QUEM GANHA E QUEM PERDE
É opinião quase unânime que a CDU e Paulo Rangel fizeram uma boa campanha. O CDS, apertado no seu raio de acção pelo PSD, e sem querer abrir hostilidades contra Rangel, fez o que pôde. O Bloco, cujas expectativas com que parte, ou que outros lhe criam, dificilmente se confirmam, teria estado mais à vontade se a discussão tivesse incidido mais sobre Europa e menos sobre política interna. Finalmente, o PS que, no decurso da campanha, passou da depressão à euforia, provavelmente exageradas tanto uma como outra, acabou-a com a convicção de que dificilmente alcançará um nível de votação que lhe permita aguentar o desgaste governativo daqui até às legislativas.
Na campanha do PS pesaram decisivamente a crise e o cabeça de lista. Ambos pelas piores razões. Por mais que se tivesse esforçado, o PS não conseguiu desligar a sua governação da maior parte das consequências da crise, se não mesmo de algumas causas e isso pesará no resultado final. O modo como durante quatro anos fustigou amplos sectores da sociedade e como agravou as desigualdades sociais, em homenagem a um pretenso valor (redução do défice) que, uma vez alcançado, logo se desvaneceu com a rapidez de um relâmpago, nunca lhe permitiu ter uma campanha fácil e antecipadamente vitoriosa. Contudo, o estado de permanente guerrilha interna em que o PSD iniciou a campanha permitir-lhe-ia acalentar certas esperanças de vitória. Porém, esta possibilidade, mais por demérito do concorrente directo do que por mérito próprio, foi relativamente inviabilizada pela infeliz campanha do seu cabeça de lista.
De facto, saiu-se mal tanto na defesa da política comunitária, como na da política interna. Tendo começado por afirmar que apenas queria discutir Europa, viu-se batido no primeiro frente-a-frente com os demais candidatos quando não foi capaz de responder convincentemente aos argumentos de uma Europa alternativa, nem às repercussões internas da política europeia. Voltou a sair-se mal na política europeia, quando trouxe para a discussão uma proposta muito mal preparada (criação de um imposto europeu), quase de conversa de café, vendo-se obrigado a recuar tanto por pressão das críticas dos concorrentes, como de pressões internas. Perante o agravar da situação, Sócrates e outros notáveis do PS tiveram de intervir na campanha, subalternizar o candidato, para criar no eleitorado a convicção de que a hegemonia eleitoral estava restabelecida. Com este objectivo relativamente conseguido e supondo-o razoavelmente consolidado, as altas figuras do PS voltaram a afastar-se da campanha, deixando novamente o candidato entregue a si próprio. É então que, por iniciativa deste, se assiste a uma reviravolta no discurso eleitoral, doravante apenas preocupado com questões de política interna, para responder mais incisivamente ao principal adversário eleitoral – o PSD. É neste novo quadro que o cabeça de lista abre uma nova frente, ligando o PSD ao BPN, sem ter em conta as repercussões desse discurso no contribuinte, que, por força de uma decisão pouco esclarecida do PS, sabe que vai ter de pagar os onerosíssimos estragos causados no BPN por administrações ruinosas, sempre com o silêncio e a complacência da autoridade reguladora.
Rangel, que andou quase sempre só, aproveitou o debate sobre temas nacionais para tirar toda a vantagem da discussão. Acabou por capitalizar o facto de não beneficiar abertamente do apoio de ninguém importante dentro do partido, mostrando-se como o novo rosto do PSD. Pode não ter tido banhos de multidão, laboriosamente organizados pelas estruturas partidárias, pode não ter feito comícios previamente encenados com cânticos, bandeirinhas e outras coreografias, mas apesar de ter andado sempre só nunca deu a imagem de ser um homem isolado. Pelo contrário, é nele que o militante desenfeudado e o votante anónimo do PSD confiam para fazer ressurgir o partido. Pode não ganhar, mas andará lá muito perto.
O CDS, com Portas e Nuno Melo, fizeram um grande esforço para encontrar um espaço de afirmação numas eleições onde o partido já defendeu quase todas as posições possíveis relativamente à Europa. Nesta campanha privilegiaram a política interna, realçaram os méritos da sua actividade parlamentar de oposição ao governo, nomeadamente a vigorosa denúncia e posterior investigação da complacência culposa da entidade reguladora das actividades financeiras, embora muito provavelmente nada disso impeça que o CDS venha a ser o grande sacrificado do voto útil (que nestas eleições até nem tem razão de existir) e o principal prejudicado do ressurgimento do PSD. Se conseguir eleger um deputado, poderá dar-se por feliz.
O Bloco, que começou muito bem na discussão das questões europeias, opondo-se com vantagem ao que parecia ser o ponto mais forte do candidato do PS, acabou por fazer uma campanha tipicamente de questões internas, num estilo muito próximo do que tem sido a matriz do partido desde que foi criado. O seu êxito vai fundamentalmente resultar da mobilização do voto urbano jovem. Provavelmente duplicará a sua participação no PE.
A CDU fez desde o princípio ao fim uma campanha muito forte, coerente e sem falhas. Vendo a Europa como mais um palco de luta pela defesa dos interesses nacionais, tal como os interpreta, a CDU não tem que se defrontar com alguns dos problemas atinentes à construção europeia com que os outros partidos se defrontam. Por outro lado, continuando a ser a força social mais consistente, com maior capacidade de luta e de reivindicação, a CDU, numa eleições como estas, poderá captar o voto de todos aqueles que entendem ser benéfico para a democracia a existência de um partido relativamente forte capaz de se opor com tenacidade e persistência aos desvarios de um governo que não hesita em passar por cima dos interesses da maioria em nome de uma mirífica e nunca alcançada vantagem futura. Ponto é saber se, não obstante toda essa imensa capacidade de luta, aumentará o número de deputados.
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