terça-feira, 5 de maio de 2009

AS SONDAGENS E O FANTASMA DO BLOCO CENTRAL


OS RECEIOS DO PS E DO PSD


A regra democrática por excelência é a da maioria relativa. Vence a proposta que reunir mais votos que as antagonistas, vence as eleições o partido que recolher mais votos que os seus adversários. Todavia, para governar é necessário que os apoiantes do governo na câmara tenham mais votos que os seus opositores. E para alcançar essa maioria, pode, em muitos casos, não ser suficiente a maioria relativa. Daí que um governo se sinta mais confortável sempre que dispõe de uma maioria absoluta no parlamento, ou seja, metade mais um dos deputados eleitos.
Esta maioria pode alcançar-se fundamentalmente por duas vias: o partido ou a coligação eleitoral de que o governo é proveniente dispõe de maioria absoluta; ou é necessário negociar uma coligação que reúna os votos suficientes para apoiar o governo. Esta coligação tanto pode ter incidência governativa, como ser meramente parlamentar, embora as primeiras sejam, em princípio, mais estáveis.
As coligações são normais e frequentes em democracia, nomeadamente nos países de sistema eleitoral proporcional; outros sistemas, como os de círculos uninominais de maioria a uma volta, tendem a gerar com facilidade maiorias parlamentares em detrimento da representação das minorias.
Num sistema como o nosso, de representação proporcional, as coligações deveriam ser uma situação normal, tanto mais que só por três vezes, em mais de três décadas de democracia, se alcançaram maiorias absolutas. E sendo uma situação normal, o mais natural é que as coligações se façam entre os partidos com mais afinidades ideológicas. Salvo nos casos excepcionais de governo de “salvação nacional” ou de “unidade nacional”, aquela é a regra mais comummente seguida
Em Portugal, as coligações pré e post eleitorais já existentes fizeram-se entre o PS e o CDS; entre o PSD e o CDS (coligação pré-eleitoral por duas vezes e post eleitoral, uma); e entre o PS e o PSD. O que significa que há uma inegável similitude programática entre os três partidos, já que todos eles se aliaram e coligaram entre si.
É natural, todavia, que o PSD que, desde a Constituição disputa a governação com o PS, prefira coligar-se com o CDS, independentemente da sua maior ou menor proximidade ideológica com este partido, do que com o PS, não obstante partilhar com este muitos dos seus fundamentos programáticos. Pela mesma razão, o PS foge a aliar-se com o PSD.
Acontece que as próximas eleições podem gerar um cenário em que qualquer um destes dois partidos, para governar, ter de se aliar com o outro, afastada que está a hipótese de tanto o PSD como o PS se aliarem a partidos de esquerda ou de o CDS reunir votos suficientes para formar com qualquer deles uma maioria.
As sondagens apontam para uma queda acentuada do PS nas europeias, fruto antes de mais da fraca prestação eleitoral do seu cabeça de lista, mas também resultado de um voto de protesto contra a governação socialista, e para uma maioria mais confortável nas legislativas, todavia aquém da maioria absoluta.
É, portanto, muito provável que PS e PSD venham a formar uma coligação pós-eleitoral por maiores que sejam as reservas que os respectivos responsáveis agora lhe levantam. Essas reservas não decorrem de divergências programáticas assinaláveis, mas antes da atitude das respectivas clientelas eleitorais que, sendo maioritárias, resistem a “dividir o bolo” com terceiros. Alguma rivalidade pessoal entre as respectivas lideranças, levará também ao sacrifício da pertencente ao partido menos votado para que a coligação se possa fazer.
Há ainda uma outra razão que leva os dois maiores partidos, ideologicamente muito próximos, a resistirem à coligação. É que uma aliança de tipo “bloco central” levaria fatalmente a um crescimento eleitoral dos demais partidos, a menos que um novo e muito pouco provável “fenómeno Cavaco Silva” despontasse num dos partidos coligados. Por isso, não seria de estranhar, se a coligação se vier a fazer, que PS e PSD, para manterem a hegemonia, venham a manipular legislativamente o sistema eleitoral, de modo a encontrar maiorias absolutas sem correspondência com o voto popular e a relegar para uma representação meramente simbólica os partidos à esquerda e à direita.
É bom que se compreenda que o grande alarido que, com a colaboração dos media, tem sido feito à volta dos perigos da maioria relativa e do risco de ingovernabilidade tem muito menos a ver com a viabilidade de coligações que assegurem o funcionamento do sistema, do que com o risco sistémico que para o PS e para o PSD representa a necessidade de uma coligação entre eles. ´
É que uma coligação de bloco central retira-lhes margem de manobra futura. Essa a verdadeira razão de ser da recusa.

2 comentários:

Ana Paula Fitas disse...

Muito interessante... vou fazer link para este texto... propondo uma inversão dos dados... Abraço.

JMC Pinto disse...

Muito obrigado pelo seu comentário.
Abraço