A CRÓNICA DE VASCO PULIDO VALENTE
Em crónica sobre o acordo ortográfico, VPV, no Público da passada sexta-feira, concluiu que o barulho feito a propósito da sua ratificação não serve para nada, já que ele não resolve qualquer problema e, por isso, morrerá depressa. Estou de acordo com a conclusão, que, de resto, eu já tinha adiantado na terça-feira passada.
E não serve para nada, porque ele não impede a divergência entre o português de Portugal e português do Brasil, que se manifesta em domínios muito mais profundos que os decorrentes da grafia.
Que esta divergência existe em vários domínios ninguém o poderá negar. Questão diferente é saber quando começou, que causas tem e por que se acentuou. Saber quando começou a divergência que se manifesta no plano da escrita, não será muito difícil de averiguar, nomeadamente as divergências gráficas, sintácticas e semânticas. Já não direi o mesmo das fonéticas por ausência de registos fonográficos…
Muito mais difícil será conhecer as causas da divergência. Obviamente, que temos sobre o assunto uma opinião, mas a mais elementar prudência impõe que a não adiantemos. De que vale uma opinião? Se tivéssemos formulado uma hipótese e depois, através do estudo de múltiplos dados empíricos, dispuséssemos de material suficiente para fazer comparações, formular generalizações, etc., talvez a opinião se pudesse transformar em hipótese de trabalho e, quem sabe, mais tarde, em tese.
VPV diz que o inglês falado e escrito em meio mundo (não será bem meio, sempre há a China, a Rússia, a América Latina, para não falar na Índia que não fala inglês) não diverge tanto, ou quase não diverge, por causa do protestantismo e da tradução da Bíblia de 1611, a king James Bible, “que por todo o mundo foi o centro do culto e o livro em que se aprendia a ler.” Além de que, houve uma literatura clássica, que vai de Shakespeare a T.S. Eliot e de Hawthorne a Fiztgerald, considerada património comum, e em que, por isso mesmo, se não tocava.
Confesso a minha ignorância: não sei se a explicação adiantada para a não divergência do inglês não passa de uma opinião ou se é muito mais do que isso – se é uma conclusão resultante de interessantes estudos que alguém terá feito.
Mas dizer que entre Portugal e o Brasil não há uma tradição literária comum é que me parece excessivo. E tentar demonstrar a afirmação dizendo que Vieira não é um autor que se partilhe, que Eça é demasiado indígena, pior ainda, lisboeta ou que Pessoa é de difícil exportação, parece-me uma grande leviandade só possível em quem não conhece minimamente o Brasil.
Na verdade, com excepção de Fernão Lopes, tudo o que na literatura portuguesa tem verdadeiro nível internacional é publicado no Brasil, em inúmeras edições, nas divulgadíssimas colecções de bolso. E os autores publicados, Gil Vicente, Camões, Sá de Miranda, Vieira, Bocage, Herculano, Garrett, Camilo, Eça, Pessoa, Florbela Espanca, Saramago, etc., para não falar dos autores brasileiros anteriores à independência, como Gregório de Matos e Tomaz Gonzaga, entre outros, não divergem ou quase não divergem dos clássicos da literatura brasileira, como Castro Alves, José de Alencar, Machado de Assis, Lima Barreto ou mesmo dos mais recentes, como J.C. de Melo Neto, Manuel Bandeira, Carlos Drumont de Andrade e Cecília Meireles. E mesmo aqueles que fizeram da diferença e do apelo às especificidades tipicamente brasileiras a razão de ser da sua literatura, como Mário de Andrade e Alcântara Machado, não divergem assim tanto dos clássicos da língua portuguesa. Isto tudo para dizer que, se a razão da convergência do inglês é a existência de um património clássico comum, então vai ter de se encontrar outra justificação para a divergência do português.
E não serve para nada, porque ele não impede a divergência entre o português de Portugal e português do Brasil, que se manifesta em domínios muito mais profundos que os decorrentes da grafia.
Que esta divergência existe em vários domínios ninguém o poderá negar. Questão diferente é saber quando começou, que causas tem e por que se acentuou. Saber quando começou a divergência que se manifesta no plano da escrita, não será muito difícil de averiguar, nomeadamente as divergências gráficas, sintácticas e semânticas. Já não direi o mesmo das fonéticas por ausência de registos fonográficos…
Muito mais difícil será conhecer as causas da divergência. Obviamente, que temos sobre o assunto uma opinião, mas a mais elementar prudência impõe que a não adiantemos. De que vale uma opinião? Se tivéssemos formulado uma hipótese e depois, através do estudo de múltiplos dados empíricos, dispuséssemos de material suficiente para fazer comparações, formular generalizações, etc., talvez a opinião se pudesse transformar em hipótese de trabalho e, quem sabe, mais tarde, em tese.
VPV diz que o inglês falado e escrito em meio mundo (não será bem meio, sempre há a China, a Rússia, a América Latina, para não falar na Índia que não fala inglês) não diverge tanto, ou quase não diverge, por causa do protestantismo e da tradução da Bíblia de 1611, a king James Bible, “que por todo o mundo foi o centro do culto e o livro em que se aprendia a ler.” Além de que, houve uma literatura clássica, que vai de Shakespeare a T.S. Eliot e de Hawthorne a Fiztgerald, considerada património comum, e em que, por isso mesmo, se não tocava.
Confesso a minha ignorância: não sei se a explicação adiantada para a não divergência do inglês não passa de uma opinião ou se é muito mais do que isso – se é uma conclusão resultante de interessantes estudos que alguém terá feito.
Mas dizer que entre Portugal e o Brasil não há uma tradição literária comum é que me parece excessivo. E tentar demonstrar a afirmação dizendo que Vieira não é um autor que se partilhe, que Eça é demasiado indígena, pior ainda, lisboeta ou que Pessoa é de difícil exportação, parece-me uma grande leviandade só possível em quem não conhece minimamente o Brasil.
Na verdade, com excepção de Fernão Lopes, tudo o que na literatura portuguesa tem verdadeiro nível internacional é publicado no Brasil, em inúmeras edições, nas divulgadíssimas colecções de bolso. E os autores publicados, Gil Vicente, Camões, Sá de Miranda, Vieira, Bocage, Herculano, Garrett, Camilo, Eça, Pessoa, Florbela Espanca, Saramago, etc., para não falar dos autores brasileiros anteriores à independência, como Gregório de Matos e Tomaz Gonzaga, entre outros, não divergem ou quase não divergem dos clássicos da literatura brasileira, como Castro Alves, José de Alencar, Machado de Assis, Lima Barreto ou mesmo dos mais recentes, como J.C. de Melo Neto, Manuel Bandeira, Carlos Drumont de Andrade e Cecília Meireles. E mesmo aqueles que fizeram da diferença e do apelo às especificidades tipicamente brasileiras a razão de ser da sua literatura, como Mário de Andrade e Alcântara Machado, não divergem assim tanto dos clássicos da língua portuguesa. Isto tudo para dizer que, se a razão da convergência do inglês é a existência de um património clássico comum, então vai ter de se encontrar outra justificação para a divergência do português.
Sem comentários:
Enviar um comentário