publica uma carta de João Cravinho, Secretário de Estado da Cooperação e do seu homólogo da Inglaterra (hoje chamado Reino Unido, embora nesta, como em muitas outras matérias, o que verdadeiramente interessa é o que os ingleses pensam), sobre os objectivos do milénio, cujo principal é, como se sabe, a redução da pobreza no mundo.
Devo confessar que não tive paciência para a ler, por razões muito óbvias: em primeiro lugar, a Inglaterra é o país que mais pobres historicamente fez no mundo e a pobreza nunca foi uma preocupação da Velha Albion. A sua preocupação historicamente documentada sempre foi, e continua a ser, o lucro. Ainda recentemente, a Inglaterra foi, no quadro comunitário, o grande paladino da imposição (disfarçada sob a forma de acordo) das doutrinas neoliberais aos países em desenvolvimento. Obrigaram-nos a aceitar um modelo económico desastroso, responsável pela destruição das economias nascentes, despudoradamente aberto às fortes economias do Norte, destruidor das economias de subsistência, que empurrou as populações para as grandes cidades e que espalhou a fome e a miséria por toda a África.
Por outro lado, confirmou-se agora o que as pessoas avisadas já sabiam quando se fixaram os objectivos do milénio: um exercício de grande demagogia em que a maior parte das promessas não iria ser cumprida. Enfim, Cravinho não poderia ter escolhido pior companhia, nem tema mais vulnerável.
ADITAMENTO

Alguns amigos, próximos do sector, fizeram-me chegar pessoalmente o comentário a este post, criticando a incidência exclusiva dos meus remoques no governante inglês. Pensei que tinha suficientemente claro. Vou-me redimir, incluindo no aditamento o que supus se depreenderia da peça principal: “Diz-me com quem andas...”.

A MANIPULAÇÃO DA INFORMAÇÃO



À DIREITA FALTA-LHE ESPAÇO

Pacheco Pereira, um dos grandes manipuladores da informação no tempo do cavaquismo, juntamente com Moniz, não tendo hoje dos meios que outrora já teve ao seu dispor, insurge-se veementemente contra o que considera as sessões de propaganda do Canal 1 a propósito da distribuição do Magalhães.
A SIC, sobre o mesmo tema, sublinha como centro da notícia as falhas de segurança que encontrou em meia dúzia de computadores distribuídos numa qualquer escola.
A TVI, no telejornal da uma, de hoje, passou 25 minutos a falar de crimes ocorridos nos quatro cantos do país.
A direita está com falta de espaço. No plano económico e em tudo o que tem a ver com a economia, Sócrates ocupou-lhes o lugar e desempenha o papel muito melhor do que eles. Além de que, tanto Sócrates, como os seus acólitos, nomeadamente os teóricos do “socialismo moderno”, sabem “embrulhar os projectos regressivos numa retórica de esquerda”.
No resto, a direita é muito retrógrada e o país, apesar de conservador, prefere Sócrates.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

A CRISE FINANCEIRA NA ONU E NO MUNDO

AS PROPOSTAS DOS RESPONSÁVEIS POLÍTICOS

Sobre a crise económico-financeira, os responsáveis e ex-responsáveis políticos de todo o mundo, a maior parte deles lavando as mãos como Pilatos, vão brandindo argumentos contra a hegemonia do mercado e propondo soluções e reformas para evitar no futuro males maiores.
Comecemos pelo Dr. Mário Soares. Soares responsabiliza os neoliberais americanos e os seus seguidores europeus pela crise; mostra-se muito céptico relativamente ao papel que a chamada esquerda americana possa desempenhar na procura de novas soluções e lamenta-se que na Europa já não haja, no campo da social-democracia, políticos como os de outrora. Os partidos socialistas, enfeudados à terceira via de Blair e Schroeder ou – ele não o diz, mas pensa-o – seduzidos pelo pragmatismo que rapidamente os lançou nos braços do neoliberalismo, deixaram de ser uma referência séria para qualquer tipo de mudança estrutural.
Sarkozy, no discurso que hoje proferiu na Assembleia Geral das Nações Unidas, fez uma crítica contundente ao modelo neoliberal em vigor, atacou o sistema financeiro internacional, traçou um novo papel para os bancos (que apenas devem servir para financiar o desenvolvimento económico) e propôs a realização até ao fim do ano de uma reunião ao mais alto nível para corrigir os erros do sistema.
Lula da Silva, o homem que está mudar a face do Brasil, baseado na superioridade moral e política que lhe advem, em quase seis anos de mandato, da criação de 10 milhões de empregos formais e de uma redistribuição, lenta mas segura, de rendimento e riqueza, manifestou-se contra medidas paliativas e preconizou mecanismos de controlo e de supervisão que assegurem total transparência ao funcionamento do sistema financeiro.
Na América, os democratas, entalados entre a “urgência” das medidas propostas por Bush e as consequências eleitorais de uma recusa, já só estão preocupados em que os 700 mil milhões de dólares não vão parar inteirinhos aos bolsos dos especuladores de Wall Street em troca do “lixo” que eles vão entregar ao Estado como retribuição e lutam para que alguma coisinha sobre para os que ficaram sem casa, sem emprego e sem dinheiro.
E também Cavaco, a quem numa curta intervenção ouvi, em N.Y., perorar sobre a situação, parece ter uma solução técnica para este problema “tecnicamente complexo” que assola o mundo.
A grande, enorme, enormíssima diferença entre esta crise e as que ocorreram até 1989, a de 1929 incluída, é que as soluções para a debelar estão sendo procuradas pelos mesmos que são por ela politicamente responsáveis. Os lesados pela crise, dada a situação excepcional que hoje se vive no mundo de completo domínio ideológico de um modelo de organização social, não têm respostas, nem vontade, nem capacidade de acção política para se tornarem sujeitos da História.
Bem se engana, por isso, o Dr. Mário Soares quando afirma que hoje não há líderes com a qualidade e coragem dos de outrora. O que não há na Europa é quem empunhe a bandeira da luta para mudar o sistema. Os líderes de que ele fala são aqueles que tiveram a inteligência de ceder o que podia ser cedido, para não perderem o essencial e cativarem com as suas cedências os que haviam optado por outro caminho. A partir do momento em que deixou de haver outro caminho, por que não deixar funcionar o sistema na sua plenitude global?

BUSH DESPEDE-SE DA ONU ACUSANDO A SÍRIA E O IRÃO DE FINACIAREM O TERRORISMO

E AHMADINEJAD VATICINA O FIM DO IMPÉRIO AMERICANO

Naquela que foi a sua última intervenção nas Nações Unidas, W. Bush, recuperando o discurso do Eixo do Mal, responsabilizou o terrorismo pela actual situação, acusou a Síria e o Irão de financiarem o terrorismo e invocou – imagine-se! - a Carta das Nações Unidas para atacar a Rússia. Ahmadinejad, por seu turno, apelou ao diálogo, sem, contudo, aceitar intervenções ilegais no programa nuclear e atacou duramente os seus principais inimigos – EUA e Israel. Vaticinou o fim do império americano e insistiu na tese de que está próximo o fim dos “assassinos sionistas”.

FIM DE UMA ERA

ACABARAM OS BANCOS DE INVESTIMENTO EM WALL STREET

A crise financeira acabou com uma tradição de 80 anos: a Reserva Federal Americana aprovou a conversão do Goldman Sachs e do Morgan Stanley, os dois últimos sobreviventes, em bancos comerciais regulados e supervisados como os demais.
Ser como Goldman Sachs”, imagem de marca de Wall Street, deixou de o ser. A crise financeira acabou com a aristocracia do sistema. O Bears Stearns foi adquirido em Março pelo JP Morgan; o Lehman Brothers faliu; o Marrill Lynch foi comprado pelo Bank America; e os dois que restavam converteram-se em bancos comerciais.
Bush e a sua gente governaram o suficiente para provarem o fel amargo da derrota em toda a extensão da sua governação. Derrotados militarmente no Iraque, de lá sairão, sem honra nem glória, com um rearranjo geoestratégico da região (emergência do Irão como grande potência regional) que está muito longe de favorecer os Estados Unidos. Barrados no Cáucaso e no Mar Negro, perderam a cartada da hegemonia na Ásia Central. Atolados no Afeganistão, onde ninguém os quer (nem a eles nem aos europeus), caminham para uma derrota de efeitos catastróficos. Cada vez mais incompatibilizados com o perigoso Paquistão, correm o risco de abrir uma nova frente que os obrigará a uma revisão completa da política de alianças na Ásia. De potência hegemónica no fim do mandato Clinton, a América viu emergir durante a Administração Bush novos pólos de poder que marcarão decisivamente o sec. XXI. E, por último, certamente o que mais dói: a derrota da ideologia neoliberal que os obrigou a fazer agora, para salvar o sistema, exactamente o contrário de tudo o pregaram aos outros nos últimos 30 anos!

A REPRESSÃO FRANQUISTA


GARZÓN JÁ RECEBEU MAIS DE 130 MIL NOMES DE VÍTIMAS

Os familiares das vítimas do franquismo e as associações de recuperação da memória histórica levaram hoje ao juiz Garzón a relação dos nomes das pessoas que foram torturadas, “passeadas”, e depois fuziladas e enterradas em valas comuns ou pura e simplesmente lançadas ao mar.
As pessoas que nos últimos anos investigaram a repressão franquista fizeram chegar à justiça espanhola mais de 130 mil nomes, bem como pistas sobre os locais onde podem ser encontrados. Para que os mortos tenham nome e sepultura!
Um dos casos mais tristemente célebre, o de Garcia Lorca, acabou por obter autorização da família para a sua exumação; as escavações serão feitas perto de Granada, no local onde se crê tenha sido assassinado.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

AS LIÇÕES DA CRISE

EM PORTUGAL, EFICÁCIA ZERO

As primeiras lições que em Portugal se podem tirar da crise assola o capitalismo neoliberal, sem freios nem açaimos, é a de que a crise nunca existiu.
À parte umas notícias nos jornais, uns suaves comentários dos banqueiros, nada mais no establishment português verdadeiramente importante passou.
Os comentadores neoliberais passaram pelo cataclismo como cão por vinha vindimada ou, quando tiveram que falar sobre o assunto, deram mais uma vez provas do seu proverbial autismo, a ponto de chegarem a afirmar que a crise mais não é do que uma demonstração da pujança do sistema capitalista!
Do lado dos partidos chamados de direita, nomeadamente o PPD/PSD, o que se ouviu foi sempre no sentido de um maior liberalismo. Se estivessem mais a par do que afirmam os seus congéneres (fundamentalistas) americanos até certamente diriam, tal como eles, que a crise tem a sua principal causa no excesso de regulação.
Mas não é destes - de quem obviamente nada há a esperar - que me quero ocupar. Estou mais interessado em perceber o que é que o PS compreendeu do que se passou. A avaliar pelos discursos da rentrée, nomeadamente o de Sócrates, parece também concluir-se que a crise nunca existiu. Ou melhor, se existiu foi apenas para justificar o desfasamento entre a actual situação económica do país e aquela que o governo previa que existisse. Tirou dela Sócrates qualquer outra lição? Pegou Sócrates neste verdadeiro 11 de Setembro económico para fustigar a direita e o capitalismo neoliberal? Foi Sócrates de opinião que o desastre dos mercados financeiros é um fenómeno comparável à queda do muro de Berlim para o comunismo soviético?
Não, Sócrates não está interessado nisso. O que o move são umas tretas contra o PSD a propósito da Madeira e afirmação de que o seu Governo é um exemplo de “modernidade” sem precedentes na história de Portugal. Por esta amostra do que o PS pensa sobre a crise já nós poderemos fazer uma ideia do contributo que os “meninos de ouro” da Respublica nos vão dar sobre tema.
O PS português deve ter sido o único partido no mundo com aquele nome que não teceu comentários políticos ao que se está a passar. O que, de resto, não constitui para qualquer observador minimamente atento motivo de espanto ou de surpresa. Basta acompanhar a sua prática política e ler os seus ideólogos para se compreender que o tema não poderia deixar de ser muito incómodo. Então não é verdade que o “socialismo moderno” é algo que nada tem a ver com a economia e que isso da redistribuição da riqueza por força da acção do Estado não passa de uma velharia sem nome? E não se sabe que a verdadeira redistribuição se faz pela acção infalível do mercado?

domingo, 21 de setembro de 2008

CONGRESSO AMERICANO ESTUDA PACOTE DE 700 MIL MILHÕES DE DÓLARES PARA ATENUAR CRISE FINANCEIRA

PELA BOCA MORRE O PEIXE

Os neo-liberais americanos, que tantas e tantas vezes teceram loas às virtualidades do mercado e à sua capacidade para através da “mão invisível” restabelecer os equilíbrios eventualmente afectados, vêem-se agora a braços com uma crise financeira sem precedentes que somente pode ser atenuada pela compra, pelo Estado, dos activos financeiros das instituições afectadas pelo crédito imobiliário.
É isso que o Presidente da América propôs ao Congresso: um pacote de 700 mil milhões de dólares para resgatar o sector financeiro.
Perante tal situação, o que os adversários do neo-liberalismo sublinham é a verdadeira natureza de um sistema que demagogicamente se apresentava capaz de operar tanto mais eficientemente quanto menos regulação estatal tivesse e que afinal teve que chamar o Estado em seu auxílio para poder sobreviver. O que eles denunciam é a verdadeira face de um sistema que privatiza os lucros, mas que “na hora da verdade” não tem pejo em remeter para os bolsos dos contribuintes o pagamento dos prejuízos.
Nunca ninguém de bom senso falou a este respeito de socialismo. Não é disso que se trata, mas antes capitalismo puro e duro.
Qualquer confusão que a este respeito se queira lançar, como a de chamar a esta intervenção uma medida típica do velho socialismo, só pode ter por objectivo fazer passar a ideia de que o “novo socialismo” já nada tem a ver com a economia.

OBAMA ACUSA McCAIN DE QUERER PRIVATIZAR A SEGURANÇA SOCIAL

McCAIN NEGA AGORA O QUE ANTES DEFENDEU


Nos períodos áureos do neo-liberalismo, quando Wall Street só somava vitórias, não faltava quem defendesse mais desregulamentação. McCain foi um deles, menos regulação para o sistema financeiro, e privatização da segurança social, como meio seguro de os reformados poderem gozar tranquilamente as suas reformas.
Obama lembrou agora as palavras de McCain. Palavras que os blogues americanos repetem sem cessar. Em 2004, dizia ele: “Without privatization, I don’t see how you can possible over time make sure young americans are able to receive social security benefits”.
Os nossos liberais nem depois do terramoto que por aí vai mudam o discurso e tal como McCain também eles estão muito preocupados com os jovens!

sábado, 20 de setembro de 2008

ZAPATA OU ZAPATERO?

A ESPANHA FICA NA AMÉRICA LATINA?


O que se passou recentemente com McCain, a propósito da Espanha e de Zapatero, ilustra na perfeição o que é hoje uma eleição presidencial nos Estados Unidos da América.
Os eleitores podem eleger qualquer pessoa, alguém que não esteja minimamente capacitado para o lugar que teoricamente vai desempenhar. Já foi assim com W. Bush e vai voltar a ser assim se McCain for eleito. Alguém se encarregará de governar por ele.
MCCain apresenta-se como um herói (já aqui falámos da sua heroicidade) e ainda como alguém que terá votado contra Bush no Senado em menos de 10% das deliberações. Votou, porém, com Bush todas as guerras e no conflito da Geórgia até mostrou garras mais aceradas do que as exibidas pelos falcões de Washington.
Recentemente, perguntaram-lhe se, caso fosse eleito, falaria com Zapatero (que está na lista negra de Bush desde que mandou retirar as tropas do Iraque) e as respostas de McCain foram muito semelhantes às que ele tem dado quando lhe falam de Cuba, da Bolívia ou da Venezuela. O entrevistador achou estranho e voltou ao tema mais duas, três vezes. Da última, e quarta vez, McCain disse: “Espero poder reunir-me com qualquer líder que tenha os mesmos princípios, e com a mesma filosofia que nós temos dos direitos humanos, da democracia e da liberdade, e me manterei firme com os que não o fazem”.
O El Pais, espantosamente, quando relatou a notícia, tentou amenizá-la, lembrando aos leitores que, em Abril passado, McCain numa entrevista que lhe concedera havia manifestado uma posição muito mais concialiatória em relação à Espanha. Ou seja, o El Pais curvou-se respeitosamente perante o império e tentou demonstrar aos seus leitores que as relações com a América não eram assim tão más como a entrevista fazia supor. Nem por um momento o El Pais teve um assomo de orgulho que lhe permitisse pôr a ridículo o candidato presidencial americano. Foi preciso que os Blogues americanos(nomeadamente o Huffington Post) e, depois, também o Washington Post, viessem ridicularizar McCain, acusando-o de confundir Zapatero com Zapata e de supor que a Espanha ficava na América Latina, para que o El País passasse a encarar a questão com outra atitude.

A AdC NÃO REGULA O PREÇO DOS COMBUSTÍVEIS

E CAVACO ACHA QUE A SITUAÇÃO É COMPLEXA

A Autoridade de Concentração capitalista, eufemísticamente chamada da concorrência, acha que não há nada a regular. E Cavaco é de opinião que o problema é complexo.
A complexidade consiste no seguinte:
Quando o petróleo subia todos os dias nas praças de Londres e Nova York, as petrolíferas tinham de subir os preços também diariamente porque o preço do petróleo na origem entrava pesadamente na “composição” do preço final ao consumidor.
Quando se verificou o movimento inverso, com o petróleo a descer todos os dias na origem, a ponto de hoje se registar uma descida superior a 40 dólares relativamente ao preço mais alto, as petrolíferas “explicam-nos” que o preço dos combustíveis não tem a ver apenas com o preço na origem, pois como diz, sem nenhuma vergonha o presidente da Galp, o “crude até pode descer e a gasolina subir”.
A AdC cruza os braços, como era de esperar, e confia na função regulatória e regeneradora do mercado; Cavaco, pelo seu lado, acha que o problema é complexo.
Da atitude da AcD até a neoliberalíssima Bruxelas se espanta. Da observação de Cavaco apenas se espera que, daqui a dois anos e meio, quando os portugueses forem votar nas presidenciais se não esqueçam de votar num candidato que veja as coisas com mais simplicidade. Alguém com menos capacidade de compreensão dos “dramáticos” problemas com que as petrolíferas se defrontam.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

CASA DE FERREIRO, ESPETO DE PAU


A INSTRUMENTALIZAÇÃO DO PODER JUDICIAL


O El País de hoje, louvando-se na Human Right Watch, denuncia com grande desenvolvimento a instrumentalização do poder judicial, na Venezuela, por Hugo Chavez.
Não estou muito a par do que se passa na Venezuela, embora, a avaliar pelo que nos contam de outras paragens, se imponha a devida reserva. Entre o que realmente se passa e o que nos contam vai sempre, de acordo com as conveniências da ideologia dominante, uma grande diferença. Veja-se o caso da Bolívia, completamente deturpado pela matilha de comentadores (como lhes chama Rui Namorado) que, dia após dia, falsifica a realidade com as suas notícias e comentários.
Mais recato se esperava, contudo, do El País, embora a gente saiba que, na América Latina, tudo o que não faça reverência a Espanha e rejeite a condição de vassalo não é bem tratado. Mas não é apenas por essa razão que se esperava mais contenção do El País. Esperava-se que num país onde o poder judicial passa por uma grave crise, tanto pela defesa exacerbada dos mais indefensáveis interesses corporativos (veja-se o caso de Mariluz), como pela sua instrumentalização pelo poder político, houvesse o pudor necessário para não abordar semelhante tema sem primeiramente fazer uma violenta crítica ao que internamente se passa.
Bata dizer que o Tribunal Constitucional esperou largos meses pela sua recomposição em consequência dos descarados jogos políticos que visavam a sua dominação. Depois foi a cena, censurada por mais de três quartos dos juízes, da composição do equivalente ao nosso Conselho superior da Magistratura, que acabou por ficar completamente nas mãos dos partidos dominantes. E, com se tudo isto não bastasse, a clara intromissão, por pressão do Governo, do poder judicial no poder legislativo.
Veja-se o que se tem passado no País Basco, com os partidos que o centralismo espanhol identifica como próximos da ETA. Primeiro, foi a ilegalização de Batasuna e, mais grave ainda, a dissolução do respectivo grupo parlamentar com a subsequente condenação da mesa do parlamento basco que se recusou a dar cumprimento da sentença, em obediência à decisão do parlamento baseada no princípio da separação de poderes. Agora, é o mesmo procedimento relativamente à ANV (acção Nacionalista Basca) e ao PCTV-EHAK (Partido Comunista das Terras Bascas), com base nas mesmas razões.
Enfim, Chavez ainda tem certamente muito a aprender com os antigos senhores da Venezuela…

OS CLUBES PORTUGUESES NA TAÇA UEFA



A MISÉRIA DO COSTUME


Com excepção do Braga que, jogando contra o último classificado do campeonato da Eslováquia, ganhou folgadamente, os restantes têm a sua sorte mais ou menos traçada. Mais uma vez, não passarão da primeira eliminatória numa prova claramente da 2.ª divisão europeia.
Há quem alimente esperanças relativamente ao Benfica, mas são infundadas. Desta vez não será por falta de jogadores que ficará pelo caminho. Mas por falta de muita outra coisa que não se adquire em quinze dias. Quique Flores, pese embora a simpatia humana que desperta, ainda não foi capaz de dar a entender que tipo de futebol pretende praticar. Jogar hoje com quatro na frente, dos quais nenhum desce, é um futebol condenado a muitas derrotas…como se está a ver.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

A FASE DE GRUPOS DA LIGA DOS CAMPEÕES

TUDO NORMAL

Com excepção da vitória em Roma do campeão romeno, tudo correu normalmente, mais ou menos como se esperava.
O Sporting perdeu em Barcelona, perante uma equipa com alguns jogadores de altíssimo nível, e o Porto ganhou em casa.
Houve, nos diversos jogos, vários erros de arbitragem, como também é normal, que os comentadores com a ajuda das imagens identificaram com facilidade. Também é normal que o penalty não assinalado, cometido pelo defesa do Porto, quando o jogo estava intenso, e Porto ganhava por 2-1, tenha merecido do comentador da RTP as palavras que todos ouvimos. Tal como na história do mexicano, em que é a vítima que mete a barriga na faca do bandido, também aqui foi o avançado turco que se movimentou no sentido contrário ao puxão na camisola. Como muitas vezes tenho dito, é um erro supor que apenas os árbitros e os dirigentes estão envolvidos na corrupção no futebol.

A CRISE FINANCEIRA E A CAMPANHA ELEITORAL


QUE ESPERAR DOS CANDIDATOS?

Agora que o debate eleitoral passou de novo a abordar temas sérios, tal a gravidade da situação gerada pelas sucessivas falências de alguns potentados da alta finança americana, o bâton dos lábios foi relegado para o papel que realmente tem. Sarah Palin saiu de cena e ficou com muito mais tempo para tratar das suas crianças.
O mais grave é que os candidatos não adiantaram nada de realmente muito novo em relação ao futuro. John McCain até chegou a dizer que os fundamentos da economia são sólidos, embora no dia seguinte tenha feito uma correcção, sem contudo deixar de advogar pouca intervenção do Estado. Obama critica Bush pela situação a que se chegou, mas não adianta nada de realmente novo para alterar a situação.
Ambos os candidatos estão ligados a Wall Street. A campanha de Obama recolheu de lá cerca de 10 milhões de dólares. Por outro lado, um dos seus grandes conselheiros na área é um ex-conselheiro delegado da Fannie Mae e entre os seus colaboradores está o ex-Secretário de Estado do Tesouro, Robert Rubin, agora assessor do Citigroup. Além destes, aconselha-se ainda, em matéria financeira, com Lawrence Summers, também ex-Secretário de Estado do Tesouro e Paul Volcker, ex-presidente da Reserva Federal, muito elogiado por Allan Greenspan. Enfim, tudo gente muito ligada a Wall Street e grandes defensores da economia neoliberal.
Talvez por tudo isto se compreenda por que razão uma tão significativa percentagem de americanos se abstém de tomar parte no acto eleitoral…

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

É VÊ-LOS CAIR


A BARBÁRIE NEOLIBERAL

Anteontem foram as gigantescas injecções de capitais na Fannie Mae e Freddie Mac, ontem foi o Lehman Brothers, hoje, se não lhe deitam a mão, é AIG, a maior seguradora do mundo.
Os arautos do neoliberalismo com assento na Reserva Federal Americana e na Secretaria de Estado do Tesouro aparecem de baraço ao pescoço sem saber como explicar ao mundo o que se está a passar.
Ainda há bem pouco tempo, eufóricos com a vitória, impunham o seu modelo a todos os que necessitavam do apoio das instituições financeiras internacionais. O FMI, grande sacerdote da ortodoxia neoliberal, garantia com a sua chancela que só poderiam beneficiar de fundos aqueles que se obrigassem a seguir à risca a cartilha do consenso de Washington. E todos o respeitavam: Banco Mundial, instituições da Comunidade Europeia e outros bancos regionais.
Por todo o lado se somavam vitórias com o imparável movimento de liberalização de capitais. Clinton, verdadeiro imperador dos tempos modernos, eliminava o défice americano e enchia os bolsos a Wall Street como nunca antes se vira, à custa de uma crise sem precedentes na Rússia, na maior parte das economias asiáticas e da América Latina, com catastrófica incidência na Argentina e prejuízos incalculáveis no Brasil.
Atordoados com o êxito, entraram num verdadeiro esquema D. Branca que ruiu como um baralho de cartas. É tempo de pôr cobro a esta verdadeira loucura que deixa o mundo à beira do abismo.

A CRISE NA UCRÂNIA

E AGORA, O QUE FAZ A NATO?

O presidente do parlamento ucraniano anunciou esta manhã o fim da “coligação laranja”, composta pelo partido minoritário do Presidente da República, Viktor Yushenko, e pelo bloco das forças lideradas pela Primeira- ministra, Iulia Timoshenko.
O novo governo tanto pode resultar de uma nova coligação entre as forças parlamentares que apoiam Iulia Timoshenko e o partido do anterior presidente, Yakunovich, como dos partidos mais votados nas próximas eleições. O mais provável é que o Presidente dissolva o Parlamento e convoque eleições gerais. Pelo menos, foram nesse sentido as suas palavras quando a crise se desencadeou.
A crise teve a sua causa próxima nas leis que reduzem os poderes do presidente, aprovadas contra o partido deste, embora a causa real esteja na posição assumida por Yushenko relativamente ao conflito georgiano. Foi a discordância relativamente às posições assumidas por Yushenko na crise da Geórgia que levou o partido da Primeira-ministra (BYT) a aliar-se ao Partido comunista e ao Partido das Regiões, de Yakunovich, todos partidários de relações amistosas com a Federação Russa.
Actualmente, no parlamento, o Partido das Regiões tem 175 lugares, o BYT 156, a coligação Nossa Ucrânia-Auto Defesa Popular 72, o Partido Comunista 27, e o bloco de Vladimir Litvin 20. O parlamento tem 450 membros e para governar é necessária uma maioria de 226.
Vendo o modo como se repartem as forças políticas relativamente às relações com a Rússia, percebe-se que a posição hostil do actual Presidente da República é francamente minoritária e não goza do apoio da esmagadora maioria da população. De facto, as forças políticas reflectem o sentimento do povo ucraniano – e não apenas das populações do leste da Ucrânia, como frequentemente se diz – que historicamente convive pacificamente com o povo russo há séculos, a ponto de se poder dizer que a Rússia nasceu na Ucrânia.
As manifestações nacionalistas estimuladas pelos nazis, durante a Segunda Guerra Mundial, dirigiam-se mais contra algumas práticas estalinistas do que verdadeiramente contra a Rússia. Por isso, não deixa de constituir, da parte dos europeus, uma manifestação de grande irresponsabilidade o fomento na Ucrânia de um clima de confronto com a Rússia e constitui por parte da NATO e dos Estados Unidos mais uma grave provocação de quem não olha a meios para atingir os seus fins. E os fins são os fins do imperialismo americano!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

CUIDADO COM AS PALAVRAS

O APELO DE JERÓNIMO DE SOUSA

Perguntado a propósito do Estatuto Político-Administrativo dos Açores se concordava com a posição do Presidente da República, Jerónimo de Sousa, para sublinhar a convergência estratégica entre aquele e o Governo, disse que em seu entender o Presidente da República intervinha de menos, citando uma série de diplomas relativamente aos quais o PR, segundo o entendimento do PCP, deveria ter intervindo.
Esta afirmação de Jerónimo de Sousa tem de ser entendida no seu devido contexto. Assim, em primeiro lugar, ele pretendeu sublinhar a tal convergência estratégica entre o PR e o Governo em tudo que realmente é essencial para a governação do país; em segundo lugar, Jerónimo de Sousa só estará realmente de acordo com uma maior intervenção do PR se ela for no sentido das propostas defendidas pelo PCP.
Mesmo assim entendida, a afirmação encerra perigos e Jerónimo de Sousa, que é um homem prudente e cauto, que sempre actua com grande sentido das responsabilidades, tendo por isso colhido a simpatia dos portugueses muito para além da base eleitoral do PCP, deveria ser o primeiro a tê-los em conta.
Na verdade, o sistema constitucional português assenta num equilíbrio de poderes entre os diversos órgãos de soberania que, uma vez alterado pela prática de um deles, nomeadamente do órgão unipessoal, levaria rapidamente à subversão do sistema. O sistema semi-presidencialista, que é o nosso, assenta num equilíbrio que tem por base o cumprimento rigoroso dos poderes constitucionalmente atribuídos aos diversos intervenientes.
Assim, o Governo responde perante o Parlamento e perante o Presidente da República; todavia, este só excepcionalmente o pode demitir ”quando tal se torne necessário para assegurar o regular funcionamento das instituições”, enquanto a Assembleia da República demite o Governo se rejeitar o seu programa, se não aprovar uma moção de confiança e, ainda, se aprovar uma moção de censura por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções. O modo como o Governo responde perante os dois órgãos de soberania acima referidos reforça inequivocamente a componente parlamentar do sistema.
Por outro lado, o Presidente da República, observados certos limite temporais, pode dissolver a Assembleia da República, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos nela representados. Este é um poder extraordinário, que deve ser exercido com a máxima prudência, pois, apesar de juridicamente não ter outros limites que os acima referidos, o seu exercício imprudente deixa o PR politicamente muito fragilizado, se as novas eleições confirmarem a composição maioritária da assembleia dissolvida.
Depois, contrariamente ao que acontece nos regimes presidencialistas, o Presidente da República não pode ser destituído pela Assembleia da República. Apenas a condenação pelo Supremo Tribunal de Justiça por crimes cometidos no exercício das funções implica a destituição do cargo.
Fora destes poderes, o Presidente da República pode dirigir mensagens à Assembleia da República e reunir-se regularmente com o Primeiro-Ministro, para este lhe dar conta da actividade governativa (soft power, em ambos os casos); além dos poderes específicos em matéria de relações internacionais e de defesa, o PR pode ainda submeter à apreciação do Tribunal Constitucional, preventiva ou sucessivamente, os diplomas que exijam a sua promulgação e vetar qualquer decreto aprovado pela Assembleia da República que lhe seja submetido para ser promulgado como lei, bem como qualquer decreto do Governo enviado para promulgação.
É exactamente a propósito deste poder de veto do Presidente da República que as palavras de Jerónimo de Sousa ganham uma particular importância. Embora se possa defender que o direito de veto não é incondicionado, já que o seu exercício tem de ser entendido no quadro constitucional como um todo, e embora também se saiba que o seu exercício é na generalidade dos casos superável, sempre que a base parlamentar que apoia o Governo disponha de uma maioria absoluta, a verdade é que o seu uso imoderado, com o objectivo de fazer vergar o Governo (qualquer Governo) às opções políticas do Presidente da República, é um perigo que não pode descartar-se, principalmente se o Governo em exercício apenas dispuser de uma maioria relativa no Parlamento.
Por isso qualquer apelo a uma maior intervenção presidencial é de rejeitar. Além de que, objectivamente, ela implica um maior poder de um órgão unipessoal, que é sempre um mal em si.
Mesmo que se entenda que o apelo a uma maior intervenção presidencial poderia levar a uma situação de conflito, geradora de um novo estádio das relações institucionais, também com esse entendimento o apelo não seria apropriado. Conhecemos as virtualidades do conflito nas lutas políticas e sociais. Pelo menos, desde Maquiavel. Contra a tradição aristotélica e escolástica, Maquiavel foi o primeiro pensador político a reconhecer ao conflito um papel positivo. Depois, Marx teorizou amplamente o conflito, atribuindo-lhe um papel decisivo no progresso da humanidade. A verdade é que o conflito, para ser virtuoso, tem de gerar um novo equilíbrio mais vantajoso que o anteriormente existente. Todavia, para que isso aconteça é necessário que uma das partes no conflito defenda inequivocamente os seus interesses. E que interesses são defendidos pela parte que Jerónimo de Sousa representa num conflito entre o actual Presidente da República e o Governo?

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

MOURINHO E A SICÍLIA


A ADVERTÊNCIA DO DIRECTOR DO CATÂNIA

Aqui há uns anos, quando Mourinho foi ao estádio do Porto, como treinador do Chelsea, acompanhado de seguranças, perguntaram-lhe: “Por que vem acompanhado de seguranças?
No seu estilo arrogante e superior, Mourinho respondeu: “Quando vou à Sicília ou a certos outros lugares faço-me acompanhar de seguranças”.
Pois é, e bem precisa, premonitórias que foram as suas palavras.
Depois do jogo com o Catânia, em que venceu pela diferença mínima, com dois auto-golos, Mourinho disse: “Deveríamos ter ganho por 5-1!
O director do Catânia, mal teve conhecimento das declarações de Mourinho, respondeu: “Ele é daqueles que se devem tratar à bastonada nos dentes”.

O SEM-VERGONHA PRESIDENTE DA GALP


COMO SE EXPLICA A IMPUNIDADE DA GALP

O presidente da Galp fez hoje um “número” em Sines para o qual convocou os jornalistas. Mas os jornalistas estavam interessados era em saber por que não baixam os combustíveis quando o barril do petróleo está a pouco mais de 90 dólares no mercado internacional.
Com a impunidade própria de quem manda em quem manda e com a total falta de vergonha que o caracteriza, o presidente da Galp, disse que não há relação entre os dois fenómenos: “O petróleo pode descer e a gasolina e o gasóleo podem subir”. E disse ainda que havia também “que tomar em conta a valorização do dólar”.
Não vale a pena argumentar contra estas grosseiras agressões à inteligência dos ouvintes, mas vale a pena continuar a afirmar que o “Robin dos Bosques” nunca existiu. Bem podem os fervorosos acólitos do Governo nos jornais., nos blogues, nas televisões continuar a afirmar que o Governo faz isto e mais aquilo, porque a única e inelutável verdade é que este Governo do PS, em matéria económica, é completamente refém do grande capital. Ele não manda, ele é mandado! Ele não tem uma política, ele serve uma política! Basta!

O INIMIGO E A AMEAÇA


QUE DIFERENÇA?

Luís Amado, interrogado hoje em Bruxelas, antes da reunião que decidiu sobre os observadores a enviar para a Geórgia, para inspeccionar as zonas adjacentes da Ossétia do Sul e da Abekázia, manifestou-se contra o tratamento da Rússia como inimigo. E estabeleceu a diferença entre inimigo e ameaça, criticando abertamente a NATO e os países da UE que confundem os dois conceitos. Igualmente se manifestou contra a criação de um novo clima de guerra-fria nas relações este-oeste.
Em primeiro lugar, é de louvar não considerar a Rússia como inimigo, como de aplaudir é a recusa de um novo clima de guerra fria.
Agora, o que não se percebe muito bem é onde está a ameaça. De facto, quem levou a cabo uma política agressiva, de cerco à Rússia, foi a NATO e os Estados Unidos, com a activa colaboração de alguns países do leste e a cumplicidade dos demais Estados da União. Como muito bem diz Santiago Carrillo, no El País de hoje, “Desde que o mundo existe, quando um exército estrangeiro cerca uma cidade é para a obrigar a capitular e a render-se ou para a atacar e a destruir”.

A SITUAÇÃO NA AMÉRICA LATINA


O DECLÍNIO DOS EUA NA REGIÃO


A crise da Bolívia, muito agudizada nos últimos tempos, pela posição assumida por algumas províncias autonomistas, tem servido para demonstrar que os Estados Unidos estão muito longe de hoje desempenharem na região um papel semelhante ao que outrora nela tiveram. Governada durante mais de um século pelas oligarquias que vinham do tempo colonial ou que substituíram os colonizadores, a América Latina foi pasto fácil do imperialismo americano, mediante o estabelecimento de uma aliança natural com as ditas oligarquias locais.
Nos últimos dez anos tudo mudou. Uma mudança muitas vezes silenciosa, mas consistente. Primeiro, foi o derrube de todas as ditaduras militares apoiadas pela América, depois, muito gradualmente, a chegada ao poder de governantes com programas populares ou mesmo oriundos das camadas populares, em grande medida constituídas pelas populações indígenas, descendentes de escravos e trabalhadores em geral.
A pouco e pouco foi-se criando um sentimento de pertença à mesma comunidade, posto que constituída por vários países com histórias diferentes ou, mesmo quando próximos, nem sempre semelhantes. Cresceu também em muitos deles um sentimento anti-americano já enraizado no sentimento popular e noutros uma vincada manifestação de autonomia em relação aos senhores do norte. Tudo isto acompanhado de um efectivo domínio das matérias-primas locais, nomeadamente as energéticas, pelos respectivos governos nacionais. O tempo de a América Latina como o pátio traseiro da casa americana acabou de vez.
Hoje, na América Latina, há países que afrontam directamente o poder americano e outros, que, embora prossigam uma política mais branda relativamente ao grande vizinho do norte, nem por isso deixam de marcar as suas distâncias e de se revelarem muito ciosos da sua autonomia e independência.
A crise da Bolívia tem ilustrado, como nenhuma outra, esta nova realidade. Eleito pelas forças indigenistas, com um programa popular, Evo Morales, cedo se deparou com a animosidade dos anteriores destinatários do poder. A crise desencadeia-se agora de um modo mais sofisticado e elaborado do que anteriormente. Não são já as antigas oligarquias que abertamente se manifestam contra o poder democrático, mas as regiões ditas mais ricas que se recusam a uma política de solidariedade nacional e fazem campanha para que os recursos nela gerados, nomeadamente os provenientes dos produtos energéticos, revertam em exclusivo benefício dessas mesmas regiões. No fundo, o que está em jogo, embora sob a capa demagógica de uma vantagem regional, é o domínio dessas mesmas fontes energéticas pelas multinacionais que durante décadas as possuíram, praticamente a troco de nada ou de muito pouco.
Primeiro tentaram, com violação da Constituição, uma autonomia que roçava a separação. Batidas em referendo nacional, o conflito foi-se gradualmente agudizando, a ponto de agora se estar à beira da guerra civil.
Evo Morales, tendo visto nesta sublevação das províncias orientais a mão do imperialismo americano, expulsou do país o embaixador yanque. Hugo Chávez, em solidariedade com a Bolívia, no estilo que é o seu, seguiu o mesmo caminho e fez regressar a casa o embaixador americano na Venezuela. As Honduras, que ainda há bem pouco tempo eram consideradas uma República das Bananas, igualmente por solidariedade, recusaram a acreditação ao embaixador indigitado. E, mais importante do que tudo o resto, o Brasil declarou que não admite nem tolera qualquer ruptura institucional na Bolívia.
Com esta posição, o Brasil marca claramente a sua posição em relação aos Estados Unidos. A Bolívia é do seu interesse estratégico e por isso o Brasil não aceita qualquer solução que ponha em causa a posição de Morales, democraticamente eleito. Esta forte mensagem brasileira é igualmente dirigida aos autonomistas das províncias orientais, que esta semana através de actos de vandalismo chegaram a interromper o fornecimento de gás ao Brasil.
Para amanhã, segunda-feira, está convocada, pelo Chile, uma reunião de emergência da UNASUR (União da América do Sul) para tratar do conflito boliviano.
Esta marginalização dos EUA e a hostilização de que têm sido alvo por parte de vários países da região são indícios claros do declínio da superpotência.

domingo, 14 de setembro de 2008

OS MEANDROS DA POLÍTICA ESPANHOLA

PNV PROPÕE-SE “SALVAR” ZAPATERO NO PARLAMENTO

Zapatero está em dificuldade para aprovar no parlamento o orçamento para 2009, sem cuja aprovação não poderá governar.
Contrariamente ao que sucedeu na primeira legislatura, Zapatero não logrou, aquando da primeira votação para a investidura nas Cortes, reunir a maioria absoluta necessária. Teve de ir a uma segunda volta, donde saiu investido por maioria simples, mercê da abstenção de alguns grupos parlamentares.
Agora, a cena repete-se para a aprovação do orçamento. O governo, sem maioria nas Cortes, vai ter de negociar. Ponto é saber com quem e a que preço. Os aliados tradicionais do PSOE, os partidos catalães (CiU, ERC, e ICV), dificilmente estarão disponíveis para um acordo, sem que primeiro se chegue a acordo sobre o sistema de financiamento autonómico. Mas esta é uma etapa que o Governo não quer antecipar. O acordo para aprovação do Orçamento tem de ser alcançado em Outubro, enquanto o do financiamento autonómico pode esperar até Dezembro.
É neste contexto, que o governo basco, com o qual o PSOE mantém um forte contencioso por causa da “consulta soberanista” de Ibarretxe, se propõe facultar a Zapatero os 5 votos de que ele necessita para aprovar o orçamento. Estes votos juntos aos 2 do Bloco Nacionalista Galego (partido com o qual os socialistas governam a Galiza) assegurarão ao PSOE a maioria indispensável à aprovação do orçamento.
Como não há votos grátis, a contrapartida que o PNV propõe é a seguinte: apoio dos socialistas bascos ao orçamento de Ibarretxe e transferência de poderes para o governo autonómico em matéria de políticas activas de emprego, além de associação deste nas competências de investigação em matéria de desenvolvimento e inovação.
Estas matérias são importantes para a imagem do PNV nas próximas eleições autonómicas, nas quais o adversário mais directo é exactamente o PSE (Partido Socialista de Euskadi).
Por aqui se vê que a política, quando conduzida com arte, está muito longe de ser um jogo com resto zero!

sábado, 13 de setembro de 2008

O RISCO DE BUSH VOLTAR A ACTUAR ANTES DO FIM DO MANDATO




A ANÁLISE DE VPV


No Público de hoje, Vasco Pulido Valente, a respeito da política americana, apresenta uma tese amplamente coincidente com a que neste blogue tem sido defendida sobre a Administração Bush.
Perante tal coincidência, é caso para perguntar: será que estou enganado? Não, não estou. O que se passa é que a realidade é tão forte que se impõe como uma evidência mesmo em relação àqueles que, por puro diletantismo intelectual, frequentemente a desprezam.

TRIBUNALCONSTITUCIONAL ESPANHOL "CHUMBA" CONSULTA SOBERANISTA DE IBARRETXE

O BLOQUEIO DA QUESTÃO BASCA

O nacionalismo é um dos males da era contemporânea. Um mal com que teremos de conviver ainda durante muito tempo. Impossível prever quanto. Mas nem tudo o que está ligado ao nacionalismo é mau. O princípio da autodeterminação, inspirado no nacionalismo, permitiu acabar com os impérios coloniais e com tudo o que a eles estava ligado de degradante para o género humano.
Os nacionalismos actuais são, porém, de outro tipo, embora continuem a inspirar-se nesse desejo de libertação de um poder estranho exercido sobre comunidades étnica e culturalmente diferentes.
A Espanha debate-se com este fenómeno centrífugo em algumas áreas do seu território constitucionalmente fixado, nomeadamente na Catalunha e no País Basco.
Na Catalunha, à parte algumas manifestações anarquistas, não se recorre à força há vários séculos para o resolver. Dito de outro modo, os nacionalistas catalães não tem recorrido à força para impor a autodeterminação, embora o poder central, principalmente a ditadura franquista, tenha recorrido a violências sem conta para combater as manifestações nacionalistas de qualquer tipo. Não assim no País Basco. No estertor do franquismo, constitui-se um grupo armado que luta pela independência de Euskadi por todos os meios ao seu alcance. De início, as acções da ETA foram saudadas pelas forças democráticas espanholas como um valioso contributo para a queda do regime. É neste contexto que o atentado contra Carrero Blanco é tido como um marco significativo na luta contra a ditadura e como um momento de viragem na estabilidade do regime. O apoio dos democratas está expresso no slogan que então ecoava em toda a Espanha: “Arriba Franco, más alto que Carrero Blanco”.
Mais de trinta anos volvidos, a Espanha é hoje um Estado de democracia representativa, amplamente descentralizado em regiões com autonomia administrativa e legislativa. Subsiste, porém, o problema territorial. A Catalunha vai progressivamente fazendo o seu caminho numa lógica mais virada para a construção, económico-financeiramente falando, de um Estado dentro de outro Estado, sem, contudo, desprezar nenhum dos elementos simbólicos do nacionalismo, enquanto o País Basco, onde a luta armada convive com as fortes manifestações nacionalistas legais e institucionais, é claramente partidário de uma independência sem subterfúgios. Há, nas correntes nacionalistas do País Basco, duas teses que simultaneamente se defrontam e se complementam. A que defende que a independência só pode ser alcançada através da luta armada e a que, actuando no quadro da legalidade democrática, advoga um caminho de acumulação progressiva e sucessiva de poderes que acabará, mais tarde ou mais cedo, por levar à independência. Ambas as correntes se alimentam uma da outra, posto que a retórica usada por cada uma delas aparentemente as afaste.
Do lado das forças centrípetas passa-se, com as necessárias adaptações, mais ou menos o mesmo. Há quem advogue uma via repressiva contra as manifestações nacionalistas de qualquer tipo e o isolamento institucional dos respectivos governos autónomos e há quem advogue uma via dialogada com os nacionalismos moderados, se não mesmo com o nacionalismo armado, para, no quadro de uma mais ampla autonomia, porventura com admissibilidade da relação federal (sem reconhecimento, contudo, do direito de separar), manter a integridade do Estado.
Com Ibarretxe na chefia do governo basco, acentuou-se a luta no quadro democrático pela auto-determinação. Como prometido na campanha eleitoral, Ibarretxe, baseado num texto constitucional, fez aprovar no parlamento basco uma proposta de referendo, que, em última instância, se viesse a ser respondida afirmativamente pelo eleitorado, permitiria ao povo basco decidir sobre o seu futuro, sem prejuízo de se saber através de que meios esta decisão poderia depois ser tomada.
Como se esperava, inclusive nos meios nacionalistas bascos, o tribunal constitucional considerou por unanimidade a consulta inconstitucional. Com vista a esgotar os meios legais ao dispor, Ibarretxe, a título meramente individual (e certamente muitos outros bascos farão o mesmo) recorrerá da decisão para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Não sendo muito crível que este tribunal venha a desautorizar o tribunal espanhol, ficará demonstrada a tese que a ETA desde há muito defende: a de que não há solução para o País Basco dentro do quadro institucional existente e que somente pela via da luta armada será possível alcançar a auto-determinação.

JÁ TUDO PARECE NORMAL



BUSH AUTORIZA INCURSÕES TERRESTRES NO AFEGANISTÃO ÀS SUAS FORÇAS ESPECIAIS

O que diria a imprensa ocidental, dita de referência, se um dos países diabolizados por Washington, ou em vias de entrar para o “Eixo do Mal”, “autorizasse” as suas forças armadas a entrar nos territórios de Estados vizinhos para perseguir grupos hostis?
A surpresa não é que Bush tenha dado essa “autorização”, pois como já aqui se disse muitas vezes da Administração americana pode esperar-se tudo, a surpresa é naturalidade com que a imprensa ocidental acolheu o facto. Não há dúvida, estamos novamente nos tempos da “Excepção e a Regra”, de B. Brecht.
Vamos ver como reagem as forças armadas paquistanesas. O que vai dizer a China, tradicional aliado do Paquistão? Provavelmente nada, que não é assunto seu…

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

ISRAELITAS CONTINUAM A ROUBAR TERRA NA CISJORDÂNIA

ISRAEL, OUTRA AMEAÇA À PAZ MUNDIAL

Por um lado, crescem os rumores de que Israel se prepara para atacar as instalações nucleares do Irão. Por outro, mais prosaicamente, Israel vai continuando a roubar terras na Cisjordânia. Para além da vergonha que os colonatos em si já são, o Estado de Israel “expropriou” agora milhares de hectares de terra para “protecção” de algo que à luz do direito internacional é ilegal – os colonatos!

O PERIGO VEM DA AMÉRICA

A ENTREVISTA DE SARAH PALIN

Já ontem aqui tinha sublinhado os perigos que a política americana representa para a democracia e para a paz mundial. À medida que o Império vai tendo dificuldade em impor a sua vontade, cresce a sua agressividade. Ela aumenta na razão directa em que é desobedecido e fica tanto mais agressivo quanto mais fracos e numerosos são os que ousam desafiá-lo. Podem chamar a isto o que quiserem, mas politica e historicamente isto é uma manifestação típica de declínio da superpotência.
A entrevista de ontem, de Sarah Palin, faz jus a todas estas preocupações. Na Convenção Republicana ela leu o que os neoconservadores lhe escreveram, ontem, embora muito “briefada”, não pode deixar de responder pela sua cabeça a algumas questões. E lá a ouvimos dizer com toda a naturalidade que iria para a guerra com a Rússia e outras barbaridades do género.
Isto vai num crescendo. Começou com Clinton, com Bush foi o que se viu e com estes será ainda pior. Não há na Europa ninguém com bom senso capaz de ir marcando as distâncias? É que, se não se fizer nada, ainda levamos por tabela…

OS "ACTIVOS EXTRAVAGANTES" DO BPN

A LATA DE CADILHE

Cadilhe, conhecido como beneficiário de indemnizações vitalícias, grande liberal (à custa do dinheiro do Estado), vem dizer-nos que o Banco Português de Negócios (BPN), de que agora é presidente, tem para lá uns “activos extravagantes” (veja-se só que nome estes tipos dão aos monos), que vão ser transferidos para o Banco de Portugal.
Mas o que é isto? Que pouca vergonha é esta? Que obrigação tem o Banco de Portugal de comprar aquela sucata do BPN?
Só há aqui uma coisa que me escapa: por que razão veio Cadilhe falar publicamente no assunto? Constâncio, interrogado sobre o dito, começou por não comentar, para depois afirmar que nada estava ainda decidido.
Constâncio, uma espécie de “guarda-geleia”, não se pôs de fora. Alguém tem de tomar providências…

CAVACO E O ESTATUTO DOS AÇORES

CAVACO SEGUIU O CAMINHO ERRADO


No Público de hoje, em entrevista a JMF, Cavaco explica por que se dirigiu ao país em 31 de Julho passado, para manifestar a sua discordância sobre algumas normas do Estatuto dos Açores.
Vamos por partes. Cavaco tem razão quando discorda da exigência estatutária para dissolução da Assembleia Legislativa Regional. Tenho para mim que a norma é inconstitucional. A lei ordinária não pode acrescentar obrigações ao Presidente da República, para além das que constam do texto constitucional. A enumeração constitucional das entidades que devem ser ouvidas, antes da decisão de dissolução, é taxativa. Não é exemplificativa. São aquelas e não outras. Admitir que a lei ordinária possa impor novos deveres de consulta ao Presidente da República corresponderia a aceitar a oneração do exercício dos poderes presidencias fora do quadro constitucional.
Além de inconstitucional, a lei, se viesse a ser aprovada, introduziria uma grave incoerência no equilíbrio do sistema constitucional de poderes. Para dissolver a Assembleia da República, o Presidente, ultrapassadas que estejam as limitações temporais dentro das quais não pode exercer o seu direito (art. 172.º, da CRP), tem de ouvir o Conselho de Estado e os partidos nela representados. Para dissolver uma assembleia legislativa regional teria de ouvir, além das entidades que a Constituição actualmente exige (Conselho de Estado e partidos nela representados), a própria assembleia legislativa regional (!), o Presidente do Governo Regional e os grupos e representações parlamentares regionais. Ou seja, para dissolver uma assembleia legislativa regional, o Presidente da República teria de fazer mais audições do que as que está obrigado para dissolver a Assembleia da República.
Mas a norma seria ainda incoerente por outra razão: a que propósito se deveria ouvir o Presidente do Governo Regional? Donde retira ele a sua legitimidade para governar? Faz algum sentido que seja ouvido para a dissolução da ALR o Presidente do Governo Regional que dela politicamente depende e perante a qual é politicamente responsável?
Por último, fazer depender a dissolução da audição do próprio órgão, além de constituir uma aberração, representaria, na prática, uma séria limitação dos poderes do Presidente da República.
Por todas estas razões, a norma em questão não pode figurar no ordenamento jurídico português. Sobre isto, nenhuma dúvida.
Como pode e deve o Presidente da República impedir a vigência da norma? O Presidente da República deveria ter suscitado ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da referida norma. O tribunal Constitucional é, em matéria de normas, a entidade competente para erradicar do ordenamento jurídico as normas inconstitucionais. Não há qualquer razão – insisto, nenhuma razão – para não seja o Tribunal Constitucional a pronunciar-se sobre a matéria. O Presidente da República ao não ter submetido a questão àquele órgão jurisdicional cometeu um erro grave e ao justificar essa decisão nos termos em que hoje o fez revela uma errada compreensão do seu papel como garante do cumprimento da Constituição. O que, por outras palavras, o Presidente disse, foi que em questões por si consideradas de grande relevância, o que verdadeiramente interessa é a sua posição e não a do Tribunal Constitucional. Ora, esta interpretação da Constituição, em matéria de vigência de normas, choca com a competência por ela atribuída ao Tribunal Constitucional. É o Tribunal constitucional e não o PR que tem competência para afastar do ordenamento jurídico as normas que nele não cabem por serem inválidas. Se o Tribunal Constitucional as validar, o Presidente da República pode exprimir a sua discordância política, que não jurídica, relativamente a essas normas, vetando-as politicamente. Ao fazê-lo, transfere a questão do plano jurídico para o político e sujeita-se ao regular funcionamento das instituições.
Cavaco não teve a distanciação necessária para tratar de um caso que lhe dizia respeito, foi mais uma vez mal aconselhado em matéria jurídica e meteu-se numa “encrenca” política que poderia perfeitamente ter evitado.
Este erro, porém, não autoriza o Presidente do Governo Regional dos Açores a usar a linguagem que utilizou quando se referiu às palavras do Presidente da República. Ele deveria saber, ou alguém lhe deveria explicar, que não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito.

AS ELEIÇÕES AMERICANAS E A DEMOCRACIA

OS RISCOS ASSOCIADOS AO DECLÍNIO DE UMA SUPERPOTÊNCIA

As primárias americanas para a designação dos candidatos presidenciais foram entendidas em todo o mundo como um salutar exercício de democracia representativa. Cada um dos candidatos concorrentes esforçava-se por demonstrar que representava melhor do que os seus rivais os eleitores do respectivo partido, quer pelas perspectivas abertas pelas novas propostas apresentadas, quer pelo esforço em ir ao encontro dos desejos dos eleitores.
Na corrida a dois para a eleição presidencial, há uma clara diferença relativamente à eleição anterior. Enquanto as primárias decorriam no seio dos respectivos partidos, a corrida a dois tem como destinatários todos os eleitores. Daqui decorre uma atitude completamente diferente dos candidatos face ao eleitorado. A partir de agora o que verdadeiramente conta é a identificação do candidato com o eleitorado e não a do eleitorado com o candidato. O poder de atracção do candidato sobre o eleitorado mede-se agora muito mais pela identificação do candidato com os eleitores, de modo a que estes vejam nele o seu representante natural, do que pela capacidade do candidato para apresentar novas propostas capazes de seduzirem e entusiasmarem o eleitorado.
A entrada em cena da Sarah Palin teve o condão de tornar tudo isto muito mais evidente. Há realmente um largo conjunto de “valores” amplamente partilhado pelo povo americano, como o abnegado amor à pátria, a missão salvífica da nação americana (verdadeira incarnação do bem, apenas possível num povo eleito), a preponderância da fé, a supremacia da iniciativa individual sobre o Estado, cujo enraizamento na sociedade americana faz com que os candidatos que relativizam aqueles “princípios” tenham poucas ou nenhumas hipóteses de serem eleitos.
De todos estes ”valores”, os que mais directamente conflituam com a democracia são o exacerbado nacionalismo e a missão salvífica que a América a si própria se atribui como verdadeira encarnação do bem. Todos aqueles que não partilham dos seus “valores”são automaticamente suspeitos (recorde-se a propósito como foram tratados os europeus na Convenção Republicana) e os que não querem compartilhar da felicidade americana e se opõem a que a América os salve do mal, são considerados inimigos. A princípio, no auge do Império, somente uns poucos foram remetidos para índex do “Eixo de Mal”, mas à medida que o mundo se vai tornado cada vez mais multipolar e a supremacia americana vai decaindo, o “Eixo do Mal” terá tendência a aumentar, com novos e cada vez mais poderosos inimigos.
A política de Bush e McCain, muito bem acolitado por Sarah Palin, leva a este resultado. O concorrente democrático, muito condicionado pela ampla partilha de “valores” do eleitorado americano, está condenado a ser imaginativo apenas no campo da economia, único domínio onde a sua proposta pode marcar a diferença, tendo em conta a situação actualmente vivida na América.
De facto, quando um candidato de um país dito ocidental afirma que os soldados americanos estão no Iraque cumprindo uma missão divina ou é vibrantemente aplaudido pelos mais lídimos representantes do Partido quando diz: “Os terroristas da Al Qaeda continuam a conspirar contra a América e ele está preocupado em que alguém lhes leia os direitos”, é a própria democracia que está em causa.
Não a democracia defendida por este ou aquele partido, mas a democracia americana. Se os interesses europeus (da velha Europa) já não eram coincidentes com os dos americanos, também agora, mais do que nunca, há um claro afastamento entre os dois lados do Atlântico em matéria de valores estruturantes das respectivas culturas.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

11 DE SETEMBRO

UMA DATA TRÁGICA

Exactamente há 35 anos as Forças Armadas chilenas, comandadas por uma junta militar, puseram brutalmente termo ao governo democrático de Salvador Allende. Apoiadas política e operacionalmente pela CIA e pela ITT, multinacional americana que operava no terreno, as forças armadas, sob a presidência de Pinochet, instauraram um dos regimes mais violentos e torcionários da segunda metade do século vinte na América Latina.
Os anos passaram e ninguém respondeu pelos crimes praticados. Pinochet morreu, de muito velho, na cama e Henry Kissinger, mentor e impulsionador do golpe, continua a viajar por todo o mundo sem ser incomodado.
Vinte oito anos mais tarde, os fundamentalistas islâmicos da Al Qaeda, inspirados na direcção de Bin Laden, ex-aliado da América no Afeganistão e ex-amigo da família Bush, executaram um dos mais espectaculares e devastadores actos terrorista de toda a história. Nele morreram ingloriamente milhares de nova-iorquinos inocentes.

O GOVERNO DO PODER JUDICIAL EM ESPANHA

UMA VERGONHA

Já, por mais de uma vez, nos referimos aqui à politização do poder judicial em Espanha. Todavia, ela ultrapassou todos os limites na composição do novo Conselho do Poder judicial, órgão correspondente ao nosso Conselho Superior de Magistratura.
Com um atraso de cerca de dois anos, motivado por divergências partidárias, principalmente a recusa do PP em negociar com o PSOE, a recomposição do novo órgão tornou-se agora possível em virtude da nova atitude do PP face ao partido do governo. No entanto, se o acordo dos dois maiores partidos era necessário para aprovar com os votos necessários a nova composição, os termos em que ela acabou por ser feita, com base em critérios exclusivamente partidários e de estrita obediência política, constituiu o que se pode chamar uma verdadeira fraude à lei. Na verdade, a maioria qualificada não é exigida pela Constituição para que cada uma das partes indique os seus nomes para os ver sufragados sem sindicância pela parte contrária, mas para que as partes que reúnem os votos necessários à nomeação os juntem em função da análise de cada nome em concreto.
Obviamente, os juízes não representados em qualquer associação, bem como os que pertencem a associações independentes dos partidos, correspondendo no conjunto a cerca de 75% dos 4.200 juízes existentes em Espanha, não lograram obter um único lugar no Conselho.
A independência do poder judicial é um bem inestimável em democracia, como aqui frequentemente temos defendido. Essa independência tem de ser defendida pelos cidadãos e pelos juízes, não podendo em caso algum ser confiada ao poder político, embora o êxito da sua defesa dependa em grande medida da capacidade de os juízes administrarem uma justiça que possa ser entendida pelos cidadãos.

CAVACO REPREENDE MINISTRO

O MINISTRO ESTAVA A PEDI-LAS

Num gesto inédito, Cavaco Silva fez publicar um comunicado para rejeitar qualquer responsabilidade no atraso da transferência de militares da GNR para funções operacionais.
O comunicado visa responder a Rui Pereira, que tinha atirado as culpas do atraso à demora na entrada em vigor da lei.
O ministro deve saber que o exercício dos poderes constitucionais do Presidente, bem como o exercício de quaisquer outros direitos, nunca pode ser invocado como desculpa do que quer que seja. Afinal, Rui Pereira é jurista ou economista?
Cavaco ao reagir como reagiu demonstrou mais uma vez que não está disposto a abdicar de nenhum dos seus direitos. Nada a opor.

EVO MORALES EXIGE A RETIRADA DO EMBAIXADOR AMERICANO DE LA PAZ


EMBAIXADOR ACUSADO DE INSTIGAR PROTESTOS CONTRA O GOVERNO

O Presidente da Bolívia acusou o embaixador americano, Philip Goldberg, de conspirar contra a democracia.
Na véspera de um aniversário tragicamente simbólico para toda a América Latina, Evo Morales toma providências enquanto é tempo. Apesar de tudo, hoje os tempos são outros, e o Império, por mais poderosos que sejam os seus meios, já não pode pôr e dispor como antigamente na América Latina.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

A DERROTA DA SELECÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL


O HOMEM NOVO COMEÇA MAL

Carlos Queirós, o homem novo do cavaquismo dos idos de oitenta/noventa, perdeu o primeiro jogo a sério da selecção portuguesa. Enquanto o homem novo de Stalin, Stakanovich, como personalidade física, relevava do domínio da ficção, como mais tarde se veio a apurar (não obstante o “Homem de mármore”, de Andrzej Wajda), o homem novo de Cavaco era uma realidade bem palpável com a qual agora temos de nos defrontar.
Queirós perdeu, como já em muitas outras ocasiões importantes tinha acontecido, tanto no Sporting e Real Madrid, como na selecção portuguesa ou sul-africana. Queirós é uma espécie de Freitas do Amaral do futebol. A derrota surge, depois de teórica e cientificamente estar assegurada a vitória.
Queirós tem, porém, boa imprensa. Pelo que ouvi, a derrota foi imerecida, foi azar. Nada mais enganador. A Dinamarca jogou bem durante todo o jogo, nunca se deu por vencida e, como os seus jogadores são técnica e animicamente superiores, não falharam nos momentos decisivos.
Essa conversa dos comentadores portugueses insistindo na superioridade técnica dos nossos jogadores é uma pura falácia. Com excepção de Deco, realmente um extraordinário jogador, os demais falham frequentemente por falta de técnica. Basta comparar o desempenho dos nossos jogadores no momento do remate com a classe e a superioridade técnica com que foi marcado o primeiro golo da Dinamarca. E ainda a pujança física expressa no segundo. Portugal, pelo contrário, marcou um golo partindo de uma posição off-side e um outro de penalty, que tanto poderia ter sido marcado como não.
Sofrer três golos a cinco minutos do fim não abona nada a favor da equipa nem de quem a dirige.

PAULO PEDROSO JÁ FALA



PARA DEFENDER O BLOCO CENTRAL


Não deixa de constituir alguma surpresa a intervenção de Paulo Pedroso reproduzida no telejornal das 13 horas.
Pedroso tem manifestamente tendência para pisar caminhos difíceis, se não mesmo melindrosos. Numa altura em que as eleições gerais estão a mais de um ano de distância e relativamente às quais o PS acalenta a esperança de alcançar a maioria absoluta, não parece fazer muito sentido vir dizer que o PS pode governar coligado com o PSD.
Que pretende Pedroso? Perfilar-se como homem de diálogo, aberto ao compromisso, por contraposição a Sócrates a quem acusam de autoritário e arrogante? Se esse for o seu objectivo, temos de concordar que a jogada é arriscada. Não apenas por ser uma jogada contra Sócrates, mas também por provir de quem esteve submetido a uma longa quarentena. Alguém que terá de reganhar a confiança dos seus colegas de partido, antes de tentar seduzir os seus putativos parceiros de bloco central.
Por outro lado, a intervenção de Pedroso, na medida em que se demarcou claramente da esquerda, serve também para pôr definitivamente fim à ilusão de que o PS tem uma ala esquerda e de que Pedroso pertencia a essa ala. Pedroso, tal como Vieira da Silva, e outros, é igual a todas as demais personalidades do PS. São gente de centro, que advogam e praticam uma política económica de direita, com um entendimento algo diferente dos demais sectores de direita relativamente a certas questões sociais.
Mesmo aqueles que mais frequentemente criticam certas políticas, ou melhor, certas medidas da governação socialista, como é o caso de Alegre e ultimamente de Soares, posto que num registo diferente, servem na perfeição aquele objectivo e ajudam com as suas intervenções, sempre posteriores às medidas que criticam, a segurar uma franja do eleitorado que poderia fugir para os partidos de esquerda.
Em conclusão: não há razão para que os eleitores que, no plano económico, preferem uma política de direita, deixem de votar no PS, não fazendo por isso sentido, pelo menos neste momento, apelar ao bloco central como instrumento indispensável de governabilidade. Ora, como Pedroso não interveio como analista, já que não é de admitir que quem pediu ao Estado uma onerosa indemnização por ter sido privado (temporariamente, presume-se…) de ascender às mais altas funções do Estado, actue naquela qualidade dias depois de ter regressado ao Parlamento, é muito provável que, no interior do PS, alguém se veja forçado a recordar-lhe que os processos em que está envolvido ainda não terminaram…

LANCE ARMSTRONG REGRESSA AO TOUR

O GRANDE DESAFIO

Lance Armstrong, o maior ciclista de todos os tempos, vencedor sete vezes consecutivas da volta à França, anunciou hoje que regressaria ao Tour no ano que vem para ganhar.

A ENTREVISTA DE GORBACHEV



OS AMERICANOS NÃO CUMPRIRAM A PALAVRA


Sobre a crise do Cáucaso e as relações da Rússia com a União Europeia e com os Estados Unidos ver a interessante entrevista de Gorbachev ao EL PAÍS.
O último dirigente da URSS confirma que os americanos (Clinton e Bush) não respeitaram a palavra dada aquando da reunificação da Alemanha: não expansão da NATO a leste. E responsabiliza pela actual situação os dois últimos presidentes americanos a quem acusa de terem aberto novas linhas de divisão no continente, embora não isente de culpas a Alemanha que “cumpriu os tratados bilaterais com a URSS, mas apoiou a expansão da NATO a leste”.
Depois de oito anos de Administração Bush, há na Europa certos sectores identificados com o centro-esquerda que tendem a responsabilizar o actual presidente americano por todos os desmandos com que actualmente o mundo se debate. Esta análise, porém, só muito parcialmente corresponde à verdade. Quem iniciou a política de desrespeito pelo direito internacional, com os mais diversos pretextos, foi Clinton. Foi também Clinton que introduziu o FMI na Rússia – uma das maiores vergonhas da história contemporânea – e quem iniciou o alargamento da NATO aos antigos países do Pacto de Varsóvia, desrespeitando os compromissos assumidos pelo seu antecessor (diga-se a propósito que o primeiro Bush não tem no seu mandato nenhuma mácula semelhante às imputadas aos seus sucessores).
Clinton bombardeou a Jugoslávia à margem do direito internacional, pretensamente com o fim de defender direitos humanos e bombardeou o Iraque acima da linha de segurança estabelecida pela ONU, bem como o Sudão, com base em pretextos fúteis, numa verdadeira manobra de diversão quando internamente estava sendo seriamente acossado pelas razões que se conhecem (Monica Lewinsky).
Por estas e outras razões é que a outra esquerda europeia saudou a derrota de H. Clinton nas primárias, ciente de que a sua eventual vitória nas presidenciais não traria nada de novo, nem de bom no domínio das relações internacionais. Obama tem, no mínimo, a seu favor o benefício da dúvida.


terça-feira, 9 de setembro de 2008

O ACORDO SARCOZY (UE) - RÚSSIA


A AMÉRICA FICOU A FALAR SOZINHA

No post que ontem escrevi sobre a crise do Cáucaso há uma incorrecção que convém corrigir.
As tropas russas não abandonam a Ossétia e a Abekázia, como erradamente referi, mas sim a Geórgia, segundo um calendário aprovado entre dois presidentes (Rússia e França).
Assim, dentro de uma semana abandonarão as posições entre o porto de Posi e Senaki e, em um mês, retirarão das zonas adjacentes à Ossétia do Sul e Abekázia para as posições anteriores ao começo das hostilidades, depois que nestas zonas tomem posição os observadores da UE, num mínimo de 200.
A retirada dos cinco postos compreendidos entre Posi e Senaki é feito sob garantia de que a Geórgia não voltará a usar a força no Cáucaso, tendo a França ficado “fiadora” da palavra do presidente Saaskashvili.
Finalmente, em 15 de Outubro terá lugar em Genebra uma conferência internacional para discutir as questões de segurança na Ossétia do Sul e na Abekázia.
O presidente francês na conferência de imprensa referiu todos os pontos relevantes do acordo acima transcritos e, além disso, reiterou a condenação do reconhecimento da independência daqueles dois territórios pela Rússia, ao que Medvedev respondeu que a decisão da Rússia sobre essa matéria era “definitiva” e “irrevogável”.
Por outras palavras, a ausência no acordo de qualquer referência à integração das regiões separatistas na Geórgia significa, pelo menos para um número considerável de Estados da UE, que esse é um assunto por agora arrumado. De resto, o princípio da integridade territorial cede perante o princípio da autodeterminação.
O acordo ontem alcançado representa uma vitória para a Europa – a Europa dos Urais a Cascais – e nesse sentido deve ser entendido por todos os europeus que preservam a paz no continente.
Toda a gente sabe que há no seio da União Europeia países a quem este entendimento não interessa e que essa divergência de pontos de vista é aproveitada e amplamente estimulada por Washington para manter a Europa dividida e enfraquecida.
É assim, desde logo, no caso da Inglaterra (Reino Unido) à qual convém por razões geoestratégicas ancestrais ligadas à sua insularidade manter a Europa continental divida e enfraquecida. É assim também com os recém-Estados independentes que antes integraram a União Soviética (Estónia, Letónia e Lituânia) ou que pertenceram ao Pacto de Varsóvia (Polónia, principalmente) e sempre tiveram uma história muito atribulada. Enquanto no primeiro caso pesam fortes razões geoestratégicas, neste segundo grupo de países prevalecem razões traumáticas do foro psicanalítico difíceis de debelar.
Pacientemente, os Estados que querem construir na Europa uma arquitectura de segurança europeia vão ter que lidar com este problema e contê-lo. O caso da Inglaterra é paradoxalmente mais simples. Está muito identificado e a sua larga experiência diplomática não deixa antever nenhum tipo de conduta cujos efeitos não possa controlar. Não assim nos demais casos, pois a própria natureza do mal que os afecta não põe Europa a salvo de uma qualquer conduta demencial do tipo da recentemente ensaiada por Saaskashvili.

MÁS NOTICIAS PARA OBAMA


SONDAGEM DE USATODAY /GALLUP DÁ A McCAIN UMA VANTAGEM DE 4 PONTOS

Em duas sondagens divulgadas ontem, os dois candidatos presidenciais estão empatados. Todavia, a sondagem do USA TODAY/GALLUP dá a McCain uma vantagem de 4 pontos.
A conclusão que se retira destas sondagens é a de que a Convenção Republicana trouxe mais vantagens a McCain do que a Democrata a Obama. O segredo parece ter sido Sarah Palin.
Ou seja, as relativas meias tintas do candidato republicano não estavam entusiasmando as hostes. Com a chegada de Palin o discurso mudou radicalmente, e os eleitores reaccionários e conservadores viram-se finalmente representados.
A convenção do Partido Democrático, contrariamente ao que se disse, foi em grande medida uma falhanço. Salvou-se o discurso emocionado de Kennedy, feito nas trágicas circunstâncias que se conhecem. Depois, houve o número dos Clinton, que não engana ninguém, e que só pode ser valorizado por quem não queira ver a realidade. Nada neles indiciava sinceridade.
Joe Biden também não trouxe nada de novo e é uma má escolha. Obama perdeu grande parte do seu fulgor e ainda não percebeu que o centro, cuja conquista ele desesperadamente busca, é muito mais sensível a um discurso forte e convicto, mesmo quando as convicções expressas não coincidem com as suas, do que a discurso ideologicamente titubeante.

PS MANTÉM LEI DO DIVÓRCIO



CAVACO TERÁ DE PROMULGAR A LEI APROVADA NO PARLAMENTO


Foi com algum alívio que ouvimos Alberto Martins afirmar nos telejornais que o parlamento manterá a lei do divórcio vetada por Cavaco Silva.
Impunha-se este comportamento da parte dos partidos que votaram a lei. A fundamentação do veto de Cavaco indicia que ele interveio como legislador. Ora, como esta competência não é sua, mas da Assembleia da República, esta, para não deixar margem a dúvidas nem abrir precedentes indesejáveis, apenas tem que reiterar o seu voto. Assim o esperamos.
Sendo a lei vetada aprovada por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções, o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua recepção.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

VIVA O CAPITALISMO NEOLIBERAL!



PRIVATIZAÇÃO DOS LUCROS, SOCIALIZAÇÃO DOS PREJUÍZOS



O Secretário de Estado do Tesouro americano anunciou ontem a intervenção do Estado nas duas grandes empresas de crédito hipotecário – a Fannie Mae e a Freddie Mac.
A Fannie Mae é filha do new deal rooseveltiano e foi privatizada em fins dos anos sessenta quando na América já começavam a soprar os ventos neoliberais; a Freddie Mac foi criada nos anos setenta para impedir a monopolização do mercado pela primeira. Elas são hoje responsáveis por cerca metade das hipotecas norte-americanas e controlam cerca de 90% do ”secondary mortgage market”.
Para as salvar da falência, os contribuintes vão ter de lhes entregar 200 mil milhões de dólares, cerca de 140 mil milhões de euros, tanto é o montante que o Tesouro americano nelas injectará. Com a mesma tranquilidade com que no passado sempre advogaram a não ingerência do Estado na economia, Henry Paulson, Secretário de Estado do Tesouro, e Ben Bernanke, presidente da Reserva Federal, que correu a apoiar a medida, consideram agora que a intervenção do Estado é absolutamente indispensável para que os mercados se recuperem.
A actuação do Estado norte-americano, na esteira aliás de outras noutros países que advogam a defesa os princípios neo-liberais, não tem que nos espantar, nem sequer pela magnitude das quantias envolvidas. Só os ingénuos não sabem em que consiste o neoliberalismo….
Muito mais do que a intervenção, que até pode ser indispensável para salvar o mundo de males maiores, o que está em causa e em colapso é princípio ideológico, que os Borges deste mundo nos tentam vender, de que os privados são sempre mais eficientes.