AS DECLARAÇÕES DE MANUELA FERREIRA LEITE
Todo o discurso de Ferreira Leite sobre a avaliação dos professores é um discurso postiço, como hoje ficou amplamente demonstrado. Mas não só o dela: o discurso da direita portuguesa é, na sua essência, um discurso anti-democrático que os momentos críticos e de crise tornam muito evidente. Não há nesta gente qualquer vivência democrática genuinamente sentida, há uma mera aceitação de procedimentos que tornam mais cómodos os processos de legitimação. Eliminada que estava a esquerda, como opção de governo, o que restava da democracia era aceitável pela direita e não punha em perigo a sua hegemonia, tanto mais que o PS, de cada que chegava ao Governo, a primeira preocupação que manifestava era a de deixar bem claro o seu propósito de não fazer qualquer rotura, por mais suave que fosse.
Todavia, numa altura em que o PS ameaçava manter-se no poder por mais quatro anos com maioria absoluta, a direita, depois dos tristes sucessos que acompanharam a sua passagem pelo Governo, tenta refazer o discurso e ganhar espaço a Sócrates.
Ferreira Leite, a terceira tentativa depois da derrota, começa por ensaiar o estilo que melhor servia a sua reduzida capacidade política: falar pouco ou quase nada para tornar a interpretação do seu silêncio eloquente. Não resultou. No clima de guerrilha interna do PSD quem não falar arrisca-se a ser de imediato substituído. E então, a Senhora começou a falar…e a dizer dislates.
Instruída para mudar o discurso, no sentido de o pôr ao sabor da corrente pró-contestação, nota-se que as suas palavras são postiças, quando pede a suspensão da avaliação, a participação dos professores nas reformas que os afectam e, por aí adiante. Em nada disto ela acredita, como já teve oportunidade de demonstrar sempre que exerceu cargos executivos. E vai daí, no auge da crítica ao Governo e da “aproximação” aos professores diz: “Em democracia isto não é assim. Se não se está é outra conversa. Eu digo como é que é e faz-se. E até não sei se a certa altura não seria bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então venha a democracia!”
Não há dúvida de que este desabafo de Ferreira Leite a aproxima muito da ideia que ela tem da democracia. Ou seja, a ideia clássica, defendida por todos os que se sentem próximos do príncipe e longe do povo: a democracia como espaço privilegiado da demagogia e da desordem.
Poderia, em sua defesa, advogar-se que a ditadura entendida em termos clássicos não é necessariamente uma instituição anti-democrática. Poderia, mas não foi isso, nem de perto nem de longe, o que Ferreira Leite quis dizer. O que Ferreira Leite quis dizer é que há ocasiões em que se justificaria “suspender” a democracia para resolver os problemas. Algo que não anda muito longe do “Deixem-nos trabalhar!”, embora dito de uma forma muito mais crua e naif.
Hoje, dada a conotação totalmente negativa do conceito, nenhum político de bom senso se atreve sequer a insinuar aquele modo de governação, quanto mais admiti-lo.
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