Vamos lá ver se nos entendemos e se podemos pôr algum cobro na onda de demagogia que por aí já começa a circular sobre a “corajosa intervenção” de Vital Moreira a propósito do caso BPN.
Que o caso BPN é um verdadeiro escândalo nacional, ninguém contesta. Que aquela gente praticou negócios ruinosos, ao que tudo indica, em proveito próprio, também é comummente aceite. Que a maior parte daquela gente é oriunda do cavaquismo, gente importante do PSD e que o actual Presidente da República também teve negócios com o BPN, como certamente muitos outros portugueses, também ninguém se atreve a contestar. Que Dias Loureiro, para falar apenas num dos mais conhecidos, foi um dos grandes beneficiários daquilo a que, na mesma época, em Espanha e no quadro de idêntico clima político, se chamava a cultura do “pelotazo” - que, segundo um dos melhores dicionários de língua espanhola, significa: golpe dado por uma “pelota”; trago de uma bebida alcoólica; negócio de duvidosa legalidade com o qual se ganha muito dinheiro de maneira rápida – também não há qualquer dúvida. Que Dias Loureiro, não obstante, merecia (e não sei se continua a merecer) a confiança pessoal e política do PR, também é inquestionável.
Que o caso BPN é apenas um exemplo, porventura o mais emblemático, da promiscuidade entre política e negócios, já é assunto que não goza de tão amplo consenso. De acordo está o povo em geral e a esquerda. A direita, o bloco central e maior parte dos comentadores e políticos comprometidos com os interesses exprimem reservas e apresentam várias justificações para fazer múltiplas distinções. Que esta gente, a que exprime reservas, está com ou no PS e no PSD e também, à sua pequena dimensão, com ou no CDS/PP, é um facto empiricamente comprovável.
Que a pouca-vergonha ocorrida no BPN, para além da perícia criminosa dos seus autores, só foi possível no quadro de uma supervisão completamente complacente com os interesses do capital financeiro e devido a um comportamento, no mínimo, grosseiramente negligente do órgão regulador, é assunto que também não goza de genérica aceitação: o PS não tem dado tréguas na defesa de Vítor Constâncio e na audição parlamentar a que este foi sujeito nada, absolutamente nada, fez para averiguar a verdade; pelo contrário, procurou evitar a sua averiguação.
Que o governo PS partiu para uma nacionalização do BPN de maneira politicamente irresponsável, comprometendo grave e onerosamente o erário público em milhares de milhões de euros é também um facto que o tempo se encarregará de demonstrar, apesar de o PS e o seu governo continuarem a negá-lo.
Que o grande prejudicado pela “roubalheira” de que falou o cabeça de lista do PS será e já é o contribuinte português também é certamente um facto demonstrável, apesar de o PS e o seu governo se recusarem a reconhecê-lo.
Que o que hoje se sabe sobre a pouca-vergonha do BPN e do papel da supervisão se deve fundamentalmente à acção do CDS/PP, do BE do PCP, bem como do papel desempenhado na Comissão Parlamentar de Inquérito pelos deputados Nuno Melo, João Semedo e Honório Novo é também um facto que o PS e o PSD relutam em reconhecer, desde logo pela escassa colaboração prestada na averiguação da verdade.
Dito isto, terá de concluir-se que a declaração de Vital Moreira, cabeça de lista do PS às eleições europeias, seria corajosa se fosse completa. Ela limita-se a reproduzir muito parcialmente as conclusões a que outros laboriosamente chegaram sem a colaboração ou até com a disfarçada oposição do PS e do PSD. Vital Moreira não está a falar em nome próprio. Está a falar em nome do PS. E nesta qualidade a sua declaração omite parte do essencial e procura apenas tirar partido da outra parte na “guerrinha eleitoral” que vem travando como PSD!