terça-feira, 30 de junho de 2009

GUANTÁNAMO: O FRETE AOS AMERICANOS

DEFESA DOS DIREITOS DE QUEM?

O recente episódio da estadia em Portugal dos advogados dos presos de Guantánamo que querem vir para Portugal e as vicissitudes a ela ligadas (recusa dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Administração interna em os receber) é a prova provada de que nesta “história” de Guantánamo o que o Governo pretende, nomeadamente o MNE, é fazer o frete aos americanos. Os direitos dos detidos é assunto que não lhe interessa nada. Nem ao Governo, nem a outros conhecidos defensores dos direitos do homem para quem Guantánamo só serve para atacar Barroso!

O GRANDE INIMIGO DO PATRONATO PORTUGUÊS


QUE FAZER COM ESTA GENTE?

Depois de ver e ouvir um programa sobre relações laborais em tempo de crise (com este ou com outro nome), a sensação com que se fica é a de que, mesmo que o custo do trabalho tendesse para zero, a maior parte das empresas portuguesas não seria competitiva. E fica-se também com a ideia de que mesmo nessas condições os trabalhadores continuariam a ser vistos pela generalidade dos patrões como os grandes inimigos das empresas. Bom, bom seria passar sem eles…

segunda-feira, 29 de junho de 2009

GOLPE NAS HONDURAS


A CORRELAÇÃO DE FORÇAS NA AMÉRICA LATINA

Se eu conhecesse o sistema jurídico hondurenho tão bem como JM Fernandes, estaria certamente em condições de comentar os meandros jurídicos que serviram de pretexto ao golpe. Como não conheço, tenho de aceitar que a Constituição não possa ser alterada por referendo, que o Parlamento, depois de convocado o referendo, possa aprovar uma lei proibindo as consultas referendárias 180 dias antes ou depois de eleições gerais, que as Forças Armadas tenham competência para declarar ilegal a convocatória do referendo e, acima de tudo, que o Supremo Tribunal de Justiça possa anular a a decisão do Presidente da República de destituir o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas.
A tudo isto responde JM Fernandes com a mesma convicção com que defende o neoliberalismo ou a "respeitabilidade" dos 28 economistas. Só que, coitado dele, mete-se num beco sem saída: depois de ter respondido tão categórica e afirmativamente àquelas questões, só lhe restava concluir pela “legalidade” do golpe. Não vai, porém, ser fácil. A América Latina já não é o que era e hoje os Estados Unidos já não põem e dispõem como outrora.

MADOFF, 150 ANOS DE CADEIA!

SEMELHANÇAS E DISSEMELHANÇAS

Quando o processo de Madoff foi instaurado, já o MP andava às voltas há uma série de anos com investigações sobre fraudes de bancos e de outras empresas. Muito antes das vigarices de Mardoff terem sido descobertas já por cá se investigava o BCP e o BPN. É verdade que os nossos negam tudo. Mesmo o que é evidente. Os anglo-saxónicos confessam...e contam tudo. Por que será?
Vamos acreditar que nos 150 anos mais próximos tenhamos uma condenação em forma dessa gente que fez por cá, à nossa escala, o que Madoff fez por lá.

A CIA E O IRÃO


O CONTRIBUTO DE PAUL CRAIG ROBERTS

Já aqui abordámos por várias vezes a situação do Irão, tentando compreender o que realmente se passa naquele milenário país. Mas não está fácil. Se, por um lado, há notícias que dão como muito provável, a curto prazo, um compromisso entre as classes dirigentes desavindas - o tal jogo que não seria de resto zero, a que aqui também já aludimos -, ou que até admitem, como possível, uma vitória do chamado sector reformista mediante a substituição do Guia Supremo, outras há que apontam no sentido oposto: uma vitória dos radicais, sem contemplações pelos vencidos. É para este entendimento que aponta a recente acusação de os distúrbios que se seguiram ao acto eleitoral terem sido preparados ou influenciados pela CIA e pelos serviços secretos britânicos que teriam visto na disputa eleitoral para a Presidência da República a criação da situação adequada à destabilização do regime.
Esta tese, defendida pelos “duros” de Teerão, foi logo sufragada por Chávez e por outros políticos que já foram alvo de manobras de destabilização da CIA. Todavia, o que mais espanta é que ela tenha também sido convictamente defendida por Paul Craig Roberts, ex - Secretário de Estado adjunto do Tesouro, na era Reagan.
Ainda é cedo para saber o que se está a passar. Duas coisas são, porém, certas. Primeira: a CIA e os serviços secretos britânicos têm experiência na área: o golpe de 1953, hoje mais compreensível e narrável em seus pormenores, depois da abertura dos arquivos. Segunda: a situação de então era muito diferente da actual.
Em 1953, o golpe, entre muitas outras acções de destabilização do regime, começou a ser preparado pelos ingleses, embora com conhecimento da CIA, que, durante a presidência Truman não teve autorização para actuar, mas acabou por ser posto em prática por aquela agência - operação Ajax-, na presidência seguinte (Eisenhower), sob a responsabilidade directa de Kermit Roosevelt Jr., neto de Theodore Roosevelt. Então, foi necessário corromper muita gente, Ayatollahs inclusive, recorrer a pessoas inqualificáveis e beneficiar de um estilo de actuação muito peculiar de Mossadegh que não se defendeu como devia. Eram a dignidade do Estado e orgulho de um povo que estavam em causa contra a secular rapina britânica. Não foi um golpe fácil, mas fez-se.
Hoje, as condições são muito diferentes. O orgulho nacional mantém-se intacto e o ressentimento contra a perfídia americana, que os iranianos tinham por amigos, Mossadegh incluído, também, mas há notoriamente um certo cansaço das populações mais jovens e das urbanas que querem viver num regime mais aberto, e sobretudo, mais próspero. A liderança de Ahmadinejad trouxe-lhes mais inflação, custo de vida mais alto, desemprego e uma excessiva crispação internacional que está muito longe de ser apoiada por todos, tanto dentro como fora do regime. Por outras palavras, teoricamente as condições são hoje mais favoráveis a uma acção da CIA do que há 56 anos. É muito provável que a CIA, durante a presidência Bush, estivesse preparando, com o apoio dos ingleses, uma acção de destabilização do regime. E também é provável que a presidência seguinte tivesse que decidir sobre “o que fazer”. Já vimos isso noutras ocasiões: com Kennedy, por exemplo, que teve de dar seguimento a uma acção preparada pela “mesma CIA” que planeou e executou o golpe de Teerão (a CIA de Allan Dulles). Mesmo que se dê o benefício da dúvida a Obama – e deve dar-se, de outro modo o discurso do Cairo seria uma ignomínia – nada nos garante que os ingleses não tenham tomado a acção a seu cargo com a colaboração oficiosa da própria CIA.
Mesmo que tudo isto fosse verdade – e tão cedo ninguém o conseguirá provar – não parece, contudo, que os americanos estejam em condições de poder retirar de uma eventual mudança de liderança em Teerão as mesmas vantagens que “colheram” com o golpe de 1953.

O SONHO DE RUBINA

A PEQUENA LATIKA DE “SLUMDOG MILLIONAIRE”

Depois da leitura deste texto, fragmento da vida de Rubina Ali, a pequena Latika de “Quem quer ser bilionário?”, é difícil não relativizar a importância das coisas…

UM SUPERBOY



ASSIM VALE A PENA DEFENDER O GOVERNO



Mérito, apenas mérito pode justificar a privilegiada situação de Luís Patrão…

AINDA A ESTRATÉGIA ELEITORAL DO PS


A ANÁLISE DA SITUAÇÃO

André Freire, nos Ladrões de Bicicletas, faz hoje (28 de Junho) um comentário sobre a estratégia eleitoral do PS, considerando pouco inteligente a captação do voto de centro e da direita por não permitir “capitalizar qualquer tipo de voto útil à esquerda”.
A estratégia do PS pode não resultar. A dinâmica do processo eleitoral pode trazer novidades que agora dificilmente se antevêem, mas a estratégia de manter o eleitorado de centro e de direita não me parece assim tão pouco inteligente como aquele artigo pretende. Certamente, que o ideal para o PS era captar aquele eleitorado do mesmo modo que o captou em 2005. Só que as condições agora são muito diferentes e por isso os actos através dos quais o PS procura fazê-lo têm de ser evidenciados de modo muito mais visível do que há 5 anos. Por outro lado, o PS conhece bem o seu eleitorado à esquerda e sabe que uma parte dele (pequena) pode ser seduzida pelo Bloco, mais dificilmente pela CDU, mas sabe também que a imensa maioria dos votos que normalmente recebe deste sector tem muita dificuldade em romper com a fidelidade de voto. É mais provável abster-se ou votar em branco, como fez nas europeias, do que mudar de partido. E o PS conta recuperar este voto com a conversa do costume, já aqui explicitada por mais de uma vez.
Neste contexto, não me parece que faça sentido falar em voto útil à esquerda. Voto útil seria deslocar tacticamente para o PS o voto da CDU e do Bloco a fim de evitar a vitória da direita mais reaccionária. Mas há condições políticas para isto? Então, não será muito mais útil votar na CDU e no Bloco para eventualmente viabilizar um governo PS minoritário ou, além de minoritário, segunda força eleitoral, pressupondo, como agora parece muito provável, que PSD e CDS não façam maioria na câmara? Ou não será ainda mais útil manter o voto naqueles partidos, obrigando – segunda alternativa - o PS a aliar-se à direita, caso seja a força política mais votada?
Reconheço que tenho alguma dificuldade em misturar os planos: se faço análise descritiva, tenho de me ater aos factos, interpretá-los correctamente e raciocinar em função deles. Se pelo contrário, me situo no plano prescritivo, como muitas vezes acontece nos posts deste blogue, o que tenho em vista é fazer vingar a minha opinião e levar os outros a agir de acordo com ela. Misturar os dois planos no tratamento do mesmo assunto é que me parece metodologicamente muito incorrecto e, porventura, mistificador.

sábado, 27 de junho de 2009

UMA OUTRA FORMA DE VER AS COISAS

PARA COMBATER AS RECEITAS DOS ECONOMISTAS DE DIREITA


Um conjunto de personalidades de várias áreas do saber apresenta "Um Manifesto com Prioridades", no qual se defende o combate ao desemprego como o objectivo central da política económica.

SOBRE A ITÁLIA DE BERLUSCONI

COMO EXPLICAR ESTA ITÁLIA?

Para uma tentativa de explicação ver o artigo de Sami Naïr, no El País de hoje.

A ESTRATÉGIA ELEITORAL DO PS


GARANTIR OS VOTOS QUE À DIREITA LHE DERAM A MAIORIA ABSOLUTA

Embora não tenha procedido a nenhuma análise minuciosa dos últimos resultados eleitorais, a leitura de certos sinais pós-eleitorais, a que aqui fiz referência, logo me disse que o PS iria tentar garantir os votos que, ao centro e à direita, lhe asseguraram a maioria absoluta em 2005. Certo de que será quase impossível repetir este resultado em 2009, o PS está agora apenas preocupado em ficar à frente do PSD pelo maior número de votos possível. Para isso não pode descurar o centro e a direita. Quanto aos votos de esquerda, para além das habituais declarações destinadas a captar este eleitorado, que a dita esquerda do PS se encarregará de fazer, os responsáveis socialistas acham que apenas uma pequena parte deste eleitorado migrará para o Bloco, enquanto a maior parte continuará a não se rever em nenhum dos dois partidos de esquerda e a ter muito dificuldade em se desligar eleitoralmente do PS. Como o PS acredita que a alternativa que se coloca a este voto é a abstenção, está confiante de que uma campanha bem dirigida e localizada sobre os reais perigos da direita (privatização da saúde e da segurança social, além da destruição de parte importante do que resta do Estado social) fará este voto retornar ao PS.
A notícia hoje publicada pelo Diário de Notícias parece confirmar esta estratégia.

CAVACO RECUA NA MARCAÇÃO DAS LEGISLATIVAS

O PSD FEZ DE "LEBRE"...E FICOU ISOLADO

Chegou a pairar na política portuguesa a ideia de que Cavaco iria marcar as legislativas no mesmo dia das autárquicas. O Presidente era claramente favorável à simultaneidade dos actos eleitorais, tendo-se o PSD feito eco público desta vontade. Perante a recusa unânime dos demais partidos, nomeadamente do CDS, Cavaco, depois das declarações sobre o negócio da PT com a Media Capital, não tinha grandes alternativas: ou marcava as eleições para o mesmo dia e confirmava-se aos olhos da opinião pública como um simples lider partidário, ou seguia a opinião da maioria e mantinha teoricamente a aparência de equidistância partidária. Foi o que fez.
A ideia de que há eleições a mais é tipicamente uma perspectiva tecnocrática. Como não é possível passar sem elas, o ideal é que haja o menos possível e pelo menor espaço de tempo possível. Para não perturbar...

sexta-feira, 26 de junho de 2009

AFINAL, O GOVERNADOR DESAPARECIDO...ESTAVA NAMORANDO



A MORAL DA DIREITA MAIS REACCIONÁRIA

A notícia também não teria nada de verdadeiramente excepcional, apesar de um dos intervenientes na história ser governador de um estado americano, se não fosse dar-se o caso de a “escapadinha” de 5 dias ter sido protagonizada por um dos mais acérrimos defensores dos “valores familiares”. Mark Sanford, Governador de Carolina do Sul, ex-congressista, defensor da supremacia das leis divinas, feroz opositor de Obama, militante fervoroso da destituição de Clinton no caso Monica Lewinsky, enfim, um baluarte do Partido Republicano, ei-lo apanhado nas “pampas” com a sua namorada argentina!
Por isso, camarada, quando ouvires falar politicamente na defesa dos “valores familiares”, põe-te em guarda!

BCP: A PROVA DE FOGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO



BANQUEIROS ACUSADOS


Mais um banco acusado de ter sido assaltado pelos seus administradores. A notícia pode fazer a primeira página dos jornais, embora na realidade nada tenha de novo. Desde que o capitalismo financeiro se tornou no principal motor da economia capitalista, vai para uma ou duas décadas, toda a gente se apercebeu de que o sistema, tal como funcionava, permitia todas as irregularidades e vigarices. Em todo o mundo, e não apenas em Portugal, os governos, subservientes, não tinham autonomia para agir, e as entidades reguladoras, coniventes, fechavam os olhos. Depois foi o que se viu: roubaram os clientes,” lícita” ou ilicitamente, e mergulharam a economia no caos. Fica-se com a sensação de que a partir de determinada altura as autoridades em geral desistiram de querer saber o que se passou e passaram a estar muito mais interessadas em evitar as piores consequências do que se passou, despejando sobre os bancos rios de dinheiro que os contribuintes, a seu tempo, pagarão.
O que entre nós se estava a passar no BCP foi sendo denunciado por aqueles que, estando mais próximos, mas não tirando qualquer vantagem das manobras em curso, quiseram defender os seus investimentos. Depois, a entidade reguladora, no seu jeito brando e apaziguador, acabou por intervir, embora o essencial – isto é, o crime – tivesse sobrado para o Ministério Público.
O MP que tem coleccionado inúmeros falhanços nas suas acusações tem aqui a sua verdadeira prova de fogo. Ou consegue que sejam exemplarmente condenados aqueles que acusa e "salva a honra do convento” ou não consegue e ninguém acredita mais na justiça em Portugal. Por isso este processo é, a vários títulos, um processo exemplar!

PT: SÓCRATES RECUA


AFINAL, JÁ NÃO HÁ NEGÓCIO

O Governo anunciou hoje que não autorizará a aquisição de 30% da Media Capital pela PT. Quaisquer que tivessem sido as motivações do negócio, uma coisa é certa: o governo cedeu à pressão da direita, encabeçada pelo Presidente da República, e da esquerda institucional, que também criticava aquele negócio.
Esta convergência de posições, ditada por razões muito diferentes, acaba por favorecer a direita. Enquanto a esquerda via no negócio uma tentativa encapotada de controlo de um sector da comunicação social hostil ao governo e funda o seu protesto na defesa do princípio da liberdade de informação, a direita apenas estava (e está) interessada na manutenção daquela tribuna. A questão de princípio não a preocupa, nem a motiva, como no passado já se viu.
Posta assim a questão, não faltará quem venha dizer que entre manter o princípio e favorecer a direita ou esquecê-lo para não beneficiar a direita, vale sempre mais defender o princípio.
Nada mais certo. Só que era possível fazer as duas coisas: defender o princípio e atacar o oportunismo da direita. A defesa incondicionada da liberdade de informação não impede a esquerda de denunciar o oportunismo da direita no caso TVI. O que a direita quer é manter Moniz a qualquer preço. Esse é o seu objectivo. Incompreensível é alinhar num protesto ao lado da direita, deixando intocada a ideia de que ambos os protestos têm o mesmo fundamento.
Mais cedo do que tarde, a esquerda conhecerá a dimensão do seu erro e se alguém admite a possibilidade de uma TVI ao contrário, em caso de vitória da direita, certamente estará vivendo num mundo irreal. Logo um imenso coro de protestos, amplificado pela “voz transparente” dos grandes pontífices, nos viria dizer que o programa seria anti-democrático por não respeitar o contraditório na informação, nem na opinião e por aí fora. Em conclusão: uma derrota de Sócrates a qualquer preço poderá ter um desfecho muito pouco vitorioso.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

CAVACO JÁ TEM RESPOSTA

SOBRE O CONCEITO DE TRANSPARÊNCIA ...

O presidente executivo da PT foi entrevistado na RTP e a jornalista que o entrevistou habituada, mal habituada, à conversa dos nossos políticos, tinha como grande objectivo saber: em que dia começaram as negociações da PT com a Media Capital; se o Governo tinha conhecimento dessas negociações ou até se incitou a PT a fazê-las; e, magna questão, se Moniz continuará na TVI caso a PT venha a comprar 30% do capital daquela empresa. E lá teve as respostas que merecia, dadas por uma daquelas raras pessoas que existem em Portugal – inteligente e competente.
Mas não foi somente ela que levou que contar. Cavaco também levou. Preocupado com a transparência, segundo ele o grande valor sobrante desta crise, Cavaco quer explicações sobre o negócio. E teve a resposta no plano institucional: uma empresa cotada nas bolsas de Lisboa e de Nova York é sindicada pelas autoridades reguladoras. Os seus negócios são mais transparentes do que quaisquer outros. E ficou também a saber que estas negociações, se tiverem êxito, não serão muito diferentes de outras já realizadas.
Esta preocupação de Cavaco pela transparência dos negócios e dos comportamentos é louvável. Pena que essa mesma necessidade de transparência não lhe tivesse ocorrido com a mesma intensidade quando os factos vindos a público já apontavam para um comportamento menos próprio de um conselheiro de estado, por si nomeado, em quem continuou a depositar a confiança, quando as dúvidas sobre a sua conduta já eram mais que muitas. Pena também que os seus negócios com a SLN, proprietária do BPN, não tivessem sido mais explicados no que respeita à compra e venda de títulos dessa mesma empresa. Se é certo que a dita empresa não estava cotada em bolsa, não sendo, por isso, tão exigentes os requisitos de transparência, também não é menos verdade que toda a gente ficou com imensa curiosidade em saber como foi determinado o valor de tais títulos.
E, para finalizar, já que estamos a falar de transparência, também uma dúvida nos assalta, que gostaríamos de ver desvanecida com uma resposta esclarecedora: o que preocupa Cavaco é que Moniz deixe de ser responsável pela informação da TVI?

AINDA A "EXCEPÇÃO" DE CAVACO E A TVI


CAVACO TOMA PARTIDO

Olhando as coisas a frio, dificilmente a intervenção de Cavaco sobre o putativo negócio entre a PT e a Media Capital, pode deixar de ser interpretada como uma tomada de partido no conflito que opõe a informação da TVI (Jornal de sexta) a Sócrates, diga-se o que se disser sobre a garantia da liberdade de imprensa. E tais palavras, ditas agora, depois da vitória eleitoral do PSD nas europeias, juntam mais umas tantas condições para o desencadeamento de uma ofensiva vitoriosa contra o governo PS. Quem está de fora, vê assim aproximar-se o cenário que, em artigo publicado durante a campanha eleitoral para a Presidência da República, considerei perigoso para a democracia portuguesa. O texto está aqui, à disposição de quem o quiser ler: nada pior, num regime como o nosso, do que ter o Presidente da República a governar por interposta pessoa.
Pode dizer-se que estamos a caminhar demasiado depressa e a antever cenários de muito difícil concretização. Oxalá assim seja, mas não deixa de ser estranho que o PR apareça a intervir exactamente para proteger o exemplo mais abjecto de liberdade de imprensa existente em Portugal. Ou seja, uma campanha ad hominem movida por um director de televisão, com a triste colaboração do seu cônjuge, contra um político, destinada a servir os seus adversários políticos.
E a propósito de adversários políticos convirá ter em conta o seguinte. Teoricamente, a campanha da TVI desfavorece o visado e favorece todos aqueles que se lhe opõem. Mas só teoricamente. Na prática, a campanha apenas favorece a força política que está em condições de o substituir. E essa força política é o PSD. O PSD de Cavaco e de Ferreira Leite. O mesmo PSD que durante os dez anos de cavaquismo foi escandalosamente favorecido por esse mesmo director de televisão, então à frente da RTP.
Por isso mesmo é que eu tenho muita dificuldade em compreender as tréguas, para não dizer o aplauso envergonhado, que as forças de esquerda institucionais concedem à TVI. Aquela gente é de direita e do mais perigoso que a direita tem. Francamente, não é necessário ter um pingo de simpatia por Sócrates e pelo governo PS – este blogue fala por si – para atacar a informação da TVI, porque na realidade, mais do que a concreta campanha contra Sócrates, aquele jornal é apenas um exemplo daquilo que o director da informação pode fazer no domínio da “política informativa”.
E não será aquela forma de fazer jornalismo o resultado de uma verdadeira usurpação de poderes que por razões muito especiais (e conjunturais) os proprietários da estação não estão em condições de impedir? Quem tem em Portugal ou no estrangeiro “aquela liberdade de imprensa”?
Insisto: gente como aquela é perigosa para a democracia. O que fariam a um governo de esquerda?

CAVACO E AS EXCEPÇÕES


OS NEGÓCIOS DAS EMPRESAS

Cavaco acaba de afirmar que não se mete nos negócios das empresas. Tal como os treinadores que não falam sobre o trabalho dos árbitros, falando sempre que lhes convém, também Cavaco Silva abriu uma “excepção”. Uma excepção para falar do eventual negócio entre a PT e a Media Capital (TVI). Neste caso, Cavaco acha que deve falar.
Não nos pronunciamos sobre o negócio, que desconhecemos. Mas apenas sobre questões de princípio. Como pode justificar-se que o Presidente da República não se pronuncie sobre o caso BPN? Como pode justificar-se o seu silêncio relativamente a negócios tão danosos para o erário público, ainda por cima da responsabilidade de pessoas que serviram nos seus governos e que são (alguns) da sua confiança pessoal? Isso é que os portugueses não compreendem!

O NEOLIBERALISMO JÁ AO ATAQUE

ÀQUELES QUE AFIRMAM QUE O NEOLIBERALIMO ESTÁ AGÓNICO

Um pouco por todo o lado, os governos europeus vêm tomando medidas anti-crise e, consequentemente, agravando o défice público. Muito se tem discutido se tais medidas serão ou não susceptíveis de gerar inflação. Como aqui já referimos certos sectores neo-keynesianos americanos têm negado essa possibilidade. E entendem que não devem deixar de ser tomadas, mesmo que haja o risco de alguma inflação. Como as medidas anti-crise não são todas da mesma natureza, aquelas a que agora nos referimos são as que assentam fundamentalmente num aumento do investimento público.
O Banco Central Europeu e alguns bancos centrais nacionais, fiéis à sua política monetarista, embora tivessem resistido inicialmente à tomada de medidas significativas contra a crise (o BCE até chegou a aumentar a taxa de juro quando a crise já estava abertamente desencadeada), acabaram por ceder à pressão dos governos, primeiro apara salvar bancos em risco de falência, depois para apoiar claramente a economia real fortemente penalizada pela crise financeira.
Como cima dizíamos, face ao agravamento dos défices, o Banco Central Europeu já começou a cerrar fileira com vista à imposição de políticas onde impere a “ortodoxia económica”.
Jean Claude Trichet, convidado um destes dias para participar em Espanha num seminário de banqueiros e empresários já veio dizer, aliás na esteira do governador do Banco de Espanha, que a crise exige uma reforma laboral e moderação salarial. E referindo-se à Espanha não teve pejo em afirmar: “O sistema espanhol de protecção é excessivamente oneroso para os empresários; para conseguir um mercado de trabalho mais dinâmico seria bom eliminar essas rigidezes” E acrescentou: “Não quero assustar ninguém, mas introduzir mais flexibilidade (no despedimento) é bom”. E quanto aos défices foi igualmente muito claro quando disse que não havia mais margem para mais endividamento, logo não haveria lugar para mais medidas de apoio.
Mais uma vez aqueles que são os grandes responsáveis pela crise, aí estão eles a passar a factura ao maior número e aos que nenhuma responsabilidade têm no que aconteceu. Mas estas palavras também demonstram que os bancos centrais vão continuar a defender as mesmas políticas como se nada se tivesse passado.
Embora seja de prever que Zapatero não ceda em matéria de flexibilização laboral, a resposta mais consistente voltou a vir de França. Sarkozy respondeu a Trichet que não poria em prática uma política de austeridade, porque tais políticas sempre falharam no passado e disse ainda que não aumentaria os impostos, uma vez que tal medida apenas contribuiria para prolongar a crise e diferir a sua superação.
De qualquer modo, a pregação já começou. Para que possa ser levada à prática depois de concluídos os ciclos eleitorais mais próximos…

terça-feira, 23 de junho de 2009

AINDA O IRÃO

QUE CONSEQUÊNCIAS?

Ainda não compreendi muito bem o que se está a passar no Irão. Às vezes isso acontece em consequência da própria dinâmica dos movimentos populares, cuja trajectória só se enxerga com clareza tempos mais tarde, outras vezes por falta de conhecimentos e informação competente. Claro, que tenho uma ideia, como toda a gente. E já tive oportunidade de aqui a expor.
À primeira vista, o que parece estar a acontecer é uma sequela das divergências existentes no seio da cúpula dirigente sob a forma de conduzir a “Revolução Islâmica”, ou, sem aspas, a República Islâmica.
De um lado, um sector que advoga uma posição intransigente relativamente a Israel e ao Ocidente em geral (na realidade, o Grande Satã), sem concessões no plano interno a quem esteja na disposição de encarar uma nova política. Deste lado, o Guia Supremo, o Presidente da República em exercício e o Conselho dos Guardiães.
Do outro lado, um sector reformista, igualmente defensor da República Islâmica, que vem mantendo divergências com os sectores próximos do Guia Supremo desde há muito tempo, mas que nos últimos meses, em consequência de algumas alterações da conjuntura internacional, de que é exemplo mais frisante a nova administração americana, passou a defender de uma forma mais clara e aberta uma mudança de política como caminho mais adequado para a defesa dos grandes objectivos da República Islâmica. À frente deste grupo está, sem qualquer dúvida, Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, um dos homens mais poderosos do Irão, economicamente. Mais em consequência da situação gerada pela contagem dos votos para a eleição presidencial e pela palavra de ordem de Musavi - “Novas eleições” - do que propriamente pelo clima criado pela campanha eleitoral, parece ter-se juntado ao sector reformista um vasto grupo inorgânico de opositores (salvo, porventura os comunistas do Tudeh) que foi engrossando com o alastramento da revolta, a quem claramente não desagrada certos estilos de vida ocidentais. Mas é preciso ter alguma prudência na caracterização deste grupo, já que o grito de contestação que todas as noites se ouve em Teerão e noutras cidades, a partir das açoteias, ainda é o mesmo que derrotou o Xá: Allah-u Akbar (Deus é grande) e Marg bar Diktator (Morte ao ditador).
Como no Ocidente a realidade iraniana é muito mal conhecida - a imprensa e os media em geral apenas reproduzem estereótipos - torna-se tudo mais difícil de analisar nas horas críticas. Por exemplo, o facto de o recenseamento eleitoral não ter semelhança com a generalidade dos recenseamentos europeus (atenção: nos EUA também há regimes impensáveis na Europa) não significa que no Irão a batota eleitoral seja mais fácil ou que, no caso de ter ocorrido, não possa ser detectada. Mas não é só nesse plano que o desconhecimento é grande. O facto de os Estados Unidos terem entrado em conflito com o Irão, praticamente desde os primórdios da República Islâmica, mais na era de W. Bush do que anteriormente, com a famosa catalogação do Irão no Eixo do Mal, fez com que a imprensa ocidental se considerasse dispensada de conhecer e de pensar. Apenas tinha que reproduzir as consignes vindas de Washington ou então, uma parte dela – e isto é o que verdadeiramente ela gosta de fazer – criticar os excessos num estilo a que poderíamos chamar “Ana Gomes”.
Um outro aspecto interessante da actual situação iraniana é a perplexidade gerada pela prudência de Obama. Os políticos ocidentais e a matilha dos comentadores internacionais que os segue e reproduz ficaram claramente desorientados com a atitude de Obama. Habituados por W. Bush, mas também por Clinton e por Reagan, a seguir “criticamente” as posições americanas, viram-se subitamente na contingência de ter opinião…

AGRADECIMENTOS


TARDIOS, MAS SINCEROS

Um pouco por falta de tempo e talvez de tranquilidade (tenho escrito sempre a correr) ainda não pude agradecer à Ana Paula Fitas a distinção que concedeu à Politeia no A Nossa Candeia.
E, como vem a calhar, agradecer também aos meus amigos JVCosta que, com textos sempre muito interessantes, às vezes só para os amigos, me vai chamando a atenção para temas que me escapam ou para uma perspectiva diferente de os encarar. Ao MCR, velho camarada de Coimbra, que com os seus comentários (aqui e noutros blogues) e textos, no Incursões, enriquece a blogosfera. Também à Anamar, no Mar à Vista, ao Castendo e ao Antreus. Finalmente, ao Osvaldo de Castro que, não estando muitas vezes de acordo comigo e não obstante as responsabilidades políticas a seu cargo, sempre que aparece é para ser simpático.

O APOIO PÉRFIDO DE NETANYAHU



O QUE OS IRANIANOS NÃO PRECISAM

A última coisa de que os iranianos que lutam na rua precisam é do apoio de Benjamim Nethanyahu.
Entretanto, o porta-voz do Conselho dos Guardiães já reconheceu que, pelo menos, em 50 cidades a participação eleitoral foi superior a 100%.
Correm também rumores de que Rafsanjani,que se tem mantido em Qom (uma espécie de Vaticano dos xiitas), continua a tentar convencer a maioria dos membros da Assembleia de Peritos (que nomeia e destitui o líder Supremo) a pedir a repetição das eleições.

BENFICA: BRUNO CARVALHO




UM DISCURSO INTERESSANTE


Bruno Carvalho, candidato à presidência do Benfica, tem um discurso interessante e ideias seguras acerca daquilo que pretende. Além do mais, fez várias profissões de fé na democracia, de que o Benfica tem andado tão arredado e de que continuará se se mantiver esta gente que lá está.
Se ele não tiver tempo de passar a sua mensagem aos sócios, como certamente não terá, aguentará o Benfica mais três anos de Vieira?
Como é possível que os benfiquistas elejam Vieira? Há limites para tudo. Até para “isso” que leva os sócios a elegerem Vieira!

domingo, 21 de junho de 2009

OS COMENTÁRIOS DE PULIDO VALENTE NA TVI E A CRÓNICA DO PÚBLICO


CADA VEZ MAIS PRÓXIMO DE MOURA GUEDES

Bem pode Moniz dizer que o jornal de sexta-feira é o semanário da TVI. Ninguém o leva a sério. Ou mesmo que a sua intenção tivesse sido essa, os intérpretes dessa vontade são tão maus, que o resultado é um produto impróprio para qualquer jornalismo que se preze. E tanto vale ser a favor de Sócrates como contra para se chegar a esta conclusão. Até o insuspeitíssimo JM Fernandes, de certo modo, na entrevista que lhe fez, o confirmou.
O comentário de Pulido Valente, no fim do jornal, também não acrescenta nada ao produto final. Pelo contrário, nos últimos tempos até tem servido para o degradar ainda mais. A princípio, como aqui referi, Pulido Valente ainda se demarcou do primarismo de Moura Guedes, deixando-a algumas vezes na situação de nem sequer se aperceber da triste figura que estava a fazer. Mas com o passar dos tempos a persistência dela acabou por levar a melhor. E agora tem sido Pulido Valente a alinhar naquela mesma conversa que ela utiliza durante todo o jornal. Ainda na passada sexta-feira, a propósito das putativas mudanças de Sócrates, isso foi por demais evidente. Aquela conversa não é própria de um intelectual.
Também não se percebe muito bem como é que o Público aceita que a conversa que ele faz à sexta-feira na TVI seja no dia seguinte reproduzida no jornal como se de uma crónica nova se tratasse. Crónica que, noutro dias, ele até já dá ao luxo de utilizar para tratar de assuntos pessoais…

IRÃO: AS GRANDES DÚVIDAS


QUEM FALA VERDADE?

Aparentemente, conviria ao Irão uma direcção política menos conservadora para poder tirar partido da conflitualidade que ameaça instalar-se entre Washington e Israel. Uma liderança mais aberta, menos agressiva, poderia tirar vantagem da intransigência israelita e estabelecer uma relação de relativa confiança com a América, tendo em conta as características da actual administração.
Mas também pode pensar-se de outra maneira. Se na América há uma administração que quer dialogar e em Israel governa uma coligação que aposta na destruição da eventual futura capacidade nuclear do Irão, o melhor é manter em Teerão um governo firme e duro, que vá dando a Washington alguns sinais de aproximação, mas que simultaneamente aproveite a relutância americana numa intervenção militar ou em autorizá-la, para, entretanto, tornar irreversível aquele objectivo estratégico.
Esta segunda opção do Líder Supremo – que designa cerca de 2 000 mil cargos entre os quais o chefe das forças armadas, o presidente da rádio e da televisão, o presidente da magistratura e o conselho de discernimento - poderia tê-lo levado a “decidir” o resultado das eleições. Para isso seria necessário montar à escala nacional uma operação de grande envergadura que no dia das eleições funcionasse sem hesitações. Esta operação tinha, todavia, um inconveniente: dificilmente poderia escapar a uma denúncia prévia. E a verdade é que os relatos da imprensa internacional, apesar de a campanha ter sido animada, dão como natural, no dia seguinte ao das eleições, a vitória de Ahmadinejad, por onze milhões de votos de diferença.
Não há fraudes desta dimensão organizadas no dia. Além de que tais fraudes pressupõem a completa ausência de liberdade dos opositores.
Ensaiemos então pensar de outro modo. Os “reformistas”, para usar uma expressão consagrada, entendem que este é o momento adequado, nacional e internacionalmente, para provocar uma mudança. E esperam alcançá-la pela via eleitoral, mas logo que intuem que tal não será possível (não esquecer que Musavi anunciou a vitória antes de os votos estarem contados) arriscam com base no descontentamento das populações urbanas mais intervenientes, que indiscutivelmente advogam um país mais aberto e mais relacionável com o mundo ocidental, um levantamento popular a partir da palavra de ordem de “eleições fraudulentas”. E como acreditam que a correlação de forças lhes será favorável, porque, à parte as milícias e os combatentes de Deus, os demais apoiantes de Ahmadinejad fazem parte da maioria silenciosa rural, que agora, como noutras ocasiões, não tem decidido o rumo da história no Irão, põem os seus apoiantes na rua dia após dia exigindo novas eleições.
Os reformistas exibem um documento, que estranhamente a imprensa ocidental não publicou, dirigido pelo ministro do interior ao Líder Supremo, que confirma a preferência deste pelo candidato Ahmadinejad, em que lhe dá conta dos verdadeiros resultados eleitorais. Dão também a conhecer que o órgão correspondente à comissão nacional de eleições terá comunicado telefonicamente a Musavi a vitória eleitoral, facto que estaria na origem da declaração por este feita pouco depois de encerradas as urnas. E explicam que o discurso da vitória não pôde fazer-se, porque, logo a seguir àquela comunicação, Musavi terá tido um encontro com os chefes militares que pura e simplesmente lhe disseram que não aceitariam os resultados eleitorais e que Ahmadinejad continuaria no cargo. Segundo aquele documento, foram os seguintes os resultados eleitorais: Musavi 19.036.078 votos; Karrubi 13.387.104 votos; Ahmadinejad 5.698.417 voos; Rezai 3.754.218 votos; e 38.216 nulos.
Evidentemente, que ninguém, deste lado de cá, está em condições de atestar a veracidade deste documento e daquelas comunicações. É, porém, muito provável que uma das duas situações acima descritas se tenha passado no Irão. Ainda é cedo para saber a verdade e para saber quem vai ganhar. Ou até se por força do confronto acabaremos por ter um resultado que não seja de resto zero (mais difícil, dada a magnitude do que está em jogo…). Há trinta anos, a revolução foi sempre num crescendo e acabou por arrastar até aquelas forças que normalmente se não manifestam. Em 1953, no golpe da CIA contra Mossadegh, foi tudo muito mais rápido. E em 2009, como acabará?

sábado, 20 de junho de 2009

ANDA E SEMPRE A REVOLUÇÃO DE ABRIL

UM TEXTO DE MANUELA CRUZEIRO


Ainda e sempre sobre a Revolução de Abril, um belíssimo texto de Manuela Cruzeiro: "Vasco e Otelo - A atracção dos opostos", publicado em "Caminhos da Memória".

OS NOSSOS ECONOMISTAS NÃO SE MANCAM

O MANIFESTO DOS ECONOMISTAS

Se há, em Portugal, classe profissional que menos tem contribuído para o bem comum e mais vantagens tem tirado da profissão que desempenha, essa classe é a dos economistas. Os economistas têm sido nestas últimas décadas os pontífices que todos escutam e a que todos recorrem para saber “o que fazer”. Eles intervêm em todos os domínios e opinam sobre todas as matérias depois de instalada a ideia de que todos os assuntos – todos! - são, em última instância, económicos.
O resultado desta tacanhez de espírito está vista, no plano mundial. Eles lançaram o mundo numa das maiores crises dos tempos modernos, com tudo o que isso tem de desumano para que tem de sofrer em primeira linha as suas consequências. Essa visão economicista do mundo, aliada a uma idolatria do mercado, não trouxe prosperidade, nem felicidade à maior parte. Trouxe angústia, dívidas (muitas dívidas!) e desemprego. E permitiu “roubalheiras” sem conta por todo o lado: legais e ilegais. Consequência: os gigantescos ”buracos” deixados pela sua acção política vão ter que ser “tapados”, por muitos anos, com o dinheiro dos contribuintes, como sempre com o sacrifício dos mais numerosos e de menores recursos.
Mas, se é assim um pouco por todo o lado, em Portugal, acresce a tudo isto, o facto de essa governação económica da política ter tido os piores resultados. No quadro da União Europeia, Portugal ostenta infelizmente os piores índices em muitas das matérias que têm a ver com o bem-estar das pessoas e caminha, cada ano que passa, para uma situação pior do que a do anterior. Há erros gravíssimos em todos os domínios, com graves reflexos na situação geral das pessoas, e há erros de política económica só possíveis pela incompetência dos economistas que, directa ou indirectamente, nos tem governado. Normalmente são incultos, conhecem umas tretas da vulgata económica (uma espécie de Politzer do neoliberalismo), são filosoficamente analfabetos, desconhecem as ciências sociais, desprezam o método científico e encaram a economia como uma ideologia. Por isso, não estão capacitados para compreender o presente. Para o analisar. E ainda se atrevem a prever o futuro. No qual evidentemente nunca acertam!
Agora, uma legião deles, que vai dos “idiotas úteis” até aos reaccionários de sempre, passando por ex-vanguardistas da revolução proletária, vem dizer-nos, na esteira de Cavaco e de Ferreira Leite, que o Estado não deve investir. Obviamente, que não está em causa a análise ponderada de certos investimentos, sem justificação político-económica, como o novo aeroporto de Lisboa. O que está em causa é a competência desses senhores para se pronunciarem sobre o que interessa ou não interessa à comunidade. De facto, eles não enxergam a inconveniência ou impropriedade do seu próprio comportamento, ou seja, não se mancam!

sexta-feira, 19 de junho de 2009

AS DEPUTADAS DO PS AO PARLAMENTO EUROPEU


E SE ESTIVESSEM CALADAS?

Com que então, Elisa Ferreira compromete-se, magnanimamente, a renunciar ao lugar de deputada no Parlamento Europeu, se ganhar as eleições para a Câmara do Porto!
E depois queixem-se da “malta”... Da “malta” que não acredita nos políticos. O que eu estava à espera de ouvir é que a ilustre deputada tivesse dito que renunciava ao mandato de deputada para ir disputar a Câmara do Porto. Mas isso digo eu que não percebo nada de “política”…
Por seu turno, Ana Gomes insurge-se por Rangel, se ganhar as eleições, admitir a hipótese de renunciar ao Parlamento Europeu para integrar o governo. Será que não estou a compreender bem? Então a norma de todos eles, Ana Gomes incluída, não é a de só trocar o certo pelo certo? Com a diferença de que Rangel, que se saiba, não vai disputar eleitoralmente qualquer outro lugar, enquanto elas parece que vão….

BARROSO COMOVIDO


MAS NADA ESTÁ RESOLVIDO


Ao jantar, o Conselho Europeu concedeu a Barroso o apoio político unânime para um segundo mandato. Entendamo-nos, em linguagem comunitária, isto quer dizer que ninguém se opôs à continuação de Barroso como Presidente da Comissão e que todos os Estados lhe concederam apoio para continuar no cargo. Não houve, obviamente, qualquer votação. Portanto, Barroso não foi juridicamente designado pelo Conselho para Presidente da Comissão e, enquanto não for, não poderá submeter-se ao voto parlamentar.
Aparentemente, Barroso está hoje mais próximo de ser Presidente da Comissão do estava ontem de manhã. Mas só aparentemente. Os imbróglios na União Europeia estão longe de estar resolvidos. A Irlanda continua a exigir um Protocolo juridicamente vinculante (isto é, ratificado por todos os Estados-membros) que integre as garantias por ela consideradas necessárias para assegurar a vitória do sim no novo referendo, enquanto a maior parte dos Estados apenas está na disposição de elaborar um protocolo com mero valor político. Outros ainda, como o Presidente da República Checa, para tornar as coisas mais difíceis, entendem que se as garantias são concedidas por via de protocolo, é necessário que elas sejam ratificadas por todos. Enquanto isto, a designação do Presidente da Comissão terá de fazer-se pelo Tratado de Nice. Paralelamente, os socialistas e os verdes, pelas vozes de Rasmussen e Cohen Benedit, fazem o possível por evitar a nomeação do português, tendo o "homem do Maio 68" já confidenciado que “Sarkozy não se vai matar por Barroso…”.
Tanto os amigos como os inimigos de Barroso sabem que o jogo ainda não terminou. Uma coisa porém é certa: como não há politicamente, em matéria de construção e gestão europeia, qualquer diferença entre um socialista e Barroso, é preferível, por razões óbvias, que o lugar fique para ele…

quinta-feira, 18 de junho de 2009

CARLOS CANDAL


UMA VITÓRIA PIONEIRA

Carlos Candal faz parte do meu imaginário académico. Quando cheguei a Coimbra, no rescaldo da crise académica de 1962, já Candal estava a estagiar em Aveiro. Mas acontece que foi ele, depois de muitos anos de domínio da direita, que ganhou as eleições para a Associação Académica de Coimbra, em 1960/61. E a partir daí o ambiente académico de Coimbra jamais seria o mesmo. No ano seguinte, a vitória já foi mais fácil e a esquerda nunca mais perdeu as eleições até ao 25 de Abril. Foi reprimida, compulsivamente transferida de universidade ou expulsa, instaladas comissões administrativas nomeadas pelo fascismo, dirigidas por “respeitáveis democratas” da II República, mas sempre que houve eleições, a esquerda ganhou!
E Candal, na Coimbra do meu tempo, beneficiava dessa auréola. O homem capaz de convencer as freiras a deixar votar as meninas que elas aprisionavam mal o sol se punha. O “diplomata”capaz de captar o voto de quem ainda não queria verdadeiramente opor-se ao salazarismo. Depois, a luta académica evolui muito e rapidamente. Radicalizou-se. A guerra colonial ajudou. Mas Candal deixou escola: cerca de dez anos mais tarde, a direcção de Alberto Martins é a continuação do mesmo estilo numa outra época.
Em Coimbra nunca vi Candal. Conheci-o, em 1969, no Segundo Congresso Republicano de Aveiro. Muitos anos mais tarde, numa recepção oferecida por Mário Soares, comentei com ele jocosamente o “Manifesto anti-Portas em português suave”, que acabara de publicar…

BARROSO: RESISTIRÁ?

O CONSELHO EUROPEU QUE TUDO VAI ADIAR

Não se percebe muito bem se por ingenuidade ou se para forçar a vontade política de quem não a tem, indigitação de Durão Barroso pelo Conselho Europeu que hoje se iniciou era, até há uns dias atrás, dada como certa tanto por políticos como por jornalistas. Nos vários posts que já dedicámos ao assunto, de há muito que vínhamos alertando para as reticências, primeiramente muito ténues, mas depois cada vez mais ostensivas, que vários governantes, alguns deles de grande peso, vinham levantando ao “calendário” proposto pelos apoiantes de Barroso para a sua indigitação. E como sempre acontece nestas coisas começaram a esgrimir com argumentos jurídicos – os famosos constrangimentos legais – que são sempre os argumentos por detrás dos quais se esconde uma razão política, quando ainda não é chegado o momento de a apresentar frontalmente.
Apesar de a direita governar em quase todos os 27 Estados-membros, não há dúvida de que estamos muito longe da conjuntura que há cinco anos atrás levou Barroso à presidência da Comissão Europeia. Se Barroso, mesmo assim, conseguir continuar, teremos de nos vergar à sua enorme capacidade para sobreviver politicamente. Mas vai ser difícil. A ratificação do Tratado de Lisboa, mesmo depois de um eventual sim da Irlanda, vai continuar a trazer problemas, já que se não vê que eficácia, ou até validade, possam ter as garantias dadas aos irlandeses se elas não forem ratificadas pelos demais Estados-membros. E com o Tratado de Nice a regular a vida comunitária, as hipóteses de Barroso serão bem menores.
A estratégia de quem, sendo da família, não quer Barroso, passa mais pela criação de condições que levem à desistência do candidato do que propriamente à sua rejeição.

BENFICA: ELEIÇÕES VICIADAS


O QUE ESPERA VIEIRA

As eleições no Benfica já estão viciadas, mesmo antes de contados os votos. Um dos hipotéticos candidatos diz que não se candidata porque nem sequer tem tempo para formar uma equipa; o outro diz que está a estudar a hipótese de interpor uma providência cautelar para suspensão do acto eleitoral com base em ilegalidade.
Haja ou não eleições no dia três de Julho, e provavelmente haverá, Vieira tem os dias contados. O golpe virou-se contra o golpista. Ninguém mais no Benfica vai aceitar os seus desaires desportivos, depois de Moniz ter deixado claro que aceitaria candidatar-se noutras circunstâncias. Pior do que uma derrota, que é acto que se esgota no resultado de uma eleição, é ter permanentemente a “cabeça a prémio” durante o mandato. E é isso o que vai acontecer a Vieira.
Os benfiquistas deveriam perguntar-se por que razão Vieira, que é sócio do Porto e também já foi do Sporting, e que nem sequer é certo que seja adepto do Benfica, quer continuar como presidente, depois de amplamente demonstrada a sua incompetência desportiva. E talvez na resposta que derem encontrem uma boa razão para o despedirem já.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

O TGV E A DIREITA

O ISOLAMENTO EUROPEU

Muitos séculos de história não se derrubam em décadas. Há, goste-se ou não, uma tradição portuguesa de isolamento e alheamento relativamente à Europa continental, pese embora a inevitabilidade da adesão europeia. Historicamente esta adesão ocorre a seguir a uma época de desmantelamento do “Império” e no fim de um ciclo de guerras coloniais que deixaram no imaginário nacional uma memória traumática muito forte.
Não obstante, uma parte muito significativa da intelectualidade portuguesa assume aquele isolamento com naturalidade e sempre que a ocasião o permite, como acontece em épocas de crise, lá está ela a dizer-nos que o nosso futuro está no mar, no além-mar. Seja esse mar o Brasil ou a África, seja, por razões de protecção, o Atlântico Norte.
Curiosamente, esta posição, embora com mais peso na direita do que na esquerda, atinge tanto uma como outra – da Jangada de Pedra de Saramago e de uma certa recusa da União Europeia às teorizações de Franco Nogueira e de Adriano Moreira ela está presente.
Acho que ela está presente também na recusa do TGV pela direita. Portugal fora da rede de alta velocidade europeia fica mais longe da Europa e mais isolado. Isso agrada à direita.
Evidentemente, que não é só isso que a motiva. Motiva-a igualmente uma visão anti-keynesiana no combate à crise. A direita continua a recusar o papel do investimento público no relançamento da economia por razões puramente ideológicas.
Não deixa de ser estranho que essa mesma direita, a começar pelo Presidente da República, não manifeste idêntica recusa relativamente à construção do novo aeroporto. Esse sim, completamente desnecessário nos tempos mais próximos como eloquentemente ilustram as estatísticas referentes ao aeroporto da Portela. Só que aí ergue-se o interesse de empresas que a direita não pode contrariar, bem como a privatização da ANA, empresa lucrativa que a direita quer ver o mais rapidamente possível nas mãos do capital privado.

AS ELEIÇÕES NO BENFICA

A CONTRATAÇÃO DE TREINADOR POR UMA DIRECÇÃO EM GESTÃO CORRENTE

Parece que a direcção do Benfica (em gestão corrente) não vai conseguir, apesar do seu golpe, evitar a concorrência no acto eleitoral. Certamente que os candidatos oposicionistas partem em desvantagem, mas mesmo assim eles podem reunir condições para, nos poucos dias que têm à sua frente, despedir Vieira e a sua gente.
Não se compreende que uma direcção demissionária, em gestão corrente, pratique actos susceptíveis de influenciar, se forem válidos, a vida do clube nos próximos anos. A contratação de um treinador nestas circunstâncias é uma irresponsabilidade. Mas irresponsabilidade maior é contratá-lo por dois anos, quando o actual presidente já demonstrou que não tem capacidade para aguentar um treinador por mais de um ano! É caso para perguntar quem beneficia com as indemnizações.
É pena que um dos movimentos oposicionistas acolha nas suas fileiras um dos grandes responsáveis pela situação a que o clube chegou – Manuel Damásio.

A MOÇÃO DE CENSURA

AS ESTRATÉGIAS DO CDS E DO PS

A moção de censura que o CDS resolveu apresentar nesta parte final da legislatura teve mais em vista a ocupação de espaço no futuro reposicionamento das forças de direita do que propriamente censurar o governo. A censura, que não deixou de ser feita, foi meramente instrumental.
O CDS, depois de ter ultrapassado com êxito o teste das europeias, sente-se com força suficiente para disputar uma parte do eleitorado do PSD. Beneficiando da estabilidade que o outro partido da direita não tem e de deputados mais preparados que os do PSD, o CDS julga-se com capacidade para ser muito mais que um simples apêndice numa futura maioria parlamentar.
O PSD, completamente entalado pela iniciativa política do CDS, entre dois males - abster-se ou votar a moção – optou por este último por o considerar o mal menor.
Da reunião da comissão política do PS, da passada segunda-feira, para além daquelas coisas que sempre se dizem em situações semelhantes, talvez decorra uma estratégia eleitoral, ainda não completamente assumida por todos os que nela participaram, mas que não deverá muito longe da seguinte ideia.
O PS já reconheceu que não reúne agora, nem até Outubro o conseguirá, as condições que há quatro anos lhe asseguraram uma maioria absoluta. E vai ter de optar entre garantir o maior número de votos ao centro e à direita ou tentar recuperar à esquerda o eleitorado que se absteve ou que perdeu para o Bloco e para a CDU, mais para aquele do que para esta.
Perante o acosso do CDS ao PSD, o PS acha que o PSD vai ter que se preocupar muito com o seu eleitorado mais à direita, deixando-lhe um espaço importante ao centro, onde o PS vai investir eleitoralmente. São sintomas desta estratégia a escolha de António Vitorino para a elaboração do programa eleitoral e a designação de Luís Amado para responder em nome do Governo à moção de censura do CDS. Depois tentará, através da habitual cosmética da propaganda eleitoral, captar o voto à esquerda que se absteve nas europeias, seja chamando Alegre a desempenhar um papel junto desses sectores, seja através de frases ocas de sentido, como as do actual Ministro do Trabalho – logo deste! – e futuro director da campanha das legislativas, de que é preciso “demonstrar que se governou à esquerda”, mais uma ou outra mudança relativamente emblemática, como a substituição de Vitalino Canas como porta-voz do partido.
Perante este cenário, com um PS claramente incapaz de atacar “ambos os bordos” com idêntica eficácia, a esquerda vai ter oportunidade de reforçar o seu peso eleitoral com vista ao seu grande objectivo político: quebrar ao hegemonia eleitoral do PS no “espaço da esquerda”.

VASCO LOURENÇO E A REVOLUÇÃO DE ABRIL


“DO INTERIOR DA REVOLUÇÃO”


aqui escrevi sobre a acção de Vasco Lourenço antes da constituição do movimento dos capitães. Fazia então tenção de continuar a apreciação crítica da sua narrativa, tanto na preparação do 25 de Abril, como posteriormente, desde o dia do derrube da ditadura até ao requiem pelo processo revolucionário. Entretanto, meteram-se a campanha eleitoral e as eleições, e o tema foi sendo adiado. É agora altura de o retomar.
Para quem viveu intensamente o período que vai de 25 de Abril de 1974 a 25 de Novembro de 1975, conhece ou mesmo participou em muitos dos episódios descritos, a narrativa de Vasco Lourenço faz novamente vibrar os corações de todos aqueles que acreditaram poder, enfim, mudar o mundo, quanto mais não fosse à escala nacional. Para isso muito contribui o entusiasmo e a convicção com que Vasco Lourenço descreve os grandes momentos da Revolução de Abril.
O que achei mais extraordinário é o facto de cada momento ser descrito com o mesmo estado de espírito com que foi vivido, apesar de a entrevista que levou à edição do livro ter sido concedida muitos anos depois da ocorrência dos factos. Diga-se, a propósito, magistralmente conduzida por Manuela Cruzeiro, a maior especialista portuguesa em “25 de Abril”.
E esse estado de espírito está muito longe de ter sido vivido com o mesmo entusiasmo ao longo dos meses que balizam a narrativa. A luta inicial contra os spinolistas e seus aliados, contra todos aqueles que logo a seguir ao 25 de Abril o quiseram amordaçar, é certamente uma das partes mais belas e mais vibrantes do livro. Depois, a partir do momento em que a Revolução se acelera, aparece-nos um Vasco Lourenço dividido entre o apoio inequívoco a todas as medidas que pudessem contribuir para a real emancipação do povo português e o constrangimento resultante de muitas dessas medidas serem impulsionadas por uma vanguarda que tendia a marginalizar quem não lhe acompanhasse o passo.
Nota-se que há da sua parte uma genuína preocupação de manter a unidade do movimento, a unidade entre todos os militares de esquerda, o que, seguramente, só poderia ser alcançado com cedências que a voracidade dos tempos então vividos de forma alguma permitia.
Se ainda há algum entusiasmo nos primórdios da formação do grupo dos 9, frustradas que foram as tentativas de encontrar uma posição unitária, ele vai-se perdendo gradualmente à medida que o confronto final se aproxima entre, de um lado, gonçalvistas e copconistas, e, do outro, os nove e toda a direita militar e civil e até mesmo a extrema-direita. Nesta fase, que culmina com o 25 de Novembro, o desencanto de Vasco Lourenço já é evidente. Muito do que é importante pela primeira vez lhe passa ao lado. E com o andar dos tempos, cada vez mais. Ele deixa claramente de ser o protagonista para passar a ser apenas mais um. E isso deixa-lhe a mágoa de não ter conseguido pôr de pé a revolução que idealizou.
Em poucas linhas, esta é a minha interpretação da narrativa de Vasco Lourenço. Convém ainda dizer que a interpretação que ele faz dos grandes momentos da Revolução de Abril: o dia 25 de Abril, a rendição de Marcelo Caetano, o papel de Spínola, o Golpe Palma Carlos (mais propriamente, Golpe Sá Carneiro/Spínola), o 28 de Setembro, o 11 de Março, a constituição do Directório, o 25 de Novembro, é muito objectiva e corresponde ao que realmente se passou. Ele não faz a menor concessão às teses da direita, nem às fantasias postas a circular pelo Partido Socialista.
Hoje, à distância de 35 anos, creio que o momento dramático da Revolução de Abril é o que na sequência da queda do IV Governo Provisório consuma a divisão entre os genuínos militares de Abril. E esse momento ocorre quando a seguir à aprovação consensual do PAP (Programa de Acção Política) se consuma a ruptura, por um lado, com a constituição de um directório insuficientemente representativo (faltava-lhe uma “perna”) e, por outro, com a aprovação de documentos que, contrariando aquele, representam uma visão parcial do pensamento político do MFA.
A perda de militares como Vasco Lourenço, Vítor Crespo e de tantos outros a eles ligados, lançados nos braços de um PS que nunca quis nada de substancialmente diferente daquilo que hoje temos, foi fatal para a Revolução e para a implantação de uma democracia avançada. Esta é uma auto-crítica que está por fazer. E fazê-la não significa nem de perto, nem de longe aderir às teses de Soares e Sá Carneiro que, em meu entender, se davam por muito satisfeitos com o resultado das primeiras golpadas de Spínola…se tivessem tido êxito.
Talvez valha a pena contar aqui um episódio em que participei, cujo significado aparente, por ser claramente contraditório com outros (únicos conhecidos), não deixará de ser questionado.
Na altura da formação do V Governo Provisório, quando já se tinham gorado as hipóteses de gente ligada ao PS fazer parte dele (Vasco Lourenço diz desconhecer se o houve essas negociações; posso assegurar que houve e nelas participaram três figuras relativamente importantes do PS, à época – uma já falecida, outra que anos mais tarde se “eclipsou” e, finalmente, uma terceira que continua a nível regional a ser muito influente), Vasco Gonçalves pediu-me par me avistar com um conhecido líder partidário para saber da sua opinião sobre alguns dos nomes que estavam a ser contactados para compor o Governo.
Sobre um desses nomes, para Ministro dos Negócios Estrangeiros, a dita figura política teceu as críticas mais contundentes e disse-me mesmo que a simples indigitação constituía um desprestígio e um descrédito para a Revolução. Sobre outros nomes que estavam sendo encarados para Vice-primeiro-ministros, a resposta que eu ouvi foi a seguinte: “São pessoas respeitáveis, mas não acrescentam nada. O que interessa é lá ter os militares de Abril desavindos. O Primeiro-ministro (Vasco Gonçalves) devia era convidar o Vasco Lourenço, o Vítor Crespo ou o Vítor Alves para Vice-primeiro-ministros. Falar com eles. Levá-los para o governo. De outro modo, o governo não terá base de apoio suficiente e cairá”.
À época, tal proposta, vinda da esquerda, seria impensável.
Desnecessário será narrar a resposta de Vasco Gonçalves.

terça-feira, 16 de junho de 2009

SER OU NÃO SER PAROQUIAL


A OUTRA FORMA DE PROVINCIANISMO


É verdade que as televisões portuguesas concedem um destaque desmedido a pequenos e insignificantes problemas caseiros. É verdade que as grandes questões, as que realmente afectam todo o mundo, portanto também a nós, são acessíveis na sua compreensão apenas a um pequeno número.
Não sei se há explicação para isto. Talvez seja a nossa defesa de não sermos grandes. Talvez ainda o reflexo do profundo trauma de 50 anos de ditadura. Lembro-me de Craveiro Lopes, já em rota de colisão com o regime, dizer: “De manhã, a gente abre o jornal, fica a saber tudo o que se passa no mundo e nada do que se passa em Portugal”. Sabe-se lá se não é este trauma psicológico herdado da memória colectiva que a TVI quer combater quando dá tanto relevo a uma pequena desavença familiar ocorrida em Alguidares-de-Baixo?
Francamente não sei. O que sei é que há uma outra forma de provincianismo disfarçada de cosmopolitismo que pretende prevalecer-se do facto de as grandes questões não serem aprofundadamente abordados para nos fazer passar as versões ideologicamente mais contaminadas desses acontecimentos. Como, por exemplo, afirmar que Netanyhu deu um passo ainda há dias inimaginável, quando na realidade o que ele disse é que queria constituir um protectorado na Palestina; ou afirmar que o nosso futuro se joga nas montanhas do Afeganistão, onde já ingleses por duas vezes e os soviéticos (quando existiam…) já enterraram as suas esperanças de domar um conjunto indomável de tribos montanhesas, para escamotear o erro histórico de proporções ainda indefiníveis de a NATO ter rompido com a sua matriz estatutária para ir fazer uma guerra do outro lado do mundo; ou, finalmente, tomar a nuvem por Juno a propósito do que se passa no Irão (ver quem é Mousavi)

A DESIGNAÇÃO DE BARROSO



VALERÁ A PENA ESTAR A FORÇAR A ALEMANHA E A FRANÇA?

Os deputados socialistas ao Parlamento Europeu continuam muito preocupados com a questão da continuidade de Barroso. Depois de tudo o que disseram na campanha, é um pouco irrelevante o que possam dizer hoje. Além do mais, a designação de Barroso pouco passará por eles.
Desde há vários meses que se detecta no discurso de Sarkozy, bem como no de Merkel, alguma hesitação a propósito da escolha do português. Primeiro, falaram em diferir a designação para depois da ratificação do Tratado de Lisboa pelos 27, ou seja, para depois do resultado do novo referendo na Irlanda. Posteriormente, passaram a falar na apresentação de um programa para a Europa. Segundo eles, não se trataria de escolher um nome, mas de escolher um programa.
Mais importante do que fazer conjecturas sobre se Barroso vai ou não ser escolhido, o que verdadeiramente interessa saber é que tipo de Europa querem hoje a França e a Alemanha. No passado não havia grandes dúvidas de que a Alemanha apostava claramente num projecto transnacional europeu e também é certo que essa forte posição alemã acabou por influenciar a França, principalmente durante a época Mitterrand/Delors, a qual, apesar de herdeira da Europa das pátrias, chegou a admitir poder restaurar naquele projecto parte da grandeza perdida
Hoje, depois da reunificação alemã e do alargamento a leste e a sul, tanto a Alemanha como a França concluíram (pelo menos, é o que parece) que aquele projecto não faz mais sentido. As clivagens que entretanto se criaram, e que a guerra do Iraque apenas evidenciou, a ligação muito estreita dos recém-aderentes do Leste à NATO e aos Estados Unidos, deixavam cada vez menos espaço ao núcleo duro da União para comandar os destinos da Europa, como aconteceu com Kohl/Mitterrand, sob a presidência de Delors.
A perspectiva com que agora a Alemanha e a França encaram a Europa já não será assim tão diferente da do Reino Unido como foi no passado. A Europa é vista também por elas mais como um espaço de afirmação nacional e acima de tudo um amplo mercado livre que encerre em si todas as vantagens da livre circulação de bens e serviços mas que não tenha de suportar os custos das desigualdades entre os seus membros. Esses deverão ser, no essencial, encargos nacionais.
Esta nova perspectiva da França e da Alemanha, que ficou clara na forma como a União Europeia abordou a actual crise económico-social, aponta para um presidente da comissão originário de um país grande e rico. Um presidente vindo de um país meridional e pobre não dará àquele núcleo garantias suficientes de interpretação “correcta” do novo conceito de Europa – uma Europa cada vez mais mercado único e mais intergovernamental no plano político.
Veremos se a França e a Alemanha ainda vão a tempo de pôr em prática esta estratégia no que respeita à escolha do Presidente da Comissão Europeia.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

CONSTÂNCIO CONTINUA ARROGANTE

COMO PODE NÃO ASSUMIR RESPONSABILIDADES?

A pergunta continua a ser pertinente: "Quem o defende"? E a resposta também: "É o capital financeiro, com a cumplicidade do Governo".
ADITAMENTO

Voltamos sempre ao mesmo. A arrogância de Constâncio só é possível porque os deputados não têm poder próprio. Eles emanam dos partidos. E Constâncio fala como fala e comporta-se como se tem visto porque verdadeitamente não toma os deputados com represemtantes do povo, mas sim como representantes dos partidos. E isso faz toda a diferença.
ADITAMENTO II
De que práticas fala Constâncio?Boas práticas das entidades de supervisão? Em que mundo vive Constâncio? Será que ele é apenas arrogante? É espantoso que, em 2009, depois de tudo o que se passou no mundo a propósito da "regulação" do capital financeiro, Constâncio continue a falar de boas-práticas, certificadas, entre outros, pelo FMI, um dos grandes responsáveis pela pobreza no mundo, como se a gravíssima crise financeira que desencadeou a actual crise económico-social não tivesse tido a sua origem nas famosas autoridades de supervisão.´
Mas, pior que tudo, Constâncio ameaça com um contra-relatório, como se depois de tudo o que disse, o que se ouviu de outros, e, principalmente, do que se descobriu, ainda houvesse dúvidas sobre a sua, no mínimo,negligência.

UM ARTIGO DE PAUL CRAIG ROBERTS

OBAMA EM VIAS DE SE TRANSFORMAR NUM DICK CHENEY?

Um artigo particularmente violento de Paul Craig Roberts, ex-subsecretário do Tesouro de Ronald Reagan, contra Barack Obama, que, de resto, não se tem cansado de combater a política americana das últimas décadas, como também se pode ler neste outro artigo :"A guerra ao terror é uma mistificação".

AS ELEIÇÕES NO IRÃO E A REACÇÃO OCIDENTAL


UMA VITÓRIA INDESEJADA

É muito difícil escrever sobre as eleições no Irão. A informação não é muita e muita dela é deturpada. Se for para negar a legitimidade da vitória da Ahmadinejad não faltará quem aplauda, seja boa ou má a informação que a sustenta. Se, pelo contrário, for para fazer uma análise tanto quanto possível objectiva não faltará quem a ataque e tenda a ver nela o que realmente se não disse.
Ahmadinejad ganhou e Musavi perdeu. Segundo os resultados oficiais, dois terços dos eleitores votaram no actual presidente e um terço no candidato da oposição. O resultado da eleição não agradou à União Europeia, nem à América e seus aliados mais próximos: Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Japão, Israel, Arábia Saudita e Egipto. Mas foi recebido com naturalidade pelos grandes países emergentes, pelos aliados árabes (que não são muitos) e por países da América Latina, como a Venezuela, Bolívia e Cuba.
Musavi não aceitou a derrota e queixa-se de fraudes eleitorais. Fraudes que ninguém consegue provar como fundamento da derrota. Irregularidades, como sempre acontece em todas as eleições, terá havido, mas do que se escreve sobre o assunto parece depreender-se que elas pouco ou nada influenciaram o resultado eleitoral. De qualquer modo, os apoiantes de Musavi, a maior parte deles oriundos das áreas urbanas e, portanto, muito mais abertos a mudanças porventura num sentido mais laico da vida política, puseram nesta eleição uma grande expectativa. A derrota frustrou-os e o apelo de Musavi levou-os à rua, onde protestaram com veemência. Apesar de não se assumirem abertamente como anti-sistema, a verdade é que eles puseram em causa a “ordem pública”, e as autoridades iranianas, à semelhança de todas as autoridades que velam pela manutenção da ordem e do “sistema”, reagiram contra os manifestantes.
Esta reacção desagradou aos ocidentais e a avaliar pela ênfase que nela puseram é de admitir que também eles não tenham argumentos mais fortes para contestar a derrota: foi também uma expectativa, posto que mais ténue, que se frustrou.
A nós não nos agrada nenhum tipo de “democracia religiosa”, qualquer que seja a religião. A política é laica e constitui uma grande conquista da nossa cultura o desligamento da política da religião, apesar de tal princípio ser, do nosso lado, frequentemente contestado seja pelas autoridades religiosas, seja pelas políticas. Não obstante, consegue manter-se o essencial.
Todavia, já é muito mais difícil, para não dizer impossível, tanto na nossa democracia, como na iraniana, aceitar a vitória das teses anti-sistema. A liberdade (aparente) com que tais teses se manifestam pode ser diferente num e noutro lado, mas em ambos os lados o poder ideológico do sistema é tão forte que praticamente diaboliza quem se lhe oponha.
Por exemplo, entre nós, uma subida, importante, ainda que modesta dos partidos de esquerda constituiu motivo de alarme em toda a imprensa bem pensante, nos comentadores “encartados” e em todo o establishment que de Aberto João Jardim a Vital Moreira se preocupou mais com esse facto do propriamente com a votação dos partidos a que pertencem. Mas não se trata apenas das reacções pós-eleitorais. Trata-se antes do clima geral permanente existente nos diversos órgãos veiculadores do poder ideológico do sistema que liga a possibilidade de aqueles partidos poderem constituir uma alternativa de governo a uma hipótese verdadeiramente demencial. É, por isso, infelizmente natural que no Irão se passe o mesmo, apesar de os contestantes terem lá ido bem mais longe eleitoralmente do que foram cá.
São estas mesmas razões que levam a dita imprensa ocidental (leia-se os media, em geral) a negarem a legitimidade de governação de Chavez, de Medvedev, de Evo Morales e por ai fora.
As reacções na administração americana, por agora o que mais interessa, ainda não são muito claras e parece até haver alguma dessintonia entre a prudente declaração de H. Clinton e as ásperas palavras de Joe Biden, posto que matizadas pela necessidade de melhor informação. Mas tudo aponta no sentido de os americanos – os grandes responsáveis pela queda de democracia laica em Teerão – terem de suportar por tempo por agora indefinido a democracia religiosa do Irão. E então se verá se o discurso do Cairo é mesmo para levar a sério…

PROTECTORADO NA PALESTINA?


UMA PROPOSTA QUE NÃO É SÉRIA

Cada vez é mais evidente que Israel não aceita a constituição de um Estado palestiniano. Já Golda Meir o tinha dito há muitos anos atrás quando pela primeira vez abordou a questão com Nixon. Depois disso os israelitas gozaram sempre da cumplicidade americana e da covardia europeia para negarem a possibilidade desse Estado, mesmo quando, com reserva mental, admitiam a sua existência, na prática sempre subordinada à aceitação de exigências intoleráveis
A proposta que hoje Netanyahu apresentou, como resposta à posição americana, é mais uma vez uma rejeição da existência de dois Estados, posto que apresentada hipocritamente sob a forma positiva da criação de um protectorado.
Em primeiro lugar, a exigência do reconhecimento de Israel como Estado dos judeus é uma proposta racista. Israel é um Estado dos israelitas, sendo como tal considerados aqueles que à luz do direito da nacionalidade israelita tenham esse estatuto, contanto que este direito não ofenda os princípios do direito internacional sobre a matéria.
E acrescentar depois que a Palestina não terá espaço aéreo (ou seja, um território amputado de um dos seus atributos fundamentais), nem exército, são exigências que colocam o novo “Estado” numa nova categoria de protectorados, muito próxima dos protectorados da época colonial.
Finalmente, recusar-se a aceitar o princípio do congelamento da construção de novos colonatos e negar-se, por maioria de razão, a desmantelar os colonatos construídos em território palestiniano, significa igualmente agravar ou manter um status quo que realmente inviabiliza a existência do novo Estado, como, de resto, claramente o comprova as demolições de casas palestinianas na parte ocupada de Jerusalém.
Bem pode a diplomacia americana, através de um porta-voz do presidente, felicitar-se por ter ouvido na mensagem a admissão do princípio da constituição de dois Estados. Na verdade, o que se ouviu foi a negação desse princípio. E Obama se na verdade quer dois Estados ou, querendo, se tiver força para manter essa exigência, mais cedo do que tarde vai ter de dizer aos israelitas que a proposta de Netanyahu é inaceitável.

domingo, 14 de junho de 2009

ZAPATERO AUMENTA OS IMPOSTOS


A CRISE EM ESPANHA

Zapatero anunciou no fim desta semana o aumento dos impostos (indirectos, sobre a gasolina e o tabaco) para fazer face à diminuição da receita e ao aumento de despesa provocadas pela crise.
Por agora, as previsões apontam para um decréscimo do PIB de 3,6% e para um défice da ordem dos 10%. Admite-se que a recuperação começará em 2011 e que até 2012 haverá mais de 4 milhões de desempregados.
Zapatero tem sido coerente nas suas políticas sociais com a análise que faz das causas da crise. Por mais de uma vez afirmou que a crise não foi causada pelos trabalhadores nem pelos sindicatos. Consequentemente, não deveriam ser eles a pagá-la, mediante a redução dos salários e dos benefícios sociais. Não podendo evitar o desemprego, que, de resto, atinge duramente a Espanha, Zapatero tem-se recusado a satisfazer as exigências dos patrões e até do próprio governador do Banco de Espanha que reclamam maior flexibilidade e menor protecção laboral. Por outro lado, várias têm sido as medidas tomadas, além das institucionalizadas, para atenuar a situação dos desempregados. É por isso natural que a despesa aumente. E Zapatero tinha por várias vezes advertido que não deixaria de prestar apoio social para não aumentar o défice. Só que, além do aumento da despesa, viu-se também confrontado com uma diminuição da receita. Perante este cenário optou pela subida dos impostos indirectos, deixando no ar a possibilidade de haver mais aumentos.
Este facto é notícia, em primeiro lugar, por o governo Zapatero ser o primeiro, em plena crise, a aumentar os impostos. O que nós ouvimos de muitos lados, embora com mais insistência da direita, é que os impostos deveriam baixar, sendo a baixa dos impostos geralmente apresentada como uma medida anti-crise susceptível de relançar a procura. O assunto discutiu-se na América, mas também na Europa.
Na América, os sectores neo-keynesianos mostraram-se contrários a uma baixa dos impostos por entenderem que essa maior receita com que as pessoas ficariam se destinaria ao aforro ou ao pagamento de dívidas, acabando por ter um efeito muito reduzido sobre a procura. Mais eficaz seria aumentar a despesa pública com reflexos imediatos na procura.
Na Europa, a diminuição da despesa pública e a baixa dos impostos reclamadas principalmente pela direita anti-Estado social foi interpretada como uma manobra premeditada para enfraquecer o Estado social, por via da diminuição das receitas.
Aliás, quando se debate a baixa generalizada de impostos é sempre necessário situar o país de que se está a falar. Nos Estados Unidos, onde existe um baixo nível de protecção social, principalmente depois da “guerra” que o pensamento neo-conservador moveu, com êxito, contra os programas de assistência social e contra tudo aquilo a que eles chamam “engenharia social”, a baixa dos impostos contribuiu em alguns casos para estimular o crescimento. Sempre alcançado à custa da precarização do trabalho. Mais tarde, essa baixa de impostos acabou por beneficiar escandalosamente apenas os mais ricos, como aconteceu no tempo de W. Bush, sem que daí tivesse resultado um aumento do crescimento.
Na Europa, a “luta” pela baixa dos impostos e a diminuição da despesa pública estiveram sempre associadas, nas últimas três décadas, a uma fragilização do Estado social. Evidentemente, que os defensores desta tese, embora estivessem a actuar com reserva mental relativamente ao Estado-social, acreditavam que ela poderia contribuir para incrementar o crescimento. Curiosamente, o único país europeu que, desde 1996, conseguiu a “quadratura do círculo” – diminuir os impostos e melhorar ou até aumentar a qualidade das prestações sociais – foi a Espanha. E essa é a segunda razão pela qual é notícia a subida de impostos anunciada na passada sexta-feira!

sábado, 13 de junho de 2009

O MINISTRO DA DEFESA E O AFEGANISTÃO


A PARTICIPAÇÃO PORTUGUESA NA GUERRA


Nada do que venha do Ministro da Defesa nos surpreende, principalmente se estiverem em causa interesses americanos. Severiano Teixeira ainda não compreendeu que a guerra do Afeganistão é uma guerra para perder. E não compreendeu, porque não pensa pela própria cabeça. Se pensasse, compreenderia o que os americanos com responsabilidades na Administração Obama já compreenderam sobre o Afeganistão: que aquela guerra não é para ganhar. E como não é para ganhar, o que se pretende evitar é que ela se transforme numa catastrófica derrota.
É provável que Obama tivesse começado por acreditar que a guerra do Afeganistão era para ganhar. Depois, com o andar dos tempos, principalmente a partir do princípio do ano passado, começou a ficar claro que a guerra estava a ser perdida. Obama que já se tinha manifestado contra a guerra do Iraque, num Congresso que quase por unanimidade a apoiou, que sempre se tinha igualmente mostrado muito reservado quanto ao eventual uso da força contra o Irão, fosse directamente, fosse por interposto Estado, que, enfim, de uma maneira geral se recusou sempre a admitir o uso da força como primeiro argumento para resolver os seus problemas, não podia, numa América belicista, onde o complexo militar-industrial desempenha um papel de peso, manifestar-se, de uma assentada, contra todas as guerras em que a América estava envolvida. Ficou com o do Afeganistão por lhe parecer ser aquela que mais facilmente poderia beneficiar do apoio da opinião pública americana: derrotar os talibãs e apanhar Bin Laden são actos de patriotismo que nenhum americano rejeita apoiar.
Entre nós, muito curiosamente, também já há quem tenha percebido isso. Aqui há uns meses atrás, quando Bush ainda governava, Luís Amado, Ministro dos Negócios Estrangeiros, numa entrevista concedida a Teresa de Sousa (Público) ainda se mostrava muito entusiasmado com a guerra do Afeganistão, mas mais recentemente, numa entrevista ao i, já admitiu que a participação da NATO no Afeganistão foi um erro e deu a entender que Portugal deveria reduzir o seu compromisso.
Pois Severiano Teixeira, exactamente nas vésperas de um Conselho de Estado convocado para discutir o assunto, vem dizer, à saída de uma reunião da NATO, que Portugal está a ponderar várias soluções com vista ao reforço significativo sua presença militar no Afeganistão.
Afinal, nestas questões militares que tem a ver com os Estados Unidos, quem é que manda aqui?

LAGES E GUANTÁNAMO



A SUBSERVIÊNCIA EM POLÍTICA INTERNACIONAL


Os imperadores desprezam os súbditos subservientes. Tiram vantagens deles, mas desprezam-nos.
O Congresso americano recusou a transferência para território nacional dos prisioneiros de Guantánamo que não estão em condições de ser julgados mas continuam a ser considerados um perigo para a segurança da América. Nenhum dos 50 estados americanos se voluntariou para os receber, um que fosse. Na Europa, os países para os quais a dignidade nacional ainda representa um valor, já fizeram saber a Washington que não têm condições para receber prisioneiros de Guantánamo, enquanto a América não der o exemplo, recebendo alguns.
Pelo contrário, as Bermudas, Palau e Portugal aceitam receber prisioneiros qualquer que seja a atitude americana.
Mas há mais. Dentro da linha política de acatamento das pretensões de Washington, o Governo português acabou de dar o seu acordo de princípio à utilização da base das Lages como base de treino dos F22 e dos futuros F35, estando por definir a extensão da área a conceder. Segundo informações veiculadas pela imprensa, os americanos reclamam a concessão de um espaço, a norte da Ilha do Corvo, igual a três vezes a área de Portugal, dizendo-se que do lado português terá sido feita uma oferta menor.
Mais uma vez estamos perante um acto de extrema gravidade, lesivo dos interesses e da independência nacional, levado a cabo por um governo que tem na Defesa e nos Negócios Estrangeiros quem sempre encontre uma boa justificação para atender às solicitações americanas.
Exactamente por isso, porque o interesse nacional tem que ser defendido por outros meios, é que tem de se afirmar sem tibiezas que é a todos os títulos inadmissível que Portugal aceite que um Estado com a extensão territorial dos Estados Unidos venha exigir a um pequeno país a concessão de uma extensa área geográfica para a realização de treinos militares que podem perfeitamente ser realizados no território americano do Atlântico ou do Pacífico, onde, além do Hawai, tem outros territórios e outras bases com condições idênticas às dos Açores para os realizar.
O princípio é aqui exactamente o mesmo de Guantánamo: o que os americanos não querem na sua terra vão tentar fazê-lo na terra dos outros, na esperança de encontrarem um súbdito subserviente que acate o seu “pedido”.
E é igualmente importante que se diga que, se este acordo pudesse ter politicamente alguma justificação – e não tem, salvo dentro do tal quadro de completo acatamento das pretensões americanas de que acima falámos – e se não representasse um perigo para a navegação aérea internacional ou não lhe impusesse sérias restrições – e representa e impor-lhe-á, digam o que disserem os ministérios directamente envolvidos – ele constituiria, nos termos em que está sendo negociado, um verdadeiro atentado aos interesses nacionais. Conceder aos americanos o acordo de princípio para a realização daqueles treinos no espaço territorial dos Açores, sem o condicionar à negociação de um tratado – exactamente, um tratado a ratificar pelo Senado americano – significa dar sem nada receber. Significa conceder no quadro de um eventual “executive agreement”, ou seja, de um acordo subordinado à legislação americana vigente, ficando assim completamente à mercê da chantagem que a Administração americana queira exercer, como tem sucessivamente acontecido com as Lages.
Aqueles que nas recentes eleições e posteriormente em discursos tanto têm expressado as suas preocupação com o futuro, com os ónus e encargos legados às futuras gerações, a propósito de obras como o TGV e auto-estradas (enfim, obras de que as futuras gerações vão beneficiar, sem com isto querer de algum modo legitimar os modelos de financiamento que o Governo se propõe pôr em prática) teriam a propósito desta questão uma excelente ocasião para fazer jus ao seu “acrisolado amor” pelo interesse nacional e pela situação das gerações futuras.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

AINDA O VOO AF 447


A PERGUNTA QUE NINGUÉM FAZ

Apesar de ainda não haver certezas sobre as causas do acidente do Airbus 330 da Air France, começa a ganhar corpo a tese de que uma avaria nos sensores de velocidade pode ter estado na origem da catástrofe. Velocidade a mais durante a turbulência pode levar à desagregação do avião em pleno voo, assim como velocidade a menos pode levar à sua queda. Os destroços recolhidos, bem como o estado dos corpos já resgatados, parecem apontar naquele primeiro sentido. Todavia, nem a Air France, nem a Airbus, confirmam para já as causas do acidente.
Há, porém, uma pergunta que, na imensa informação já publicada sobre o tema, ninguém parece interessado em fazer: por que razão os pilotos do voo 447 da Air France não contornaram a tempestade na chamada zona de convergência intertropical, à semelhança do que fizeram os demais voos que nessa mesma noite por lá passaram?

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A TRANSFERÊNCIA DE CRISTIANO RONALDO


COMO SE DETERMINA O PREÇO DA MERCADORIA EM FUTEBOL?

Todas as televisões abriram o telejornal da noite anunciando a transferência de Cristiano Ronaldo para o Real Madrid por 94 milhões de euros. Como se determinará o preço de um jogador de futebol? Há algum jogador de futebol que possa justificar um preço de venda daquela grandeza? Há algum jogador, cuja actividade profissional possa gerar um retorno ao menos equivalente àquele preço? E se a isto juntarmos os vencimentos que o Real Madrid vai pagar chegaremos certamente a números astronómicos. Dir-se-á, de acordo com aquilo a que se pode chamar a lógica Belmiro de Azevedo, que ninguém tem nada a ver com os preços que as empresas privadas se propõem pagar pelos serviços que lhes prestam. Só que esta argumentação que serviu e serve para defender os extraordinários vencimentos e demais regalias atribuídos aos executivos das grandes empresas é hoje, comprovadamente, uma argumentação falhada. Como a crise desencadeada pelo capital financeiro e especulativo se encarregou de demonstrar, quem, de uma forma ou de outra, acaba sempre por pagar aqueles vencimentos e mordomias é a comunidade, seja pela via do contribuinte, seja pela exploração do consumidor. E se a tudo isto acrescentarmos o facto de esta compra ser feita por uma empresa com um passivo superior a 500 milhões de euros menos justificação ela terá ainda.
Deixando agora de lado as incidências sociais do negócio para atender apenas ao plano desportivo, também não falta quem pense que Cristiano Ronaldo, qualquer que seja o vencimento acordado com o Real Madrid, fará um mau negócio. Já se viu que Ronaldo não é um daqueles jogadores que por si transformem o valor de uma equipa. Tem-se visto isso na selecção nacional, mesmo sob a direcção de Scolari onde primava um espírito de grupo e uma disciplina como nunca houve em selecções portuguesas.
No Manchester, onde se notabilizou, ele teve sempre a seu lado grandes jogadores que privilegiavam acima de tudo a equipa e beneficiou também de um treinador que não admitia qualquer tipo de vedetismo e se fazia respeitar por todos, sem excepção.
No Real Madrid, Ronaldo não vai encontrar nada disto. O que ele lá terá é uma espécie de selecção nacional portuguesa, com melhores jogadores, mas com o mesmo clima de permissividade que por cá existe. Dificilmente, muito dificilmente, alguém no Real Madrid de hoje poderá atingir o nível desportivo que Ronaldo alcançou ao serviço do Manchester United.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

AS PERSPECTIVAS DA ESQUERDA

O ARTIGO DE RUI TAVARES SOBRE O COLAPSO DO CENTRO-ESQUERDA

Sem qualquer pretensão de fazer uma análise aprofundado dos resultados eleitorais e das perspectivas que se abrem à esquerda para além do que aqui já foi dito, acho que se justifica uma palavra sobre o artigo de Rui Tavares, no Público de hoje: “Por que colapsou o centro-esquerda”.
A minha convicção, que somente um estudo aprofundado dos resultados eleitorais poderia confirmar, é que o PS não perdeu votos ao centro, nem à direita que o costuma apoiar eleitoralmente com o sentido estratégico de quem não se engana. Pode, por razões que se prendem com a natureza destas eleições, alguma daquela gente não ter votado. Ter-se abstido por entender que o que estava em causa não justificava o “sacrifício” de votar. Onde o PS teve transferência de voto e abstenção marcadamente penalizadora foi naquele sector de esquerda que vota PS quer para barrar o caminho à direita, quer por não ter sido ainda capaz de se reconhecer em nenhuma outra força de esquerda. Este voto, que é um voto mais definido pela negativa do que pela positiva, está à mercê de quem o saiba cativar e convencer de que há outras alternativas credíveis e viáveis.
Mas há ainda um outro voto numericamente muito importante no PS. Há aquele voto dos que ingenuamente acreditam que o PS é o único partido com capacidade para dar satisfação às aspirações do “povo de esquerda” não comunista. Este voto, ao fim de quase 14 anos de governo PS, seja com amplas maiorias relativas, ou mesmo com maioria absoluta, sente-se hoje decepcionado e até defraudado com os resultados da governação socialista, que, agora por uma razão, ontem por outras, encontra sempre motivos para governar à direita quanto mais não seja com a desculpa de que tudo isso é feito no presente com vista a um próximo futuro redentor…que nunca chega.
Este voto está cansado da sua fidelidade eleitoral, mas ainda não conseguiu romper a barreira psicológica que lhe permita mudar.
É para estes eleitores que a esquerda tem de se voltar. São estes eleitores que a esquerda tem de conquistar se quiser constituir-se numa alternativa credível de governação.
Quem continuar a acreditar que encontra dentro do Partido Socialista os nomes ou as forças capazes de promover a mudança, associando-se a outras forças de esquerda, engana-se redondamente. Mais do que as palavras, por vezes “cirurgicamente” altissonantes, contam os factos. E os factos no PS, como de resto em todos os demais partidos social-democratas europeus, apontam sempre no mesmo sentido. No sentido da aproximação cada vez mais consistente às políticas de direita.
Se a gente de esquerda se continuar a deixar enganar pelas palavras, inclusive daqueles que já tiveram responsabilidades de governação, jamais as propostas que defendem serão concretizadas.
Não faltará quem leia neste texto a marca de algum sectarismo. Só que não adianta ir por aí. O que importa – e isso acontece pela primeira vez em Portugal desde o 25 de Abril – é empreender uma luta que acabe com a hegemonia eleitoral do PS no “espaço da esquerda”. Enquanto essa hegemonia se mantiver, as propostas, realistas e viáveis, de esquerda continuarão a ser uma miragem!

BENFICA: O GOLPE DE VIEIRA E COMPANHIA


PROCEDIMENTOS QUE NÃO SÃO SÉRIOS

Se os órgãos sociais do Benfica, nomeadamente a Direcção e a Mesa da Assembleia Geral, fossem constituídos por benfiquistas que encontram na dedicação ao clube a razão suficiente para o servir, ter-se-iam demitido e não se recandidatariam, pela simples facto de já terem dado provas mais do que suficientes de que são incapazes de alcançar os objectivos que se propuseram atingir.
Mas não foi nada disto o que eles fizeram. Esta gente que o Benfica lá tem hoje, a começar em Vieira e acabar no pobre Vilarinho, apenas está interessada em manter os lugares a qualquer preço, caminhando de derrota em derrota para a degradação cada vez mais acentuada da imagem do Benfica.
Esta gente não quer servir o Benfica, quer manter-se no Benfica, quer tirar vantagem de pertencer aos órgãos sociais de um clube outrora grande, mesmo depois de demonstrada, por eles próprios, a sua completa inépcia para dirigir um clube de futebol. E para isso estão dispostos a tudo, mesmo a recorrer aos procedimentos mais batoteiros.
Fazendo o que fizeram, um verdadeiro golpe destinado a inviabilizar o aparecimento de uma lista opositora com capacidade suficiente para lhes disputar o lugar, eles demonstraram que são gente, sem escrúpulos, capaz de manipular os procedimentos para se manterem no lugar.
O Benfica não pode ser governado por gente assim. É gente que não oferece garantias de seriedade. Se se comportam assim com os seus consócios como se comportarão com os adversários?

O AUTISMO EM POLÍTICA

NÃO SE CORRIGE QUEM NÃO TENTA COMPREENDER

Nada pior em política do que não saber fazer as perguntas correctas para as questões que nos preocupam.
Se as eleições me correm mal e eu continuo a atribuir a causa desse fracasso à abstenção ou à ausência de discussão de questões verdadeiramente europeias e me sinto confortável com essa justificação, é óbvio que eu reúno todas as condições para que as coisas me continuem a correr mal no futuro.
Se eu tenho a convicção de que a fraca afluência às urnas me prejudicou ou se estou igualmente convencido que o resultado poderia ter sido diferente se eu tivesse podido debater temas europeus, a primeira coisa que eu tenho de fazer é interrogar-me por que isso aconteceu e não me contentar com a descrição do fenómeno como razão explicativa suficiente do meu fracasso.
Mas há quem não queira fazer perguntas, formular questões, por temer o resultado das respostas. Só que este caminho, autista, é perigoso, neste caso mais do que em qualquer outro. Encontrar repostas para aquelas perguntas revela-se cada vez mais urgente e necessário, já que não é crível que a União Europeia possa por muito mais tempo continuar a resistir a eleições como estas.
Aliás, nem sequer se compreende, a menos que as palavras já tenham em política perdido todo o sentido, que se possa assumir a responsabilidade por uma derrota sem compreender cabalmente as causas dessa derrota e sem depois tirar todas as consequências da assumpção dessa responsabilidade.

terça-feira, 9 de junho de 2009

CONSTÂNCIO PERSISTE NA DEFESA DO INDEFENSÁVEL


A DEMISSÃO SERIA O MÍNIMO QUE SE LHE PODERIA EXIGIR

Constâncio errou pelas mesmas razões que teriam errado a maior parte dos economistas do sistema que saltitam do Banco de Portugal para a Caixa Geral de Depósitos, da Caixa Geral de Depósitos para a Associação de Bancos Portugueses, daqui para o governo, do governo para uma qualquer grande empresa: o papel deles é defender em primeiro lugar o capital financeiro contra os utentes do sistema. Defender o sistema a qualquer preço, mesmo quando estupidamente o fazem contra os próprios interesses do sistema. Mas como Portugal é um país pequenino, com primos e primas por todo o lado, com amigos de amigos comuns e com interesses cruzados em todo o tipo de actividades, o mais cómodo, para quem nunca elegeu coragem como padrão de conduta, é ir contemporizando com tudo até que a força avassaladora dos factos desnude por completo uma situação cujas consequências não podem mais ser escondidas ou encobertas.
Não há durante o longo mandato de Constâncio uma único acto do Banco de Portugal destinado a defender, por iniciativa sua, os utentes do sistema. Foi assim com os arredondamentos, foi assim com os pequenos accionistas do BCP, foi assim com as comissões indevidamente cobradas, foi assim com tudo. Somente quando um clamor se levantava na imprensa, nas televisões, na opinião pública em geral, é que Constâncio, contrafeito, actuava.
Por outro lado, todas – mas mesmo todas! – as declarações públicas de Constâncio sobre a evolução da economia nacional apontavam sempre para a penalização de quem trabalha, para a contracção da massa salarial, enquanto os bancos privilegiados pelo fisco e por operações especulativas sem controlo iam acumulando lucros obscenos, muitas vezes obtidos, como se está ver, a custa de quem neles confiou.
Já aqui explicámos neste blogue que as situações ocorridas no estrangeiro, nomeadamente em Espanha e em França, invocadas por Constâncio para justificar o seu comportamento enquanto supervisor não têm qualquer analogia com o que se passou cá.
Constâncio está agarrado ao lugar e sente com certeza as “costas quentes” para assim proceder. Tem certamente o apoio daqueles cujos interesses defende. Mas não tem seguramente o apoio do povo português. Deveria ir para casa. Estudar. Meditar sobre o que se está passar com o capital financeiro em vez de continuar a usar argumentos de baixa política que, esses sim, mais do que uma tentativa denegridora do Banco de Portugal são um verdadeiro acto consumado de agressão à inteligência de quem o ouve.