segunda-feira, 17 de novembro de 2008

O CATASTROFISMO DE JOSÉ SARAMAGO



ENTÃO, NÃO HÁ PROGRESSOS NA HUMANIDADE?


De cada vez que José Saramago fala das coisas do nosso tempo fica-se com a impressão de que se vive num ambiente de barbárie mais grave do que o estado de natureza descrito por Thomas Hobbes.
Recordo-me de uma participação de Saramago no Programa do Jô, a propósito do lançamento de um livro seu no Brasil, em que durante cerca de vinte minutos falou, quase sem interrupções, das desgraças deste mundo, perante o olhar semi-aterrorizado de Jô Soares e o silêncio sepulcral e tétrico da plateia. Mesmo em países como o Brasil, habituados a pregações evangélicas do Velho Testamento, cheias de maldições, vinganças e castigos, o discurso de Saramago meteu medo!
Em Portugal, já estamos mais habituados. A pretexto do que quer que seja, lá vem Saramago dizer-nos que o mundo nunca foi tão mau e tão injusto como hoje. E ainda ontem ou anteontem, a propósito de uma comemoração dos Direitos do Homem, Saramago ultrapassou todos os limites quando afirmou: “Em todo o mundo os direitos humanos não contam nada. São, como dizia Hitler, que tem frases interessantes, papel molhado”.
Antes de mais, é de um mau gosto sem limites citar Hitler – a quem pelos vistos reconhece alguns dotes literários! – a propósito de uma crítica relativa ao incumprimento dos direitos do homem. Depois, negar os progressos civilizacionais alcançados e potenciados pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 28 de Agosto de 1789, pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de Dezembro de 1948, e pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem, de 4 de Novembro de 1950, é uma atitude extremamente reaccionária, ou, no mínimo, estúpida, se com críticas daquele género se pretende chamar a atenção para as violações que por todo o lado continuam a existir.
Insistir permanentemente na ideia de que se vive em toda a parte um clima de completa barbárie e opressão, quando se sabe, independentemente de desejarmos mais e melhor, que centenas de milhões de pessoas vivem hoje na China, na Índia, na Indonésia, no Brasil, para apenas citar os casos mais significativos, como nunca nesses países se viveu no passado em momento algum da sua história, só serve para retirar legitimidade às críticas certeiras aos grandes responsáveis pelas desigualdades mundiais.
Sem eu perceber nada de psicanálise, ciência cujos meandros não domino, venho constatando que Saramago, desde que ganhou o prémio Nobel, convive mal com o fama e, principalmente, com o dinheiro que o prémio lhe trouxe. Recordado certamente do menino pobre ribatejano que muito novo teve de fazer pela vida e do jornalista mal pago numa Lisboa triste e cinzenta, Saramago parece ter uma permanente necessidade de expiação de um pecado que na realidade não cometeu, mas que religiosamente carrega na alma: ser rico e abastado!

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